Biografia e coletânea de Raymundo de Farias Brito

RAIMUNDO DE FARIAS BRITO. Natural do Ceará, em cuja vila de São Benedito nasceu a 24 de julho de 1864, vindo a falecer, aos cinqüenta-e-três anos, no Rio de Janeiro, em 1917. Fêz o curso de Direito em Recife, recebendo o grau em 1884. Exerceu vários cargos públicos em sua Província e em 1899 transferiu-se para Belém do Pará, como lente substituto da Faculdade de Direito, lecionando também a cadeira de Lógica no Ginásio Paes de Carvalho.

De 1909 em diante assistiu no Rio de Janeiro, onde foi nomeado lente de Lógica do Colégio de Pedro II.

Espírito investigador e meditativo, Farias Brito surge como verdadeiro filósofo, tal a base em que assenta convictamente a sua forte e sincera obra de pensador e espiritualista. "Nele, como em Platão — escreveu Laudelino Freire — havia duas feições primordiais: a investigação dos fenômenos do espírito e a inquirição das leis morais. Era o moralista antes de ser psicólogo, ou psicólogo para ser moralista".

Dentro do campo de estudos a que se volveu desde moço, Farias Brito publicou as seguintes obras: Finalidade do Mundo, em que se integram A Filosofia como Atividade Permanente do Espírito Humano (Ceará, 1895), A Filosofia Moderna (Ceará, 1889) e Evolução e Relatividade (Pará, 1905); e A Verdade como Regra das Ações (Pará, 1905), A Base Física do Espírito (Rio, 1912) e O Mundo Interior (Rio, 1914).

Excertos

(Filosofia e Religião)

O homem tem sobre todos os outros seres este privilégio excepcional: que é êle próprio quem formula as leis a que deve obedecer. Ora, é justo dizer: quem formula as leis a que deve obedecer tem consciência de si mesmo. É a propriedade da natureza humana. Nisto precisamente consiste a liberdade, que, na sua significação real e mais profunda, não é senão a consciência da ação. É a superioridade do homem. E como esta consciência da ação é, em cada um, naturalmente tanto maior quanto maiores são os seus conhecimentos, quanto mais clara se faz a sua percepção das cousas, daí se segue que a liberdade, por sua vez, é uma conquista do espírito, que é um princípio, uma força, que tanto mais cresce quanto mais se aprofunda o homem em seus conhecimentos. E não basta que o homem se conheça a si mesmo como princípio de atividade; é preciso que conheça também a natureza, teatro em que esta atividade se exerce. De modo que é da noção do conhecimento que resulta o conceito da liberdade, sendo que é pelo conhecimento que 0 homem se torna livre. E sendo, como vimos, a filosofia o prin cípio gerador do conhecimento, logo por aí se compreende que é também da filosofia que nasce a liberdade e com esta o direito, que não é senão o organismo objetivo da liberdade, no dizer de Rodolfo von Ihering.

A filosofia não é, pois, somente conhecimento abstrato; é também força social, força viva, capaz de exercer influência sobre a sociedade: e esta influência é real e decisiva, pois é da filosofia que nasce o sentimento moral.

Resta acrescentar que, assim compreendida, a filosofia se confunde com a religião. A religião, de fato, é a filosofia mesma, considerada em sua função prática. Isto facilmente se compreende, considerando que toda religião é uma comunidade de princípios, uma comunhão de idéias. Diversos indivíduos que se sentem unificados por uma convicção comum, são naturalmente levados a formar uma agremiação, sentindo-se bem, pela formação desse corpo harmônico, na unidade da mesma crença e do mesmo ideal: é o que se chama religião. Quer dizer: a religião é a filosofia mesma passando do mundo das abstrações para o mundo da realidade, do pensamento para a vida; é a filosofia deduzindo as leis da conduta e organizando espontaneamente e sem coação a sociedade, só pelo acordo das convicções; numa palavra: a religião é a moral organizada.

(A Verdade como Regra das Ações — Belém, 1905, cap. I, pp. 9-10).

(A Natureza e o Homem)

Tudo se reduz a um só problema: indagar se a natureza, que é um todo orgânico, tende à realização de um fim e se este fim pode ser atingido pela inteligência humana. Esse pro-

blema, como é fácil de ver, decompõe-se em inumeráveis questões particulares, cada uma das quais deve ser estudada em separado e exige uma solução especial; mas todas elas se prendem e obedecem ao mesmo plano de investigações, como anéis sucessivos de uma só e mesma cadeia. Entre esses problemas particulares, o mais importante, aquele que, por assim dizer, constitui a alma de tudo, é o seguinte:

Se na natureza cada cousa ocupa um lugar definido e exerce uma função determinada, qual vem a ser o lugar que ocupa e qual vem a ser a função que exerce o homem, ou, em outros termos: qual é o papel que representa o homem no mundo? E sem que tenhamos disto uma idéia ao mesmo tempo segura e precisa, não poderemos saber qual deve ser nossa norma de conduta na sociedade, pelo que, é só pela solução desse grave problema que poderemos chegar à determinação dos verdadeiros princípios reguladores da ação, sendo dado um fundamento durável à ciência do direito e do dever. De modo que é preciso começar pela ciência da natureza, para terminar pela ciência do homem; nem há outro meio para que se possa chegar à dedução de que devemos estar satisfeitos com o mundo dado, não obstante as misérias a que estamos sujeitos, senão no fato de que entramos como elementos na obra comum da natureza, quando esta não pode deixar de tender à realização de um fim grandioso.

É certo que nada é mais eloqüente e nada se impõe de modo mais esmagador e terrível do que o contraste que existe entre o nada de todas as grandezas humanas e a majestade infinita da natureza. Mas tudo vem de longe e nada do que é grande começou grande. Por isso devemos acreditar na elevação do nosso destino, nem outra cousa se pode supor, quando tudo demonstra e se sente que há perfeita conformidade dos nossos destinos para com o destino universal: pelo que a miséria, o sofrimento, a morte, em uma palavra, todas as formas da dor, devem ser consideradas não como o fim, mas como meios tendentes à realização do fim a que é destinada a natureza humana. E como estamos acostumados a ver que as cousas valem tanto mais quanto maiores são os esforços e sacrifícios com que são obtidas, a conseqüência é que o destino da humanidade é tanto mais elevado quanto mais profundos e mais dolorosos são os sofrimentos humanos, encontrando-se por esta

forma a legítima explicação da verdadeira significação do sofrimento e da dor, e a única interpretação possível da verdadeira significação da morte.

(Finalidade do Mundo, Fortaleza, 1894, 1.° vol. Introd. § VII, pp. 26-27).


Seleção e Notas de Fausto Barreto e Carlos de Laet. Fonte: Antologia nacional, Livraria Francisco Alves.


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