Anotações de Aula do Curso de Filosofia sobre Sartre do Prof. Franklin Leopoldo e Silva – Aula 2

Anotações de aula do curso sobre Sartre ministrado pelo professor dr. Franklin Leopoldo e Silva na FFLCH-USP


Material Enviado por José de Medeiros Machado Jr.

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[J.P.
Sartre, O Existencialismo é um Humanismo (2)]

 

Ao esclarecer noções importantes para o existencialismo, como desamparo e
angústia, Sartre nos alerta para que não nos deixemos impressionar pela
grandiloquëncia retórica habitualmente associada a essas palavras. Devemos
atentar para o conteúdo descritivo. Assim, no caso do desamparo, trata-se do
traço ontológico distintivo do existente, ou da realidade humana: estar lançado
no mundo sem razão ou essência que justifique a sua existência, e portanto sem
uma definição prévia que oriente o uso que deveria fazer de sua liberdade. A
angústia é outro traço ontológico: como nada orienta previamente o exercício da
liberdade, cada ato livre comporta a responsabilidade pela invenção do valor
que lhe corresponde, e a cada vez que exerço minha subjetividade livre defino
ou invento o homem, não como forma universal de humanidade, mas como imagem que
se projeta universal e imperativamente a partir de minha escolha, que tem o
valor absoluto, já que não depende de nada mais a não ser de minha liberdade. A
angústia decorre da opacidade do mundo e de si mesmo, inerente ao ser finito.

Na
mesma direção deve ser entendida a outra característica mencionada por Sartre:
o desespero. Significa que, na ausência de rotas previamente traçadas no
caminho da subjetividade, não há certeza e segurança quanto a qualquer projeto
humano, individual ou coletivo. Assim, se escolho o que entendo que deverei
ser, e portanto as ações que estariam incluídas nesse projeto, essa projeção de
vida se faz no contexto de uma existência inteiramente contingente. Pois se não
há qualquer determinação prévia em relação aos acontecimentos nos quais minhas
ações se inscrevem, não posso contar antecipadamente nem comigo mesmo nem com
os outros. E isso simplesmente porque, sendo livres tanto as minhas ações
quanto as dos outros, uma margem de imprevisibilidade as afeta, e não tenho
qualquer garantia da permanência do teor implicado nas minhas opões, nem nas
escolhas alheias. Isso significa que o objetivo da ação não está nunca
prefigurado nela mesma, e o acontecimento não se segue necessariamente nem de
meu projeto nem de minhas intenções. Nesse sentido, é de forma inteiramente
relativa que devo esperar as conseqüências que julgo decorrerem das
ações, sejam as minhas, de outros, individuais ou coletivas. Não é porque
certas possibilidades são antecipadas por mim nas decisões que venho a tomar
que elas se tornarão realidades. Daí decorrem os enunciados de Sartre que
estabelecem a relação entre possibilidade e realidade no plano da ação: “agir
sem esperança” (pg. 12); ou “não é preciso ter esperança para empreender” (pg.
13).

Desse
significado decorrem duas considerações. Primeiramente, a resposta à acusação
de quietismo, feita ao existencialismo: o desespero não é inibidor das
iniciativas humanas (dos empreendimentos) porque a desesperança que caracteriza
originalmente toda ação decorre da contingência como marca fundamental da
realidade. Não se trata de ter ou não ter esperança, mas sim de que a
contingência absoluta impede que o resultado de qualquer ação possa ser
antecipado determinadamente. Assim não ajo exclusivamente baseado em algum grau
de certeza, ou mesmo de crença, quanto aos acontecimentos, nem mesmo
probabilisticamente, porque estas ações inserem-se num mundo contingente que me
escapa completamente. Mas não posso deixar de agir porque a simples existência
já é liberdade e até mesmo o quietismo seria um ato escolhido livremente. Em
segundo lugar, é necessário agir porque, não sendo o homem pré-definido por
qualquer essência, ele é o que fizer de si. Esse fazer e fazer-se contínuos
implicam um paradoxo: é necessário agir e nenhuma ação é necessária. Porque
ninguém pode definir-se fora do processo de existência que é sempre curso de
ações. Cada um é o que faz de si e nada mais do que isso. Ninguém pode ser
julgado pelo que permaneceu virtualmente capaz de fazer, pela carga de
irrealização com que deseje caracterizar sua vida. Desse modo, o desespero
consiste em que, não tendo domínio antecipado sobre o curso dos meus projetos,
defino-me entretanto pelas ações efetivas, sendo inteiramente responsável pelos
resultados, ainda quando contrariam as minhas intenções. Não havendo moral
formal, também não se pode aceitar uma moral de intenções. Qualquer apelo a
disposições, inclinações e possibilidades não realizadas configura má-fé ou
fuga da responsabilidade pelo processo de existir.

A
perspectiva do “agir sem esperança” não é pessimismo, mas a consciência do
caráter histórico da existência e do exercício da liberdade. Pois é no mundo
histórico que as nossas ações tomarão os rumos que o próprio contexto lhes
prescrever, estando assim, além da minha vontade. É claro que conto com alguns
possíveis implicados em minhas expectativas, e o exemplo dado por Sartre
elucida o teor dessa imbricação: quando espero pela chegada de meu amigo,
alimento expectativas quanto aos acontecimentos aí envolvidos, como por ex., o
trem em que virá não sofrerá acidente, chegará no horário, etc. O fato de que
conto com essas possibilidades significa apenas que elas fazem parte da
expectativa que tenho quanto à chegada de meu amigo, mas é claro que tais
expectativas em nada interferem no rumo dos eventos. Assim também, quando ajo,
faço-o de acordo com os possíveis implicados em minha ação, conto com uma série
de eventos que deverão tornar minha ação efetiva, mas não posso ir além de
expectativas porque não domino a contingência. E isso é ainda mais verdadeiro
quando se trata do contexto das ações históricas. Minha ação depende de outros
que também agem livremente, mesmo quando concordam comigo ou pertencem ao mesmo
grupo. A minha expectativa de uma eventual unidade de ação que concorra para a
consecução de certos objetivos situa-se no plano das possibilidades, e só posso
contar com ela na mesma medida em que conto com a chegada do trem que traz o
meu amigo. Ou seja, a minha ação é limitada não apenas no horizonte de sua
efetividade, porque não domino as circunstâncias, mas também porque outras
ações a limitam, participando do jogo de possibilidades. A liberdade de eleger
a cada momento a ação impede que se estabeleça qualquer representação
inteiramente clara quanto à efetivação de qualquer projeto.

Ora,
isso repercute diretamente em outra característica da liberdade existencial e
histórica: o compromisso ou engajamento. A questão é difícil e motivou também
uma grave objeção ao existencialismo: como posso me comprometer com
determinados objetivos históricos se não tenho condições de prever onde
conduzirá minha própria ação assim como as dos outros? Se não posso esperar
alguma convergência e unidade efetiva das minhas ações e, ao menos, daqueles
com quem compartilho certas expectativas, qual o sentido do compromisso? De
fato, só poderia alimentar esperanças reais quanto a resultados da ação se pudesse
contar com uma natureza humana em que apoiar minhas expectativas; se me fosse
permitido subordina-las a atributos e interesses humanos essenciais e
universalmente válidos, porque nesse caso teria algo como uma base objetiva
para projetar o papel que eu mesmo e os outros indivíduos desempenhariam na
história. Mas não posso afirmar nada a esse respeito porque antecipar o futuro
seria como antecipar a realidade antes que ela se faça, isto é, antes que os
homens se façam e façam a história. O compromisso está nesse sentido
relacionado com o desespero, porque nenhum engajamento pode ocorrer a partir
de uma garantia do futuro. Acreditar que há uma continuidade de ações que tende
a superar a limitação dos projetos individuais é, além de um falso otimismo, uma
crença no determinismo e assim uma negação da liberdade. Comprometo-me hoje com
um certo trabalho político, por ex., contra o fascismo. Minhas ações são
limitadas, e antes de tudo pela minha morte. Os que vierem depois de mim se
conduzirão de acordo com minhas convicções e expectativas? Não necessariamente,
e podem escolher o fascismo como verdade e o mundo histórico será então
configurado a partir dessa decisão. Meus projetos, minhas idéias e minhas
expectativas não imprimem qualquer teleologia ao curso da história, e portanto
nenhuma ação histórica pode inscrever-se num plano de verdade definitiva e de
universalidade, porque nenhuma ação histórica se define de maneira irrevogável.
Para afirma-lo, teria que supor o determinismo histórico.

Sartre
responde então à objeção marxista acerca do sentido do compromisso mostrando
que o engajamento livre não precisa e mesmo não pode fundar-se no determinismo
histórico. O caráter cientificista que está na base desse determinismo, a
concepção naturalista do homem e da ação que sustenta a determinabilidade
completa excluem a subjetividade e a liberdade, sob pretexto de que seria a
continuidade teleológica das ações humanas (alguma espécie de progresso) que
daria sentido ao compromisso. Quando associamos o compromisso à liberdade de
todos os homens temos de excluir do engajamento histórico a certeza e a
determinação. Dessa maneira, o compromisso não pode ser logicamente
universalizado pela continuidade determinada das ações, mas deve ser assumido
historicamente, de acordo com os limites impostos pelo presente que constitui o
quadro de possibilidades imediatas. A conseqüência da liberdade histórica é que
somente há saber histórico na medida em que a história se faz por via das
subjetividades agentes. Não há como antecipar um conhecimento, a menos que se
projete formal e logicamente a história totalizada, isto é, as expectativas
realizadas, numa espécie de sobrevôo que ignoraria a temporalidade e a
contingência da efetuação histórica. Agir sem esperança significa, pois, comprometer-se
sem qualquer certeza. Essa é, aliás a única perspectiva coerente a partir da
definição de opção histórica fundada na liberdade radical.

Assim,
compreender o homem, a ação e a história, é antes de tudo compreender os
limites do processo de existir como o desenrolar da ação histórica. Ainda
assim, compreendemos que há limites sem conhecê-los objetivamente, porque, como
os limites são existenciais e históricos, só os conhecemos na medida em que se
constituem, e eles se constituem na medida em que tentamos superá-los. Aí já
está implicado o significado que a práxis assumirá para Sartre. Ela é vivida na
forma dos projetos e dos limites que enfrentamos na sua realização. Aqui também
aparece de maneira nítida o papel da negação na auto-constituição do sujeito e
no seu processo de historicização. Pois o que podemos notar é que a condição
humana
se define principalmente pelos seus limites. Na medida em que cada
homem não é uma realização parcial de uma essência universal, ou uma
determinada participação numa Idéia da Humanidade, o indivíduo se define pela
condição, isto é, pelo “conjunto de limites a priori que esboçam a sua
situação fundamental no universo.” Todos os projetos humanos, pois, “não passam
de tentativas para transpor esses limites, ou para afastá-los, ou para
negá-los, ou para se adaptar a eles. Conseqüentemente, qualquer projeto, por
mais individual que seja, tem um valor universal” (pg.16). É nesse sentido que
Sartre pode considerar “que exista uma universalidade humana de condição”, pois
“é sempre necessário estar no mundo, trabalhar, conviver com os outros e ser
mortal.” É preciso entender o sentido em que aqui se aplica o termo universal.
Não se trata de uma essência metafisicamente anterior à existência concreta;
trata-se de traços ontológicos comuns a uma condição compartilhada. Esses
traços configuram limites, que são objetivos porque inerentes à condição
humana, e subjetivos, porque cada sujeito os vive singularmente.

Ao
que tudo indica, Sartre afirma essa universalidade de condição não
apenas para fixar traços ontológicos comuns a todos os homens, na forma de
limites definidores da existência histórica, como também para colocar, segundo
o critério da condição existencial, o problema da alteridade ou da
intersubjetividade, e responder, também assim, a uma objeção concernente ao
possível subjetivismo da filosofia da existência. Repita-se: o ponto de partida
só pode ser a subjetividade porque é a única verdade apreendida diretamente.
Essa apreensão, no entanto, não significa conhecimento claro e distinto, como
para Descartes, mas um modo de inteligibilidade processual, o único compatível
com o processo existencial e o processo histórico. É uma inteligibilidade dos
limites e de como o sujeito se constrói tentando ultrapassá-los. O que os projetos
humanos têm em comum, como já vimos, são esses limites, quer dizer, essa
construção, que é uma auto-constituição da subjetividade. Se pretendermos
conhecer o outro de forma clara e definitiva, é a sua própria realidade em
processo de auto-constituição que impede tal conhecimento. Mas essa é também a
razão pela qual não podemos conhecer-nos a nós mesmos. Nesse sentido, não há
subjetivismo ou solipsismo se por essas expressões entendo que posso me
conhecer completamente e que o outro me é completamente inacessível. Conheço-me
experimentando os meus limites e conheço o outro por via de seus limites, na
partilha de uma finitude comum. É o caráter limitado e provisório do projeto
que o outro desenvolve na temporalidade contingente que me permite conhecê-lo –
e precisamente a partir dessa incompletude que o constitui e que nos constitui.
De modo que a alteridade não é um obstáculo intransponível para a
intersubjetividade, desde que não se pretenda conhecer o que o outro é,
mas sim o a construção sempre inacabada que ele faz de si mesmo. Pois,
lembremos, a universalidade está em cada escolha, não como critério dado, mas
como invenção de si mesmo. É nesse sentido que cada um constrói o universal,
escolhendo, sob a égide da universalidade, o que fará de si. O universal não é
algo que paira no céu das idéias, algo de que desfrutamos apenas a sombra ou a
aparência. É algo presente na condição humana na medida em que faz parte de
cada opção. Não posso não escolher, e é impossível que, escolhendo, não escolha
para todos, porque invento em cada escolha o valor que a reveste, e então
invento o universal a partir de minha singularidade. Por isso Sartre pode dizer
que “cada um de nós é absoluto respirando, comendo, dormindo ou agindo de um
modo qualquer.” (pg. 17)

“Sem
dúvida, a liberdade enquanto definição do homem, não depende de outrem mas,
logo que existe um engajamento, sou forçado a querer, simultaneamente, a minha
liberdade e a dos outros; não posso ter como objetivo a minha liberdade a não
ser que meu objetivo seja também a liberdade dos outros.” (pg. 19) Cada
consciência se define como liberdade; mas a consciência encarnada na história
vive o confronto das liberdades. Nesse sentido o desejo de liberdade não é,
para mim e para os outros, a vontade de estabelecer relação com algo que está
fora de mim, mas a tentativa de exercitar a minha condição, cujo conhecimento
implica a universalidade da condição, isto é, a liberdade também como
definição do outro. Pode ser, entretanto, que essa liberdade do outro se torne abstrata
no contexto do exercício concreto da minha liberdade. Há uma influência
significativa em Sartre da idéia hegeliana de conflito das consciências, ou a
dialética do senhor e do escravo. Para Hegel, a minha subjetivação como ser
livre se dá como objetivação do outro e negação da sua liberdade. O senhor se
impõe como tal por via da submissão do escravo. Mas a relação que assim se
estabelece não é uma via de mão única. Precisamente porque a sua condição de
senhor advém da submissão do escravo, o senhor precisa do escravo para
afirmar-se como tal, e nesse sentido ele também se submete ao outro. O que
constitui a dificuldade com que Sartre sempre se defrontará é aquela que já
aparece em Hegel como a questão do reconhecimento. A condição de senhor não
impede que o senhor se reconheça como senhor graças ao escravo e por meio dele.
Ele o objetiva para afirmar a sua subjetividade. E essa relação só poderá ser
conflituosa na medida em que a afirmação de si exigir a objetivação do outro. O
que Sartre ensaia como uma possível saída do impasse, na conferência, é a
incompletude do reconhecimento como limite comum, presente tanto no
reconhecimento de mim mesmo quanto no reconhecimento do outro. Assim fica
suspensa a possibilidade de conhecer o outro na medida em que também não existe
a possibilidade de que venha a conhecer-me a mim mesmo completamente. Pode-se
dizer portanto que o sujeito não está fechado em sua subjetividade porque a
subjetividade não é fechada: seu caráter processual e sua incompletude – a
falta que a constitui – abrem-na indefinidamente, fazendo com que o
conhecimento que posso ter de mim mesmo e do outro nunca se consolide numa
definição. Isso não exclui a objetivação que posso vir a fazer do outro como
efeito cristalizador do meu olhar; mas essa objetivação será sempre um
conhecimento do outro para mim, e nunca uma definição em si mesma.
Consciente dessa incompletude inerente ao processo aberto da existência, cada
um poderá entender que a intersubjetividade não é intercognoscente, mas algo
como a interconsciência da falta constitutiva do sujeito na condição humana.

Essa
impossibilidade de conhecimento e de reconhecimento de mim e do outro não
constitui ainda um isolamento de cada um na sua liberdade? Ou seja, na medida
em que cada um é inteiramente livre para exercer suas escolhas, “cada um de nós
pode fazer o que bem entender” e, não sendo qualquer opção em si mesma
preferível a outra, não haveria como julgar qualquer escolha ou qualquer
pessoa. Afinal, uma escolha é tão gratuita quanto outra. Tudo se passaria como
no ato gratuito de Gide, em que a liberdade não se distingue do capricho.
Capricho e fantasia implicam exercício ilimitado e abstrato da liberdade. Ora,
já vimos que a condição humana se define em Sartre como os limites a serem
transpostos pela liberdade. Esses limites estão sempre dados numa situação
concreta, entendida como o contexto existencial e histórico em que é exercida a
liberdade e no qual se constroem os compromissos que dão sentido às opções.
Assim, a liberdade, sempre situada, não consiste em agir por agir, mas sim em
agir no contexto de uma situação específica. Há toda uma configuração de fatos,
desde os biológicos e psíquicos, até os sociais e históricos, que desenham a
situação em que me encontro. Nessa situação e diante desses elementos,
exercerei a minha liberdade, elegendo uma conduta e ao mesmo tempo o seu valor,
bem como assumindo a responsabilidade pela atribuição de universalidade a essa
escolha. Minha escolha não é, pois, gratuita no sentido de que qualquer
outra seria equivalente; ela é gratuita no sentido em que nada a prescrevia
antes de eu a escolher, nenhum valor pré-estabelecido me inclinava mais para
ela do que para qualquer outra. Mas permanece o fato de que eu a escolhi,
atribui-lhe um valor universal e tornei-me responsável, como se tivesse
escolhido em nome de todos os homens. Então, é verdade que “posso fazer o que
bem entender”, mas se entendo que devo fazer isso em vez daquilo, é porque não
vejo equivalência abstrata entre todas as opções possíveis. Escolher é
instituir valor, dotá-lo de universalidade e assumir a responsabilidade.

A
liberdade assim exercida, sob o peso de uma responsabilidade derivada da
universalidade do valor instituído, permite julgar a escolha. Não,
evidentemente, julgá-la enquanto esta ou aquela escolha, porque não há valores
que me permitam efetuar este tipo de juízo. O que podemos julgar é se a escolha
foi feita com autenticidade, isto é, por via de um efetivo exercício da
liberdade radical. Porque muitas vezes não escolhemos, deixamo-nos escolher,
deixamo-nos levar pelas razões consolidadas que se expressam numa hierarquia de
valores já cristalizados. Essa renúncia à liberdade é o contrário da
autenticidade e Sartre a designa como má-fé. Uma tal renúncia, fuga da
responsabilidade pelo processo do existir, assume duas formas. A primeira é a
dissimulação da liberdade, ocultada sob determinações de vários tipos, sob o
pretexto da recusa da gratuidade. A segunda forma consiste na assunção da
necessidade da existência, atitude que me leva a me atribuir a estabilidade do
ser, a negar o processo de existir e as possibilidades de me tornar diferente
do que sou. Observe-se que a recusa de optar é uma opção, porque se pode
escolher qualquer coisa exceto não escolher. Dito de outra forma: a má-fé é o
ocultamento da contingência e a tentativa de demonstrar que uma existência,
sendo regida pela necessidade, não comporta liberdade ou escolha. Sendo a
existência “a própria contingência do aparecimento do homem sobre a terra” (pg.
20) a conduta livre não pode submeter-se a princípios formais e abstratos.
Assim, a crença na necessidade é a alienação, ou a delegação da própria
subjetividade a instâncias ou princípios estranhos e contrários à liberdade.

O
humanismo existencialista, ao admitir a contingência tem de privilegiar o
concreto. Não se trata, portanto, de emitir julgamentos morais acerca da
Humanidade: o Homem é admirável; ou o Homem é desprezível, porque não existe
humanidade realizada. Assim não há porque odiar a Humanidade nem porque idolatrá-la.
O Homem não está feito e jamais estará. Por isso diz Sartre que “o homem está
constantemente fora de si mesmo; é projetando-se e perdendo-se fora de si que
ele faz com que o homem exista.” (pg.21) Procurar-se fora de si é o mesmo que
se superar ou transcender-se na direção de si mesmo, pois por mais que se
transcenda e vá além de si, o homem somente encontrará a si mesmo, como se o
ato de transcender-se constituísse o próprio centro do homem. Desse modo,
contrariando o humanismo tradicional, o existencialismo não considera que o
centro do homem esteja nele mesmo: o universo humano é aberto e descentrado:
“recordamos ao homem que não existe outro legislador a não ser ele próprio e
que é no desamparo que ele decidirá sobre si mesmo; e porque mostramos que não
é voltando-se para si mesmo mas procurando sempre uma meta fora de si –
determinada libertação, determinada realização particular – que o homem se
realizará precisamente como ser humano.” (pg.22)

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