A MÃE DE BRANCO – Conto de Fyodor Sologub

SOLOGUB

(1863 — 1927)

" FIÓDOR KUSMJTCH TETÈRNIKOV é o verdadeiro nome do escritor russo Fiódor Sologub, geralmente conhecido como narrador e, principalmente, autor do romance "O demônio mesquinho", embora pela história literária russa considerado mais como poeta, conhecido entre os modernos autores pelo seu "satanismo" e pelo classicis7)io de sua linguagem muito vizinha da dos parnasianos. Embora simbolista, Sologub se mantém fiel a certo purismo lingüístico da escola anterior, sendo um grande mestre da palavra. O poeta é geralmente apreciado, tendo publicado seu primeiro volume de "Poesias" em 1896, sendo ãe resto muito 2>essoal na sua inspiração tôãa voltada para um mundo sem Deus, reflexo do próprio mundo interior.

O primeiro romance de Sologub chamou-se "Sonhos maus" e é francamente autobiográfico. O objetivo realista é indicado pelo próprio autor que escreveu: "Não tive necessidade de imaginar nada. Tudo aquilo que aparece como anedótico e psicológico em meu romance está fundado em observações muito precisas". Sologub escreveu outros trabo.lhos em que a lenda se mistura à realidade e, por vezes mesmo, aos contos de fadas. "O triunfo da morte" é um deles. Em 1921 foi publicado o seu romance "A encantadora de serpentes" em que entra em cena o elemento social. Nesse livro, Sologub se mostra um sonhador, mas com tendência a certo sentimento de consolação, que o redime de todo o pessimismo de sua obra anterior.

Fyodor Sologub (1913)
Fyodor Sologub (1913)

A MÃE DE BRANCO

I

A Páscoa aproximava-se. Esperidião Constantino-vitch Saksanlov sentia-se aborrecido, de mau humor. Aquilo principiava, ao que parece, no momento em que lhe tinham perguntado, na residência dos Gorodischevs: "Onde tenciona passar as festas?"

Saksanlov, fosse porque fosse, demorou a responder. A dona da casa, senhora robusta, míope, bastante faladora, acrescentara: "Venha ter conosco".

"Que maçada!" pensou o interpelado. Ao ouvir as palavras da mãe, Valéria Mikhailovna lançou um olhar rápido a Saksanlov e depois continuou, com muita naturalidade, a conversar com certo rapaz, professor auxiliar numa Faculdade qualquer.

Para as mães de meninas casadoiras, Esperidião Constantinovitch representava um bom partido, e esta circunstância irritava-o; considerava-se velho solteirão, pois já ia nos trinta e sete anos. Resolveu-se, por fim, a responder ao convite, e fê-lo de modo consiso: — Muito obrigado. Em geral, passo essa noite em casa.

A jovem fitou-o outra vez, sorriu e indagou:

— Com quem?

— Só, replicou Saksanlov, com a voz um pouco alterada. *

— Que lindo misantropo! comentou a senhora Goro-dischev, esboçando um sorriso amarelo.

Saksanlov gostava da sua liberdade. Havia ocasiões em que perguntava a si mesmo como é que estivera, uma vez, tão à beira do casamento. Agora, havia-se habituado aos seus reduzidos aposentos, que mobiliara com sobriedade, da mesma forma que se tinha acostumado ao criado Teodoro, homem tranqüilo, já de idade, e à mulher deste, Cristina, também velha, e que lhe cozinhava o jantar. O fato é que se convencera de que nunca se casaria; assim permaneceria fiel ao seu primeiro amor. Aquela vida solitária, sem nenhum fito sério, ajudara a encher-lhe o coração de indiferença. Possuía meios de vida razoáveis; o pai e a mãe tinham morrido havia muito, e êle não conhecia nenhum parente chegado. A vida, assim, decorria-lhe sossegada; interessava-se um pouco pela literatura e pela arte moderna e saboreava, com epicurismo, alguns dos prazeres que há no mundo; isto não impedia, porém, a que o tempo lhe parecesse vazio, sem maior significação. Não fora certo sonho, puro e resplandecente, que o visitava, às vezes, e Esperidião Constantinovitch ter-se-ia conservado inteiramente frio, como acontece a muitos outros homens.

II

O seu primeiro e único amor, esse que findara antes mesmo de haver desabrochado, é que o fazia, em certas noites, ter sonhos suavemente tristes. Cinco anos antes encontrara a moça que lhe produziria tão duradoura impressão. Pálida, delicada, de cintura fina, olhos azuis e cabelos loiros, surgira-lhe assim como uma criatura quase celestial, feita de névoa e tombada por acaso e por pouco tempo no tumulto da cidade. Seus gestos eram lentos; a voz clara, terna, doce, assemelhava-se ao murmúrio duma corrente que deslizasse sobre a areia.

Saksanlov, por acaso ou por desígnio da Providência, viu-a sempre vestida de branco. A impressão de alvura tornou-se para êle inseparável da imagem dela. Até o nome, Tâmara, lhe parecia alvinitente, branco como a neve das montanhas. Esperidião Constantinovitch começou a visitar os pais de Tâmara. Por mais de uma vez pensou em lhe dizer essas palavras que unem os destinos de alguém aos duma pessoa muito querida. Ela, porém, esquivara-se sempre, e, nesse instante, o medo e angústia refletiam-se-lhe nos olhos. Que receava ela? No entanto, Saksanlov adivinhou-lhe no rosto os sintomas do amor juvenil: cintilava-lhe o olhar, quando êle aparecia, e, nas faces, espelhava-se-lhe um leve rubor.

Mas, numa tarde inesquecível, Tâmara dignou-se ouvi-lo. Estava-se nos primeiros dias da Primavera; as árvores revestiam-se de folhas; o rio desprendera-se do gelo e suas águas corriam apressadas. Numa casa da cidade, Tâmara e Saksanlov, sentados junto da janela, contemplavam o Neva. Sem se preocupar como falaria, principiou êle a dizer-lhe palavras doces, que a ela pareceram alarmantes. Ficou mais pálida, sorriu constrangida e levantou-se. A mão delicada tremia-lhe no espaldar da cadeira.

— Amanhã, foi tudo quanto respondeu, com voz sufocada. E saiu da sala.

Saksonlov, numa espectativa ansiosa, ficou, por muito tempo, fitando a porta por onde ela desaparecera. A cabeça andava-lhe a roda. De repente descobriu um caminho de lilás branco. Pegou-o e foi-se embora, sem se despedir dos donos da casa.

Naquela noite não pôde dormir: deixou-se ficar atrás das vidraças, a ver a rua escura, que, pouco a pouco, despertava com os alvores da manhã; sorria e, uma vez por outra, aspirava o ramo de lilás que tinha na mão. Quando foi dia claro, notou que o chão do quarto estava cheio de pétalas daquela flor. Aquilo o surpreendeu e Saksanlov achou-se ingênuo e ridículo. Depois de tomar banho, o que o fêz recuperar a calma habitual, saiu de casa e foi visitar Tâmara.

Soube, então, que ela adoecera. Apanhara um resfriado na véspera. Esperidião Constantinovitch nunca mais a viu. Duas semanas depois ela estava morta. O desolado pretendente não foi ao enterro. Aquele triste desenlace deixara-o estupefato, mas quase insensível, e, agora, nem mesmo seria capaz de dizer se a tinha amado ou se fora simples e breve fascinação.

Não era raro, à noite, sonhar com ela. A imagem da moça, entretanto, tornara-se pouco nítida. Não possuía nenhum retrato de Tâmara. Mais tarde, decorridos alguns anos, viu um ramalhete de lilás branco na vitrina dum restaurante; e essa flor, deslocada ali no meio das iguarias, recordou-lhe, de súbito a pobre Tâmara. Voltou a pensar nela, com insistência, geralmente à noite. Às vezes, passava de leve pelo sono e isso bastava para que a visse chegar e aproximar-se. A visão parecia-lhe querer dizer qualquer coisa e fitava-o com expressão carinhosa e suplicante. Afligia-o sobremaneira esse ar ansioso do fantasma.

Ao sair de casa dos Gorodischevs, Esperidião Constantinovitch pensou: "Ela, decerto, há de querer dar-me as boas-f estas…" E sentindo-se tão desolado e tão apreensivo, perguntou a si mesmo: "Por que não caso? Não convém continuar assim sozinho … demais a maisagora nestas noites festivas…"

Lembrou-se, então, de Valéria Mikhailovna. Não era bonita, não. Mas vestia-se muito bem. Saksanlov tinha a certeza de que ela o amava e que não recusaria o seu pedido de casamento.

 

Na rua, o rumor e a multidão distraíram-no um pouco, e o seu cinismo habitual envenenou-lhe os pensamentos que Valéria lhe havia despertado. Além disso, poderia ser infiel à memória de Tâmara? Tudo lhe pareceu, à sua volta, tão vulgar e insípido, que Saksanlov só desejou uma coisa: que a sua Tâmara lhe viesse dar as boas-festas da Páscoa.

"Mas", refletiu, em seguida, "se ela fixar em mim aquele olhar ansioso? Linda e inocente Tâmara, que é que você pretende? Será beijar-me com seus lábios puros?"

III

Assim pensando a respeito dela, Saksanlov vagueou pelas ruas, perscrutando a fisionomia dos transeuntes. Esses rostos sem graça logo o enfastiaram. Quem haveria, de fato, bastante digno e interessante, com quem êle pudesse trocar as saudações da Páscoa? Se devesse beijar alguma boca, só poderia ser a duma criança. Para Saksanlov só os lábios infantis mereciam receber o ósculo festivo.

Continuou a passear por mais algum tempo, até que se sentiu fatigado. Então, fugiu à multidão turbulenta e entrou num cemitério. Ali viu um rapazinho sentado num banco, imóvel, com ar apreensivo. Tinha olhos azuis e suaves como os de Tâmara, e todo êle era tão pequenino, que as pontas dos pés lhe ficaram a balançar, sem tocarem o chão. Saksanlov sentou-se-lhe ao lado e contemplou-o com curiosidade e simpatia. Naquela crian-ça havia qualquer coisa que lhe despertava as mais doces recordações, embora o desconhecido não passasse dum garotinho pobre, mal vestido, com um gorro branco enxovalhado sobre os lindos cabelos loiros, e de botas mas e cambadas nos pezinhos frágeis.

Dali a pouco o pequeno levantou-se e começou a chorar; depois, correu para ò portão, saiu, atravessou a rua e parou; correu noutra direção e parou outra vez. Era evidente que não sabia que caminho tomar. Chorava sempre e as lágrimas caíam-lhe pelas faces. Algumas pessoas o rodearam e um polícia aproximou-se. Perguntaram-lhe, então, onde morava.

— Na casa alta, murmurou o interrogado, com voz quase inaudível.

— Em que rua? inquiriu o policial.

O pequeno, porém, não sabia responder, e tornou a declarar que era na casa alta.

O guarda pensou um pouco e foi de opinião que, naquelas imediações, não havia nenhum prédio que se identificasse com esse.

— Com quem mora? indagou um operário. Não tem pai?

— Não tenho, confirmou o pequeno, olhando, por entre a névoa das lágrimas, para as pessoas que o rodeavam.

O operário abanou a cabeça, com ar compungido, e tornou a perguntar:

— E mãe?

— Sim, tenho mãe, volveu o garoto.

— Como se chama?

— Chama-se mãe.

Refletiu uns instantes e acrescentou:

— Mãe de preto.

— E o nome dela? exclamaram, admirados.

— Primeiro, tive uma mãe de branco e agora tenho uma de preto, explicou o rapazinho.

— Pois, meu pequeno, ninguém lhe consegue arrancar mais nada, observou o polícia. O melhor que posso fazer é levá-lo à delegacia. Talvez lá se apure alguma coisa.

Aproximou-se de uma porta e tocou a campainha. O porteiro, logo que viu o guarda, veio até ele, com a vassoura na mão, e o polícia pediu-lhe que levasse a criança à delegacia. O rapazinho, no entanto, reconsiderou e disse:

— Deixe-me ir só. Sou capaz de me lembrar ondeé a casa.

Ter-se-ia, de fato, recordado ou assustar-se-ia com a vassoura do porteiro? O certo é que se escapuliu tão depressa, que Saksanlov o perdeu de vista. Mas, não demorou que o fugitivo não afrouxasse a corrida. Subia a rua, indo do lado esquerdo ao lado direito e vice-versa, como se procurasse, em vão, a porta da sua residência. Esperidião Constantinovitch seguiu-o em silêncio; não sabia de que forma devia falar a uma criança.

Por fim, o pequeno parou, cansado, junto dum lampião, ao qual se encostou, e pôs-se, novamente, a chorar.

— Diga-me, meu pequeno, não encontra a casa?

O garoto olhou para o seu interlocutor, com semblante triste, e Saksanlov lembrou-se, de repente, qual fora a razão que o levara a perseguir o pequeno com tanta insistência: no olhar e no aspecto dele havia algo que o assemelhava a Tâmara.

— Como se chama, meu filho?

— Lexa.

— Vive com sua mãe?

— Sim, senhor . .. com a mãe de preto. Mas já tive uma mãe de branco.

Saksanlov calculou que, pela expressão "mãe de preto", queria éle referir-se a alguma freira.

— Onde se perdeu?

— Eu andava a passear com, ela, e passeamos, passeamos. Depois, ela disse-me que me sentasse e esperasse e foi-se embora. E eu tive medo.

— Quem, a sua mãe?

— É muito má … e veste de preto.

— Que faz ela?

O rapazinho pensou um pouco.

— Toma café, respondeu.

— E não faz mais nada?

— Zanga-se com os vizinhos, replicou Lexa, depois duma pausa.

— E a mãe de branco … onde está ?

— Levaram-na, metida num caixão. E o pai também o levaram.

Apontou, nesse momento, para qualquer parte, longe, e o pranto recomeçou-lhe.

— Que lhe poderei fazer? cogitou Saksanlov.

De súbito, Lexa desatou, outra vez, a correr. Dobrou várias esquinas e abrandou o passo. Esperidião Constantinovitch viu-o, e o pequeno mostrou-se, ao vê-lo, contente e assustado, ao mesmo tempo.

— É aqui a casa alta, disse êle, apontando para um prédio grande, de cinco andares, muito feio.

Nessa ocasião, apareceu à porta uma de olhos e cabelos negros, vestida de preto. Tinha na cabeça um lenço também preto, semeado de bolinhas brancas. O pequeno recuou, amedrontado.

— A mãe! balbuciou.

Espantada, a madrasta não tirava o olhar de cima dele.

— Como veio até aqui? gritou ela. Não lhe disse que ficasse sentado onde estava?

Parecia disposta a bater-lhe, mas, reparando que um cavalheiro de aparência respeitável os observava, baixou logoi a voz:

— Não sabe ficar sozinho um instante. Estou cansada só de andar à sua procura, patetinha!

Agarrou na mão do garoto e conduziu-o para dentro de casa.

Saksanlov tomou nota da rua e regressou aos seus aposentos.

IV

Esperidião Constantinovitch não desgostava de ouvir as opiniões, sempre sensatas, do criado. Ao chegar a casa, contou-lhe a história do pequeno Lexa.

— A madrasta perdeu-o de propósito, declarou logo Teodoro. — Que malvada, levá-lo assim para tão longe!

— Mas por que seria?

— Quem é que sabe? Talvez calculasse que o pequeno andaria ao acaso pelas ruas até encontrar alguém que se condoesse dele. Que se há de esperar das madrastas? De que lhe serve o garoto?

— No entanto, a polícia podia descobri-la, observou,

ingenuamente, Saksanlov.

— É possível. Mas, se ela saísse da cidade, quem lhe poria mais a vista em cima?

O patrão sorriu. "Na verdade", pensou, "Teodoro daria um juiz de primeira ordem".

Mais tarde, sentado, com um livro nos joelhos, perto do candeeiro, Saksanlov passou pelo sono e viu Tâmara, de branco, afável, aproximar-se da cadeira onde êle estava. Seu rosto assemelhava-se extraordinariamente ao de Lexa. Tâmara fitou o seu namorado de outrora, com grande insistência, como se esperasse qualquer coisa. Como era opressivo, para êle, aquele olhar tão brilhante, tão súplice! Que desejaria ela? Saksanlov ergueu-se, em sonho, e foi até a poltrona onde Tâmara se havia sentado. Em frente dela, perguntou em voz alta, implorando :

— Que quer? Diga-me!

Ela, porém, já se havia ido embora. "Foi só uma alucinação", murmurou Saksanlov, desiludido.

V

No dia seguinte, ao sair da exposição de pintura, encontrou-se com as Gorodischevs, e contou a Valéria a história do rapazinho perdido no cemitério.

— Coitado! exclamou a moça, enternecida. — O que a madrasta queria era ver-se livre dele.

— Provavelmente, retorquiu Saksanlov, admirado da concordância de opiniões a respeito daquele simples incidente.

— Não há dúvida. O rapaz não tem, pai e vive com a madrasta, que o considera um obstáculo. Se ela se descartasse do garoto, recuperaria sua liberdade.

— Vê as coisas pelo lado mais sombrio, notou Saksanlov, sorrindo.

— E por que você não o adota? sugeriu Valéria Mikhailovna.

— Eu?! … exclamou o outro, surpreendido.

— Você vive só, insistiu a moça. — Não tem nenhum parente. Faça uma boa ação agora na Páscoa. Ao menos já teria alguém com quem trocasse o beijo (la praxe…

— Mas que faria eu com um pequeno em casa?

— Arranje uma criada para êle. O destino enviou-lhe essa criança, Esperidião Constantinovitch.

Saksanlov fitou a sua interlocutora e viu-lhe o rosto animado, terno, com uma expressão que o convenceu.

Quando Tâmara lhe tornou a aparecer em sonhos, parecia-lhe ser mais fácil interpretar-lhe o desejo tão persistentemente insinuado no seu olhar. No silêncio do quarto pareciam ressoar estas palavras, ditas numa voz suavíssima: "Faça o que ela lhe disse".

De manhã, Saksanlov levantou-se satisfeito. Na mesa estava um ramo de lilás branco. De onde viera? Seria Tâmara quem o tinha posto ali, para lhe recordar que devia cumprir a sua vontade? Se casasse com a filha dos Gorodischevs e se adotasse aquela criança, ser-lhe-ia possível aceder ao desejo de Tâmara. Aspirando o perfume da flor, Saksanlov sentiu-se com o espírito mais tranqüilo. Só então se lembrou de que fora êle mesmo quem, no dia anterior, comprara o ramo e o trouxera para casa. "Mas isso não tem importância", disse, com seus botões. "De qualquer maneira é um bom presságio."

Saiu e foi à rua onde morava Lexa. O rapazinho estava à porta da casa. A madrasta, informou, tomava café, nesse momento, e questionava com a senhoria. Explicou ainda que a mãe dele falecera quando êle tinha só três anos e que o pai, depois, se casara com aquela mulher morena, mas que morrera logo no ano seguinte.

A madrasta, Irene Ivanovna, ficara com um filho, agora com doze meses de idade, e tencionava casar-se outra vez.

O enlace devia verificar-se dentro de poucos dias, e, logo a seguir, partiriam para a província. Lexa era, mais do que nunca, um estranho para ela.

Saksanlov procurou-a e pediu-lhe que deixasse o pequeno ir em sua companhia.

— Com todo o gosto, respondeu Irene Ivanovna, esboçando um sorriso malicioso. Fêz uma pausa e acrescentou: — Só exijo que me pague a despesa que fiz com a roupa dele.

Desta forma, Lexa ficou instalado nos aposentos de Esperidião Constantinovitch. Valéria ajudou-o a descobrir uma criada para cuidar do pequeno e ocupou-se de outros pormenores relacionados com o fato. Assim tinham desculpa as visitas amiudadas que fêz à casa de Saksanlov, e este, vendo-a nesses trabalhos, achou-a diferente : dir-se-ia que ela lhe estava abrindo o coração e que seus olhos se tornavam cada vez mais meigos. Era como se a ternura, que irradiava da memória de Tâmara houvesse atingido também a alma e o corpo de Valéria Mikhailovna.

O que Lexa contava de sua vida enternecia Teodoro e a mulher. Na véspera de Aleluia quando o levaram para a cama, os fiéis velhos empregados penduraram um ôvo de Páscoa no leito do rapazinho.

— É a mamãe de branco que lhe envia, explicou Cristina. — Mas não lhe deve mexer antes que Nosso Senhor tenha ressuscitado e que os sinos comecem a tocar.

Lexa obedeceu. Durante algum tempo contemplou o ôvo, deliciado. Por fim, o sono chegou.

Nessa noite, Saksanlov estava em casa, só, no seu quarto. Cerca da meia-noite, experimentou um desejo irresistível de se deitar, e fê-lo com prazer, pensando que Tâmara lhe apareceria, como de costume. Na verdade, ela veio, vestida de branco, radiosa; ouviam-se, ao longe, os sinos das igrejas repicando. Tâmara inclinou-se para êle, e Esperidião Constantinovitch — oh alegria indizível! — sentiu um contato suavíssimo nos lábios. Ao mesmo tempo, uma voz meiga murmurou: "Boas Festas.

Sem abrir os olhos, apertou nos braços um corpo que lhe pareceu terno e delicado. Era Lexa, que lhe viera dar as saudações da Páscoa. Os sinos haviam-no acordado, e o pequeno agarrara no ôvo e fora logo ao quarto do seu benfeitor.

Saksanlov acordou, então, de uma vez. Lexa riu e apresentou-lhe a oferta.

— É a mãe de branco quem manda isto, balbuciou êle. — Eu dou-o ao senhor, que pode oferecê-lo à tia Valéria.

— Está bem, meu filho, farei o que você dia, replicou Saksanlov.

Tornou a deitar Lexa na cama e foi, depois, à casa de Valéria Mikhailovna, com o presente da "mãe de branco". Mas, nesse momento, a impressão que tinha era de que levava uma oferta da parte de Tâmara.

(Tradução revista de Cabral do Nascimento).

 

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