Santo Agostinho: a verdade e a felicidade residem em Deus.
Por Miguel Duclós
Este texto procura elucidar brevemente os pontos do
pensamento
agostiniano que são necessários para poder compreender porque,
para este autor, o homem pode conhecer apenas pela graça divina, mas
tem o dever moral de preparar sua alma e seu corpo para receber esta luz e de
fazer bom uso do livre-arbítrio. Procurei fazer associações
despretensiosas com outros traços da cultura anterior a sua época,
como a mitologia helênica.
No Livro VII das
Confissões
e no diálogo
O Livre Arbítrio
, Agostinho argumenta especificamente sobre
o problema do mal. Tem ele o mal como algo presente, e nos primeiros livros
das
Confissões
, identifica-o em sua infância e na sua
juventude libertina, ocorridas antes do episódio de agosto de 386 que
o levou à conversão, (1)e antes de sua convivência com Santo
Ambrósio, que o batizou e a quem chama de agente de Deus.
Sendo Deus eterno e imutável, autor de coisas
muito boas, qual é, então, a origem do mal? Agostinho sabe, quando
isto pergunta, que a origem do mal é tradicionalmente explicada pela
Igreja Católica com a queda do Arcanjo Lúcifer. Embora as
referências
Bíblicas ao Maligno como ex-Arcanjo sejam escassas, e o próprio
nome Lúcifer (formado a partir do latim
lux
) e a hierarquia
angelical tenham sido forjadas com o decorrer da Idade Média, ainda assim
encontramos algumas passagens bíblicas que ilustram bem este tema
daqueles
que querem ser como Deus e por isso são punidos. Alguns exemplos
estão
no Velho Testamento, em Isaías 14:
”12 Como caíste do céu, ó estrela
da manhã, filha da alva!
como
foste lançado por terra,
tu que debilitava as nações!
13 E tu dizias no teu coração: Eu subirei
ao céu, acima das estrelas de Deus exaltarei meu trono, e no monte
da congregação me assentarei, da banda dos lados do norte.
14 Subirei acima das mais altas nuvens e serei semelhante
ao Altíssimo.
15 E contudo levado será ao inferno, ao mais
profundo do abismo. “(2)
Ou no Novo Testamento, no Apocalipse segundo São
João, no capítulo 12, onde há uma mulher, possivelmente
virgem Maria, que dá à Luz um varão “que há de reger
todas as nações com vara de ferro” e é tentada pelo
Dragão
da maldade, que após isso tem de enfrentar as tropas celestiais:
”7 E houve uma batalha no céu. Miguel e seus
anjos batalhavam contra o dragão, e batalhava o dragão e seus
anjos.
Mas não prevaleceu, nem mais o seu lugar se achou
nos céus.
E foi precipitado o grande Dragão, a antiga
serpente, chamada o Diabo, e Satanás, que engana todo o mundo; ele
foi precipitado na terra, e os seus anjos foram lançados com ele.”
Satanás na terra tenta os homens, mas o Apocalipse
prossegue explicando que é vencido pelo poder do Cordeiro, o Jesus
Cristo.
Não podemos também esquecer que no
Gênesis,
a Serpente consegue seduzir Eva prometendo-lhe que esta ficaria igual a Deus
se comesse o fruto proibido, e era por isso que Deus lhe proibira. Realmente,
após comer a queda, Deus fala para seus anjos: ” E eis que o homem
é
um de nós, sabendo o que é bem e o mal; ora, pois, para que
não
estenda a tua mão, e tome também da árvore da vida, e coma
e via eternamente” (
Gen,
3, 22). Começa então, segundo
a Bíblia, a condição miserável do homem, obrigado
a trabalhar para garantir seu sustento, e a se abrigar para fugir do frio. Este
trecho sugere que o homem estará eternamente condenado a escolher entre
o Bem e o Mal. Então, tanto a queda do primeiro anjo quanto a queda do
primeiro homem é causada por um ato livre de vontade, em que se pretende
ser igual a Deus.
No capítulo 3 do livro VII das
Confissões
, Agostinho se pergunta, a respeito de Lúcifer: “E se por uma
decisão
de sua vontade perversa, se transformou de anjo bom em demônio, qual
é
a origem daquela vontade má com que se mudou em diabo, tendo sido criado
Anjo perfeito, por um criador tão bom?”. Logo, não ignora o
problema
da origem do mal tal qual a Igreja Católica o explica, mas vai ainda
além, perguntando a origem da perversão da vontade nas criaturas
boas criadas por Deus.
A argumentação segue considerando que,
naturalmente, o mal não provém de Deus, mas está nas coisas
criadas e na matéria. As coisas criadas “não existem absolutamente
nem totalmente deixam de existir” (Livro VII, cap 11). As coisas existem
enquanto
participam da Suma Existência, daquele que é, do Imutável,
e deixam de existir quando se afastam dele. As coisas que se corrompem
são
boas ao menos em parte, pois não haveria o que se corromper se fossem
totalmente más. Porém, não são como Deus,
absolutamente
boas, pois se assim fosse seriam incorruptíveis. Assim, o mal ocorre
quando as criaturas se afastam de da existência, ou seja, o mal não
existe propriamente, mas é um não-ser. Tudo é verdadeiro
enquanto existe e a falsidade só ocorre quando se toma por existente
o não existente. Agostinho no capítulo 16 do livro VII, chega
à definição do mal como uma perversão da vontade
desviada da Substância Suprema – Deus.
Se Deus é a suma Existência e a Suma
Bondade,
os seres para alcançar a verdade tem de procurá-lo. Julgar que
o caminho para se atingir a verdade seja humano, ou dependa apenas de
esforços
humanos, constitui soberba, pois a verdade é externa e independente do
homem. Para Agostinho, o conhecimento da Verdade depende em última
instância
da Graça Divina, que agracia apenas alguns escolhidos. Qual é
o dever moral do homem então, qual é o seu campo de
ação,
se ele parte em busca da verdade sem saber se a vai encontrar? Procurarei tratar
deste tópico a seguir.
Como aponta Novaes, em seu artigo “Nota sobre o problema
da universalidade em Agostinho, do ponto de vista da relação entre
fé e razão”, Agostinho destoa tanto dos aristotélicos,
quanto dos estóicos e epicuristas em sua concepção de
felicidade.
Os primeiros tomam a felicidade como uma atividade da alma em consonância
com a virtude, os segundos como um vigor da alma e os terceiros como a vontade
do corpo. Para um cristão, porém, a felicidade é um dom
de Deus. Não obstante, o homem deve procurá-la através
da purificação da alma. Para purificar a alma o homem tem de
reconhecer
a condição miserável da humanidade após o pecado
original, e tem de ter a humildade de reconhecer o a felicidade como alheia
a si. O homem tem de se tornar digno de receber a graça. A idéia
da ascese da alma é muito importante também para os
platônicos
e neoplatônicos (3), que influenciaram Agostinho profundamente. Mas
Agostinho
vê nesta doutrina o erro crucial de Porfírio, por não ter
reconhecido que o verdadeiro caminho não é humano, mas
provém
do Absoluto, de Deus. (4)
O homem é mais especial que as outras
criações
de Deus, e que os outros seres dotados de alma (animais), pois tem uma alma
racional. O homem é especial porque foi feito à imagem e
semelhança
de Deus. {5} No Gênesis, antes da queda, Deus concede ao homem que usufrua
livremente da terra. Para Agostinho, a semelhança do homem com o seu
criador é a razão. Deus, conhecedor de todas as coisas, possui
também a razão infinita. Porém a razão humana
está
corrompida, e distante da divina. O homem tem um “déficit moral”, e por
isso não consegue cumprir plenamente a sua natureza de animal racional.
E mesmo os bebes já nascem no pecado, como exemplifica Agostinho em sua
autobiografia, quando se recrimina pelo seu deleite durante o amamentamento.
Os desejos e as paixões impedem um bom uso da razão, e impedem
uma vida contemplativa. Mesmo ao se recolher em seu monastério, se
entregando
à devoção religiosa ao lado de companheiros como
Alípio
e Evódio, Agostinho nunca conseguiu se livrar das
preocupações
mundanas. Era afastado do
otium intelectuale
, por exemplo, pelas suas
obrigações com o povo em suas funções sacerdotais
ou familiares.
O problema do pecado original é fundamental para
compreender-se o que se segue, por isso me demorarei um pouco mais nele. Antes
de comer do fruto da árvore da ciência do bem e do mal, a alma
encontrou sua perfeição no paraíso. Livre de dúvidas
e incertezas, o homem apenas
era
no seio da natureza. Nada foi negado
a Adão e Eva, e eles estavam integrados à toda
criação,
circulando livremente e de maneira abençoada. Mas a vontade é
infinita, e ao homem foi dado o poder de escolher. Assim, seduzida pela serpente
Eva desobedece ao único mandamento até então, e o homem,
sabendo o que é mal e o que é bem, pode escolher entre os dois,
e pode portanto, se afastar do Bem do Supremo Ser. Ele passa a
poder querer
o mal, e é sobre este ponto de vista que a purificação
da alma deve ser entendida. Esta é necessária para a escolha certa
quando a graça se apresentar. A liberdade, para Agostinho, vem a ser
a capacidade consciente e reflexa que tem o espírito de determinar por
si e espontaneamente, a querer e preferir acima de tudo o Bem absoluto e
perfeito,
do modo que este se lhe apresente, e nunca preferindo nada contrário.
Deus, do alto, abarca a todos aqueles que o invocam com um olhar e pode iluminar
alguns com sua graça. Muitos são chamados, mas poucos escolhidos.
Esta é a causa dos pecados da humanidade, o
livre-arbítrio.
Pela perversão da vontade o homem escolhe a privação do
ser. Este quadro só encontra redenção em Jesus Cristo,
o mediador entre Deus e os homens. O cristão tem de aceitar pela
fé
o mistério da Trindade, que Jesus Cristo é o verbo encarnado,
vindo ao mundo terrenos e morto pelos homens, para redimir a humanidade.
É
preciso pois, que o homem tenha fé, e acredite em algo além de
si e do mundo sensorial, em algo invisível. Precisa ter a humildade de
admitir seu “déficit moral” e que o caminho da verdade lhe é
extraposto
(NOVAES, 34).
A purificação da alma para receber a
revelação
é feita de várias formas. Agostinho defende ardorosamente um
ascetismo,
chegando a condenar o casamento e a procriação, e a cantar a
maravilha
do celibato. O homem precisa se livrar das paixões, e por paixões
entende-se tudo aquilo que move (ou comove) a alma. Somente uma alma
estável
é capaz de perceber a Idéia. Para esta elevação
do espírito, é necessário também o
auto-conhecimento.
(6)
Estando a alma purificada, está preparado o
terreno
para conhecer. A fé chama a razão para algo além dela
própria,
para o mistério. À razão cabe investigar os
conteúdos
da fé. Como aponta Novaes, não há uma
oposição
entre estas duas formas de conhecer, porém uma reciprocidade, uma
completude,
uma convergência. “Para entender, com o intuito de entender, uma
condição
é crer. Mas o que é entendido, o que é inteligido, exige
novamente a fé, e assim por diante.” (NOVAES, 41). Há uma
precedência
do invisível sobre o visível, do transcendente
(inteligível)
sobre o sensível. A alma é hierarquicamente superior ao corpo.
O homem precisa crer para entender. (7) Este entendimento é feito
racionalmente,
Mas o conhecimento da razão divina ultrapassa em muito a finitude da
razão humana, e por isso o homem precisa novamente da fé para
alcançar o conhecimento, sendo que este não se esgota nunca, nem
quem bebe do conhecimento de Deus sacia sua sede. (8)
No Livro X das Confissões Agostinho faz uma
brilhante
exposição sobre a memória, chegando mesmo a dizer que a
memória é o espírito, ou a parte mais importante da alma
humana. Nesta exposição está contida o grosso da doutrina
Agostiniana de reminiscência, e suas adaptações em
relação
ao platonismo. Farei mais um vôo panorâmico para explicá-la.
A memória era importante já desde a cultura
helênica clássica. Na
Teogonia
de Hesíodo ela aparece
como parte da primeira geração divina, como uma deusa, filha de
Urano e Géia (
mnemósina
), que, amada por Zeus, foi
mãe das nove Musas. De uma forma geral, pode-se dizer que sem
memória
não é possível conhecer. A memória está
também
associada ao destino das almas quando a morte ocorre e ela deixa o corpo, para
ir ao Hades. Existe um poema órfico (9) que pretende guiar a alma ao
chegar na mansão de Hades: (10)
”Encontrarás à esquerda da Mansão
do Hades, uma fonte,
E a seu lado, um branco cipreste.
Não te aproximas deste manancial.
Mas encontrarás um outro junto à Fonte
da Memória,
De onde fluem águas frescas e, diante das quais
há guardiões.
Diz-lhes: “Sou um filho da terra e do céu
estrelado;
Mas minha raça é do céu (somente).
Vós próprio o sabeis.
E – ai de mim! – estou ressequido de sede, e
pereço.
Dai-me rapidamente
A água fresca que flui da Fonte da
Memória”.
E eles mesmos te darão de beber do manancial
sagrado,
E desde então tu dominarás entre os
outros heróis”. (11)
As almas puras devem beber da sagrada fonte da
memória,
ao passo que as almas impuras devem banhar-se no rio Lete afim de se esquecer
de seus “pecados” e iniquidades e poderem reencarnar. As almas puras
poderão
manter seu Ser e habitar junto aos deuses, em companhia dos heróis.
Mas voltemos à Agostinho. Diz o bispo de Hipona
que nos recônditos do palácio da memória estão
guardados
todas as sensações e vivências dos indivíduos. Nas
inúmeras concavidades e recônditos secretos estas imagens
apresentam-se
à inteligência, que as une, relaciona e ordena. Algumas imagens
que residem na memória são fornecidas pelos sentidos, mas o
entendimento que reside na memória
não é. No livro
X, capítulos 10-12 das
Confissões
, o autor exemplifica
afirmando que, apesar de ter ouvido haver três espécies
questões
(12), não foi por nenhum dos sentidos do corpo que atingiu o significado
contido nestes sons, mas o viu somente em espírito. Da mesma maneira,
as inúmeras regras dos números e das dimensões estão
guardadas na memória, mas não vieram pelos sentidos. Como resume
Agostinho “os números são uma coisa e as idéias que eles
exprimem outras”. (13)
De uma forma diferente, a felicidade também habita
na memória. O homem antes do pecado original, foi em um tempo feliz,
e ainda há resquícios desta felicidade. A vida feliz só
pode ser alcançada quando se busca a Deus. É voltando a ele que
o homem atinge a verdadeira felicidade, e seu ser se completa. Como diz
Agostinho,
“Tarde Vos Amei, Senhor”, pois sem que ele o soubesse, Deus sempre esteve
presente
em sua vida, e sua desesperança só teve fim quando retornou
à
Deus, ou quando se lembrou de Deus. Esta volta só pode ser feita por
intermédio do Cristo. A teoria agostiniana de reminiscência
afasta-se
da teoria platônica, contudo. Nesta, a alma contempla as Formas eternas
antes de nascer, em outro mundo. (14) Em Agostinho a contemplação
da luz divina não é uma lembrança da vivência
anterior
da alma, mas uma irradiação presente. Deus ilumina o intelecto
com sua luz, tornando-o capaz de conhecer segundo sua ordem natural.
Para Agostinho, todos os homens querem ser alegres e
felizes, mas a verdadeira alegria só vem de Deus. A carne e seus apelos,
a matéria, podem levar o homem a confundir-se e fazer aquilo que
pode
fazer, mas não aquilo que
realmente quer
fazer. Deus
é a felicidade porque é a verdade. E a alegria reside na verdade.
Esta é uma só, e Deus a sua fonte. Reside ela na memória,
pois, como exemplifica Agostinho, desde o episódio de sua
iluminação
em que encontrou a serenidade de espírito, Agostinho encontrou sempre
a mesma verdade, e dela se lembrou. Desde que conheceu a Deus, dele se esqueceu,
e este permanece em sua memória como fonte de suas delícias.
Resumindo, o homem deve invocar a Deus, mas este
já
habita nele. Para voltar a encontrar a verdade, tem de purificar sua alma,
livrando-se
principalmente do orgulho e da soberba, das comoções da carne,
seguindo exemplo de Jesus Cristo, que foi ao mesmo tempo Deus e homem, verbo
imortal e carne perecível. Este morreu para salvar o homem do pecado
original.
Em último lugar, gostaria de fazer umas breves
associações com Platão, não obstante as
advertências
dos perigos de “platonizar Agostinho”, que me levam a fazê-las timida
e superficialmente, na forma de lembrança.
Também em Platão o homem deve procurar
a virtude, deve levar a vida corretamente. Mas o problema da ascese da alma
não é meramente humano, como critica Agostinho. Afinal,
vê-se
no
Mênon
e no
Protágoras
, que, em última
instância são os escolhidos aqueles que alcançarão
a verdade. Péricles, exemplo de homem virtuoso, não conseguiu
ensinar a virtude aos seus filhos. É feita uma associação
com as três Moiras (ou parcas), as Deusas do destino, a quem até
mesmos os outros deuses, como Zeus, estão submetidos. É por
escolha
dos deuses (graça divina? ) que são designados os
daimons
aos homens. O próprio Sócrates, é de certa forma,
escolhidos pelos deuses, como vaticinou o Oráculo de Delfos ao
apontá-lo
como o mais sábios dos homens, ou como indicam o seu guia interior, a
voz do
daimon
que lhe mostrava o caminho certo (
Apologia de Sócrates
), ou o sonho místico que teve na prisão, às
vésperas
de ser executado, tal como é descrito em
Críton
. Apesar
disso, em Platão, aquele que procura a verdade também tem de
enfrentar
um duro caminho de purificação, através da ascese
dialética,
e há igualmente uma forte ascendência da alma sobre o corpo- que
no
Fédon
chega a ser negativizado.
Em Platão, o tema do mal também é
bastante presente. Gostaria apenas de salientar que no
Protágoras
, chega-se à conclusão que nenhum homem deseja o mal (assim
como Agostinho) , mas o escolhe apenas por ignorância do que seja o bem.
Notas
Este episódio pode assim ser descrito brevemente: Agostinho buscava angustiado
a solução para o problema da existência, em um sofrido conflito consigo mesmo,
quando, no jardim de sua casa cai em pranto e se afasta do seu companheiro
Alípio. Chorava então na sombra de uma figueira, clamando a Deus por uma
solução,
quando ouve uma voz de criança oriunda das vizinhanças, que em canto repetia
“Toma e lê, Toma e lê”. Interpreta isso como um sinal para que leia alguma
lição evangélica ao acaso, a exemplo do que ocorrera com Antão. Volta então
à companhia de Alípio, aonde havia deixado a Bíblia e lê uma passagem de Paulo
de Tarso. Seu coração então é penetrado pela luz da serenidade e sua alma
inundada pela paz. Esta conhecida historieta, interpretada como um milagre,
é narrada no capítulo 12 do Livro VIII das
Confissões
.
A tradução usada da Bíblia foi a de João Ferreira de Almeida. Este trecho,
contudo, é controverso, pois no início deste capítulo Isaías dá a entender
que se trata de um poderoso tirano da Babilônia, possivelmente Nabucodonossor.
Pode-se dizer de uma maneira geral a maior parte da obra de Platão está
identificada com a procura da definição e prática da virtude. O tema da
superioridade
da alma sobre o corpo, e de sua purificação durante a vida para que não seja
punida após a morte é explicitado, por exemplo no último livro da
República
e no diálogo
Fédon
.
Esta desavença está mostrada em
Sermo
150, 7, 9 apud Novaes, Moacyr,
op. cit
. Porfírio, como se sabe, foi o organizador das obras do principal
neoplatônico, Plotino, este por sua vez discípulo de Amônio Sacas.
-
Gen 1, 27
, que diz : “E criou o homem à sua imagem e semelhança,
à imagem de Deus o criou: macho e fêmea os criou”. Uma nota destoante de nossos
propósitos, mas interessante é a observação de que a criação da fêmea está
contida neste versículo, porém Eva só é criada posteriormente em 2, 21. Isto
deu origem à lenda de Lilibith, que teria sido a primeira companheira de Adão,
símbolo máximo da feminilidade arrebatada.
O tema do auto conhecimento – a essência, afinal, das
Confissões
,
é, como sabemos, caro para toda a tradição filosófica, desde a sua origem.
Platão no início do
Protágoras
encara este (
gnôthi s´authon
– Conhece-te a ti mesmo) um dos princípios máximos da antiga filosofia
Lacedemônica,
sendo depois inscrito na entrada do Oráculo de Delphos. O outro princípio
máximo dos lacedemônicos era “Nada em excesso”, que está de pleno acordo com
o tema da mediania, da justa medida, da prudência, que permeia tanto a mitologia
quanto a filosofia grega – por exemplo na
Ética a Nicômaco
de Aristóteles,
aonde este define a virtude como um meio termo entre a falta e o excesso.
“Se não crerdes não entendereis” é a fórmula agostiniana que ficou famosíssima
como mais um dos chavões usados para exemplificar e sintetizar o pensamento
de um filósofo, e foi retirada do profeta Elias, 7, 9. “Entretanto a cabeça
de Efraim será Samaria, e a cabeça de Samaria, o filho de Remalias, se o não
crerdes, certamente não ficareis firme”.
Deus em sua totalidade é insondável, e qualquer tentativa de abarcá-lo
com palavras está fadada ao fracasso. Agostinho retira do
Êxodo
o que
julga ser a melhor definição. Neste trecho Moisés pergunta ao Senhor o que
deve dizer na Aldeia quando lhe perguntarem quem encontrou, e Deus assim se
define “Eu sou o que Sou”, ou em outras traduções, “Eu sou aquele que é”.
O orfismo foi o criador da metempsicose (transmigração das almas), e associado
ao pitagorismo, deu origem a uma das mais veneráveis e secretas seitas de
todos os tempos. Baseia-se sobretudo no mito de Orfeu e Eurídice. Este mito
pode ser assim resumido: Orfeu era filho do deus Eagro e da musa da Poesia
trágica Calíope (portanto neto da memória). Encantava a todos com o seus versos
e sua lira. Se casou com a adorável nêiade Eurídice, mas o matrimônio durou
pouco, pois esta, fugindo de um pastor, morreu ao ser picada por uma cobra
venenosa. As súplicas da música dolorosa de Orfeu tocaram aos deuses, e lhe
foi concedido resgatar sua amada no reino das sombras (o Hades), desde que
durante a volta não olhasse para trás e visse Eurídice sequer uma vez. Tomado
pelo amor e curiosidade, Orfeu dá uma olhadela, e ele vê sua esposa sofrer
a segunda morte. Este mito é erroneamente tomado como a única ocasião em que
foi concedido a um mortal penetrar no reino do Hades com vida e retornar,
mas isto não é verdade, pois Odisseu (ou Ulisses), como é relatado no canto
XI da Odisséia, graças à deusa Circe, consegue penetrar na mansão de Hades
e de sua terrível esposa Perséfone. Lá vagueiam cegas as almas dos mortos,
e Odisseu conversa com eles, inclusive com sua mãe.
O problema do guia no Hades era fundamental, visto que ao morrer as almas
ficam cegas, e transformam-se em sombras. Para tomar o caminho certo nos
recônditos
do Hades, ir aos Campos Elíseos, por exemplo, era preciso que o homem tivesse
um bom guia, um bom daimon. Aliás, a origem da palavra felicidade em grego
(
eudaimonia
) está naqueles escolhidos pelos deuses para ter um
daimon
.
Poema inscrito na tábua de Petélia, citado por Bertrand Russel em
História
da Filosofia Ocidental
vol.1 e por Junito de Souza Brandão em
Mitologia
Grega
, vol. 1.
No exemplo ele fala de “se uma coisa existe (
an sit
)? qual sua natureza
(
quid sit
)? e qual sua qualidade (
quale sit
)?”.
capítulo XII do Livro X. Em outras palavras, a imagem do número fornecida
pelos sentidos é diversa de seu significado.
Em Platão, como é sabido, conhecer é se lembrar. A melhor ilustração da
teoria da reminiscência de Platão está contida no
Mênon
, em que Sócrates,
dialogando com um jovem e inculto escravo, o força a reconhecer um problema
complexo de leis geômétricas em quadradados, apenas através de hipóteses e
da lógica.
BIBLIOGRAFIA PRINCIPAL
Agostinho, Santo.
Confissões
. Tradução de
J. Oliveira e A. Ambrósio de Pina. Livraria Apostolado da Imprensa,
5ª edição. Porto, Portugal, 1955 .
Agostinho, Santo.
Confissões
e
De Magistro
in
Volume Santo Agostinho da Coleção Os Pensadores. Editora
Abril Cultural. Vida e Obra de José Américo de Mota Pessanha.
Agostinho, Santo.
Do Livre Arbítrio
. Tradução
de Antônio Soares Pinheiro. Editora da Universidade de Braga, Faculdade
de Filosofia.
Novaes, Moacyr. “Nota sobre o problema da Universalidade em Agostinho,
do ponto de vista da relação entre fé e razão.
in
Cadernos História da Filosofia e Ciência. pg 31-54.
vol. 7 nº2. Editora Unicamp. Campinas, 1997.
BIBLIOGRAFIA AUXILIAR
Brandão, Junito de Souza.
Mitologia Grega
, volume 1. Editora
Vozes. São Paulo, 1987.
Homero
Odisséia
Tradução de Jaime Bruna.
Editora Cultrix. São Paulo, 1976.
Russel, Bertrand .
História da Filosofia Ocidental
. Tradução
de Brenno Silveira. Companhia Editora Nacional. São Paulo, 1957.
A Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira
de Almeida. Sociedade Bíblica do Brasil. Brasília, 1969.
Web Site sobre Mitologia de Luciano Miranda. Texto sobre Orfeu.
http://meltingpot.fortunecity.com/malta/242/mitologia.htm
The Internet Classics Archives – do Massachussets Institute of Technology.
http://classics.mit.edu/– Consultas às edições online
de obras clássicas.
Anotações das aulas do professor Estevão no curso
de História da Filosofia Medieval I, FFLCH- USP.
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