É POSSÍVEL NATURALIZAR A CONSCIÊNCIA?

É
POSSÍVEL NATURALIZAR A CONSCIÊNCIA?

 

Palavras-chave:
Filosofia da Mente, Consciência, Dualismo

 

Fabio Antonio Costa
Mestrando pela PUC-SP
[email protected]

 

Ivone dos Santos
Graduando em Filosofia pela UNIFESP
[email protected]

 

 

INTRODUÇÃO

A
partir da pergunta “é possível naturalizar a consciência?”, orienta-se do
presente estudo. A resposta para tal questão é orientada na obra A Redescoberta
da Mente
(2006) do professor John Searle (Universidade da Califórnia). Para
tal elucidação, torna-se necessário apresentar a obra; produzida originalmente
em 1972 e impressa pela primeira vez no Brasil em 1997, é dividida em 10
capítulos, que segundo o autor, entre suas várias metas, está iluminar as
propostas que os estudiosos anteriores da Filosofia da Mente ou não conseguiram
alcançar ou então mostravam erroneamente.

 

ANTIGAS
CIÊNCIAS DA FILOSOFIA

O
conceito proposto por John Searle acerca de consciência é bem amplo e como
apontado na parte inicial da sua obra, será necessário explicar sobre Dualismo,
Materialismo e Cartesianismo, que durante cinco décadas ou mais, foram às
principais referências para os interessados na Filosofia da Mente. Segundo John
Searle, os três campos que em épocas não muito distantes estudavam a Filosofia
da Mente devem ser superados, pois seus pontos de vista só não eram discutíveis
como errôneos.

Para
respondermos a questão proposta, será necessário detalhar alguns conceitos que
John Searle aponta em sua obra. Sua dedicação aos estudos de Filosofia da Mente
apontava para mais de duas décadas de produção acadêmica e com base em debates
e discussões feitos entre amigos, alunos e professores.

Neles
– especialmente no dualismo – a princípio, o mundo era pensado em dois reinos,
a saber, a mente que representava tudo que não tinha uma forma física e
o reino físico, sendo apresentado como coisas com estado físico, podendo
ser observáveis. Mesmo com os devidos cuidados que John Searle aponta que são
necessários para quando se estuda o argumento de outros cientistas ou filósofos
no tocante às interpretações destes, existia uma ideia da ciência que, outrora
negando a existência (ou ignorando) da mente, prometia poder penetrar nela e
descobrir uma caixa-preta com tudo aquilo que ela própria não conhecia, mas o
autor aponta uma dificuldade da ciência, que ao tentar penetrar na caixa-preta
da mente, ela encontrou mais caixas-pretas ainda, o que em um primeiro momento
abriu caminhos para estudos que só não contrariavam seus estudos, mas apontariam
novos caminhos para a Filosofia da Mente. Por naturalizar, na Filosofia da Mente
de décadas atrás, o entendimento que se dava era tornar-se físico (p. 8), ou
seja, reduzir a fenômenos físicos. Mas deve-se descrever a ideia deste
conceito. Nestes termos considerados arcaicos por Searle, não existia
explicações mais profundas acerca do que eram os estados mentais, embora fizesse
mais de um século que estavam disponíveis para interessados no tema os estudos
acerca da problemática mente/corpo, e resolvidos a partir desta data.

As
antigas tradições materialistas, que enfatizavam principalmente o reino do
físico e deixavam para segundo plano as teorias da mente e o Dualismo, da
concepção corpo/mente ofereciam uma separação que em si, traduz uma
problemática para a pergunta inicial desta pesquisa, pois era necessário se
centralizar nas teorias físicas para responder as teorias mentais, estas,
portanto, submissas a uma ciência que enfatizava a prática da observação, tão
característica do Materialismo, mas muito arcaico quando se busca a
complexibilidade do que é mental, quando não tem características de nada mental
que os estudos posteriores indicarão.

 

CONTEXTAÇÃO
DOS ANTIGOS ESTUDOS

A
partir da concepção que indica John Searle, que cabe ao filósofo refutar as
tradições concebidas em nossa sociedade, foi necessário introduzir, senão
incorporar a noção de consciência, que era até então muito pouco valorizada. Na
contramão dos eventos dos séculos anteriores, como a Ciência no Renascimento
que observava o universo e reconhecia seus eventos por apresentarem-se físicos,
a consciência estava exatamente nesta contramão, por ela em essência não se
apresentar como algo físico. Alguns outros conceitos, como computação e símbolo
eram muito pouco definidos. O estudo da consciência é importante por diversos
fatos, como o estudo da consciência para se entender a mente e o comportamento (como
o comportamento inteligente), que se origina da própria mente. As crenças e
desejos, tão naturais para todas as pessoas de nossa sociedade são uma
indicação da consciência, pois para se desejar algo é necessário ter a
consciência disto. A ligação existente entre mente e consciência desprezada em
épocas anteriores nessa mais recente abordagem ganha uma maior importância,
pois a ideia de neutralidade nessa ligação não pode existir.

 

COMPORTAMENTO

A
partir da ideia de John Searle que a mente é uma área de difícil estudo, devido
à complexibilidades apresentadas, tanto nos seres humanos como em alguns
animais com as suas características que se não ainda existe um consenso, abre
um leque de possibilidades de algumas particularidades com os seres humanos. Pode-se
imaginar a questão do comportamento, como o comportamento inteligível observado
nos seres humanos e que confirma como o grupo humano tem essas características
que os qualifica como conscientes de seu mundo, mas nós assim como os outros
animais habitantes do planeta Terra compartilhamos de processos evolutivos de
nossos cérebros; certos animais, por exemplo, apresentam um comportamento que
são em casos observáveis semelhantes aos humanos, ou seja, nem tudo nos é
compreensível (p. 39). Por outro lado apesar do comportamento que um rádio produz
como a emissão de sons não os caracteriza como um comportamento digno de se
assemelhar ao dos humanos, como indicado por John Searle, dificilmente em nossa
sociedade alguém pode informar que um rádio ou mesa tenha consciência, embora
esta afirmação ainda tenha vários pontos de atrito quanto aos outros animais.
Filosofando, John Searle esclarece que se esse fosse o nosso limite, teríamos
que conhecer os dois lados dele (p. 40), algo que também não possuímos.

Para
a naturalização da consciência, é necessária a desconstrução do que a antiga
Ciência da Mente defendia; a explicação de tudo que era material ou físico,
através de partículas materiais, não era, portanto, aceita a ideia de um
material imortal, que não tivesse sua concepção no mundo físico, um dos poucos
casos talvez se deva ao universo da visão religiosa, no qual a crença da alma
imortal alimente o imaginário dos fieis, negando assim a visão científica
predominante, que não reconhecia essa visão religiosa. Uma das áreas também contestadas
é a visão Behaviorista, que a explicação mostra seu maior vigor no
comportamento; no Behaviorismo o comportamento pode ser um importante indicador
das propriedades mentais. John Searle em seu estudo não aceita tal tese, e
coloca a prova o exemplo do guerreiro superespartano, que pode ser compreendido
com um soldado treinado para agüentar casos quase insuportáveis de dor e
alterando a perspectiva que qualquer estudioso do Behaviorismo esperaria. Os
desejos, ponto importante para a pesquisa do Behaviorismo também é confrontado
por John Searle, como em casos que uma pessoa doente que não consegue se
expressar e imagina um pedido, ou seja, sua característica comportamental não
corresponde ao seu desejo interno.

 

CARACTERÍSTICAS
DA CONSCIÊNCIA

Desse
modo, percebem-se os vários problemas em estudar a consciência. A dor, por
exemplo, pode ser um indicativo disso. A pergunta “na hora da dor, onde está a
dor?” (p. 59) indica a complexibilidade da ideia de como a consciência se
encaixa nisso e a contrariedade da dualidade mente/corpo, pois embora a dor pudesse
estar em uma parte específica do corpo como em um dedo acertado por um martelo,
a dor em si é uma característica mental no estado cerebral, e apresentando-se
como uma característica mental está inclinado para a balança da mente na
dualidade mente/corpo.

Existia,
portanto, para o autor medo por parte dos Materialistas no tocante às ideias da
consciência. E para um melhor entendimento do conceito de consciência, faz-se
necessário a separação dos conceitos de mente e cérebro. Por cérebro podemos
compreender todo o material que se encontra dentro da caixa craniana,
comparando a relação do cérebro com a mente, seria próxima da relação existente
entre um computador (como os caseiros) e um determinado programa que nele
esteja instalado, o cérebro então estaria para o computador assim como a mente
estaria para o programa. É claro, segundo John Searle que esta é uma simples
redução, pois comparar a complexibilidade da mente com um programa de
computador, um software, é reduzir e em muito as particularidades da
mente humana. A naturalização da mente segundo essa tese não é possível (p. 76),
pois seria explicá-la a partir de fenômenos físicos, e algumas ideias como a
dor só pode ser expressa através dos estados mentais. O raciocínio é um
processo puramente mental (p. 85) e sem ele, haveria pouca viabilidade para uma
correta explanação do que seria a dor em si, entendida, portanto com um estado
mental, localizada na mente.

A
consciência como tal, que é encontrada nos seres humanos (e em alguns
determinados animais) está presente na maior parte da vida das pessoas de um
modo em geral, nesta afirmação equivale a dizer que sendo conscientes, todas as
pessoas notam as suas intenções no mundo. A inteligência que é uma das
características da consciência, que no decorrer da história dos estudos da
Ciência da Mente questionava sobre como ela havia surgido, ou mais exatamente
se partículas não inteligentes poderiam compor um conjunto que poderia produzir
inteligência. A resposta é sim a partir de como essas partículas se organizam.
Partículas organizadas pressupõem critérios de inteligência (p. 85) e
reforçando esta tese, John Searle indica que os neurônios em si não são
conscientes, mas a partir de sua organização no cérebro, mesmo sem apresentarem
o aspecto da consciência apresentam-se como inteligentes, que em si indica que
a inteligência é uma das características da consciência.

As
teorias populares, criticadas pelo fato de apresentarem a verdade dos fatos,
são por John Searle melhor elucidadas, pois se de fato elas não provassem a
veracidade dos fatos elas não teriam sobrevivido, assim como a própria
humanidade (p. 88), pode-se pensar no exemplo do conhecimento da altura do
penhasco; se a teoria que qualquer pessoa fosse avançar alguns passos a frente
poder-se-ia cair e morrer após a queda não fosse verdadeira, neste simples
exemplo a própria humanidade não teria sobrevivido até os dias atuais, deve
ficar esclarecido acerca de teorias mais avançadas, como a antiga visão da
posição do nosso planeta no universo, pois como apontado por Searle pouco
importa qual fossem às teorias populares, independente delas neste caso que
mesmo se tratando de teorias mais avançadas não mudaria muito o cotidiano de
pessoas comuns, mas onde a sobrevivência foi necessária, as teorias populares
triunfaram. Após a instalação da ciência a partir da modernidade – essa,
portanto uma ciência em moldes próximos aos nossos atuais – o senso comum
começou a ter seu conhecimento baseado, pelo menos em partes, a partir do
conhecimento cientifico (p. 95).

A
consciência em si, é uma categoria que se apresenta sobre uma gama de
determinadas variantes e assim também relativa ao ponto de vista de quem por
nela centraliza seus estudos. Afim que se possa elucidar mais detalhadamente
acerca da pergunta inicial deste estudo “É possível naturalizar a
consciência?”, deve-se situar com a maior nitidez possível, as variantes do
entendimento da consciência para que assim, a questão em si fique mais
inteligível. Uma das variantes elucidadas por Searle é referente ao
comportamento. Nas visões mais tradicionais que a ciência da mente tinha, era o
vínculo que existia entre o comportamento e a mente, se, por exemplo, fosse
colocada a prova o que estava acontecendo na mente bastava inicialmente
observar o comportamento, pois este através de uma conexão pré-estabelecida
indicaria a atividade mental. O autor aponta casos em que temos tanto uma
situação ficcional como uma situação real. No exemplo apresentado na obra, um
determinado paciente iria implantar na área especifica do cérebro partes de
silício para compensar a parte original prejudicada. Com o passar do tempo
devido à necessidade desse mesmo paciente teria mais partes do cérebro trocadas
por mais silício, chegando uma hora a ter praticamente o cérebro todo de
silício, em um teste que os médicos poderiam realizar fariam perguntas para o
paciente para conferir se estaria tudo indo bem, ele poderia responder “sim” de
forma consciente, mas internamente tentar responder ao contrário, mas não
conseguir exteriorizar sua vontade. Pode-se imaginar também a situação
invertida, com o paciente não estando bem internamente, mas sua voz ordenar que
esteja tudo bem com ele. E situações assim não são tão ficcionais; na síndrome
de Guillain-Baré o paciente pode ter uma comunicação perfeita com o
mundo exterior, mas segundo foi relatado internamente ele (o paciente) poderia
estar morrendo por dentro (p. 100). Outros exemplos de variação da consciência
também podem ser destacados, como a noção do campo magnético que algumas aves
sentem e usam de referência quando estão em fase de imigração, algo apenas
possível para determinadas espécies de aves e não perceptíveis para os seres
humanos, longe de algo consciente. Outro ponto destacado é acerca do aparelho
gastrintestinal, que segundo apresentando em sua obra, ele é altamente
inteligente (p. 121) e capaz de optar por funções conforme a necessidade física
de cada indivíduo, não sendo necessária (nem possível, aliás) do consciente do
ser humano para que o aparelho gastrintestinal precise funcionar. Mesmo sendo
considerado inteligente o aparelho gastrintestinal, não se pode afirmar que ele
é consciente, igualmente como se pode classificar como não conscientes uma
caneta e uma mesa, pois estes não apresentam formas conscientes de comunicação
com o mundo, no caso de algumas apenas de modo limitado.

 

 

INÚMERAS
FORMAS DE CONSCIÊNCIA

São
inúmeras as formas de consciência (p. 157) e ela pode ser também definida com
um “liga/desliga”. John Searle usa o exemplo do sono. Ele próprio pode ser uma
forma de consciência, pois quando uma pessoa dorme está interagindo com o seu
sonho e em casos até mais intensamente do que estivesse em uma pacata e
sonolenta atividade do seu cotidiano. Quanto a isso não se pode limitar a ideia
que só é consciente quem está acordado, independente deste ou do estado que
alguém esteja dormindo, ninguém é totalmente consciente (p. 125), pois existem
diferentes graus de consciência. Os próprios cérebros causam consciência e a
própria consciência é estudada pela subjetividade e consciência (p. 142).
Descobrir qual o papel da consciência é algo que ainda precisa de mais estudos,
pois ainda não é bem detalhada qual a relação que a consciência teve com a
própria evolução humana e especialmente como se deu essa importante união que
fez que alguns poucos animais, como o ser humano e umas poucas raças possuírem
consciência. Outro caso a ser analisado é acerca de uma antiga teoria, que
justificava que as plantas viravaM-se para o sol para sua própria sobrevivência,
quase como um ato consciente; mas na realidade como descrito por John Searle as
plantas não tem essa capacidade de consciência e sim reações biológicas
próprias que mudem para determinadas direções, de forma a poder cumprir suas
reações biológicas, necessárias a esses seres vivos. A religião em si com os
seus seguidores são um caso importante de ser lembrado. John Searle descreveu
uma cena que pode ser facilmente apreciada no cotidiano comum: certa vez ao
viajar para a Índia ele ao conversar com praticantes de religiões locais, ouviu
relatos de religiosos que insistiam que foram animais em outras vidas e que as
teorias de John Searle não condiziam com a verdade instituída por eles. Acerca
destas narrativas pode-se pensar que no caso da religião, possa existir na
mente dos seguidores uma parte especifica um compartimento isolado (p. 134) em
que estariam reservadas e independentes de outras áreas da mente, conhecimentos
religiosos. Deve-se, portanto, separar que segundo as diretrizes científicas
como a da própria Ciência da Mente, tais depoimentos de teor religioso têm pouca
validade, embora a ideia do compartimento isolado não seja uma tese a ser
ignorada, acerca também de uma visão que gerou duelos no Renascimento, entre a
visão religiosa medievalista e uma visão que estava a se estabelecer com base
em uma ciência ainda ampla para os padrões atuais, a visão de universo
valorizava a matéria (p. 126), não é ademais inédito afirmar que a visão que a
Terra fosse o único lugar do universo aonde existissem seres vivos e, portanto
conscientes, mas contrário a esta ideia, devido à imensidão do universo, com
seu incontável número de planetas, galáxias, estrelas e outras variedades, é
muito provável que exista vida inteligente e consciente. Existe também uma
lacuna acerca da reprodução da consciência, pois se esta é uma característica
biológica como qualquer outra (p. 137) por princípios lógicos a reprodução da
mesma poderia ocorrer por vias paralelas como ocorre à reprodução da
fotossíntese. A consciência também se mostra subjetiva, mas aqui se deve
esclarecer acerca desta ideia. A subjetividade é uma das várias características
da consciência, prova isso com a frase de John Searle: “a observação é um ato
subjetivo a realidade objetiva” (p. 146), nela podem entender-se as relações
que o subjetivo e objetivo desempenham na consciência, enquanto pode ser
objetiva uma vontade como, por exemplo, a preferência por um determinado tipo
de alimento, o mesmo não se pode dizer com referência a dores; se uma pessoa ao
entrar no carro tem a sua mão pressionada na porta do mesmo ela irá gritar de dor
ou puxar a mão independente de sua vontade, a falta de sentimentos como nesse
caso exposto mostra que a própria dor é subjetiva (p. 139). Além da consciência
como afirmou Searle ser uma característica da mente, entre as várias que ela
possui, uma que ele também destaca são os prazeres de natureza biológica, como
o exemplo pessoal de seu cachorro que tem certa paixão por correr atrás de
bolinhas como as usadas em esporte como tênis e o outro exemplo, de pessoas que
possuem prazer de esquiar, enfrentando sem maiores problemas as dificuldades
para o exercício de seu esporte como subir montanhas geladas, carregando esquis
e seus equipamentos, para aproveitar poucos instantes de prazer que a descida
proporciona. Não é obviamente a racionalização ou a inteligência que o cérebro
produz no individuo que o induzirá a tais ações, mas sim o prazer biológico que
nestes dois exemplos citados guiarão seus praticantes. A consciência, portanto
não deve ser pensada como memorização, ou os atos de se memorizar, pois consciência
possui características particulares, como a flexibilidade, sensibilidade e
criatividade (p. 160), a simples memorização de fatos ocorridos na vida
biológica de seres não acrescenta consciência como o próprio John Searle
destaca, pois dos habitantes do planeta Terra é certo que nem todos os possuem,
mas as características apresentadas acima indicam que são necessárias mais
qualidades à mente, inclusive de conexão com o mundo e adaptabilidade às
condições adversas em formas não somente biológicas.

A
mente é empiricamente misteriosa (p. 179), isso equivale a dizer que embora
existam inúmeros estudos que a mente é o enfoque principal, existe muita coisa
ainda a ser descoberto e provado. No exemplo de John Searle, a mente poderia
ser redutível aos processos do cérebro, desde que se considere que dentro do
cérebro (parte biológica) temos o fenômeno da mente e na mente, uma de suas
características é a consciência. Entre uma das formas de se comprovar isto está
uma relação em paralelo traçado por ele com cadeiras, que em essência é o mesmo
que uma coleção de moléculas, ao se reduzir uma cadeira para as menores partes
que se tem conhecimento as moléculas confirmariam esta tese, e o autor acredita
em tais orientações traduzidas para a redução que a consciência teria a partir
dos processos do cérebro.

Outra
ideia explorada por Searle é o ponto de vista que poderíamos ter sobre
determinados objetos, como no exemplo de objetos em cima de uma mesa, o
observador poderia afirmar sobre os objetos que ele estaria vendo, mas uma
descrição mais detalhada como a impressão de cada objeto pelo seu ponto de
vista desvincula-se da afirmação inicial, e esses objetos que ele estaria
observando não teriam um ponto de vista (p. 189).  Na realidade, a consciência possui
um número limitado de modalidades, como verbos e imagens e isso equivale a
dizer que ela opera pela sua própria simbologia no contato com o mundo
exterior. No tocante as imagens segundo apontam os estudos, o córtex, que ocupa
uma parte física considerável do cérebro, é a parte referente da visão que está
reservada dentro do cérebro, e não coincidentemente, nossa visão é uma
importante ligação com o mundo exterior, possivelmente o mais importante de
todos os sentidos humanos. A intenção, quando se pensa nesta como uma das características
da consciência, possui um papel destacado como na frase em que afirma que boa
parte da consciência é intencional (p. 188) e essa intenção ajuda no prazer
humano, como inclusive apresentado nos exemplos acima como do esquiador, que
guiado pelos seus instintos e prazeres biológicos, exerce determinadas funções,
como o ato de encarar subidas cansativas para satisfazer o seu prazer pessoal.
Então se a relação prazer/intenção esta ligada dentro da própria consciência,
existe ai uma ligação que ajuda a explicar determinados desejos que a
consciência produz. John Searle aponta para outras modalidades da consciência,
como a percepção, que por ele é apontado como a função da expectativa (p. 195),
pode-se imaginar como exemplo uma pessoa que esteja à espera de uma determinada
notícia, como a resposta da procura de uma vaga de emprego; ela por necessidade
e outras atribuições, está ansiosa pela resposta, na expectativa de receber uma
resposta (que se não for uma pessoa “negativa”, obviamente estará esperando uma
sim) começa a treinar sua percepção, como no horário que esta resposta chegaria
teoricamente se fosse ao horário da madrugada estaria mais provável que fosse
um conhecido ou uma emergência do que a esperada resposta, que ficaria mais
centralizada no horário comercial, sem a noção de percepção apurada, ele
estaria ansioso em qualquer horário, sua ansiedade ou expectativa do telefonema
seria muito parecida tanto na parte do almoço quanto em altas horas da noite. 
O estado de espírito também pertence a uma das modalidades da consciência; John
Searle demonstra como no exemplo por ele apontado; de uma pessoa que vai jantar
no restaurante e em sua refeição ele observa as demais pessoas do restaurante o
observando insistentemente sem saber o que acontece, e embora este personagem
do exemplo tenha consciência de tudo, como de estar ali se alimentando, de como
chegou lá, do pedido de sua refeição e a própria noção de situação em si ele
esquece que foi ali de cueca, tendo se esquecido de colocar suas calças, ou
seja, ele esteve sempre consciente desde a saída de sua casa ao restaurante,
mas contrariamente a tudo, ele no momento de se vestir não estava consciente.
Pode-se pensar também em uma pessoa eufórica, mas que tenha tido um difícil dia
de trabalho, sua euforia interna não condiz com suas atitudes na relação com
outras pessoas, ou em outro exemplo apontado, como o caso do orgasmo, que pode
ser tanto estimulado por um ato sexual ou por interferências clínicas, sendo
que nestes dois casos, os praticantes podem estar em estados de espíritos bem
diferenciados. A ideia de categoria também é destacada, pois a categoria só
pode existir caso haja acontecido à experiência anteriormente, como num caso de
alguém que poderia relatar do acontecimento de uma situação em sua vida, ela só
poderia afirmar isso se tivesse a experiência anterior para fazer a referência.
Outro tópico importante é apontado, como a consciência e inconsciência de
certas transformações biológicas do corpo. Qualquer pessoa em plena sã
consciência poderia descrever a sensação das roupas encostando-se em seu corpo
ou da mudança de um determinado corte de cabelo pelas sensações pessoais, mas
como pode ser a descrição dos cabelos crescendo ou das suas unhas no mesmo
processo? São apontados também outros exemplos, como o ato de dirigir que em
essência é um ato consciente (caso contrário a probabilidade de acidentes
aumentaria consideravelmente), mas e se ao atender um telefone ao mesmo tempo
de dirigir, não estaria deixando inconsciente mesmo por momentos curtos de
tempo, o motorista? A consciência possui níveis de atenção (p. 199) como o
atestado no exemplo acima, ou em outro exemplo como no caso de uma situação de
dor, em que a pessoa que não sofre a dor possa estar em um estado inconsciente,
mas ao sentir dor, como ao sentir a pressão de um martelo em cima do dedo ao
tentar pregar um pedaço de madeira e acerca o próprio dedo, passar de instante
do estado inconsciente para o estado consciente. Pode-se encaixar nesta ideia
outra modalidade da consciência apontada por John Searle, a autoridade de
estados mentais, no exemplo do individuo que por acidente acerta o próprio dedo
poderia estar em um estado inconsciente ou mesmo consciente, mas independente
de um ou de outro, ele por ocasião da dor iria imediatamente para o estado
consciente que a dor provocaria e pode-se imaginar numerosos exemplos, como um
aluno entediado com a aula (inconsciente), mas que com uma determinada fala se
interessar e estar consciente, ou seja, se a consciência não é composta por
somente uma, elas podem se sobressair, uma antes de outra ou uma acima de
outra. A familiaridade mesmo com coisas desconhecidas é outra modalidade da
consciência, como no caso de poder observar-se um elefante que apresenta formas
que chamem muito a atenção pela sua exuberância (como um elefante de outra cor
ou com o dobro do tamanho normal), independente da forma o elefante é um
elefante (p. 193) e pelo fato de ser um elefante ele é familiar para seu observador,
que neste caso já teria o conhecido anteriormente.

As noções
que conclui Searle dos estudos acerca do consciente e inconsciente ainda não é
nada clara (p. 218), ou seja, os estudos anteriores não chegaram a um patamar
que pudesse explicar razoavelmente bem os conceitos de consciente e
inconsciente e os novos estudos (o livro data de 1972) embora pioneiros em suas
argumentações não conseguiram delimitar os territórios de modo mais eficaz. Acerca
de importantes estudiosos do inconsciente, John Searle destaca Sigmund Freud,
que embora trouxesse importantes estudos acerca do inconsciente faz referência
a uma ingênua concepção de inconsciente e reitera sua afirmação ao não atribuir
a Freud uma função verificacionista, cabendo ao psicanalista austríaco o de
produzir seus estudos sem uma preocupação com a validade dos mesmos. Uma das
definições da inconsciência é o estado mental consciente menos a consciência
(p. 218), o que indica que tanto um como o outro podem ter algumas
características em comum, que compartilham entre si e o conteúdo do
inconsciente é acessível ao consciente (p. 230). Pode-se elucidar em um exemplo
dado nesta obra; ao observador notar a presença de um carro, ele tem uma
experiência consciente, este, por exemplo, pode ser classificado com um
processo mental (entre os inúmeros que podem existir) que em princípio é algo
pertencente ao inconsciente, mas que é um forte candidato a atingir a área
destinada a consciência, positivando a relação que pode existir entre
consciente-inconsciente, como nos processos neurofisiológicos existentes no
cérebro (p. 232). A dor inconsciente como relatado anteriormente pode provocar
o despertar de uma pessoa, fazendo-o transitar do estado inconsciente para o
estado consciente inclusive em um curto espaço de tempo. A consciência pode ser
classificada também como uma coesão de percepção de estados e eventos, ou seja,
uma pessoa consciente possui capacidade de perceber através de seus sentidos os
eventos e também dos estados a sua compreensão, como uma chuva prestes a cair
ou um dia de sol muito forte, em que o calor excessivo pode provocar sensações
como o cansaço. Embora esta ideia se aplique ao consciente, ao inconsciente
ainda não possui uma noção unificada (p. 247), o que se propõem a dizer que os
mecanismos de compreensão do inconsciente ainda é incompleta neste sentido. A
representação lingüística aqui por John Searle é bem aprofundada; no qual ele
afirma que qualquer representação lingüística é sempre incompleta, pois dependem
de vários fatores, como o sentido da própria representação, a variação
lingüística, modo de interpretação, receptor da mensagem etc.

A
consciência, enfim, possui um papel de destaque quanto aos seres humanos, a
saber, a própria sobrevivência. A consciência do mundo que cerca os seres
humanos é mais que as adaptações biológicas que os outros animais deste planeta
possuem. As reduções que os futuros estudos irão produzir no sentido de tentar
reproduzir a mente enfrentarão dificuldades que só posteriormente vai se
descobrir seus efeitos. Mas devem-se ressaltar alguns pontos como apontado por
John Searle. O sistema binário, no qual é a base de informação dos computadores
pode também ser reproduzido por animais (p. 294), como em uma sequência de
pombos treinados para produzirem um determinado movimento quando seus bicos
tocarem alguma superfície como, por exemplo, que reproduzam algum tipo de som. Embora
os estados computacionais sejam originais da Física, pode-se aplicar uma
interpretação computacional ao cérebro (p. 322), mas diferente do processo de
informações que é próprio aos computadores. Quando um computador pilota um
avião isso não deve ser considerado um estado consciente, pois a realização de
tal ato pelos computadores em si é anteriormente programada, caso haja neste
exemplo alguma ocorrência fora dos processos de informações que o computador
recebeu poderia transformar-se em uma tragédia, caso um piloto humano
consciente não estivesse por lá para solucioná-la.

Deve-se
por parte do pesquisador, filosofar sobre as influências – inclusive pessoais –
que poderá enfrentar em sua pesquisa, como enfatizado pelo autor. No exemplo
que elucida sobre o ato de bombear sangue que o coração produz (p. 340), o
pesquisador que neste caso especifico também é um influenciado pelo seu próprio
coração, deve se afastar de opiniões que nesta função descrita do coração,
direcione seus estudos de modo não satisfatório ou influenciado. Não se pode
deixar guiar pela opinião que só pelo fato que o coração bombeia sangue nas
veias e artérias do corpo que essa é a única e especifica função dele, outras
conclusões como o ato de bombear sangue faz parte de uma das atividades do
coração e não somente em sustentar a vida humana (ou animal) pode trazer
resultados mais satisfatórios, devido a uma maior liberdade de pesquisa nos
resultados que se procura. Outro exemplo é o da visão (p. 343), nele Searle
elucida acerca de não ser um processo mental, e sim o aparelho visual humano
que leva imagens à mente e estas são processadas, pelo inconsciente e
consciente conforme a particularidade do observador e receptor das imagens. A
mente humana segundo o autor trás ainda muita confusão (p. 353) e serão
necessários muitos estudos (o livro data de 1972 a sua versão original) para
conseguir alcançar um patamar que resolva razoavelmente bem as dúvidas como
apontadas por John Searle em sua obra. Em um interessante exemplo, ele
esclarece sobre como eram solucionados os problemas na época de publicação de
sua obra: ele chama de metáfora do bêbado, em que ele ao retornar para casa
perde no quintal de casa as chaves da porta da entrada, pelo fato de ser no
mato do quintal, o bêbado procura no asfalto, que recebe melhor a luz para
procurar suas chaves, ou seja, segundo Searle a solução para as dúvidas
apresentadas em seu livro como outras que irão surgir devem ser resolvidas não
somente nos campos que se julgue o mais adequado para a pesquisa (o asfalto
iluminado), mas sim onde ele pode ser mais bem resolvido e onde ele em sim
apresente o problema (no quintal). A metáfora, portanto, pode nesse simples
exemplo resolver uma questão que perdurava por muitas décadas, e na parte onde
menos se esperava achar a resposta, estaria.

 

CONCLUSÃO

Em
suma, para responder a questão que serve de guia para está presente obra “É
possível naturalizar a consciência?”, é necessário fazer os devidos
apontamentos.

Destarte,
a ideia da dualidade mente/cérebro que foi a base dos estudos da Filosofia da
Mente e originária de uma visão de mundo cartesiana, deve ser superada para
satisfazer a questão da naturalização da mente. Segundo o autor, essa dualidade
não pode ser levada como satisfatória, pois existem elementos desses dois pólos
– mente e físico – que ultrapassam essas fronteiras antigas. O físico pode ser
encontrado tanto no não físico e vice-versa.

Devem-se
destacar as múltiplas variedades que a consciência possui e os aspectos
apontados de estudiosos como John Searle que a separam da inconsciência, assim
também como os estados mentais encontrados nos seres humanos e poucos animais
que possuem os estados mentais conscientes, também em nossas ideias através de
estudos que chegamos à constatação da consciência (estudo da consciência pela
própria consciência).

A
partir dessas reflexões propostas por John Searle, a consciência em si já está
naturalizada, pois se entendido que o ato de naturalizar é tornar físico como a
própria consciência, então ela em si é natural. Com base no rompimento do
argumento das antigas concepções da Filosofia da Mente, como o Dualismo e
Materialismo, a separação consciência e físico deixa de possuir barreiras
especificas. A consciência passa a se naturalizar, pois, os aspectos físicos
são encontrados na consciência, assim como os aspectos não físicos igualmente
são encontrados no campo físico.

 

BIBLIOGRAFIA

SEARLE,
John. A Redescoberta da Mente. São Paulo: Martins Fontes. 2006. 388 p.

 

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