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Os tipos arquitetônicos religiosos. Basílica, mesquita e catedral

A Idade Média legou três tipos arquitetônicos, cada qual mais expressivo da sua civilização: a basílica bizantina, a mesquita árabe e a catedral gótica, com seus correspondentes tipos civis. Na basílica, que em Roma era o local dos tribunais de justiça, a abóbada romana toma o aspecto da cúpula. Foram os romanos que aplicaram o arco aos tetos, aos aquedutos, às pontes, às portas monumentais, às termas e vilas, a tudo em que se combinavam arquitetura e engenharia, as obras utilitárias e as de ornamentação. O teto do seu Panteão uma vez elevado, temos Santa Sofia de Constantinopla e São Marcos de Veneza.

Mosaicos e arabescos

A decoração interior das basílicas — seus jaspes e seus pórfiros, seus oiros e seus mosaicos — constitui o espelho do esplendor bizantino, da mesma forma que os azulejos e arabescos dão bem a nota discreta e fina da decoração árabe, onde, graças a esses pitorescos desenhos e engenhosa disposição de linhas, não parece fazer falta a representação da criatura humana vedada pela religião muçulmana. A arte como a poesia, entre os árabes, deve muito à influência imaginativa dos persas. Vai grande distância da Kaaba de Meca ou da pedra negra, talvez um meteorito, caído do céu para que descansasse no deserto a fatigada Agar, que o atravessava com o filho Ismael, de quem se dizem descender os árabes ou ismaelitas, à mesquita de Córdova, à Giralda de Sevilha ou ao Alhambra de Granada. Os minaretes, que são torres adelgaçadas, dão por sua vez uma nota espiritual a essa arquitetura religiosa.

O arco e a ogiva

A arquitetura românica, em que predomina o arco redondo, perdurou além do século XI. A arquitetura gótica surge quase no fim do século XII. A igreja românica, com suas abóbadas baixas e seu interior sombrio, traduz a alma transida de humildade e de pavor da primeira fase da Idade Média; a catedral gótica, com suas ogivas elegantes e desassombradas, suas torres esguias como frechas, suas rosáceas e vitrais inundando as naves de uma luz suave, traduz a alma elevada como nunca para o céu. Ela é, na segunda fase da idade histórica que tanta claridade encerra nas suas sombras, o símbolo da Igreja triunfante, como o viu um historiador, a ninguém podendo escapar esse aspecto luminoso do idealismo cristão.

Divisão do império de Carlos Magno. O Tratado de Verdun

O filho e sucessor de Carlos Magno, Luís, o Bonacheirão (le Débon-naire, 814-840), cometeu o grave erro, muito do seu tempo, de destruir a unidade do império paterno, associando a si no governo um filho, dando reinos aos outros e até erigindo em reino a Suábia para um seu filho de segundo matrimônio, que veio a ser Carlos, o Calvo. Daí a série de discórdias de família que lhe amarguraram a existência e conflagraram os povos, sendo êle alternadamente encerrado num convento e reposto no trono ao sabor das intrigas e das lutas. Por sua morte as dissenções, que lhe sobreviveram, levaram ao tratado de Verdun (843), a primeira das convenções entre Estados

europeus depois da dissolução do impório romano, e convenção em si mesma importantíssima porque dela datam os reinos da Alemanha, com que ficou Luís, o Germânico, da França, com que ficou Carlos, o Calvo, e da Itália, com que ficou Lotário. Entendia-se por Alemanha as regiões a leste do Reno; por França, as regiões a oeste do Ródano, do Saône e do Mosa, e à Itália, com o título imperial, se agregara uma faixa central entre as duas outras seções, indo do Mar do Norte ao Mediterrâneo, incluindo a bacia inferior do Reno e ao vale da Borgonha e da Lorena, que ficou por isso se chamando Lotaríngia.

Alemanha e França

Pela morte dos filhos de Lotário, Carlos, o Calvo, herdou seus Estados e recebeu do papa o título de imperador (875), mas faltava-lhe a energia precisa para debelar a ameaça dos novos invasores — normandos, sarracenos e húngaros — e para arcar com os grandes senhores feudais. Seus sucessores foram de mal a pior, pelo que os senhores deram a coroa francesa a Carlos, o Gordo (884), filho de Luís, o Germânico, o qual já reinava na Alemanha. A idéia era reconstituir o império carlovíngio para fazer frente ao perigo normando, mas Carlos, o Gordo, foi uma decepção: comprou a paz aos normandos, em vez de os esmagar com o exército que trouxera da Alemanha. Deposto por isso na dieta de Tribur em 897, viu seu império retalhado em uma porção de reinos, cabendo o de França ao conde de Paris, Eudes, que soubera defender sua cidade contra os sitiantes normandos. Em 987 subia ao trono a terceira dinastia francesa na pessoa de Hugo Capeto, duque de França, nome este que sendo o de um dos maiores feudos, passou a designar todo o reino.

O fato de o novo rei, elevado por seus pares, ser êle próprio um dos principais senhores feudais, munia-o de rendas, de terras e de forças com que não podiam contar os carlovíngios.

Henrique I

Na Alemanha estes reinaram menos de um século após o falecimento de Carlos Magno e durante esse tempo os duques governaram mais do que o rei. Ao falecer o último da dinastia (911), cinco desses grandes senhores elegeram rei o duque Conrado da Francô-nia, ficando desde então a Alemanha reino eletivo. Seguiram-se-lhe cinco soberanos saxões, a começar por Henrique I, o Passarinheiro (l’Oiseleur, 919), que anexou a Lorena, estabeleceu os margraviados ou grandes condados fronteiriços destinados a conter as invasões eslavas e dos quais foi tipo o de Brandeburgo, protegeu a fundação de cidades no intuito de coibir os excessos feudais e bateu em Mer-seburgo (933) os húngaros ou magiares de raça uralo-altaica, que, instalados na antiga Panônia, como os hunos, causaram na Alemanha, na alta Itália e na França oriental sérias devastações.

Oton, o Grande, e o Sacro Império Romano

Esse monarca atilado faleceu em 936 e seu filho Oton, o Grande, eleito no seu lugar, seguiu-lhe bem as pegadas. Sobrepôs-se aos grandes feudatários, fazendo membros de sua família assumirem os ducados vagos e organizando em contrapeso ao feudalismo leigo um

feudalismo eclesiástico, conferindo aos bispos condados, com prerrogativas idênticas às dos príncipes seculares. Bateu definitivamente em Augsburgo (955) os húngaros que, tendo perdido 100 000 homens nessa batalha, se confinaram desde então às suas planícies e deixaram de representar uma ameaça para a Europa ocidental. Finalmente, desposando a viúva do último rei carlovíngio da Itália, Lotá-rio, uniu a alta Itália ao reino alemão e foi coroado imperador em 962, estabelecendo o Sacro Império Romano da nação alemã, que durou até Napoleão, se bem que sendo nalguns aspectos mais uma ficção do que uma realidade.

A Itália o o papado. Origem do direito de investidura

Retalhada em reinos, ducados como os de Spoleto e Benevento, senhorios pontifícios e eclesiásticos e cidades livres como Veneza e Gênova, a Itália andava dilacerada pelos conflitos e crimes de que era teatro. Os italianos não gostaram muito da sujeição mais forte que para o todo da península representava a elevação dos soberanos alemães a imperadores romanos do Ocidente e o papa entrou pessoalmente a recear pela posse de Roma, onde se devia fazer a proclamação imperial e que era portanto a capital verdadeira. A intervenção de Oton foi aliás violenta, fazendo depor num concílio irregular o pontífice João XIII, que o coroara — um dos

piores papas que tem havido, na opinião do historiador inglês Free-man — e elegendo no seu lugar o antipapa Leão VIII, que lhe outorgou e à sua sucessão o famoso direito de investidura, origem de tanta querela e pelo qual competia ao imperador aprovar a eleição do papa e nomear os bispos nos seus Estados.

A casa da Francônia

Oton faleceu em 973 e a casa da Saxônia reinou até 1024, sendo substituída pela da Francônia, que significa França de leste ou teutónica, para diferençá-la da França do oeste ou celto-latina.

Um imperador alemão dando a investidura a um bispo, por meio do báculo. Cópia de uma miniatura do século IX.

Sob essa dinastia foi incorporado em 1032 o reino da Borgonha, embora dependente conseguiu manter-se sempre fora das combinações territoriais dos reis francos. O maior soberano desta série, com o qual o novo império romano chegou ao seu apogeu, foi Henrique III (1039), ao qual remonta a luta do papado e do império.

Henriquo III. Henrique IV e Gregório VII

Henrique III foi chamado a Roma no momento em que três candidatos se disputavam o sólio pontifício: depôs todos três (1046) e confiou o papado sucessivamente a vários bispos alemães. O pior da contenda veio porém ao tempo de seu filho Henrique IV, a quem coube lutar com o grande Hildebrando, papa sob o nome de Gregório VII em 1073. Reunido no ano imediato o concílio de Latrão, retirou ao imperador o direito de investidura, o que o pontífice se deu pressa em notificar-lhe. Respondeu o imperador reunindo em Worms um sínodo de bispos alemães que pronunciou a deposição de Gregório VII, o qual replicou com uma bula de excomunhão que desligava os senhores feudais do seu juramento de fidelidade. E como os duques da Suábia e da Saxônia dessem mostra de quererem aproveitar o ensejo para deporem a casa reinante da Francônia, Henrique IV achou de boa política implorar o perdão do pontífice, o qual o conservou três dias de pés descalços sobre a neve e apenas coberto com um cilício antes de o receber em Canossa, castelo da condessa Matilde, filha do duque Bonifácio da Toscana e amiga dedicada do papado.

Imperador e papa

Como senhor de Roma, era o papa vassalo do imperador, mas, como chefe espiritual da cristandade, era supremo e dispunha das armas terríveis, para os crentes, da excomunhão e do interdito, pena esta última que privava dos sacramentos todo um país. Gregório VII preparara de longa data a sua obra de rígida disciplina eclesiástica. Como cardeal Hildebrando fora durante 20 anos primeiro chanceler e amadurecera as reformas com que assinalou seu pontificado e tentou restituir à Igreja a moralidade que perdera com os bispos políticos, os frades luxuosos e o baixo clero contaminado pelas riquezas e pelos vícios mundanos. Foi ele quem mais urgiu e apertou o cumprimento da lei do celibato dos padres e condenou a simonia ou tráfico de coisas santas, entre cujos abusos se devem contar os relativos aos feudos eclesiásticos.

Os feudos eclesiásticos

Estes feudos eram tratados da mesma forma que os feudos leigos pelos senhores feudais, aos quais cabia o privilégio de preenchê-los, pelo que os governantes temporais tinham vindo a exercer o direito de nomear ou confirmar a eleição de quase todos os grandes prelados da Igreja. Os escolhidos pagavam pela investidura uma soma proporcional ao rendimento do feudo, o que gerava um comércio vergonhoso, dando-se a vaga ao maior licitante, pessoa às vezes sem idoneidade nem moral. Gregório VII cortou o mal pela raiz proibindo toda investidura eclesiástica feita por um governante temporal. E êle sabia acompanhar suas palavras de atos fulminantes. O excomungado não podia ter mais relações com os outros fiéis; recusava-se-lhe comida e abrigo; ficava em condição pior do que a de um pestífero. Na região interdita fechavam-se as igrejas; não repicavam mais os sinos; não se celebravam casamentos nem funerais religiosos. Pode-se bem calcular o efeito de tais medidas sobre as imaginações medievais.

Desforra de Canossa

Entretanto Henrique IV não se deu por vencido, ou antes, procurou a sua desforra do papa, uma vez reduzidos à obediência os vassa-. los rebeldes, morrendo em combate o seu competidor já eleito, Rodolfo da Suábia. Entrando depois disso em Roma, depôs Gregório VII, a quem substituiu o antipapa Clemente III ao mesmo tempo que o grande pontífice, por seu turno humilhado, se refugiava entre os normandos de Nápoles, onde faleceu em 1085. Henrique IV faleceu miserável em Liège em 1106, despojado da dignidade imperial e atacado pelos próprios filhos.

A concordata de Worms

A luta prosseguiu entre sucessores de um e de outro até a concordata de Worms em 1122, a qual serviu de trégua na renhida questão e tentou dar-lhe solução, confiando ao papa a investidura espiritual pelo báculo e pelo anel e entregando ao imperador o direito de conferir pelo cetro os benefícios eclesiásticos. A eleição do papa ficou desde então pertencendo somente ao clero romano, datando de 1274 a eleição pelo conclave’dos cardeais. Um e outro sistema asseguravam a continuidade de pontífices italianos, com exceções a começo que não mais se repetiram após certo tempo.

A posse dos Lugares Santos. Cristãos, árabes e turcos

As cruzadas foram a projeção do intenso sentimento religioso da Idade Média e só se tornou possível seu esforço, duas vezes secular (1096-1291), por causa da instituição feudal e do predomínio do aventuroso espírito de cavalaria — fatores esses que arrastaram os povos cristãos da Europa a libertarem os Lugares Santos da opressão muçulmana e fundarem no seu terreno de ação infiel um reino latino do Oriente. O motivo imediato foi mesmo a perseguição a que entraram a ser sujeitos os cristãos depois que a posse da Palestina passou dos califas árabes para a dos turcos seldjúcidas, tribo tártara fanática e sanguinária que aqueles califas, os quais costumavam até favorecer o movimento de peregrinos como produtor de bom rendimento, tinham engajado ao seu serviço ao sentirem debilitar-se a fibra da sua gente. Os turcos formaram uma espécie de guarda pretoriana que, como a de Roma, entrou a influir na sucessão e, pior do que a de Roma, entrou a apropriar-se do império.

Urbano II e Pedro, o Eremita

Nada melhor se casava com o espírito do tempo e respondia à sua organização eclesiástica e temporal como essa idéia de resgatar a terra de lesus, limpá-la da profanação a que andava reduzida. O papa Urbano II trouxe pessoalmente, com a grande eloqüência de que dispunha, o assunto à consideração do concílio de Cler-mont (1095), após haver sondado a disposição de ânimo das nações

Cruzados em marcha. Fac-símile do manuscrito "De passagiis in Terram Saneiam".

cristãs por meio das prédicas apaixonadas de Pedro, o Eremita, vítima como se apregoava, dos maus tratos dos inimigos da íé e instigador principal do fervor papal.

Acresce que nessa ocasião o imperador bizantino Aleixo Comneno implorou da Igreja Romana auxílio contra os turcos que ameaçavam Constantinopla e que já se previa poderia constituir, como de fato veio a acontecer, um sério perigo para a Europa,

A primeira cruzada

Decidiu-se a expedição e o entusiasmo foi de fato geral e profundo. A flor da cavalaria marchou com satisfação íntima dos soberanos, para os quais sua turbulência era um pesadelo. Precederam porém os contingentes regulares dos senhores feudais — os condes de Tolosa, Blois e Flandres, os duques da Normandia e da Baixa Lorena, o príncipe de Tarento e outros — bandos de fanáticos em número diz-se que de 80 000 contando as mulheres e crianças, que foram morrendo em boa porção pelo caminho, vítimas da fome e do cansaço; não poucos foram massacrados na Alemanha e na Hungria em represália às devastações cometidas, sendo o restante quase todo exterminado pelos turcos depois de atravessar o Bósforo.

Não foram muito mais felizes os que se seguiram — 600 000 infantes e 100 000 cavaleiros. Tomaram Nicéia, depois Antioquia defendida por 450 torres, mas cerca de metade dos combatentes foi sacrificada na marcha penosíssima e a outra metade, cruelmente dizimada nos encontros, teve que parar e se refazer antes de, num arranco supremo, apoderar-se de Jerusalém, onde apenas chegaram

1 500 cavaleiros, 20 000 infantes e outros tantos peregrinos desarmados e parasitas de acampamento.

Tomada de Jerusalém

Todos, ao avistarem a cidade santa, caíram de joelhos rezando e chorando no transbordamento da sua fé. Esta os inspirava, e eles alucinados talvez se deixassem arrastar a verdadeiros atos de crueldade. Jerusalém achava-se então em poder do califa sarraceno do Egito, que a tomara aos turcos: eram porém igualmente infiéis e a matança déles foi tal que, segundo escreveu um dos cruzados, no pórtico do templo de Salomão o sangue chegou a subir acs joelhos dos cavalos.

O reino latino. Os freires cavaleiros

Organizado o Estado feudal de Jerusalém, com varios condados e principados vassalos, servindo de constituição as Assises, foi escolhido rei, Godofredo de Bouillon, duque da Baixa Lorena, o qual entretanto não quis ser mais do que barão defensor do Santo Sepulcro (1099). Como milícia desta guarda formaram-se ordens de freires militares — a dos Hospitaleiros ou de São João de Jerusalém (1100), a dos Templários (1118) e mais tarde a Teutónica (1190) — presos por votos e dotados do espírito de organização que tanto faltava às tropas medievais. Sua cavalaria foi o melhor elemento tático das guerras de então e constituiu o dique oposto por algum tempo, dois séculos quase, à reconquista da Terra Santa pelos infiéis.

Visão do Pedro, o Eremita, na igreja do Sanfo Sepulcro. À direita, Pedro recebendo notícias do Patriarca de Jerusalém. Fac-símile do manuscrito "De passagiis in Terram Sanctam", obra editada em Veneza, no começo do século XIV.

A segunda cruzada

A segunda cruzada (1147-1149) foi pregada por São Bernardo quando se receou pela sorte do reino latino de Jerusalém, por causa da tomada pelos turcos de Edessa na Mesopotâmia, sede de um principado cristão. Desta vez foram os próprios soberanos: Luís VII de

França, em expiação de um ato desumano, e o imperador Conrado III da Alemanha. A expedição foi um malogro, apenas chegando à Síria destroços do exército. Os alemães tinham mesmo sido trucidados nos desfiladeiros do Tauro e os franceses, muito desfalcados, não conseguiram sequer tomar Damasco, a que puseram sítio.

A terceira cruzada. Ricardo Coração de Leão

Em 1187 o sultão do Egito, Saladino, apoderou-se de Jerusalém e a consternação foi grande em toda a cristandade. Os maiores soberanos da Europa — Frederico Barbarroxa da Alemanha, Filipe Augusto da França e Ricardo Coração de Leão da Inglaterra, trineto de Guilherme, o Conquistador — alistaram-se numa terceira cruzada (1189-1192). Os alemães, idos por terra, foram de novo as piores vítimas, primeiro.das perfídias bizantinas e depois do fado inclemente: seu próprio imperador morreu afogado na cheia de um rio na Ásia Menor. Franceses e ingleses, transportando-se por mar de Gênova e de Marselha, tomaram com grande dificuldade São João d’Acre, que estava sendo cercada pelo resto das forças alemãs — 5 000 homens de 100 000 que tinham partido — mas não conseguiram tomar Jerusalém. Filipe Augusto voltou logo para se aproveitar da ausência do rival inglês na posse dos feudos franceses; Ricardo Coração de Leão ficou a pelejar desajudado dois anos e, ao atravessar de regresso à Alemanha, Joi encarcerado pelo duque d’Áustria, a quem ofendera e que o vendeu ao imperador Henrique VI, o qual só o libertou a troco de avultado resgate. Era aliás comum naqueles tempos e constituía para os vassalos capítulo de pesada despesa, resgatarem seus suseranos aprisionados nas freqüentes guerras privadas.

A quarta cruzada e o reino latino do Oriente

A quarta cruzada (1202-1204) partiu de Veneza e a qualidade da gente que a compunha era inferior à das anteriores. Veneza alugou-lhe os serviços para a tomada de Zara e habilmente desviou a expedição, que se destinava ao Egito, para Constantinopla, onde as dissenções de corte prometiam boa recompensa a uma comunidade mercantil, como aquela do Adriático, que apetecia o comércio do Mar Negro. O grego era aliás para um cruzado tão infiel quanto o turco, pois que era um herege, e o saque de Constantinopla foi executado com fervor. Nem parou aí a pilhagem que se prolongou por mais de meio século, enquanto durou o império latino e feudal do Oriente, fundado nessa ocasião com Balduíno de Flandres no trono e cercado de uma série de Estados vassalos, que se estendiam até a Moréia ou antigo Peloponeso.

A pilhagem de Constantinopla católica

A Europa civilizada — que boa parte ainda o não era — tornou-se assim nos começos do século XIII toda católica, com a autoridade papal restabelecida no Oriente cismático, e toda feudal. Pelo que toca pessoalmente aos flamengos, fizeram no dizer de Driault excelente negócio com o tráfico sistemático a que se entregaram, de preciosidades artísticas e relíquias, a coisa que na Idade Média era mais altamente cotada. A coroa de espinhos de Jesus Cristo foi por eles vendida em 1239 a São Luís, rei de França, o qual, para albergar condignamente essa jóia religiosa mandou construir a famosa Sainte Chapelle de Paris, que é uma jóia da arquitetura gótica. Veneza também íêz bom negócio porque, mesmo quando voltou o império grego em 1261, ficou com a maioria das ilhas do Arquipélago (o antigo Mar Egeu) e pontos da terra firme.

Génova e Veneza

Gênova ajudou a dinastia dos Paleólogos a derrubar o império latino de Constantinopla e a subir ao trono, datando daí o poderio daquela comunidade liguriana, pois que, havendo já conquistado a Córsega e a Sardenha, adquiriu, então, além do bairro bizantino de Gaiata, os portos de Azof e de Cafa, a saber, o comércio do Mar Negro que os venezianos tinham pretendido monopolizar. Batendo em 1359 Pisa, que no tempo das cruzadas estabeleceu feitorias em Constantinopla, Tiro e Tripoli e disputou a Gênova o predomínio no Mediterrâneo ocidental, esta república teve que lutar somente contra Veneza que, após porfiada contenda, acabou por suplantá-la, estendendo seu domínio no começo do século XV sobre o Golfo de Corinto, a costa setentrional do Adriático e várias cidades da Itália setentrional.

A cruzada das crianças

Entretanto sucediam-se as cruzadas menores, posto que carecendo da anterior emoção. A febre declinara, mas antes de ceder, contagiou as crie iças, pregando a guerra santa um rapazola de 12 anos, precursor de Joana d’Arc, no levantar esta os brios patrióticos, aquele os brios religiosos. Partiram bandos de crianças, refere-se que 30 000 da Alemanha e outras tantas da França. Foi isso em 1212. As primeiras transpuseram os Alpes e desceram ao longo da costa italiana à procura que o mar se abrisse para lhes dar passagem, como o Mar Vermelho o fizera para os hebreus. Em Roma o papa as recebeu e as mandou para casa. As francesas não passaram de Marselha, a não ser umas cinco a seis mil que aceitaram o pérfido oferecimento de transporte de dois comerciantes, os quais as venderam aos negociantes de escravos da África setentrional. O caminho, escusado será dizer, ficou juncado dos corpos das que não resistiram às privações e fadigas.

As cruzadas menores

A quinta cruzada deve ser dividida em duas partes: a primeira (1217-1221), comandada pelo rei da Hungria, resultou num desastre; a segunda (1228-1229), organizada pelo imperador Frederico II, resultou numa vitória, mas a Igreja opôs-se a que se concedesse liberdade para o culto muçulmano no recinto de Jerusalém, que era a base da negociação. A sexta cruzada (1238) gorou pela invasão dos turcos na Palestina. A sétima e a oitava (1248-1251 e 1270) foram as de São Luís IX, de França, que quis cumprir uma promessa e para isto se aproveitou das perturbações que no século XIII estavam causando no Oriente as invasões mongólicas.

A sorte de São Luís

Na primeira foi São Luís feito prisioneiro depois de tomar Damie-ta, na marcha para o Cairo, por onde queria encetar a campanha. Resgatado, percorreu e restaurou algumas praças do reino latino que ainda se achavam no poder dos cristãos. Na segunda foi induzido pelo irmão, Carlos d’Anjou, rei das Duas Sicílias, a começar por Túnis e aí foi vítima da peste que lhe dizimou o exército.

Reconquista da Terra Santa pelos infiéis. Os cavaleiros de São João de Jerusalém.

A reconquista da Terra Santa pelos infiéis ultimou-se em 1271, quando os cavaleiros de São João de Jerusalém perderam seu fortíssimo reduto de São João d’Acre e não puderam mais conter o progresso dos turcos. Vieram então para Rodes e quando daí os expulsou em 1522 o sultão da Turquia, Solimão II, passaram para Malta, onde permaneceram até o fim do século XVIII.

Os Templários e seu destino. A Ordem de Cristo.

Os Templarios espalharam-se pelo Ocidente e, da mesma forma que aqueles outros, prestaram grandes serviços à reconquista cristã da península Ibérica. Acumularam fartos bens e dispunham de considerável poder, tendo mais de 10 000 mansões sujeitas a um grão-mestre. A cessação das guerras contra os infiéis desmoralizou-os porém: a inatividade junta com a opulencia corromperam-nos e Filipe, o Belo, rei de França, cuja rapacidade era notória, armou contra eles uma acusação, torturou-os, queimou o grão-mestre Jacques Mor-lay e outros cavaleiros, e apoderou-se dos seus bens móveis (1307). A cumplicidade de Clemente V, o primeiro papa de Avinhão, para onde êle transportou a sede da Igreja Romana, para ser agradável à França, e onde decorreram dessa vez sete pontificados (1307-1377) até Gregrório XI ceder às ameaças romanas da escolha de outro papa, fêz com que a ordem dos Templários fosse abolida, devendo suas terras passar aos cavaleiros de Rodes. Os príncipes cristãos preferiram todavia confiscá-las em seu benefício. Apenas D. Dinis, rei de Portugal, reconhecendo quanto tinham os Templários contribuído para a fundação da monarquia lusitana, criou a ordem de Cristo (1319), na qual se iniciaram quase todos os Templários das mansões portuguesas, e doou-lhe a maior parte das suas terras.

A ordem teutônica e a Prússia

Os cavaleiros da Ordem Teutónica foram habitar a Curlândia, no litoral do Báltico, e ali fizeram sua cruzada contra os russos, que eram tribos eslavas habitando a leste do Vístula, idolatras ainda e cuja conversão se não consumou sem estrenuo pelejar e sacrifício de missionários. Deu-se isto entre 1226, quando o papa e o imperador concederam aos cavaleiros Teutónicos as terras que pudessem conquistar, e 1283, quando a violenta cruzada terminou pela sujeição do território prussiano e dos territórios bálticos, germanizándose toda essa região. Riga fora aliás fundada por uma colônia de Bremen. A Prússia, ducado na Polônia, uniu-se depois ao eleitorado de Brandeburgo, que foi crescendo desde o século X; destarte se constituiu o reino da Prússia em 1701.

Resultados das cruzadas

As cruzadas puseram o mundo em movimento e desse movimento resultou necessariamente permuta de idéias e de gêneros. O Oriente tinha naquele tempo mais para dar e o tráfico oriental tomou por isso incremento, estreitando relações a Itália e o Levante. Os reis ganharam autoridade pela quantidade de senhores feudais que encontraram a morte nas expedições e cujos senhorios reverteram para a coroa. Outros nobres arruinaram-se ao passo que muitas comunas enriqueceram. Várias novidades foram introduzidas na Europa — os moinhos de vent", a bússola, o trigo mourisco, a cana-de-açúcar, primeiro aclimada na Sicília, donde passou à Madeira e depois ao Brasil. O conhecimento direto da ciência greco-arábica estimulou a inteligência latina e entrou a preparar a renascença da cultura clássica. As> explorações geográficas na Ásia não se teriam talvez realizado sem esse contato prévio e com êle despertou o espírito das aventuras marítimas, que certas circunstâncias favoreceram. Marco Pólo, o viajante veneziano do século XIII, foi num dado sentido o precursor do genovês Cristóvão Colombo.

Acampamento mongol e carro de transporte puxado a bois. Desenho do livro "Viagem de Marco Pólo", volume da Biblioteca Nacional, de Paris.

 

A reconquista cristã da península Ibérica. Os emirados e o reino asturiano

A reconquista cristã da península Ibérica foi grandemente facilitada pelas discórdias que minaram a prosperidade do califado de Córdova: os valis ou governadores entraram a revoltar-se para tornarem suas províncias independentes, e em 1031 o califa abdicou por não poder lutar contra os seus e contra os cristãos, organizan-do-se os emirados independentes^ de Murcia, Badajoz, Granada, Saragoça, Maiorca, Valência, Sevilha, Toledo e Córdova, que por vezes se guerreavam mutuamente. Aquela reconquista começara entretanto a ser uma realidade quando Pelágio, deixando seu ninho asturiano, ganhou sua primeira vitória em Covadonga, proclamando-o os companheiros, na forma germânica, rei (Koenige), após haver sido o escolhido (gewaehlte) para exercer o comando.

Leão e Navarra

O pequenino reino, que teve como capital Gijon, no Mar Cantábrico, transformou-se em 760 no reino de Oviedo e em 914 no reino de Leão, à medida que se ia ampliando nessa luta oito vezes secular, que só findou com a queda de Granada em 1492. Afonso III, o Grande (866-910), levou sues armas até o sul do Rio Douro. Outros reinos se iam porém formando. A Navarra, que fizera parte com o condado de Barcelona do império franco de Carlos Magno, constitituiu-se se Estado independente com Pamplona como capital, sendo reconhecido na dieta de Tribur em 837. Navarra por um momento, no comêço do século XI, dominou os territórios cristãos da península, os quais novamente se desmembraram por morte do seu unificador, Sancho III, o Grande.

 

Um dos filhos deste monarca foi rei de Aragão, condado até então dependente, e outro rei de Castela, a qual fazia parte do reino de Leão e se pôs independente. A Navarra, isolada por montanhas e até certo ponto separada da Espanha, não estava em condições de assumir um papel considerável nesses acontecimentos. Suas tropas compareceram entretanto na famosa batalha das Navas de Tolosa (1211) que deteve a invasão dos almoades, a qual chegou quase até as Astúrias, obrigando o papa Inocêncio III a pregar uma cruzada g eral, concorrida por todos os monarcas cristãos da península e servida por ordens militares locais — Calatrava, Santiago e Alcântara – segundo o modelo das dos Templários e Hospitaleiros, igualmente atraídas por meio de largas doações.

As ordens militares espanholas

Depois do século XIII a Navarra gravitou para a França pelo casamento da sua última princesa com Filipe, o Belo (1284), e passou de domínio ao sabor de outros matrimônios. Fernando, o Católico, do Aragão, rei de Espanha pelo seu casamento com Isabel de Castela, conquistou em 1512 a Alta Navarra, situada na vertente meridional dos Pireneus, a fim de unificar o território peninsular do norte. A Baixa Navarra porém, situada na vertente setentrional, passou para a casa de Bourbon pelo casamento de loana Albret e foi incorporada na monarquia francesa quando seu filho, Henrique IV, herdou a coroa dos Valois.

Aragão

O Aragão não participou tanto quanto Castela e Leão dos esforços da reconquista porque sua posição geográfica sobre o Mediterrâneo e o caráter industrioso da sua população o inclinavam de preferência para a labuta comercial. Não deixou contudo de ajudar a rechaçar as invasões muçulmanas que de Marrocos vieram — antes dos almoades, os almorávides — recuperar o perdido domínio árabe. Nessas lutas, Aragão, nos fins do século XI, tomara Huesca e depois estabeleceu sua capital em Saragoça até que, no princípio do século XII, extinguindo-se sua dinastia, seus senhores convidaram para rei o conde de Barcelona, Raimundo Berenger. Assim aumentado, Aragão anexou com Jaime, o Conquistador, Valência e as Baleares, juntou-se com Pedro III à Sicília, chamou a si em 1326 a Sardenha e ainda se ligou a Nápoles em 1435.

Castela e Portugal. O conde Henrique

Castela formou-se em 1037, sob Fernando Magno, pela união de Leão, mas por morte desse rei, em 1075, seus Estados foram novamente divididos pelos filhos, um dos quais, Afonso VI de Leão, conseguiu novamente anexar Castela e Galiza e fazer de Toledo sua capital (1085). Foi no seu tempo que o cavaleiro francês Henrique de Borgonha, bisneto de Roberto, rei de França, veio pelejar na península contra os mouros, e tão bem o fêz que lhe deu Afonso VI em recompensa a mão de sua filha natural Dona Tareja e o governo do condado portucalense (1094), subordinado ao governo da Galiza e compreendendo pouco mais do que o território situado entre o Minho e o Douro, com Guimarães como capital.

O conde Henrique acrescentou ao seu domínio o condado de Coimbra e foi tratando de pôr-se quanto possível autônomo. Sua viúva, regente na menoridade de D. Afonso Henriques, que ficou com três anos quando o pai faleceu em 1114, nutria a ambição de ser rainha, mas indispôs-se com a nobreza portucalense por causa do valimento dispensado ao fidalgo galego Fernão Peres de Trava. Não menos ambicioso, D. Afonso Henriques, aos 18 anos, pôs-se à frente do partido contrário à mãe, desbaratando as forças de Dona Tareja (1128), tirando-lhe o governo e iniciando suas lutas com os leoneses para consolidar a independência do novo Estado e com os mouros para alargar seus territórios. Aos mouros venceu primeiro em Ourique (1139) e como obtivesse igualmente vantagens sobre seu primo Afonso VII de Castela, foi proclamado rei em 1140. Sempre belicoso até morrer em 1185, caiu quando já avançado em anos prisioneiro dos leoneses, que o libertaram em troca de terras de que se apoderaram, mas aos mouros tomou Santarém, Lisboa —, auxiliado por cruzados que aí fizeram escala — Alcácer do Sal, Évora, Beja e Serpa, isto é, o Alentejo.

 

O período heróico da reconquista

O período sobre todos heróico da reconquista da península Ibérica foi o século XI. Neste século foi que, chamadas pelo emir de Sevilha, vieram as hordas cruéis de fanáticos berberes, substituindo-se ao elemento árabe o elemento mourisco; foi que se concentrou em D. Rodrigo de Bivar, o Cid Campeador da legenda, o esforço temerário que levou os cristãos de vitória em vitória até Valência; foi que chegaram cavaleiros estrangeiros a ajudarem a cruzada ocidental. Tal situação se prolongou pelo século XII, talvez mais premente ainda nalguns momentos e por isso mesmo mais gloriosa para o valor hispânico. No século imediato, Fernando III de Castela tomou quase toda a Andaluzia, inclusive Córdova, e Afonso X, o Sábio, apoderou-se de Murcia e repeliu uma terceira e última invasão marroquina, a dos merenides (1275).

A organização D. Sancho

A organização já ia acompanhando nas preocupações a conquista, tanto assim que ambos esses monarcas foram também legisladores. Ao segundo se deve o célebre código das Siete Partidas, mandado traduzir para português por seu genro D. Dinis, marido de Santa Isabel. Em Portugal o segundo rei, D. Sancho I (1154-1211), foi logo tratando de povoar seus territórios, atraindo colonos, fundando concelhos e vilas, apenas embaraçado nos seus propósitos por questões com Leão e com o clero.

D. Afonso II e D. Sancho II. Os nobres e o clero

Seu sucessor, D. Afonso II, o Gordo (1185-1223), teve as mesmas discórdias com o clero e outras com os nobres, mas achou tempo para reconquistar Alcácer do Sal e para convocar cortes, consolidando a autoridade real em tácita união com os conselhos. Foi este monarca o que tomou parte na batalha das Navas de Tolosa.

Sancho II (1202-1248) foi quem rematou por assim dizer a conquista do reino, tomando aos mouros Elvas, Serpa e Aljustrel, no Alentejo, e arrebatando-lhes a bacia do Guadiana, cem Mértola e Tavira, na invasão do Algarve; e foi igualmente quem sofreu o resultado dos conflitos anteriores com a nobreza e com o clero que, levando a Roma suas acusações, moveram o papa a depô-lo. Este episódio marca o auge da intervenção da Igreja nos negócios públicos de Portugal. Com os nobres mais fácil corria a solução, porque na península hispânica o feudalismo não vingou como na França ou na Alemanha, e isto sobretudo pelo papel assumido na reconquista pelos reis, ganhando eles próprios seus feudos, e pela preponderância que com a monarquia visigótica alcançara o clero, prestigiando a realeza no interesse da Igreja: sem falar na vigorosa tradição municipal legada pelos romanos.

D. Afonso III e D. Dinis

D. Afonso III (1210-1279), irmão de D. Sancho II, vivia em França e entrou nas intrigas contra o seu antecessor; acabou de conquistar o Algarve e disputou-o a Castela, que reclamava sua posse. Ainda teve graves dificuldades com a Santa Sé e foi mesmo interdito, com o que se submeteu. Protegeu a agricultura, a qual mereceria especial carinho de seu filho D. Dinis (1261-1325) que foi cognominado o rei lavrador. No reinado de Afonso III reuniram-se cortes em Leiria em 1254, nas quais teve pela primeira vez voto o Terceiro Estado, representado pelos procuradores dos municípios. No reinado de D. Dinis fundou-se em 1290 a Universidade, transferida de Lisboa para Coimbra em 1307; o rei, cujo preceptor fora um universitário francês, cultivava êle próprio as letras e colaborou no Cancioneiro que traz o seu nome.

D. Afonso IV e D. Inês de Castro

No filho de D. Dinis, Afonso IV (1290-1357), reapareceu o espírito combativo de Afonso Henriques. Pegou em armas contra o pai por zelos de um irmão bastardo, devastando trechos do país. Pelejou quatro anos contra o genro, Afonso XI de Castela, por ser este mau marido. Aliou-se depois com êle contra os mouros, a pedido da filha, e juntos ganharam a batalha do Salado em 1340. Finalmente, por motivo político, isto é, o receio de ver crescer a influência de Castela, ordenou a morte de Inês de Castro, amante e apregoada esposa clandestina de seu filho D. Pedro, o qual, doido por ela de amor, tornara infel: : sua mulher, a princesa espanhola D. Constança, de quem a "linda Inês" era dama. Intrépido e irascível, impetuoso e violento, não descurou no entanto esse monarca, nem a legislação nem a administração.

D. Pedro I e D. Fernando

D. Pedro I (1320-1367) mereceu o cognome de justiceiro pelo rigor com que perseguia os criminosos, a começar pelos assassinos de Inês de Castro. Era também econômico e pacífico, mas um tanto desequilibrado, tendo acessos de furor e acessos de alegria: nos primeiros castigava com suas mãos os culpados; nos segundos bailava pelas ruas com o povo. Foi seu filho, D. Fernando I, o Formoso (1345-1383), que entrou em lutas desastrosas com Castela, cujo cetro ambicionou e cujo monarca ofendeu, faltando ao compromisso de contrair matrimônio com a infanta sua filha, pela paixão que o desvairou por Leonor Teles, mulher casada com um fidalgo da corte.

Lutos com Castela. O mestre d’Avis e D. Leonor Teles

Os castelhanos duas vezes vieram a Lisboa, uma por terra, outra por mar, sendo a cidade em parte destruída e talados os arredores. Da paz concluída foi cláusula o consórcio do rei de Castela com a infanta D. Beatriz, filha única de D. Fernando e de Dona Leonor Teles, cujo anterior enlace fora anulado, dando-se assim àquele monarca direitos sobre a coroa portuguesa, que prontamente invocou quando faleceu D. Fernando. O povo, que sempre detestara o castelhano e nunca suportara a aventureira, amotinando-se por ocasião do seu casamento régio — o que custou a vida aos cabeças ■—, não vacilou em tal conjuntura em aclamar defensor do reino o mestre da Ordem d’Avis, D. João (1357-1433), filho natural de D. Pedro.

Aljubarrota e Valverde

Resoluto e destemido, D. João assassinou por sua mão o conde An-deiro, espanhol que era amante da rainha Leonor Teles e, tomando o campo contra Castela, ganhou em 1385 a batalha de Aljubarrota, perto de Leiria, que salvou a independência portuguesa, sendo desbaratado um inimigo quatro a cinco vezes mais numeroso. O con-detestável D. Nuno Álvares Pereira, uma das figuras mais sugestivas da história portuguesa, que fora parte importante em Aljubarrota, ganhou sobre os espanhóis mais outro combate, o de Valverde, em território inimigo à beira do Guadiana.

Dom João II e sua esposa. Da crônica "Vita Christi", impressa em 1495.

 

Os filhos do D. João I

Os filhos de D. João I e da princesa inglesa Dona Filipa de Lan-castre, filha de João de Gaunt, formam uma plêiade de nota, composta do rei D. Duarte (1391-1438), o ilustrado autor do Leal Conselheiro; D. Pedro, duque de Coimbra (1392-1449), o autor da Virtuosa Benfeitoria, tradutor de Cícero e viajante curioso; D. Henrique, o Navegador (1394-1460), o iniciador das descobertas portuguesas, e D. Fernando, o Infante Santo (1402-1443), que morreu prisioneiro dos mouros, em cujo poder ficara por ocasião da desastrosa expedição a Tânger em 1437, no reinado de D. Duarte, como refém da restituição de Ceuta, conquistada em 1415 pela expedição na qual participaram rodos os infantes e que foi a primeira aventura portuguesa fora do continente europeu e o início do seu império colonial.

D. Afonso V

A subida ao trono de D. Afonso V (1432-1481), filho de D. Duarte, foi manchada de sangue pela tragédia da Alfarrobeira, a saber, o encontro de forças reais com cavaleiros de D. Pedro, tio do jovem monarca e regente do reino durante a sua menoridade, no qual foi morto o preclaro infante, que vinha a Lisboa não para cometer violência, mas para reclamar justiça contra a calúnia que lhe moviam de querer esbulhar o sobrinho do trono. Afonso V tomou várias praças marroquinas: Alcácer-Seguer, Arzilla e Tânger, mas foi menos feliz no seu projeto de unir Castela a Portugal pelo casamento com sua sobrinha Dona Joana, a Excelente Senhora, filha de Henrique IV de Castela e ali alcunhada a Beltraneja, por ser geralmente considerada filha adulterina de Beltran de la Cueva. Afonso V invadiu a Espanha para ser infeliz no combate de Toro (1476), que confirmou a coroa de Isabel, a Católica.

d. João II

No reinado de seu filho e sucessor D. João II, o Príncipe Perfeito (1455-1495), graças à energia indomável do monarca, foi de vez consolidada a realeza com relação aos fidalgos que a generosidade inconstante de Afonso V fizera mais arrogantes.

D. João II mandou abrir inquérito sobre as acusações formuladas nas cortes de Leiria pelos procuradores dos conselhos contra as usurpações pelos nobres de terras da coroa e arbitrariedades praticadas com menosprezo da autoridade real; e como a nobreza por isso tramasse com Castela, mandou decapitar o duque de Bragança (1483) e no ano imediato apunhalou êle próprio seu cunhado, o duque de Viseu, o qual se pusera à testa de uma conspiração para vingar aquela execução.

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