JACINTO FREIRE DE ANDRADE

JACINTO FREIRE DE ANDRADE (Beja, 1597-1657) abade de Santa Maria das Chãs, escreveu poesias de pouco mérito e a Vida de D. João de Castro, na qual se nota por vezes a animação da narrativa de par com a pureza da frase. O Sr. Teófilo Braga o dá como — "vicioso panegirista imposto pela superstição clássica"; mas não esqueçamos que o mesmo erudito não poupou a supermacia estilística de Fr. Luís de Sousa, acoimando de prestígio a tradicional admiração por esse vulto das letras. Felizmente logo o Sr. Teófilo Braga equipara o prestígio de Fr. Luís de Sousa, entre os que falam português, à — "monomania da admiração de Racine para os Franceses". (resumo da biografia de JACINTO FREIRE DE ANDRADE )

Morte de D. João de Castro

Achava-se D. João de Castro gastado, (390) menos dos anos que dos trabalhos de tão contínuas guerras, com que veio a cair, rendido ao peso de tão graves cuidados. Enfermou gravemente, e descobriu (391) a doença em poucos dias indício de mortal; o que êle conhecendo pela moléstia de repetidos acidentes, se aliviou da carga do governo. Chamou o bispo D. João de Albuquerque, D. Diogo de Almeida Freire, ao Dr. Francisco Toscano, chanceler-mor do Estado, a Sebastião Lopes Lobato, seu ouvidor geral, e a Rodrigo, Gonçalves Caminha, vedor da fazenda, aos quais entregou o Estado com a paz dos príncipes vizinhos, assegurada sobre tantas vitórias. Mandou vir a si (392) ao governo popular da cidade, ao vigário geral da Índia, ao guardião de S. Francisco Xavier e aos oficiais da fazenda d’el-rei, a quem fêz esta fala:

"Não terei, senhores, pejo de vos dizer que ao vizo-rei da índia faltam nesta doença as comodidades que acha nos hospitais o mais pobre soldado. Vim a servir, não vim a comerciar no Oriente; a vós mesmos quis empenhar os ossos de meu filho, e empenhei os cabelos da barba, porque, para vos assegurar, não tinha outras tapeçarias nem baixelas. Hoje não houve nesta casa dinheiro com que se me comprasse uma galinha; (393) porque nas armadas que fiz, primeiro comiam os soldados os salários do governador, que os soldos de seu rei; e não é de espantar que esteja pobre um pai de tantos filhos. Peço-vos que, enquanto durar esta doença, me ordeneis da fazenda real uma honesta despesa, e pessoa por vós determinada, que com modesta taxa me alimente".

E logo, pedindo um missal, fêz juramento sobre os Evangelhos que até a hora presente não era devedor à fazenda real ile um só cruzado, nem havia recebido coisa alguma de cristão, judeu, moiro ou gentio; nem para autoridade do cargo ou da pessoa tinha outras alfaias que as que de Portugal trouxera; e que ainda a prata, que no reino fizera, havia já gastado, nem tivera jamais possibilidade para comprar outra colcha que a que na cama viam; só a seu filho D. Álvaro fizera uma espada guarnecida de algumas pedras de pouca estima para passar ao reino. Que disto lhes pedia mandassem fazer um termo, para que, se alguma hora se achasse outra coisa, el-rei como perjuro o castigasse. Esta prática se escreveu nos livros da cidade, a qual se poderá ler como instrução aos que lhe sucederam; nos quais, creio, ficou a memória mais viva que o exemplo.

Logo que o vizo-rei entendeu que era chamado à mais dura batalha, fugindo à importuna diversão dos cuidados humanos, se recolheu com o padre S. Francisco Xavier, buscando para tão duvidosa viagem tão seguro piloto; o qual lhe foi, todo o tempo que durou a doença, enfermeiro, intercessor e mestre. Corno não adquiriu riquezas de que dispor de novo, não fêz outro testamento que o que deixou no Reino, quando passou a governar a Índia, em mãos do bispo de Angra, D. Rodrigo Pinheiro, com quem o tinha comunicado. E, recebidos os sacramentos da Igreja, rendeu a Deus o espírito em 6 de junho de 1548, aos quarenta e oito de sua idade, e quase três do governo daquele Estado.

(Vida de D. João de Castro, liv. IV, obra de JACINTO FREIRE DE ANDRADE ).

(390) gastado — V. n. 381.
(391)
descobriu = revelou, manifestou, apresentou.
(392)
vir a si — O sujeito desse verbo são os entes {governo, vigário, guardião, oficiais) adiante escritos e antecede-o a preposição, para melhor entendimento do texto; aliás pode ser aceito como objeto indir. do verbo mandar e repetir-se mediante o pronome pessoal, sujeito de vir: "Mandou (ao governo, ao guardião etc.) virem até si ou que (eles) viessem à sua presença.
(393)
com que se me comprasse uma galinha — me — adjunto adverbial de fim; se — pronome apassivante.

 


Seleção e Notas de Fausto Barreto e Carlos de Laet. Fonte: Antologia nacional, Livraria Francisco Alves.

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