THE TREE OF LIFE: A EPIFANIA DO ERRO
jan 27th, 2012 | Por Nei Duclós | Categoria: CinemaNei Duclós
A fonte do sofrimento da cultura americana é o amor masculino mal resolvido, que tem na origem a família patriarcal bruta que exige ao mesmo tempo amor enquanto impõe-se pela violência. O herói americano é aquele que procura vingar-se do seu Outro – o vilão, representação do desamor ao pai – e para isso cerca-se do irmão, o companheiro fiel, que é seu apoio no perdão à brutalidade paterna. Terrence Malick faz uma prospecção longa, delirante e belíssima dessa tragédia nacional – que ele confunde com o destino de toda humanidade, já que faz parte de um império que se considera a única nação sobre a terra. Em A Árvore da Vida (2011) propõe o resgate de uma relação truncada e perdida não para condená-la mas transformar todos os erros numa epifania, numa celebração de almas perdidas que se reencontram como num evento batista fundamentalista.
Narrado o tempo todo, o filho mais velho (Sean Penn/ Hunter McCracken) que perde o irmão procura nos confins do universo uma ligação espiritual com essa perda para não sucumbir ao vazio da vida, representado pelo ambiente hiperrealista da urbanidade americana clean e mesquinha. A pista é a natureza. Primeiro, o cosmo, com suas assombrosas revelações feitas pelos telescópios digitais. Depois, os quintais e jardins do verão, em que a adolescência reprimida se ressente da aprovação paterna (Brad Pitt) e ensaia a transgressão, sob a permissão materna (Jessica Chastain) que é submissa ao patriarca mas também se insurge na ausência deste.
A natureza desvirtuada (a grama trabalhada com aspereza nas relações) é a família criada na violência, nas imposições das vontades dos adultos, num sistema mascarado de educação para a vida. O pai se sente um fracassado como subalterno e empregado, músico frustrado, e tenta incutir a coragem nos filhos, mas só consegue gerar o ódio. A impunidade do chefe da família com seus crimes diários leva a família à dissolução. O filho que parte e morre longe – provavelmente numa guerra, não fica claro no filme – e o primogênito que se refugia numa carreira e na meia idade quer de volta os laços que o formaram. É impossível viver no isolamento e no eterno presente. É preciso não apenas a memória, a lembrança, mas a reencarnação dos gestos, a recuperação dos espaços, o reviver dos momentos. A volta do beijo e do abraço e também da surra.
Não gosto desse diretor tão megalômano e que todos consideram gênio e que com esse filme arrebatou a Palma de Ouro em Cannes. Acho-o pretensioso e todo o seu esforço nas imagens cósmicas é para chegar perto de Kubrick em 2001, naquele final lisérgico que todos admiram e não esquecem (inclusive há imagens absolutamente iguais nos dois filmes). Mas Kubrick sim era gênio, Malick não. Quer ser, mas não é. Torra de tanta introspecção, mas é raso na concepção e objetivos. Você não pode justificar os erros só porque pertence a uma cultura hegemônica. A família fundada no amor masculino imposto na porrada não funciona, acaba no que sabemos bem: homens vazados de sentimento, endurecidos ou então frouxos no envolvimento que deveria ter com o gênero feminino.
A mulher é a grande outsider do cinema americano. Mae West, Marylin, Garbo, Liz, Natalie, Vivien são todas protagonistas e magníficas estrelas. Mas o foco é a relação entre os fortes, Batman e Robin, o mocinho e seu companheiro, o herói e o vilão,e aqui neste filmes, nos irmãos que cresceram à sombra do tacão paterno e acabam tendo que voltar ao início dos tempos para poder se encontrar. Mas é um território mítico, assim como a família. Em ambos, não há salvação. O núcleo familiar é fonte de desamor e a celebração é uma indulgência dos vencedores, os que perdem tudo ao se declarar os primeiros em tudo.
É preciso paciência para aguentar os intermináveis minutos deste filme, que começa no choque das estrelas e passa até pelos dinossauros (sério, eles aparecem no filme) e desaguam nos edifícios exuberantes da América hegemônica. Mas como todo mundo acha o máximo, é preciso ver para crer. Eu decidi não gostar, mas algo sempre se tira de tudo, principalmente do que nos desagrada.
Além do competente Brad Pritt (sempre bom), a concentrada e talentosa Jessica Chastain, temos essa grande revelação que é o garoto Hunter McCracken, o Sean quando jovem. Aliás, bem melhor do que o próprio Sean, que só faz figuração. Sean é o tipo cansado de ser o máximo. Excelente em muitos filmes, mas preguiçoso neste.