Vida de Pirro – Plutarco – Vidas Paralelas

SUMÁRIO DA VIDA DE PIRRO

I. Origem do reino do Épiro. II. Genealogia de Pirro. III. Eácides, seu pai, é destronado pelos filhos de Neoptólemo. IV. Pirro, ainda criança, é subtraído às suas perseguições por Andróclidas e Ângelo. V. Gláucias,rei da Ilíria, toma-o sob sua proteção. VI. Coloca-o no trono. VII. Nova revolta no Épiro. Pirro dirige-se para junto de Demétrio. VIII. Regressa ao Épiro e partilha o trono com Neoptólemo. IX. Os dois reis tornam-se inimigos. X. Pirro faz malograr a conspiração de Neoptólemo e se desfaz dele. XI. Vai em socorro
de Alexandre, contra Antípatro, mediante a cessão de uma parte da Macedônia. XII. O adivinho Teodoto dissuade-o de assinar o tratado que negociara com Lisímaco e Demétrio. XIII. Começo das divergências entre Pirro e Demétrio. XIV. Declara-se a guerra. Batalha na qual Pirro
se distingue. XV. Comparação de Pirro com Alexandre, o Grande. XVI. Elogio de seu talento militar. XVII. Doçura e bondade de seu caráter. XVIII. Suas mulheres e filhos. XIX. Êle se apodera de uma parte da Macedônia, que perde logo depois. Faz as pazes com Demétrio. XX. Novo
motivo de guerra. XXI. Investe de novo contra Demétrio. XXII. Motim no acampamento de Demétrio. Pirro é proclamado rei da Macedônia. XXIII. Partilha o trono com Lisímaco. XXIV. Vai a Atenas. XXV. Abandona completamente a Macedônia. XXVI. Retira-se para o Êpiro. XXVII. Pensa em auxiliar os tarentinos contra os romanos. XXVIII. Descrição do que então se passou em Tarento. XXIX. Retrato em Tarento. XXIX. Retrato de Cíneas.XXX. Conversação de Pirro com Cíneas sobre esta guerra. XXXI. Pirro parte, não obstante suas advertências. Enfrenta uma tempestade que destrói sua esquadra. XXXII. Aporta na Calábria. XXXIII. Estabelece em Tarento uma disciplina severa.XXXIV. Acampa perto dos romanos, e observa a formação de suas tropas, que provoca a sua admiração. XXXV. Empenha-se na batalha. Sua
conduta reúne, a prudência de um general e toda a coragem de um infante. XXXVI. Alternativas do combate. XXXVII. Pino, finalmente, põe os romanos em fuga, e apodera-se de seu acampamento. XXXVIII. Envia Cíneas a Roma a fim de negociar a paz. XXXIX. Após Cláudio, o Cego, faz-se conduzir ao Senado, para a isso se opor. XL. Resposta do Senado às propostas de Pirro. X LI. Fabrício é enviado, com vários outros
embaixadores, ao encontro de Pirro. Tentativas inúteis de Pirro para que ele aceitasse presentes, e para inspirar-lhe medo. XLII. Julgamento de Fabrício sobre Epicuro e sua doutrina. XLIII. Generosa resposta de Fabrício a Pirro. O rei confia-lhe os prisioneiros de guerra, sob palavra. XLIV. Os cônsules romanos advertem Pirro da perfídia de seu médico. XLV. Pirro envia aos romanos todos os prisioneiros de guerra, sem resgate. Empenha-se numa segunda batalha. XLVI. Sai vitorioso. XLVII. Diferença na maneira como Hierônimo narra este combate. XLVIII. Frase de Pirro por ocasião de suas vitórias. XLIX. Embaixadores da Sicília junto a Pirro. Notícias que lhe chegam da Grécia sobre a situação na Macedõnia. Segue para a Sicilia. L. Ocupa a cidade de Erix. LI. Recusa-se a conceder a paz aos cartagineses. Modifica-se a sua atitude em relação aos sicilianos. LII. Toda a Sicília se une contra êle. LIII. Volta à Itália. É atacado durante a viagem, e perde parte de sua esquadra. Aporta na Itália, onde os mamertinos o atacam de novo. LIV. Combate singular de Pirro com um bárbaro; êle o fende ao meio com um golpe de espada. LV. Ataca os romanos. LVI. É derrotado. LVII. Deixa a Itália e segue para a Macedõnia a fim de atacar Antígono, que o derrota. LVIII. Consagra os despojos dos gauleses no templo de Minerva Itonéia, com uma inscrição. LIX. Coloca na cidade de Egas uma
guarnição de gauleses, que pilham os túmulos dos antigos reis da Macedõnia. LX. Segue com um forte exército para Esparta, a pedido de Cleônimo. LXI. Entra na Lacônia, e acampa perto de Esparta. LXII. Os espartanos abrem durante a noite uma trincheira diante de sua cidade. As mulheres ajudam os homens. LXIII. Começo do ataque. LXIV. Proeza de Acrotato. LXV. Feito e morte de Filio. LXVI. Pirro recomeça o ataque na manhã do dia seguinte. LXVII. Acidente que obriga Pirro a bater em retirada. LXVIII. Chegam em retirada. LXVIII. Chegam socorros a Esparta. LXIX.Pirro deixa a Lacônia e segue para Argos. Um contingente escolhido de lacedemônios ataca-o no caminho. LXX. Êle os dizima, mas seu filho é morto. LXXI. Continua em sua marcha para Argos. LXXII. Diversos presságios. Pirro entra com suas tropas em Argos. LXXIII. Combate em Argos. LXXIII. Combate noturno. Pirro é tomado de espanto ao ver figuras de cobre representando o combate de um lobo e de um touro. LXXIV. Origem desta representação. LXXV. Obstáculos que Pirro encontra em sua retirada. LXXVI. Uma mulher fere-o com uma telha e um soldado corta-lhe a
cabeça. LXXXVII. Honras fúnebres que lhe são prestadas por Antígono. Envia este Heleno, filho de Pirro, ao Épiro.

Do ano 430, de Roma, ao ano 482; 272 A. C.

BIOGRAFIA DE PIRRO – Plutarco – Vidas Paralelas – Vidas dos homens Ilustres

Tradução de José Carlos Chaves. Fonte: Ed. das Américas

I.
Conta-se que, após o dilúvio, Faetonte, um dos que se
dirigiram para o Épiro (1) com Pelasgo, foi o
primeiro rei dos tesprotos e dos molossos;
porém, outros historiadores dizem que Deucalião (2) e
sua mulher, Pirra, depois de construírem o templo de Dodona, no país dos molossos, ali
se estabeleceram.

II. Seja
como fôr, muito tempo depois, Neoptólemo,
à frente de um exército numeroso, conquistou o país, deixando depois dele uma
sucessão de reis, que foram chamados os pírridas,
devido ao nome de Pirro, que recebera ainda em sua
infância, e dado igualmente ao mais velho dos filhos legítimos que teve de Lanassa, filha de Cleódeo, filho
de Hilo. Este o motivo por que Aquiles é honrado e reverenciado
no Épiro como um deus, sendo ali chamado Aspetos, na
língua do país. Mas como os que sucederam a
estes primeiros reis
caíram na barbárie, nenhuma memória deles nem de suas
ações e poderio existe. O primeiro a que a história faz menção é Tárritas (1), cujo nome passou à posteridade por ter dado
às cidades de seu país os costumes dos gregos, polindo-as através do cultivo
das letras e estabelecendo leis e normas civis. Este Tárritas
deixou um filho, chamado Alcetas, e de Alcetas nasceu Arimbas (2), e de Arimbas e Tróiade, sua mulher,
nasceu Eácides; este despcsou
Ftia, filha de Menão, o Tessálio, que, tendo adquirido grande renome durante a
chamada guerra Lamíaca (3), gozou de maior
autoridade, junto de Leóstenes, do que qualquer outro
confederado.

(1 Hoje a Albânia.

(2) Segundo
Eusébio, Deucalião reinou no Parnaso 1542 A. C. O
dilúvio que inundou a Grécia ocorreu treze anos mais tarde. Trata-se do dilúvio
de Deucalião, e não do dilúvio uni-. Yersal, que teve lugar, segundo se calcula,
2344 A. C.

III. Eácides teve de sua mulher Ftia
duas filhas, Deidâmia e Tróiade,
e um filho, a quem deu o nome de Pirro. Entretanto,
os molossos se rebelaram, expulsaràm-no de seu reino e colocaram no trono, o filho de
Neoptólemo. Todos os amigos de Eácides
que não conseguiram fugir foram mortos. Pirro, que
era ainda criança de peito, foi procurado por toda
parte peles inimigos de seu pai, os quais queriam matá-lo, Andróclidas
e Ângelo, porém conseguiram subtraí-lo às suas buscas, e fugiram. Levaram consigo alguns
poucos servidores, bem
como várias mulheres, para tratar
e amamentar a criança. Como o grupo era numeroso, não podia caminhar
rapidamente, e a fuga se tornou difícil. Andróclidas
e Ângelo, vendo que cs inimigos estavam prestes a
alcançá-los, entregaram o menino a Androclião, Hípias e Neandro, três jovens
robustos e dispostos, em quem confiavam, e ordenaram-lhe que se dirigissem o mais depressa possível para uma cidade do reino
da Macedônia chamada Mégara. E, em seguida, em parte
orando, em parte, combatendo., conseguiram conter os
perseguidores até à tarde. Livrando-se destes, afinal, com muita dificuldade,
foram correndo ao encontro dos jovens a quem haviam confiado Pirro. Ao pôr do sol, eles supuseram ter atingido o objeto
de suas esperanças, mas logo verificaram que dele estavam mais distante do que
nunca. O rio existente ao longo das muralhas da cidade corria com tal rapidez
que amedrontava. Procuraram um lugar onde pudessem atravessá-lo a vau, mas
verificaram que isto era impraticável: com o volume aumentado em conseqüência
de chuvas abundantes, suas águas lamacentas rolavam com grande violência, e a
escuridão da noite tornava as coisas ainda mais medonhas.

(1) Pausánias
chama-o Taripo.

(2) É
o seu nome, segundo
Diodoro.
Pausânias chama-o Aribas.

(3) Os
atenienses começaram esta
guerra após a
morte de Alexandre, o Grande.

IV. Desesperavam
já de poder atravessar sozinhos o rio com a criança e
as mulheres que a ornamentavam, quando viram, na outra margem, moradores da
região, aos quais suplicaram, em nome dos deuses, que os ajudassem a conduzir Pirro através da

torrente,
mostrando-lhe ao mesmo tempo, de longe, o menino. Porém, o ruído forte das
águas impedia que fossem ouvidos, e assim, ficaram todos
muito tempo parados junto às margens do rio, uns gritando e outros
prestando atenção, sem que nada pudessem entender. Finalmente, um dos membros
do grupo teve a idéia de arrancar, uma casca de carvalho, na qual escreveu com
o fuzilhão de uma fivela várias palavras, expondo a situação da criança e a
necessidade que tinha de ser socorrida. Em seguida, enrolou a casca numa
pedra, a fim de dar-lhe peso e poder atirá-la ao outro lado do rio, o que fêz. Há quem diga que êle espetou
a casca na ponta de um dardo, e o arremessou. Os que estavam na outra margem
leram os dizer os escritos na casca, ficando assim ao par do
perigo que corria o menino, imediatamente, cortaram o mais depressa que puderam
várias árvores, as quais amarraram juntas, e sobre elas atravessaram o rio. O
primeiro a chegar se chamava, por acaso, Aquiles; êle
pegou a criança e a levou para o lado oposto, enquanto seus companheiros
fizeram o mesmo com as outras pessoas.

V. Salvos assim
do perigo, e fora do alcance daqueles que os perseguiam, puseram-se todos a
caminho, dirigindo-se para a Ilíria, junto ao rei Gláucias, o qual encontraram em sua casa, sentado ao lado
da esposa. Colocaram a criança no chão, no meio da sala, diante do soberano.
Este permaneceu pensativo durante muito tempo, sem nada falar, meditando sobre
o que devia fazer, pois que temia Cassandro, inimigo
mortal de Eácides. E, enquanto isso, o menino Pirro, engatinhando, alcançou com suas mãos a rcupa do rei, e tanto fez que ficou de pé, junto aos
joelhos de Gláucias. Este pôs-se
a rir, mas logo depois se apiedou, pois pareceu-lhe achar-se diante de um
suplicante que tivesse vindo atirar-se-lhe aos
braços, para salvar-se. Outros autores dizem que não foi a Gláucias
que êle se dirigiu, mas ao altar dos deuses
domésticos, diante do qual se ergueu, abraçando-o com os dois braços. O rei,
achando que isto fora feito através de uma determinação divina, colocou o
menino entre os braços de sua mulher, e ordenou-lhe que o criasse com seus
filhos.

VI. Pouco
tempo depois seus inimigos mandaram procurá-lo, tendo Cassandro
chegado a oferecer duzentos talentos pela entrega do
menino. Gláucias recusou-se a entregar Pirro, e, quando este atingiu a idade de doze anos, levou-o
para o Épiro à frente de um exército, e o colocou no
trono. Pirro tinha em seus traços um ar de majestade
que inspirava mais terror do que respeito; e seus dentes superiores, em vez de
serem separados, um do outro, formavam um osso contínuo, sobre o qual ligeiras incisões marcavam os lugares onde devia haver
as separações. Atribuíam-lhe a virtude de curar as doenças do baço, para o que êle sacrificava um galo branco, e, com o pé direito deste
tocava docemente a víscera do enfermo, que fazia deitar sobre o dorso. Por mais
pobres que fossem as pessoas que o procurassem, ou per mais baixa que fosse a
sua condição, êle não deixava de aplicar esse
remédio, quando solicitado. Recebia como salário o galo sacrificado, presente
que lhe era muito agradável. Afirmava-se que o dedo grande de seu pé direito
tinha certa virtude divina; e, quando, após .sua
morte, seu corpo foi queimado e reduzido a cinzas, foi encontrado inteiro, sem nenhum
sinal da ação do fogo. Mas disto trataremos mais adiante (1).

(1) Plutareo
esqueceu-se dessa referência, ou, então, o trecho cm que o fez desapareceu. Plínio, entretanto, remedeia
este silêncio. Êle nos
conta que o
dedo de Pino foi colocado num relicário e conservado em um templo. (Plínio, VII, 2),

VII. Ao
completar dezessete anos, Pirro acreditando estar
assegurada a posse de seu reino, decidiu realizar uma viagem à Ilíria, a fim de
assistir às núpcias de um dos filhos de Gláucias, com
o qual havia sido criado. Mal se ausentara, e os molossos
rebelaram-se de novo, expulsaram os seus servidores e amigos, pilharam todos os
seus bens, e entregaram-se depois ao seu adversário Neoptólemo.
Pirro, despojado de seus territórios, e vendo-se
abandonado por todos, retirou-se para junto de Demétrio, filho de Antígono, que
tinha desposado Deidâmia. sua
irmã. Esta princesa, quando ainda muito jovem, fora dada como noiva a
Alexandre, filho de. Alexandre, o Grande, e de Roxana, e a tratavam mesmo como
sua mulher. Porém, como toda aquela família, por infelicidade, extinguiu-se
inteiramente, Demétrio casou-se com ela, ao chegar à nubilidade.
E na grande batalha travada perto da cidade de Hipse,
(1), da qual todcs os reis participaram, Pirro, apesar de muito jovem, esteve sempre ao lado de
Demétrio, distin-guindo-se como um dos melhores
combatentes, pois obrigou todos os que se encontravam à sua frente a fugirem.
Demétrio foi derrotado, mas êle não o abandonou,
conservando-lhe, fielmente, as cidades gregas que lhe haviam sido confiadas.

(1) Na Frígia,
no ano 301 A. C. Segundo alguns
autores, Pode-se escrever Ipse.

VIII. Depois do
tratado concluído entre Demétrio e Ptolomeu, êle
foi,

como
refém, seguindo para o reino do Egito. Durante a sua estada nesse país, deu
tanto na caça como em vários exercícios, as maiores provas de sua força,
paciência e resistência às canseiras. Verificando que, de todas as mulheres de
Ptolomeu, Berenice era a que gozava de maior crédito junto do marido, e era
também a mais prudente e a mais sensata, começou a fazer-lhe assiduamente a
corte. Êle sabia humilhar-se perante os grandes, dos
quais podia tirar proveito, e insinuar-se para
conquistar-lhes as boas graças; ao mesmo tempo, mostrava-se cheio de desprezo
pelos que pertenciam a categoria inferior à sua. E, como fosse honesto e
moderado em sua conduta, foi o preferido, entre vários outros jovens príncipes,
para marido de Antígona, filha de Filipe e da rainha Berenice, e nascida antes do casamento desta com Ptolomeu. Esta aliança
tornou maiores os favores e a consideração de que gozava; e, com o apoio de
Antígona, a qual se mostrava boa e afetuosa para com êle,
conseguiu gente e dinheiro para voltar ao reino do Épiro
e reconquistá-lo. Foi ali bem recebido pelo povo, pois este odiava Neoptólemo, que costumava tratar os seus súditos cem violência e crueldade. Entretanto, receando Pirro que êle fosse à procura de
outros reis para convencê-los a assumirem a sua defesa, achou melhor concluir
um acordo, ficando combinado que ambos reinariam juntos.

IX. Com o passar do tempo, alguns cortesãos se puseram
secretamente a irritar um contra o outro, através da
desconfiança que semearam entre eles. Mas nada irritou tanto Pirro quanto, segundo se conta,
este fato: os reis do Épiro tinham o costume, já
muito antigo, de fazer um sacrifício solene a Júpiter Marcial, num lugar da Molóssia denominado Passarão, onde proferiam um juramento
e recebiam outro dos epirotas: os reis juravam que
governariam de acordo com as leis, e os estatutos do país, e os súditos que
defenderiam o reino e nele viveriam de acordo, igualmente, com as leis. Os dois
reis, acompanhados de seus amigos, dirigiram-se ao lugar da cerimônia, e ali
trocaram presentes de grande valor. Gelão, que era um
dos mais fiéis e dedicados servidores de Neoptólemo,
após dar a Pirro os maiores testemunhos de amizade e
afeição, presenteou-o com dois pares de bois, próprios para trabalhos
agrícolas. Mirtilo, copeiro de Pirro,
que por acaso, se encontrava na cidade, pediu os bois ao rei. Este negou-lhos, e deu-os a outra pessoa. A recusa magoou Mirtilo, e Gelão, percebendo-o, convídou-o para cear. Alguns autores dizem que, após
embriagá-lo, Gelão abusou de Mirtilo,
que era jovem e belo. Após a ceia, pôs-se a falar a princípio de coisas vagas,
e em seguida concitou-o a colocar-se ao lado de Neoptó-lemo
e a envenenar Pirro. Mirtilo
simulou estar de acordo com essa sugestão, demonstrando contentamento. Mas
logo depois procurou Pirro a quem tudo contou; o rei ordenou-lhe
então que levasse Alexicrates, o chefe dos copeiros, à
casa de Gelão, apresentando-o como se
estivesse disposto a participar da trama. O que Pirro
queria era dispor de várias testemunhas, a fim de provar a conspiração contra êle tramada.

X. Tendo
sido Gelão assim enganado, Neoptólemo,
que também de nada desconfiara, julgou que a conjura estivesse bem encaminhada,
e tal era a sua satisfação que não conseguiu guardar o
segredo, revelando-o a alguns de seus amigos. Um dia, achan-do-se
em casa de sua irmã Cádmia, não conseguiu conter-se, certo
de que não era ouvido por mais ninguém, e falou-lhe a respeito. Perto deles só estava
Fenareta, esposa de Samão, intendente
dos rebanhos do rei Neoptólemo. Deitada numa pequena
cama, e voltada para o lado da parede, ela fingia dormir. Mas tudo ouviu, sem que os dois irmãos c percebessem;
e, no dia seguinte, dirigiu-se a Antí-gcna, esposa de
Pirro, e contou-lhe com pormenores aquilo que Neoptólemo dissera à irmã. Pirro,
informado de tudo, nada disse na ocasião; mas, tendo feito um sacrifício aos deuses,
convidou Neoptólemo para vir cear em sua casa, e matcu-o. Êle não ignorava que podia
contar com a boa vontade das principais personalidades do reino; fazia já muito
tempo que elas o exortavam a se desfazer de Neoptólemo,
e a não se contentar apenas com uma pequena parte do Épiro,
que lhe pertencia inteiro, concitando-o ainda a seguir a inclinação de sua natureza,
a qual o destinara a grandes feitos. Diante de tudo isso, e sobrevindo a conspiração,
decidiu desfazer-se de Neoptólemo, fazendo-o
morrer em primeiro lugar.

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