Início › Fóruns › Pedidos de ajuda › O que é o presente, esse momento que escapa sempre?
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12/07/2002 às 16:50 #70034Miguel (admin)Mestre
Alguém pode me ajudar???
O que é o presente, esse momento que escapa sempre, e que é, todavia, o único em que somos dados a nós mesmos? Qual a relação desse presente com o passado, que já não é e com o futuro, que ainda não é?
Se ontem éramos… amanhã seremos… enfim, que sociedade nos aguarda???12/07/2002 às 21:53 #77042Miguel (admin)MestreOlá Cris!
Essa questão da temporalidade é uma questão filosófica bastante complexa que preocupou muitos filósofos que a procuraram equacionar…
Normalmente, o presente é entendido como dimensão do tempo que está perto de nós, contudo, o presente constutui-se como uma espécie de corte/ruptura no próprio fluir do tempo, algo que só “é” enquanto que é na conexão entre o que já foi e o que será. Todavia e, em rigor, o presente não existe…neste preciso momento o que escrevo é passado ..o passado já não é…o futuro ainda não é!..A noção de “presente” é paradoxal…se não conhece, penso que deveria ler uma passagem de Sto Agostinho em “As Confissões” onde ele, de um modo exemplar, expressou este mesmo paradoxo (livro XI, cc.12 e ss.)..leia também Kierkegaard e Heidegger e, por que não, Platão e Aristóteles que também reflectiram sobre esse paradoxo…
abs.
13/07/2002 às 1:41 #77043Miguel (admin)MestreCris, segue alguns apontamentos sobre temporalidade feitos em uma aula sobre este capítulo do Ser e o nada de Sartre…
Está desconexo em várias partes, mas talvez você possa extrair alguma valia. Foi digitado rapidamente, desculpe os erros.
___Não há problema mais tradicional e difícil da História da Filosofia do que o problema do tempo, que deve estar presente em qualquer ontologia. A ele se liga o problema da essência e da aparência, da contigência e da existência.
O tempo não foi nunca resolvido como problema na filosofia. Nenhum autor entende que chegou numa solução satisfatória para esse problema. É, portanto, um tema aporético.
A formulação agostiniana diz: “Eu sei o que é o tempo, mas se me perguntarem o que ele é, não saberei responder”. Vemos aí a ressonância existencial. Eu apreendo o que é o tempo mas essa experiência não é passível de objetivação.
De onde provém essa dificuldade? Resposta possível: da maneira como se focaliza o tema. Para Sartre, a visão analítica das dimensões temporais é constante na História da Filosofia. Costumos dizer que o tempo é constiuído em três dimensões, passado, presente e futuro.
E como se define o passado? Aquilo que já não é. O futuro é aquilo que ainda não é. O presente é uma transição entre suas dimensões.
A grande dificuldade é que, embora possamos dizer como ele se constitui, não podemos apreender como ele se constitui. Pois a definição passa pelo não ser. A experiência do tempo nos afeta muito, mas é difícil apreender a realidade do tempo.
O tempo, como uma descontinuidade de momentos, é paradoxalmeente constituído por instantes que nunca são realmente. Se fossemos tirar alguma conclusão, teríamos de dizer que o tempo é uma série do que não é.
O tempo, como fluxo contínuo, tem uma dificuldade semelhante. É uma realidade visada aquem o além do que é.
O Sartre nota uma predominância do aspecto constitutivo do tempo. Há dimensões interelacionadas, mas separadas. Ele busca outro caminho além da análise, síntese. As dimensões são absolutamente interdependentes umas das outras. A melhor maneira de se referir a elas é pensá-las como totalidade. A partir dessa totalidade as 3 dimensões do tempo acontecem. Isso não é apenas uma diferença metódica, mas antes ontológica, que quer visa o tempo primeiro como totalidade sintética estruturada. Depois como interdimensionalidade articulada. A compreensão da síntese deve ser anterior à compreensão dos seus elementos.
A totalidade domina suas estruturas secundárias e lhes confere significação.
A totalidade se articula com o processo.É necessário apreender cada uma dessas dimensões nelas mesmas, perceber as estruturas temporais. A dificuldade é a conciliação. O estruturalismo causou uma polêmica, protagonizada por Foucault e Levi-Strauss, que discutia se primeiro vem a estrutura ou o processo. Segundo a visão estruturalista, tem-se uma realidade estruturada, eu apreendo como ela se articula. Isso pode ser aplicado em diversos campos de conhecimento.Segundo Foucault, há um primado do processo, a realidade se produz, continuamente. O estruturalismo seria meramente formal, lógica abstrata do dever.
O Sartre quer mostrar essas duas opções, que aparentemente são opostas. Ainda que haja um processo, ele se articula estruturalmente. Na compreensão da totalidade entra tanto o processo quanto a estrutura.Para se compreender a totalidade primária, é necessário compreender as articulações dos momentos.
Primeiro passo metódico : a totalidade em primeiro lugar não deve impedir a perspectiva das três dimensões. A dicotomia é aparente. Há que se ver a estrutura na perspectiva do processo.Não é possível apreender uma diferentemente da outra. Elas estão sempre em relação.
Isso aparece na primeira das dimensões temporais que é o passado. Como se constitui o sentido do passado? É na obviedade da resposta que está o primado da toalidade. Só existe o passado quando é do presente.
O passado em si é uma abstração que leva a aporia. Eu só esclareço o passado por ele mesmo se eu o vinculo. o dado fenomenológico mais primário da experiência do passado é que ele é um passado de um ato presente.
Algumas questões da perspectiva tradicional perdem assim importância e deixam de ser obstáculo. por exemplo, a de que o passado já não é. Como ele é passado desse presente, aparece com estreita veiculação com ele. É um certo movimento que a consciência faz.
A consciência faz assim o movimento entre o ser e o nada, como no caso da angústia. O futuro é uma transcendência. A totalidade sintética não é indivisível. As dimensóes existem, mas são secundárias. O primado é a totalidade.
Na tradição, a tendência é ver as coisas geometricamente, sendo portanto possível reconstituí-las. O passado é passado do presente, É possível, por outro lado, conhecer o passado como perdido, inexistente, ou ainda existente, como em Bergson e Freud.
Nunca podemos apreender o passado sem considerar seu vinculo com o presente. APesar da aparente obviedade, Sartre tira disso conclusões que a tradição não considerou.
O passado nunca é isolado. O movimento da consciência é essencial para a atribuição de sentido. Se a transcendência é sair de si, com o passado ela faz um movimento para trás. O futuro é o projeto que a consciência faz para frente.
O passado é a dimensão imutável da consciência. O que eu ui já tem de ser. O passado está em mim porque eu sou, eu tenho de ser, visto que o passado não muda. Essa presença do passado já tinha sido notada por Santo Agostinho como uma solução para a aporia. Não há desvinculação com o seu presente. Sobreviver ao passado, sobrepujar o passado com o presente.
O passado já foi ultrapassado, mais ainda em mim permanece. Porque eu sou, dessa maneira tendo de ser.
Não há presente sem o tenho de ser em relação ao passado. Sou passado.
Na questão do tempo há um padrão, são perguntas que se repetem. O ser humano é o ser cuja existência está sempre em questão. Esse ser que está em questão é a realidade humana. O que eu era no passado, eu continuo sendo.
A maneira de ser do passado entra na realidade humana. Só a realidade humana tem o passado. As coisas não tem passado. A referência ao passado é sempre uma síntese entre o passado e o presente. A relação é interna, não espacial. A identidade diferenciada vem dessa síntese. Daí vem a expressão tenho o passado, trago, não possuo, é uma relação interna comigo mesmo. Apenas quando morro passo a ser inteiramente o que fui. Não há mais possibilidade. Daí sim se pode pensar em necessidade, em destino. A morte cessa com a liberdade de ser e escolher. Não há mais destino a cumprir, somente destino cumprido. Não é possível um destino a frente, somente em relação com o passado. É a única maneita do para si realizar suas aspirações e se tornar em si. O passado é o em si. Quanto mais se vive, mais se morre. A experiência é sedimentação, cristalização. E isso é um paradigma.
Enquanto eu estiver vivo eu sou o meu passado. Assim a consciência está sempre distante de si. No passado a consciência coincide com o si.
A existência é um processo marcado pela heterogeneidade. A consciência é heterêogena a si mesma. No passado é no projeto, é portanto para si.
O presente é a dimensão do em si. É infinitesimal. A realidade temporal por excelência é o presente. Essa realidade que deveria ser mais forte é justamente a mais fugidia, por causa do movimento da consciência. A intensidade temporal mais forte perde por causa do movimento da consciência em direção ao não ser. Toda a consciência é uma consciência de alguma coisa.
Isso aplicado à concepção de presente diz que o presente é um modo de consciência.A referência é o objeto. A consciência não tem substância (fenomelogia). Não é algo presente. É uma presença de alguma coisa.
Interpretar a consciência como esse nada que se projeta em relação a alguma coisa. Tomar consciência de si mesmo no movimento da intencionalidade. A coisa intencionada é o presente.Para que haja presennça, é preciso que haja uma atestação, um testemunho, isso é feito pela consciência que não é uma coisa. A consciência é o terceiro termo que faz a relação entre duas coisas. A relação de presença é feita pelo testemuho.
Há uma diferença fundamental entre o passado e o futuro. O passado já foi, o futuro pode ser. Ter de ser implica em poder ser, ou seja, em não=ser. O passado são possibilidades realizadas. Serei e também não serei, pois não poderei ser tudo. A possibilidade de negação imanente à consciência está no futuro. Isso reflete a escolha, a liberdade humana.
Toda realização é negação de algo. Na imanência do presente é que o futuroi vai se realizando. O futuro jpa conferfe sentido ao eu presente. Em não ser o que se é. Só saberei o que serei ante a realização das alternativas. Viver o presente é projetar-se. A angústia é a vivência daquilo que ainda não existe. Da indeterminação total do futuro é que retiro algum sentido para a vida presente. Estar adiante de si é estar na possibilidade do futuro. Sou meu futuro na possibilidade constante de não ser.
O passado sustenta-se, na medidade em que já não é. O futuro ainda não é, há a possibilidade de não-ser. A consciência, separada de si, está no futuro. Não há determinismo causal entre presente e futuro, tendo em vista a possibilidade. Eu me imponho escolhas, Eu sou o meu futuro na forma de não ser. Esta é a articulação imanente da temporalidade.
Poder ser implica em poder não ser. Há uma escolha, um vácuo. A abertura para o poder ser e o poder não ser acaba com a concepção histórica de liberdade.
Aristóteles diz que o tempo é a medida do movimento segundo o antes e o depois. O antes e o depois permite articular semelhanças.
A temporalidade é algo sempre vivido pela consciência. O tempo tem uma realidade objetiva. Sem o testemunho, não há temporalidade. A consciência é o testemunho do tempo. O futuro é o que ainda não é, nem o que a consciência já viu na forma de expectativa.
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