Início › Fóruns › Fórum Sobre Filósofos › Nietzsche › Alguém leva Nietzsche à sério?
- Este tópico está vazio.
-
AutorPosts
-
28/07/2011 às 22:19 #85346MonstrinhoMembro
Eu penso que Nietzsche talvez seja o único filósofo ocidental a ser levado a sério. Ele apontou para o "rei que está nu", colocando em evidência todas as mentiras da Filosofia Idealista, que, como nos diz Bachelard "constrói um mundo à imagem e semelhança da razão", ou seja, constrói um mundo ilusório. Nietzsche desbanca o ideal da verdade da ciência e da filosofia modernas. Não pergunta, "O que é a verdade", mas sim, "Para que ela serve", o que irá de algum modo fornecer elementos para uma crítica da ciência a partir da Sociologia da Ciência. O que é uma verdade? Existe a verdade? Uma verdade é aquilo que se auto-evidencia por si mesma, logo, porque uma instituição como a ciência, com métodos e técnicas peculiares, tem a necessidade de demonstrar uma verdade? Qual é a verdade do Sol? Dirá Alberto Caeiro (Fernando Pessoa): "A verdade do Sol é que ele está brilhando, e a única verdade de uma flor é que ela existe, e nada mais". Mas a ciência diz que a "verdade sobre o Sol" é que ele é uma estrela que converte Hidrogênio em Hélio, e isto é que faz gerar a sua luminosidade. Ora, que verdade é essa, senão uma "verdade" construída pela razão? Muita gente leu Nietzsche e pensa que o entendeu. Mas na minha opinião ele é pouco compreendido - e me perdoem por já ir postando sem ter lido todo o tópico, mas o farei mais tarde, porque certamente há especialistas em Nietzsche aqui, e talvez trazendo abordagens inusitadas. Mas, vamos resumir o que é a filosofia de Nietzsche. Ela não é senão uma crítica ao "ideal da verdade", que tem suas origens em Sócrates e sua culminância na Filosofia Idealista Moderna, talvez na filosofia de Kant, ao preconizar - e retomar o velho ideal grego - de procurar por detrás das aparências, alguma verdade. Me parece que Kant diz que a "coisa em si" é impossível de ser alcançada, mas Nietzsche diz que "a coisa em si" de Kant é uma grande mentira. O ideal da Filosofia e da Ciência Moderna ocidentais é "procurar ver além dos sentidos, porque os sentidos enganam" (Descartes). Os índios do Mato-grosso ou da Amazônia olham as Plêiades em Touro, e vêem um "enxame de abelhas", mas a ciência aponta o telescópio e diz estar vendo um aglomerado de estrelas constituídas de Hidrogênio, com idade não superior a 100 milhões de anos, e distando da Terra, cerca de 400 anos-luz. Então temos apenas um sentido artificial (telescópio) vendo mais longe. Mas o fato de ver mais longe não significa nada! O que é importante é a "auditoria", a "averiguação" a interpretação que o pensamento científico irá fazer desse "olhar que viu mais longe", e aí se constrói todo o conjunto de crenças de que "são estrelas que nasceram de uma nuvem de Hidrogênio e que estão envoltas por esse gás de temperatura elevadíssima. A ciência está portanto construindo uma representação simbólica, através da razão, sobre o que foi observado. Até aqui tenho tecido uma breve crítica da ciência. Vamos falar rapidamente como Nietzsche vê a ciência. Para ele, a ciência é de cunho cristão :D Essa doeu né? ;D Mas é verdade! A ciência substitui a religião quando se torna uma instituição superprotetora, assim como a religião era no passado. O ideal da ciência é cristão: ela não te promete o céu ou o inferno, mas promete a cura dos males do corpo de da mente; enquanto a religião permitia que você tivesse várias amantes e poderia matar um monte de gente em nome de Deus, desde que se pagasse o dízimo, a ciência também permite que o indivíduo use drogas, fume, beba, faça sexo, trabalhe além das forças, pois ela tem os medicamentos e as técnicas cirúrgicas para curar as doenças advindas dessas práticas. Se você está ansioso ou depressivo por que vive num mundo louco de extrema competição, não há problema, há ciência dispõe de psiquiatras e calmantes para que você continue vivo. Vamos tomar como exemplo, para facilitar o pensamento de Nietzsche essas poesias do Alberto Caeiro - Fernando Pessoa. O conto antigo da Gata Borralheira,O João Ratão e o Barba Azul e os 40 Ladrões,E depois o Catecismo e a história de CristoE depois todos os poetas e todos os filósofos;E a lenha ardia lá fora em dias de destino,E por cima da leitura dos poetas as árvores e as terras...Só hoje vejo o que é que aconteceu na verdade.Que a lenha ardida, exatamente porque ardeu, Que o sol dos dias de destino, porque já não há,Que as árvores e as terras (para além das páginas dos poetas) - Que disto tudo só fica o que nunca foi:Porque a recompensa de não existir é estar sempre presente. Alberto Caeiro (Fernando Pessoa) IN: Poemas Inconjuntos _______________________________Todas as opiniões que há sobre a naturezaNunca fizeram crescer uma erva ou nascer uma flor.Toda a sabedoria a respeito das coisasNunca foi coisa em que pudesse pegar como nas coisas;Se a ciência quer ser verdadeira,Que ciência mais verdadeira que a das coisas sem ciência? Fecho os olhos e a terra dura sobre que me deitoTem uma realidade tão real que até as minhas costas a sentem.Não preciso de raciocínio onde tenho espáduas. Aberto Caeiro (Fernando Pessoa) - IN: Poemas Inconjuntos (1913-1915).http://mascarasdedeus.blogspot.com/2011/06/delirios-da-razao-ii.htmlPara Nietzsche, portanto, a razão cria um mundo falso, e a Filosofia Idealista cria um homem e um mundo que estão muito aquém do que é realmente o homem e o mundo. Conceitos de "fraco e forte" em Nietzsche_Para Nietzsche, a moralidade socialmente instituída cria a fraqueza. Como no canto de Zaratustra "Dos Virtuosos", as pessoas religiosas fazem o "bem" com vistas a dois objetivos: o primeiro é fazer notar, salientar a existência dos "maus" e da sua "maldade" - porque, se eu "sou do bem", logo tem que haver o "do mal". O segundo objetivo é que os "virtuosos" querem ser recompensados pelo "bem" que fazem, e daí Nietzsche faz notar que os conceitos de "bem" e "mal" são invenções da moralidade e da razão. Mas aqui é preciso cuidado, pois, como eu já andei lendo aí para traz, há a interpretação de que Nietzsche valoriza os instintos humanos, mas a questão não é bem por aí, porque o próprio Nietzsche não foi um homem que viveu sob o império dos instintos, muito pelo contrário, ele gostava de artes, de música clássica, ou seja, ele valorizava a cultura humana, mas criticou o mundo ilusório criado e idealizado pelos filósofos e pelos cientistas.Nietzsche era ateu? - qual era o "deus de Nietzsche"? Ele foi um dos poucos homens que compreenderam o que Jesus veio fazer na Terra. Leiam e tirem suas conclusões ==> http://mascarasdedeus.forumeiros.com/t40-auto-conhecimento-em-friedrich-nietzsche-a-psicologia-dos-evangelhos-segundo-nietzsche Nietzsche assinala que Jesus interpretou a verdade como realidades subjetivas no aqui e agora, o que está de acordo com todos os mestres da Filosofia Oriental - Krishna, Buda, e mais recentemente, Swami Vivekananda e Krishnamurti, que retomam no século XIX toda a tradição da Filosofia Vedanta, cuja cultura indiana fora ameaçada pela invasão dos ingleses e sua cultura ocidental no século XIX).Então o cristianismo, NEGA - assim como a Filosofia Idealista - o aqui e agora, e sempre projeta no futuro a realização da felicidade, o que é um engodo e uma mentira, segundo Nietzsche. Tampouco o passado deve servir de referência para se construir o futuro, diz Nietzsche, e nesse sentido, ele mesmo é um filósofo cujos referenciais são os mitos gregos, a mitologia grega e nisso, Nietzsche é singular, pois que não retoma a Filosofia a partir dos seus vícios e dos erros do Idealismo - o Mundo das Idéias de Platão - e por isso mesmo é que Nietzsche é um dos poucos filósofos que devem ser levados a sério, ao contrário do que postula o título do tópico. Bom, paro por aqui. Passo a palavra... Abçs,
28/07/2011 às 23:07 #85347MonstrinhoMembroFazendo um paralelo tosco com Jesus Cristo, ele também foi martirizado, mas seus ensinamentos foram desvirtuados pelos discípulos. Ou seja, quando a coisa se institucioanaliza, os algozes que tiraram sua vida mantém o triunfo. No Corão tem uma passagem interessante em que, admitindo a veracidade de Cristo, Maomé no entando condena a Igreja Católica:
Muito bom! Discutir tudo o que foi dito seria cansativo. Mas o que me chamou a atenção foi um certo tipo de unanimidade sobre o "desligar-se do rebanho". E questionou-se a vida de Nietzsche tem relação com a sua obra! E como! O próprio Miguel já apontou essa relação, mas só para lembrar, apenas a audácia de Nietzsche em se colocar contra os filósofos de sua época - criticando e chamando de fracos e covardes os defensores das doutrinas de igualdade social, os religiosos, os cientistas - já é o bastante para concluir que a obra de Nietzsche está em estrita concordância com a sua vida. Outro aspecto interessante é a questão do "ódio ressentido", alimentado pelo rebanho religioso, e cuja "realimentação" do rebanho, hoje, é fornecida pela ciência, a partir do século XIX. Vejo Nietzsche como um homem vivendo a Boa-nova de Jesus Cristo, que o "Reino dos Céus" é um aqui e agora. O que há em comum entre Nietzsche e Jesus? Este último veio combater a religião, veio criticar os sacerdotes - fariseus e saduceus - que detinham poder ideológico em Roma. E o próprio Nietzsche esclarece toda a tragédia da incompreensão dos discípulos: a idéia do "salvador" de Israel ainda estava presente, e foi essa idéia que Jesus veio combater, dizendo de forma alegórica, que você tem que se salvar a si mesmo - :D e que interessante né? Não é outra coisa que Jiddu Krishnamurti cansou de dizer às multidões na Inglaterra e nos Estados Unidos do século XIX. A filosofia de Nietzsche talvez não tenha "deixado seguidores", porque ele "falou umas verdades" para os filósofos e representantes de movimentos sociais no século XIX não é mesmo? ;) - particularmente aos seguidores do Marxismo e os filósofos idealistas, que logo vestiram a touca que foi tecida por Nietzsche, para eles mesmos ;D. (Até hoje esse povo odeia ele, assim como a humanidade odeia Cristo, porque é "gostoso" permanecer no unânime formigueiro não é mesmo? E Cristo é cruficicado todos os dias por aqueles que dizem ser seus seguidores http://mascarasdedeus.blogspot.com/2011/05/humanidade-odeia-cristo.html.Com relação ao niilismo presente no vindouro século XX, Nietzsche profetizou! Se a sua filosofia é capaz de trazer uma mudança radical na sociedade? A resposta é não! Pois, para seguir Nietzsche ou Jesus Cristo, ou Buda, Lao-tzu ou Krishnamurti, o primeiro pressuposto é sair do unânime formigueiro, e não é fácil, pois para isso é preciso ter coragem para negar todas as tradições, costumes, normas, condicionamentos, leis, e para isso é preciso bater de frente com a autoridade socialmente instituída (pais, família, professores, mestres, Estado, escola, igreja), mas ninguém quer se aventurar nessa empreitada, pois que, a autoridade sempre oferece aquela proteção - que na verdade não protege ninguém - e assim, a Filosofia de Nietzsche, retomando os ensinos de Jesus, vem conclamar os corajosos a saírem do rebanho, negando a autoridade, para enfim entrar no "Reino dos Céus" que é, como proclamou Buda, "aceitar a vida como ela é", e não projetar, inventar, idealizar um mundo e um homem como eles deveriam ser. Essa é a "verdade" de Nietzsche e de todos os instrutores da humanidade de todos os tempos, no ocidente e no oriente. Abçs,
15/09/2011 às 13:08 #85348RubineroMembroJá escrevi no meu fórum [url=http://historiauniversal]História Universal[/url] sobre isto: substituir Deus ou o Ideal por Nietzsche é errado. O próprio Nietzsche disse que não há verdades absolutas, logo a interpretação do pensador alemão também não é uma verdade absoluta. Mais: quem quiser ser discípulo de Nietzsche, tem primeiro de ser mestre e discípulo de si próprio. Em última análise, os adeptos de Nietzsche – como eu – não o podem levar a sério. É preciso superar Nietzsche e é preciso rejeitá-lo… É isso que o pensador alemão quer…
05/11/2011 às 7:36 #85349MonstrinhoMembroJá escrevi no meu fórum [url=http://historiauniversal]História Universal[/url] sobre isto: substituir Deus ou o Ideal por Nietzsche é errado. O próprio Nietzsche disse que não há verdades absolutas, logo a interpretação do pensador alemão também não é uma verdade absoluta. Mais: quem quiser ser discípulo de Nietzsche, tem primeiro de ser mestre e discípulo de si próprio. Em última análise, os adeptos de Nietzsche - como eu - não o podem levar a sério. É preciso superar Nietzsche e é preciso rejeitá-lo... É isso que o pensador alemão quer...
Concordo, eu não tinha levado em conta essa hipótese, que no fim de contas quer dizer: "a verdade tem que ser buscada por você mesmo, e não baseado na filosofia ou no pensamento de outrem" - incluindo do próprio Nietzsche. Abçs,
05/11/2011 às 20:21 #85350Miguel DuclósMembroNa questão da biografia X biografado, o próprio Nietzsche precaveu-se quando escreveu: “uma coisa sou eu, outra são meus livros”. Também fica patente quando ele fala do momento inspirador de Zaratustra, que tornou-se um dos seus Alter Ego literários (chegou também a assinar Dioniso naultima carta à Cosima Wagner) “de repente, de dois fez-se um, e Zaratustra passou por mim”. Cito de cabeça, não sei se é exatamente assim.Sobre Nietzsche e seu legado, ele foi crescendo de importância aos poucos, principalmente através da recepção francesa, de forma que foi tornando-se um ponto fulcral da tradição posterior, sendo impossível ignorá-lo, mesmo que fosse para adotar uma postura crítica ou contrária. É o que faz Heidegger, por exemplo, dizendo que Nietzsche não superou a metafísica com o "Eterno retorno" e a "vontade de potência", ou Habermas, minimizando o seu alcance ao reduzi-lo como uma inquietação pós romântica burguesa que não oferece alternativa ao paradigma racional da modernidade. Um pensador católico com Giovanni Vattimo tenta ainda incorporá-lo à filosofia católica, de forma a agregar o conjunto das críticas, pensando pós-modernização e reformismo, mas sem sair de dentro dos dogmas do cristianismo.Juntanto as duas coisas, mesmo alinhando-se com Nietzsche, que dirige-se à "espíritos livres" o difícil é aceitar uma leitura superficial do seu pensamento, uma redução do seu alcance, ignorar o que disse por si e como influenciou os outros, ou vendo simplesmente tentativas burlescas e falhas de adonar-se de sua força contundente em reveses históricos, como no caso do nazismo - e isso ainda servir de embasamento para desqualificações.
05/11/2011 às 21:44 #85351MonstrinhoMembroAinda sobre a questão do “forte e fraco” em Nietzsche. Em "O Anti-cristo", logo no início, Nietzsche que "os fracos devem perecer e devemos ajudá-lo nisso". No livro "O Céu e o Inferno" de Allan Kardec, há a narrativa de Telêmaco, sobre as visões que têm do inferno pagão, cujo quadro é fornecido pelos poetas gregos Vergílio e Homero. Há três deuses-juízes, que julgam implacavelmente os "ímpios", logo que estes chegam ao "tártaro". Apesar de haver filhos que matam pais, esposas infiéis, ladrões, o principal alvo da ira dos juízes são os hipócritas religiosos que são julgados com maior rigor, uma vez que "não se contentam com ser maus como os demais ímpios, porém querem passar por bons e concorrem por sua falsa virtude para a descrença e a corrupção da verdade. Os deuses, por eles zombados e desprezados perante os homens, empregam com prazer todo o seu poderio para se vingarem de tais insultos" (O Céu e o Inferno, pp. 47.8, Allan Kardec). E temos outros exemplos. Sabemos historicamente que, "o homem que bate em mulher é covarde". Isto é uma idéia construída simbólica e socialmente. É uma falsa idéia. O homem bate na mulher, não porque é covarde, mas porque tem mais força física. É nesse terreno que os fracos ganham força e enfraquecem os fortes - dirá Nietzsche - porquanto, uma mulher pode lançar no rosto de um homem toda sorte de insultos, mas o refrão secular que diz "homem bater em mulher é covardia", é como se fosse uma corda que lhe ata as mãos. Em O Anticristo, Nietzsche enaltece o império romano, tendo-o à conta da realização da Vontade de Potência, com os instintos no comando, em que o mais forte não é acusado de covardia. Ele é temido apenas. Somente após o Cristianismo fincar suas bases, é que se irá criar uma mentalidade de enfraquecimento do forte, que consiste em acusá-lo da sua força, de que ele não pode utilizar a sua força para triunfar entre outros; se ele usar, ele será mau. E é aí, que surge, segundo Nietzsche os conceitos de bem e mal no ocidente. Abçs,
22/11/2011 às 22:58 #85352RubineroMembroÉ importante tomar em consideração que Nietzsche foi um grande filólogo, um grande estudioso do homem greco-romano, das tragédias gregas e da História do pensamento. A sua genealogia da moral é certeira, como quase toda a sua filosofia. O problema é que Nietzsche escrevia com “sangue”, como ele gostava, e não de uma forma mais distante, despreocupada, relaxada. Se ele tivesse escrito de outra forma, a sua filosofia seria mais respeitada, ou seja, seria menos popular e não tão aproveitada por “gado com chifres” como Hitler e Mussolini. A Nietzsche faltou-lhe uma esposa, faltou-lhe uma vida mais estável. Ele disse certa vez que onde o povo bebe a água fica envenenada. Ora, a filosofia dele tornou-se popular, por isso ficou estragada pelos muitos “macacos de Zaratustra”.
-
AutorPosts
- Você deve fazer login para responder a este tópico.