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19/09/2005 às 14:14 #70290Miguel (admin)Mestre
Pessoal necessito de algo resumido que fale sobre metafisica, algo simples e bastante claro, para eleborar um trabalho para faculdade.
desde ja agradeço
05/12/2005 às 20:25 #80410Miguel (admin)MestrePor favor pessoal eu estou presinsando de uma sinteze, bem simples, clara e objetiva sobre a Metafísica Aristotélica. com urgência para a Faculdade
05/12/2005 às 21:02 #80411Miguel (admin)MestreAbbagnano, História da Filosofia, vol I.
____________________________________§ 72. A FILOSOFIA PRIMEIRA: SUA POSSIBILIDADE E SEU PRINCIPIO
O primeiro grupo de investigações empreendidas por Aristóteles na
Metafísica versa precisamente sobre a possibilidade e sobre o principio
de uma ciência do ser. Aristóteles preocupa-se antes de mais em definir
o lugar desta ciência no sistema do saber
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e as suas relações com as outras ciências. Acima de tudo, cada ciência
pode ter por objecto ou o possível ou o necessário: o possível é o que
pode ser indiferentemente de um modo ou de outro; o necessário é aquilo
que não pode ser de modo diferente do que é. O domínio do possível
compreende a acção (praxis) que tem o seu fim em si mesma, e a produção
(poiesis) que tem o seu fim no objecto produzido. As ciências que têm
por objecto o possível, enquanto são normativas ou técnicas, podem
também ser consideradas como artes; mas não há arte que concerne aquilo
que é necessário (Et. Nic., VI, 3-4). Entre as ciências do possível, a
política e a ética têm por objecto as acções e por isso chamam-se
práticas; as artes têm por finalidade a produção de coisas e chamam-se
poéticas. Destas últimas, há uma que leva no próprio nome o selo do seu
carácter produtivo-é a poesia.
O domínio do necessário pertence pelo contrário às ciências
especulativas ou teóricas. Estas são três: a matemática, a física e a
filosofia primeira, que depois de Aristóteles se chamará metafísica. A
matemática tem por objecto a quantidade no seu duplo aspecto de
quantidade descontínua ou numérica (aritmética) e de quantidade
contínua de uma, duas ou três dimensões (geometria) (Met., XI, 3,
1061 a, 28). A física tem por objecto o ser em movimento e, por
consequência, aquelas determinações do ser que estão ligadas à matéria
que é condição do movimento (1b., VI 1, 1026 a, 3). A filosofia deve
constituir-se por analogia com as outras ciências teóricas se quer
assumir como objecto de sua consideração o ser enquanto ser. Como a
matemática e a física, deve proceder por abstracção. O matemático
despoja as coisas de todas as qualidades sensíveis (peso, leveza,
dureza, etc.) e redu-las à quantidade descontínua ou contínua; o físico
prescinde de todas as determinações do ser que não se
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reduzem ao movimento. De modo análogo, o filósofo deve despojar o ser
de todas as determinações particulares (quantidade, movimento, etc.) e
considerá-lo só enquanto ser. Além disso, como a matemática parte de
certos princípios fundamentais que concernem o objecto que lhe é
próprio, a quantidade em geral (como é por exemplo o axioma: tirando
quantidades iguais a quantidades iguais os restos são iguais), assim a
filosofia deve partir de um princípio que lhe é próprio e que concerne
o objecto que lhe é próprio, o ser enquanto tal.
O problema consiste em saber se uma tal ciência é possível.
Evidentemente, a primeira condição para a sua possibilidade é que seja
possível reduzir os diversos significados do ser a um único significado
fundamental. De facto o ser diz-se de muitas maneiras: nós dizemos que
são a quantidade, a qualidade, a privação, a corrupção, os acidentes; e
até do não ser dizemos que é não ser. Todos estes modos devem ser
reduzidos à unidade, se hão-de ser o objecto de uma única ciência. O
ser e o uno devem de algum modo identificar-se, já que é necessário
descobrir aquele sentido do ser, pelo qual o ser é uno e é também a
unidade mesma do ser (1b., IV, 2, 10003 b). E esta unidade não deve ser
acidental. mas intrínseca e necessária a todos os diferentes
significados que o ser assume. O que é acidental não pode ser objecto
de ciência porque não tem estabilidade ou uniformidade; e a ciência é-o
somente do que é sempre, ou quase sempre, de um modo (lb., VI, 2, 1027,
a). Se se quer pois determinar o único significado fundamental do ser é
necessário reconhecer um princípio que garanta a estabilidade e a
necessidade do próprio ser. Tal é o princípio da contradição.
Este princípio é considerado por Aristóteles, em primeiro lugar como
princípio constitutivo do ser enquanto tal; em segundo lugar, como
condição de
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toda a reflexão sobre o ser. isto é, de todo o pensamento verdadeiro. É
portanto simultaneamente um principio ontológico e ló gico; e
Aristóteles expressa-o em duas fórmulas que correspondem a duas
significações fundamentais: “Ê impossível que uma mesma coisa convenha
e ao mesmo tempo não convenha a uma mesma coisa, precisamente enquanto
é a mesma”; “É impossível que a mesma coisa seja e simultaneamente não
seja”; tais são as duas fórmulas principais em que o princípio ocorre
em Aristóteles (por exemplo, Met, IV, 3, 1005 h, 18; 4,
1006 a, 3); e destas fórmulas, evidentemente a primeira refere-se à
impossibilidade lógica de predicar o ser e o não ser de um mesmo
sujeito; a segunda à impossibilidade ontológica de que o ser seja e não
seja. Aristóteles defende polemicamente este princípio contra aqueles
que o negam: Megáricos, Cínicos e Sofistas, os quais admitem a
possibilidade de afirmar todas as coisas de todas as coisas;
Heracliteanos, que admitem a possibilidade de que o ser, no devir, se
identifique com o não ser. Na realidade, o princípio só se pode
defender e esclarecer polemicamente porque, como fundamento de toda a
demonstração, não pode por sua vez ser demonstrado. Certamente pode-se
demonstrar que quem o nega nada diz ou suprime a possibilidade de
qualquer ciência; e é este, com efeito, o argumento polémico adoptado
por Aristóteles contra os que o negam. Mas com isto ainda não resulta
evidente o seu valor como axioma fundamental da filosofia primeira,
como principio constitutivo da metafísica como ciência do ser enquanto
tal. Este valor provém, ao invés, das considerações que Aristóteles
desenvolve a propósito do ser determinado (tóde li). Se. por exemplo, o
ser do homem se determinou como o de “animal bípede”, “necessariamente
todo o ser que se reconheça como homem deverá ser reconhecido, como
animal bípede”. Se a
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verdade – afirma Aristóteles -tem um significado, necessariamente quem
diz homem diz animal bípede: pois que isto significa homem. Mas se isto
é necessário, não é possível que o homem não seja animal bípede: de
facto a necessidade significa isto mesmo, que é impossível que o ser
não seja” (Met., IV, 4,
1006 b, 30). Aqui se descobre claramente o significado do princípio da
contradição como fundamento da metafísica: o princípio leva a
determinar o fundamento pelo qual o ser é necessariamente. E de facto a
fórmula negativa do princípio da contradição: “Ê impossível que o ser
não seja” traduz-se positivamente por estoutra: o ser, enquanto tal, é
necessariamente. Nesta fórmula, o princípio revela claramente a sua
capacidade para fundamentar a metafísica. O ser que é objecto desta
ciência, é o ser que não pode não ser, o ser necessário.
A necessidade constitui portanto para Aristóteles o sentido primário ou
fundamental do ser, aquele a partir do qual todos os outros (embora não
existam), podem ser compreendidos e distinguidos. Era esta a própria
tese de Parménides (“o ser é e não pode não ser”: fr. 4, Diels) que
fora adoptada pelos Megáricos. Todavia Aristóteles não entende esta
tese no sentido que só o necessário existe e que o não necessário é
nada. Porquanto (como se viu) ele afirma que só o necessário é o
objecto da ciência e que portanto a própria ciência é necessidade
(apodítica, isto é, demonstrativa); o possível é admitido por ele como
objecto de artes ou de disciplinas que têm só imperfeita ou
aproximadamente carácter científico. Portanto, aquilo que ele entende
afirmar é que o ser necessário é o único objecto da ciência e mais que
do que não é necessário somente se pode ter conhecimento na medida em
que de qualquer modo se avizinha da necessidade, no sentido de que
manifesta uma certa uni-
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formidade ou persistência. “Algumas coisas – diz ele – são sempre
necessariamente o que são, não no sentido de serem constrangidas, mas
no sentido de não poderem ser de outra maneira; pelo contrário, outras
são o que são, não por necessidade mas “mais uma vez”; e este é o
princípio pelo qual podemos distinguir o acidental, que é tal
precisamente porque não é nem sempre, nem o mais das vezes (1026 b,
27). Como se vê, Aristóteles admite ao lado do necessário e do uniforme
(o “mais das vezes”) também o acidental; mas do acidental não há
ciência mas, em todo o caso, tal como com o uniforme não-necessário
pode ser distinguido e reconhecido sobre fundamento do necessário.
Qual é portanto o ser necessário? A esta pergunta Aristóteles responde
com a doutrina fundamental da sua filosofia. O ser necessário é o ser
substancial. O ser que o princípio da contradição permite reconhecer e
isolar na sua necessidade é a substância. “Esses-diz ele (referindo-se
aos que negam o princípio da contradição) -destroem completamente a
substância e a essência necessária, pois que se vêm obrigados a dizer
que tudo é acidental e não existe nada como o ser-homem ou o
ser-animal. Efectivamente se há alguma coisa como o ser-homem, esta não
será o ser-não-homem ou o não-ser-homem, mas estes serão negações
daquele. De facto, é um só o significado do ser e este é a sua
substância. Indicar a substância de uma coisa não é mais que indicar o
seu ser próprio” (Met., IV,
4, 1007 a, 21-27). O princípio da contradição, tomado no seu alcance
ontológico-lógico, conduz directamente a determinar o ser enquanto tal
que é o objecto da metafísica. Este ser é a substância. A substância é
o ser por excelência, o ser que é impossível que não seja e portanto é
necessariamente, o ser que é primeiro em todos os sentidos. “A
substância é primeira-diz Aristóteles (lb., VII,
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1, 1028 a, 3 1) -por definição, para o conhecimento e para o tempo. Ela
é a única, entre todas as categorias, que pode subsistir separadamente.
É primeira por definição, pois que a definição da substância está
implícita necessariamente na definição de qualquer outra coisa. É
primeira para o conhecimento porque acreditamos conhecer uma coisa, por
exemplo o homem ou o fogo, quando sabemos que coisa ela é, mais do que
quando conhecemos o seu qual, o quanto, o durante; e também só
conhece~s cada uma destas determinações quando sabemos que coisa são
elas mesmas”. O que coisa é a substância.
O problema do ser transforma-se portanto no problema da substância e
neste último se concretiza e determina o objectivo da metafísica.
“Aquilo que desde há tempo e ainda agora e sempre temos buscado, aquilo
que será sempre um problema para nós. O que é o ser? significa : O que
é a substância?” (Met., VII, 1, 1028 b, 2).
§ 73. A SUBSTÂNCIA
O que é a substância? Tal é o tema do principal grupo de investigações
na Metafísica. Aristóteles enfrenta-o com o seu característico processo
analítico e dubitativo, formulando todas as soluções possíveis,
desenvolvendo e discutindo cada uma delas e fazendo assim brotar um
problema de outro. No emaranhado das investigações que nos vários
escritos que compõem a Metafísica se entrelaçam por acaso, voltando
amiude ao princípio da discussão ou interrompendo-a antes da conclusão,
o livro VII oferece-nos o desenvolvimento mais maduro e concludente
deste problema fundamental.
O último capítulo do livro, o XVII, apresenta como, conclusão o
verdadeiro princípio lógico e especula-
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tivo de todo o trabalho. A substância é aqui considerada como o
princípio (arché) e a causa (aitia): em consequência, como o que
explica e justifica o ser de cada coisa. A substância é a causa
primeira e, o ser próprio de toda a realidade determinada. É o que faz
de um composto algo que não se resolve na soma dos seus elementos
componentes. Como a sílababa não é igual à soma de b e a, mas tem uma
natureza que desaparece quando se dissolve nas letras que a acompanham;
assim qualquer realidade tem uma natureza que não resulta da adição dos
seus elementos componentes e é diferente de cada um e de todos estes
elementos. Tal natureza é a substância daquela realidade: o princípio
constitutivo do seu ser. A substância é sempre princípio, nunca
elemento componente (1041 b, 31). Só ela, portanto, permite responder à
pergunta a respeito do porquê de uma coisa. Se se pergunta, por
exemplo, o porquê de uma casa ou de um leito, pergunta-se evidentemente
qual a finalidade para que a casa ou o leito foram construídos. Se se
pergunta o porquê do nascer, do morrer ou em geral da mudança,
pergunta-se evidentemente a causa eficiente, o princípio pelo qual o
movimento se origina. Mas finalidade e causa eficiente não são outra
coisa senão a própria substância da realidade de que se pergunta o
porquê (1041 a, 29).
Estas observações são a chave para compreender toda a doutrina
aristotélica da substância e consequentemente para penetrar no próprio
coração da metafísica aristotélica. A expressão de que Aristóteles se
serve para definir a substância é: aquilo que o ser era (to ti en
einal, quod quid erat esse). Nesta fórmula, a repetição do verbo ser
exprime que a substância é o princípio constitutivo do ser como tal; e
o imperfeito (era) indica a persistência e a estabilidade do ser, a sua
necessidade, A substância é o ser do ser: o princípio pelo qual
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o ser é tal necessariamente. Mas como ser do ser, a substância tem uma
dupla função a que corresponde uma dupla consideração da mesma: é por
um lado o ser em quem se determina e limita a necessidade do ser, por
outro lado o ser que é necessidade determinante e limitadora. Podemos
exprimir a dupla funcionalidade da substância, à qual corresponde dois
significados distintos mas necessariamente conjuntos, dizendo que a
substância é, por um lado, a essência do ser, pelo outro o ser da
essência. Como essência do ser a substância é o ser determinado, a
natureza própria do ser necessário: o homem como “animal bípede”.
Como ser da essência, a substância é o ser determinante, o ser
necessário da realidade existente: o animal bípede como este homem
individual. Os dois significados podem ser compreendidos sob a
expressão essência necessária, a qual dá, o mais exactamente possível,
o sentido da fórmula aristótélica.
Evidentemente, a essência necessária não é a simples; essência de uma
coisa. Nem sempre a essência é a essência necessária: quem diz de um
homem que é músico, não diz a sua essência necessária, porque ele -pode
ser homem sem ser músico. A essência necessária é aquela que constitui
o ser próprio de uma realidade qualquer, aquele ser pelo qual a
realidade é necessariamente tal. A substância é portanto não a
essência, mas a essência necessária, não o ser tomado genericamente mas
o ser autêntico: é a essência do ser e o ser da essência.
Entendida assim, ela revela o aspecto mais íntimo do pensamento
aristotélico e ao mesmo tempo a sua relação mais secreta com o
pensamento de Platão. Platão explicara a validade intrínseca do ser
como tal, a normatividade que o ser apresenta em si próprio e ao homem,
referindo o ser aos outros valores e fazendo do bem o princípio do ser.
Para Platão, se o ser vale, se possui um valor graças ao
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qual se põe como norma, isso acontece, não porque é ser, mais porque é
bem; aquilo que o constitui enquanto ser é o bem, o próprio valor. A
normatividade do ser é, para Platão, estranha ao próprio ser: o ser
está no valor, não o valor no ser. Ao contrário, Aristóteles descobriu
o valor intrínseco do ser. A validade que o ser possui não lhe vem de
um principio extrínseco, do bem, da perfeição ou da ordem, mas do seu
principio -intrínseco, da substância. O ser não está no valor, mas. “o
valor no ser”. Tudo aquilo que é. enquanto é, realiza o valor
primordial e único, o ser enquanto tal. A substância, como ser do ser,
dá às mais insignificantes e pobres manifestações do ser uma validade
necessária, uma absoluta normatividade. Efectivamente, não é privilégio
das realidades mais elevadas, mas encontra-se tanto na base como no
cimo da hierarquia dos seres e representa o verdadeiro valor metafísico.
Com a descoberta da validade do ser enquanto tal, Aristóteles está con
condições de adoptar ante o mundo uma atitude completamente distinta da
de Platão. -Para ele, tudo aquilo que é, enquanto é, tem um valor
intrínseco, é digno de consideração e de estudo e pode ser objecto de
ciência. Ao contrário, para Platão só aquilo que encarna um valor
diferente do ser pode e deve ser objecto de ciência: o ser enquanto tal
não basta, porque não tem em si o seu valor. Com a teoria da
substância, Aristóteles elaborou o princípio que justifica a sua
atitude frente à natureza, a sua obra de investigador infatigável, o
seu interesse científico que não se apaga nem diminui nem sequer ante
as mais insignificantes manifestações do ser. A teoria da substância é
ao mesmo tempo o centro da metafísica de Aristóteles e o centro da sua
personalidade. Ela revela o íntimo valor existencial da sua metafísica.
258
§ 74. AS DETERMINAÇÕES DA SUBSTÂNCIA
A dupla função da substância aparece continuamente na investigação
aristotélica e comunica-lhe uma ambiguidade aparente que só se pode
eliminar reconhecendo a distinção e a unidade das duas funções da
substância. Quando Aristóteles diz que a substância é expressa pela
definição e que só da substância há definição verdadeira (VII, 4,
1030 b, a), entende a substância como essência do ser, como aquilo que
a razão pode entender e demonstrar do ser. Quando, ao contrário,
declara que a substância se identifica com a realidade determinada
(tode ti) e que, por exemplo, a beleza não existe senão naquilo que é
belo (VII, 6, 1031 b,
10), entende a substância como ser da essência, como o princípio que dá
à natureza própria de uma coisa a sua existência necessária. Como
essência do ser, a substância é a forma das coisas compostas, e dá
unidade aos elementos que compõem a todo e ao lodo uma natureza
própria, diferente daquela dos elementos componentes (VIII, 6 b, 2). A
forma das coisas materiais, que Aristóteles chama espécie (VII, 8, 1033
b, 5), é portanto a sua substância. Como ser da essência, a substância
é o sujeito (ypokeimenon, subjectum): aquilo de que qualquer outra
coisa se predica, mas que não pode ser predicado de nenhuma. E como
sujeito é matéria, isto é, realidade privada de qualquer determinação e
que só possui essa determinação em potência (VIII, 1, 1042 a, 26). Como
essência do ser, a substância é o conceito ou logos ou razão de ser, de
que não há geração nem corrupção (pois que o que devém não é a essência
necessária da coisa, mas esta ou aquela coisa). Como ser da essência, a
substância é o composto ou sinolo, isto é, a união do conceito (ou
forma) com a matéria, a coisa exis-
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tente; e em tal sentido a substância nasce e morre (VIII, 15, 1039 b,
20). Como essência do ser, a substância é o princípio de
inteligibilidade do próprio ser. É o que a razão pode tomar da
realidade enquanto tal; e constitui o elemento estável e necessário,
sobre o qual se fundamenta a ciência. De facto não há ciência senão do
que é necessário, enquanto que o conhecimento do que pode ser e não
ser, é mais opinião que ciência. Precisamente por isto não existe
definição ou demonstração das substâncias sensíveis particulares que
são dotadas de matéria e não são por consequência necessárias mas
corruptíveis: o seu conhecimento obscurece-se apenas deixam de ser
percebidas. Todavia permanece íntegro, no sujeito que as conhece, o seu
conceito que expressa precisamente a sua natureza substancial, ainda
que não na forma rigorosa da definição (Met., VII, 15,
1039 b, 27). A substância é portanto objectivamente e subjectivamente o
princípio da necessidade: objectivamente, como ser da essência,
enquanto realidade necessária; subjectivamente, como essência do ser,
enquanto razão de ser necessitante.
Ao considerar a diversidade e disparidade dos significados que a
substância toma para Aristóteles, dir-se-ia que Aristóteles se havia
limitado a formular dialecticamente todos os significados possíveis da
palavra, sem escolher entre eles nem determinar o único significado
autêntico e fundamental. Por um lado, como forma ou espécie, a
substância é iningendrável e incorruptível, pelo outro, como composto e
realidade particular existente, é engendrável e corruptível; por um
lado, como sujeito é existência real que não se reduz nunca ao
predicado, isto é, à pura determinação lógica; por outro lado, como
definição e conceito, é pura entidade lógica. Na realidade, concebida a
substância como ser do ser, na sua dupla funcionalidade de ser da
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essência e essência do ser, Aristóteles podia reconhecer igualmente a
substância em todas aquelas diversas determinações e reduzir portanto à
unidade a disparidade aparente. Tal era precisamente o objectivo que se
propusera ao constituir a metafísica como ciência do ser enquanto tal e
ao tomar como seu fundamento o princípio da contradição. A riqueza das
determinações ontológicas que o conceito de substância permite
justificar a Aristóteles, relacionando-as com um único significado
fundamental, é a prova de que alcançou verdadeiramente, com o conceito
de substância, o princípio da filosofia primeira, como aquela ciência
que deve constituir o fundamento comum e a justificação última de todas
as ciências particulares. Aristóteles só devia excluir como ilegítimo
um significado da substância: aquele que separa o ser da essência ou a
essência do ser, que põe a validade e a necessidade do ser de fora do
ser, numa universalidade que não constitui a alma e a vida do próprio
ser. Tal era o ponto de vista do platonismo; por isso Aristóteles se
serve dele continuamente como termo de confronto polémico na construção
da sua metafísica.
§ 75. A POLÉMICA CONTRA O PLATONISMO
A característica do platonismo é, segundo Aristóteles, a de considerar
as espécies como substâncias separadas, reais independentemente dos
seres individuais de que são forma ou substância. Para Aristóteles a
substancialidade (a realidade) da espécie é a mesma do indivíduo de que
é espécie. Para Platão as espécies têm uma realidade em si que não se
dissolve na dos indivíduos singularmente existentes: e em tal sentido
são substâncias separadas.
261
Ora tais substâncias separadas são impossíveis. segundo Aristóteles.
Como espécies deveriam ser universais; mas é impossível que o universal
seja substância porque enquanto o universal é comum a muitas coisas, a
substância é própria de um ser individual e não pertence a nenhum
outro. Se em Sócrates, que é substância, existisse uma outra substância
(“homem” ou “ser vivente”) teríamos um ser completo de várias
substâncias, o que é impossível.
Aristóteles insiste portanto várias vezes na Metafísica na crítica dos
argumentos que eram seguidos por Platão e pelos Platónicos para
estabelecer a realidade da ideia. Tal crítica versa essencialmente
quatro pontos. Em primeiro lugar, admitir a ideia que
corresponda a cada conceito significa actuar mais ou menos como aquele
que, tendo de contar alguns objectos, julgasse que não podia fazê-lo
senão acrescentando o seu número. As ideias devem ser efectivamente em
número maior que os respectivos objectos sensíveis, porque há de haver
não só a ideia de cada substância, mas também a de todos os seus modos
ou caracteres que podem concentrar-se num único conceito. São outras
tantas realidades que se acrescentam às realidades sensíveis. de modo
que o filósofo se encontra no dever de explicar, além destas últimas,,
também as primeiras, enfrentando dificuldades maiores do que se se
encontrasse apenas perante o mundo sensível.
Em segundo lugar, os argumentos com que se demonstra a realidade da
ideia conduziriam a admitir ideias que até os Platónicos não consideram
que haja; por exemplo, a das negações ou das coisas transitórias, pois
que também destas há conceitos. E assim, até para a relação de
semelhança entre as ideias e as coisas correspondentes (por exemplo,
entre a ideia do homem e cada homem) deveria haver uma ideia (um
terceiro homem); e entre esta
262
ideia, por uma parte, e a ideia do homem e cada homem individual, por
outra, outras ideias; e
assim até ao infinito.
Em terceiro lugar, as ideias são inúteis porque não contribuem nada
para fazer compreender a realidade do mundo. De facto, não são causa de
nenhum movimento e de nenhuma mudança. Dizer que as coisas participam
das ideias não quer dizer nada, porque as ideias não são princípios de
acção .que determinem a natureza das coisas.
Finalmente, é este o argumento mais importante que se liga com a teoria
aristotélica da substância: a substância não pode existir separadamente
daquilo de que é substância. A afirmação do Fédon de que as ideias são
causas das coisas é, segundo Aristóteles, incompreensível, pois ainda
que supondo que as ideias existam, delas não derivarão as coisas se não
intervir para criá-las um princípio activo.
Estes argumentos a que Aristóteles retorna amiúde são simplesmente
indicativos, mas não reveladores do verdadeiro ponto de separação entre
ele e Platão. Partem do pressuposto de uma realidade das ideias
absolutamente separada do mundo sensível e da própria inteligência
humana que as apreende: pressuposto que se não verifica no espírito
autêntico do platonismo. Para Platão, a ideia é o valor e constitui ao
mesmo tempo o dever ser, o melhor, das coisas do mundo e a norma de que
o homem deve servir-se para a valoração das próprias coisas. A ideia
aparece a Aristóteles como separada do mundo não porque Platão haja
negado implicitamente ou explicitamente a relação com o mundo, mas
porque a ideia é incomensurável com o ser do próprio mundo. A ideia é o
bem, o belo ou em geral (segundo os últimos diálogos platónicos) a
ordem e a medida perfeita do mundo, e constitui um princípio diferente
e em consequência estranho e separado do ser’ cujo fundamento se
263
pretende que seja. A descoberta da validade intrínseca do ser como tal,
o reconhecimento de que o ser, precisamente enquanto ser e não já
enquanto perfeição ou valor, possui a validade necessária, leva
Aristóteles a rejeitar a doutrina que separa o ser do seu próprio valor
e faz deste um mundo ou uma substância separada.
Por isso a substância aristotélica, até entendida como forma ou
espécie, não pode ser reconduzida à ideia platónica. A substância não é
a ideia que abandonando a esfera supraceleste se envolveu no ser e no
devir do mundo e readquiriu a sua concreção, mas um princípio de
validade intrínseco ao ser como tal: é o ser próprio do devir e do
mundo na própria necessidade.
Aristóteles realizou a inversão do ponto de vista platónico. Para
Platão, os valores fundamentais são os morais que não são puramente
humanos, mas cósmicos, e constituem o princípio e o fundamento do ser.
Para Aristóteles o valor fundamental é o ontológico, constituído pelo
ser enquanto tal, pela substância; e os valores morais circunscrevem-se
à esfera puramente humana. Quando Aristóteles nega que o universal seja
substância, tem em mente o universal platónico que verdadeiramente está
separado do ser, na medida que é um valor distinto do ser. O que ele
defende constantemente contra o platonismo é que o valor do ser é
intrínseco ao ser: é a doutrina da substância.
§ 76. A SUBSTÂNCIA COMO CAUSA
DO DEVIR
Com a indagação sobre a natureza da substância se entrelaça na
Metafísica a investigação em torno das substâncias particulares. Nesta
segunda investigação, Aristóteles é guiado pelo critério que ilustra
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num passo famoso do livro VII. É necessário partir das coisas que são
mais cognoscíveis ao homem a fim de alcançar aquelas que são mais
cognoscíveis em si; do mesmo modo que, no campo da acção, se parte
daquilo que é bom para o indivíduo a fim de que consiga fazer seu o bem
universal (1020 b, 3). Mais facilmente cognoscíveis para o homem são as
substâncias sensíveis; portanto, destas se deve partir na consideração
das substâncias determinadas. E dado que estão sujeitas ao devir,
trata-se de saber que função desempenha a substância no devir.
Tudo aquilo que devém tem uma causa eficiente que é o ponto de partida
e o princípio do devir; devém alguma coisa (por exemplo, uma esfera ou
um círculo) que é a forma ou ponto de chegada do devir; e devém. de
alguma coisa, que não é a simples privação dessa forma, mas a sua
possibilidade ou potência e se chama matéria. O artífice que constrói
uma esfera de bronze, como não produz o bronze, tão-pouco produz a
forma de esfera que infunde no bronze. Não faz mais que dar a uma
matéria preexistente, o bronze, uma forma preexistente, a esfericidade.
Se tivesse de produzir também a esfericidade, teria de a tirar de
alguma outra coisa, como tira do bronze a esfera de bronze; isto é,
deveria haver uma matéria da qual tiraria a esfericidade e logo ainda
uma matéria desta matéria e assim até ao infinito. É evidente, pois,
que a forma ou espécie que se imprime na matéria não devém, pelo
contrário, o que devém é o conjunto da matéria e forma (sinolo) que
desta toma o nome. A substância como matéria ou como forma escapa ao
devir: ao qual pelo contrário, se submete a substância como sinolo
(VII, 8, 1033 b). Isto não quer dizer que haja uma esfera aparte das
que vemos ou uma casa fora das construídas com tijolos. Se assim fosse,
a espécie não se converteria nunca numa realidade determinada, isto é,
esta casa ou
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esta esfera. A espécie exprime a natureza de uma coisa, não diz que a
coisa existe. Quem produz a coisa, tira de algo que existe (a matéria,
o bronze) qualquer coisa que existe e tem em si aquela espécie (a
esfera de bronze). A realidade determinada é a espécie que já subsiste
nestas carnes e nestes ossos que formam Cálias ou Sócrates, os quais
certamente são distintos pela matéria, mas idênticos pela espécie, que
é indivisível (1b., 1034 a, 5).
A substância é portanto a causa não só do ser mas ainda do devir. No
primeiro livro da Metafísica, Aristóteles distinguira quatro espécies
de causas, repetindo uma doutrina já exposta na Física ffi, 3 e 7).
“Das causas-dissera (Met., 1,
3, 983 a, 26)-fala-se de quatro modos. Chamamos causa primeira à
substância e à essência necessária, pois que o porquê se reduz em
última instância ao conceito (logos) que, sendo o primeiro porquê, é
causa e princípio. A segunda causa é a matéria e o substracto. A
terceira é a causa eficiente, isto é, o princípio do movimento. A
quarta é a causa oposta a esta última, o objectivo e o bem que é o fim
(telos) de cada geração e de cada devir. ” Mas agora é claro que estas
quatro causas são verdadeiramente tais só enquanto se reduzem todas à
causa primeira, à substância de que são determinações ou expressões
diversas. Naquele primeiro ensaio de história da filosofia, que
Aristóteles nos oferece precisamente no primeiro livro da Metafísica,
ele põe à prova esta doutrina das quatro causas para se certificar se
os seus predecessores haviam descoberto outra espécie de causa, além
daquelas enunciadas por ele nos escritos de física. A conclusão da sua
análise é que todos se limitaram a tratar de uma ou duas das causas por
ele enunciadas: a causa material e a causa eficiente foram admitidas
pelos físicos, a causa formal por Platão, enquanto da causa final só
Anaxágoras teve um certo indí-
266
cio. “Mas estes – acrescenta Aristóteles – trataram delas confusamente;
e se num sentido se pode afirmar que as causas foram indicadas antes de
nós, num outro sentido pode dizer-se que não foram indicadas
inteiramente” o Q, 10, 992 b, 13). Aristóteles está assim consciente de
inserir-se historicamente na pesquisa estabelecida pelos seus
predecessores e de levá-la à sua culminação e clareza.
O objectivo que se propôs parece-lhe sugerido pelos resultados
históricos que a filosofia conseguiu antes dele.
§ 77. POTÊNCIA E ACTO
A função da substância no devir confere à mesma substância um novo
significado. Ela adquire um valor dinâmico, identifica-se com o fim
(telos), com a acção criadora que forma a matéria, com a realidade
concreta do ser individual no qual o devir se executa. Em tal sentido a
substância é acto: actividade, acção, conclusão.
Aristóteles identifica a matéria com a potência, a forma com o acto. A
potência (dynamis) é em geral a possibilidade de produzir uma mudança
ou de sofrê-la. Há a potência activa que consiste na capacidade de
produzir uma mudança em si ou noutro (como, por exemplo, no fogo a
potência de aquecer e no construtor a de construir); e a potência
passiva que consiste na capacidade de sofrer uma mudança (como por
exemplo, na madeira a capacidade de inflamar-se, naquilo que
é frágil a capacidade de romper-se). A potência passiva é própria da
matéria; a potência activa é própria do princípio de acção ou causa
eficiente.
O acto (enérgheia) é pelo contrário a própria existência do objecto.
Este está relativamente à potência “como o construir para o saber
construir,
267
o estar acordado para o dormir, o olhar para os olhos fechados, apesar
de ter vista, e como o objecto tirado da matéria e elaborado
completamente está para a matéria bruta e para o objecto ainda não
acabado” (Met., IX, 6, 1048 b). Alguns actos são movimentos (kinesis),
outros são acções (praxis). São acções aqueles movimentos que têm em si
próprios o seu fim. Por exemplo, ver é um acto que tem em si próprio o
seu fim e do mesmo modo o entender e o pensar, enquanto que o aprender,
o caminhar, o construir têm fora de si o seu fim na coisa que se
aprende, no ponto a que se pretende chegar, no objecto que se constrói.
Aristóteles chamou a estes actos não acções, mas movimentos ou
movimentos incompletos.
O acto é anterior à potência. É anterior relativamente ao tempo: pois é
verdade que a semente (potência) é anterior à planta, a capacidade de
ver anterior ao acto de ver; mas a semente não pode ser derivada senão
de uma planta e a capacidade de ver não pode ser própria senão de um
olho que vê. O acto é anterior também pela substância, pois o que no
devir é último, a forma completa, é substancialmente anterior: por
exemplo o adulto é anterior ao rapaz e a planta à semente, na medida
que um já realizou a forma que o outro não tem. A galinha vem antes do
ovo, segundo Aristóteles. A causa eficiente do devir deve preceder o
próprio devir e a causa eficiente é acto. Também do ponto de vista do
valor o acto é anterior já que a potência é sempre possibilidade de
dois contrários; por exemplo, a potência de ser saudável é também
potência de ser doente; mas o acto de ser saudável exclui a doença. O
acto é portanto melhor que a potência.
A acção perfeita que em em si o seu fim é designada por Aristóteles
como acto final ou realização final (entelequia). Enquanto o movimento
268
é o processo que leva gradualmente ao acto aquilo que antes estava em
potência, a entelequia é o termo final (telas) do movimento, o seu
término perfeito. Mas como tal, a enteléquia é também a realização
completa e portanto a forma perfeita daquilo que devém; é a espécie e a
substância.
O acto identifica-se por consequência em cada caso com a forma ou
espécie e, quando é acto perfeito ou realização final, identifica-se
com a substância. Esta é a própria realidade em acto e o princípio
dela. Frente a ela, a matéria considerada em si, isto é, como pura
matéria ou matéria prima, absolutamente privada de actualidade ou de
forma, é indeterminável e incognoscível e não é substância (Met., VII,
10, 1036 a, 8; IX, 7, 1049 a, 27). A matéria prima é o limite negativo
do ser como substância, o ponto em que cessa conjuntamente a
inteligibilidade e a realidade do ser. Mas aquilo que se chama
comummente matéria, por exemplo o fogo, a água, o bronze não é matéria
prima, porque tem já em si em acto uma determinação e portanto uma
forma; é matéria, isto é, potência, no que diz respeito às formas que
pode assumir, enquanto que é já, como realidade determinada, forma e
substância. Se conhecer a realidade e o porquê de uma coisa significa
conhecer a sua substância mediante a espécie ou forma (que é
precisamente a substância das realidades compostas ou “sinoli”), a
matéria representa o resíduo irracional do conhecimento, assim como a
substância representa o princípio ou a causa não só do ser, mas também
da inteligibil idade do ser como tal.
§ 78. A SUBSTÂNCIA IMóVEL
À filosofia como teoria da substância compete evidentemente não só a
tarefa de considerar a natureza da substância, as suas determinações
fun.
269
damentais e a sua função no devir, mas também o de classificar as
substâncias determinadas existentes no mundo, que são objecto das
ciências particulares e de tomar como objecto de estudo aquela ou
aquelas que escapam ao âmbito das demais ciências. Ora todas as
substâncias se dividem em duas classes: as substâncias sensíveis e em
movimento e as substâncias não sensíveis e imóveis. As substâncias do
primeiro género constituem o mundo físico e por sua vez subdividem-se
em duas classes: a substância sensível que constitui os corpos celestes
e é iningendrável e incorruptível; as substâncias constituídas pelos
quatro elementos do mundo sublunar, que são pelo contrário geráveis e
corruptíveis. Estas substâncias são o objecto da física. O outro grupo
de substâncias, as não sensíveis e imóveis, é objecto de uma ciência
diferente, a teologia, à qual Aristóteles dedicou o livro XII da
Metafísica.
A existência de uma substância imóvel é demonstrada por Aristóteles
tanto na Metafísica (XII, 6) como na Física (VIII, 10), mediante a
necessidade de explicar a continuidade e a eternidade do movimento
celeste. O movimento contínuo, uniforme, eterno do primeiro céu, o qual
regula os movimentos dos outros céus, igualmente eternos e contínuos
deve ter como sua causa um primeiro motor. Mas este primeiro motor não
pode ser por sua vez movido pois de outro modo requereria uma causa do
seu movimento e esta causa uma outra ainda e assim até ao infinito;
portanto, deve ser imóvel. Ora o primeiro motor imóvel deve ser acto,
não potência. Aquilo que só tem a potência de mover, pode também não
mover; mas se o movimento do céu é contínuo, o motor deste movimento
não só deve ser eternamente activo, mas deve ser pela sua natureza
acto, e absolutamente privado de potência. E pois que a potência é
matéria, esse
270
acto está também privado de matéria: é acto puro (Met., XII, 6, 1071 b,
22). Este acto puro ou primeiro motor não tem grandeza, portanto não
tem partes e é indivisível. Com efeito, uma grandeza finita não poderia
mover por um tempo infinito, pois que nenhuma coisa finita tem uma
potência infinita; e uma grandeza infinita não pode subsistir. Mas não
tendo matéria nem grandeza, a substância imóvel não pode mover como
causa eficiente; resta-lhe portanto que mova como causa final, enquanto
objecto da vontade e da inteligência. De facto tudo aquilo que é
desejável e inteligível move sem ser movido e um e outro se identificam
no seu princípio, pois que aquilo que se deseja é aquilo que a
inteligência julga bom enquanto é realmente tal. Na hierarquia das
realidades inteligíveis, a substância simples e em acto tem o primeiro
lugar; na hierarquia dos bens tem o primeiro lugar aquilo que é
excelente e desejável por si mesmo. Graças à identidade do inteligível
e do desejável, o sumo grau do inteligível, a substância imóvel
identifica-se com o sumo grau do desejável: a substância é pois também
o grau supremo da excelência, o sumo bem, Como tal, é objecto de amor,
move enquanto é amada, e as outras coisas são movidas pelo que ela move
dessa maneira, isto é, pelo primeiro céu (Met., XII, 7,
1072 b, 2).
À substância imóvel, na medida que é a mais elevada de todas, pertence
propriamente a que até para os homens é a vida mais excelente, mas que
só lhes é dada por breve tempo: a vida da inteligência. Só a
inteligência divina é que não pode ter um objecto diferente de si ou
inferior a si própria. Ela pensa-se a si mesma no lugar do inteligível:
a inteligência e o inteligível são em Deus um só. Enquanto que no
conhecimento humano frequentemente o ser do pensar é distinto do ser
271
do pensado porque este último está ligado à matéria, no conhecimento
divino, como em geral em todo o conhecimento que não se dirige à
realidade material, o pensar e o pensado identificam-se e fazem um só.
“Deus, portanto, se é o mais perfeito que há, pensa-se a si próprio e o
seu pensamento é pensamento do pensamento (Met., X, XII, 9, 1074 b,
34). E pois que a actividade do pensamento é o que pode existir de mais
excelente e mais doce, a vida divina é a mais perfeita de todas, eterna
e feliz (1b., 7, 1072 b, 23).
Se na ordem dos movimentos, Deus é o primeiro motor, na ordem das
causas Deus é a causa primeira, às quais revertem todas as séries
causais, compreendidas as das causas finais (Met., 11, 2). Mesmo no
sentido da causa final, Deus é o criador da ordem do universo que é
comparado por Aristóteles a uma família ou a uni exército. “Todas as
coisas são ordenadas uma relativamente a outra. mas não todas do mesmo
modo: os peixes, as aves, as plantas têm ordem diferente. Todavia
nenhuma coisa está relativamente a uma outra como se nada tivesse a
fazer com a outra; mas todas são coordenadas a um único ser. Isto é,
por exemplo, aquilo que acontece numa casa onde os homens livres não
podem fazer aquilo que lhes agrada, mas todas ou pelo menos a maior
parte das coisas acontecem segundo uma ordem; enquanto que os escravos
e os animais só em pouco contribuem para o bem-estar comum e muito
fazem casualmente” (lb., XII, 10.
1075 a, 12). Do mesmo modo, o bem de um exército consiste
“conjuntamente na sua ordem e no seu comandante, mas especialmente
neste último: pois que ele não é o resultado da ordem mas antes a ordem
depende dele” (1075 a, 13). Assim Deus é o criador da ordem do
mundo mas não do ser do próprio mundo. A estrutura substancial do
universo, para Aristóteles como para Platão, está para
272
lá dos limites da criação divina: ela é insusceptível de princípio e de
fim. Com efeito só a coisa individual, composta de matéria e forma, tem
nascimento e morte, segundo Aristóteles; enquanto que a substância que
é forma ou razão de ser ou aquela que é matéria não nasce nem perece
(VIII, 1,
1042 a, 30). O próprio Deus participa desta eternidade da substância já
que ele é substância (XII,
7, 1073 a, 3) a substância no mesmo sentido em
que são tais as outras substâncias (Et. Nic., 1, 6,
1096 a, 24). A superioridade de Deus consiste só na perfeição da sua
vida, não na sua realidade ou no seu ser, pois que, diz Aristóteles,
“nenhuma substância é mais ou menos substância do que uma outra” (Cat.,
V. 2b, 25).
Como Platão, Aristóteles é politeísta. De facto, em primeiro lugar,
Deus não é a única substância imóvel. Ele é o princípio que explica o
movimento do primeiro céu; mas como, além deste, existem os movimentos
igualmente eternos, das outras esferas celestes, a própria demonstração
que vale para a existência do primeiro motor imóvel vale também para a
existência de tantos motores quantos são os movimentos das esferas
celestes. Aristóteles admite assim numerosas inteligências motoras,
cada uma das quais preside ao movimento de uma determinada esfera e é
princípio de todo o movimento do universo. Aristóteles obtém o número
de tais inteligências motrizes do número das esferas que os astrónomos
do tempo haviam admitido para explicar o movimento dos planetas. Estas
esferas eram em número superior ao dos planetas, pois que a explicação
do movimento aparente dos planetas em volta da terra exigia que cada
planeta fosse movido por várias esferas; e isto com o objectivo de
justificar as anomalias que o movimento dos planetas apresenta
relativamente a um movimento circular perfeito em torno da terra.
Aristóteles admitia por
273
consequência 47 ou 55 esferas celestes e portanto
47 ou 55 inteligências motoras; a oscilação do número devia-se aos
diferentes números das esferas celestes admitidos por Eudóxio e por
Calipo, os dois astrónomos a que Aristóteles se referia (Met., XII, 8).
Aliás Aristóteles fala constantemente em “deuses” (Et. Nic., X, 9, 1179
a 24; Met., 1, 2, 983 a, 11;
111. 2. 907 b, 10, etc.); e aludindo à crença popular segundo a qual o
divino abraça toda a natureza, considera que este ponto essencial, isto
é “que as substâncias primeiras são tradicionalmente consideradas
deuses”, tem sido “divinamente designado” e é um dos ensinamentos
preciosos que a tradição salvou (Met., XII, 8, 1074 a, 38), Noutros
termos, a substância divina participou de muitas divindades no que a
crença popular e a filosofia coincidem.
§ 79. A SUBSTÂNCIA FíSICA
A palavra metafísica, inventada provavelmente por um peripatético
anterior a Andrónico, deriva da ordenação dos escritos aristotélicos,
na qual os livros de filosofia se colocaram “depois da física”; mais
expressa também o motivo fundamental da “filosofia primeira” de
Aristóteles, a qual se ocupa da substância imóvel, partindo das
aparências sensíveis e está dominada pela preocupação de “salvar os
fenómenos”. O estudo do mundo natural que para Platão pertence â esfera
da opinião e não ultrapassa os limites dos “raciocínios prováveis” (§
59), para Aristóteles é ao contrário uma ciência no pleno e rigoroso
significado do termo. Para Aristóteles não há na natureza nada tão
insignificante, tão omissivel que não valha a pena ser estudado e não
seja fonte de satisfação e de alegria para o investigador. “As
substâncias interiores-diz ele (Sobre as partes
274
dos animais, 1, 5, 645 a, 1 segs.) -sendo mais e melhor acessíveis ao
conhecimento, adquirem superioridade sobre as outras no campo
científico; e como estão mais próximas de nós e mais conformes à nossa
natureza, a sua ciência acaba por ser equivalente à filosofia que
estuda as substâncias divinas… Com efeito até no caso daquelas menos
favorecidas do ponto de vista da aparência sensível, a natureza que as
produziu dá alegrias inefáveis àqueles que, considerando-as
cientificamente, sabem compreender as suas causas e são por sua
natureza filósofos… Deve-se, além disso, ter presente que quem
discute uma parte qualquer ou elemento da realidade, não considera o
seu aspecto material, nem este lhe interessa, antes olha à forma na sua
totalidade. O que importa é a casa, não os tijolos, a cal e as traves:
assim, no estudo da natureza, aquilo que interessa é a substância total
de um ser determinado e não as suas partes que, separadas das
substâncias que o constituem, nem sequer existem”. Estas palavras, que
pode dizer-se traduzem o programa científico de Aristóteles, encontram
a sua justificação na teoria da substância que é o centro da sua
metafísica. Esta teoria demonstrou com efeito que cada ser possui, na
substância que o constitui, o princípio ou a causa da sua necessidade.
Cada ser tem, portanto, enquanto tal, o seu próprio valor e se se
considera nele aquilo que precisamente o faz ser, isto é, a forma total
ou substância, é digno de consideração e de estudo e pode ser objecto
de ciência. Por isso Aristóteles adverte na passagem referida que se
deve olhar à forma e não à matéria, à totalidade em que se actualiza a
substância e não às partes.
COnformemente ao programa que as suas últimas e mais maduras
investigações metafísicas tinham especulativamente justificado, a
actividade científica de Aristóteles dirige-se cada vez mais para as
investigações particulares. Fixou a sua atenção principalmente no
mundo animal, como se deduz dos números, os escritos de história
natural que nos restam; mas pode afirmar-se que nenhum campo da
investigação empírica lhe era estranho, pois que preparava ao mesmo
tempo a reunião das 158 constituições políticas e se entregava a outras
investigações eruditas, como a compilação do catálogo dos vencedores
dos jogos píticos.
Mas não é possível ocuparmo-nos de todas as vastas investigações
naturalísticas de Aristóteles, que como tais saem do campo da
filosofia. Sabemos já que a física é para ele urna ciência teorética,
ao lado da matemática e da filosofia primeira. O seu objecto é o ser em
movimento, constituído pelas duas substâncias que são dotadas de
movimento, a engendrável e corruptível que forma os corpos sublunares e
a iningendrável e incorruptível que forma os corpos celestes.
Segundo Aristóteles, o movimento é a passagem da potência ao acto e
portanto possui sempre um fim (telos). que é a forma ou espécie que ele
tende a realizar. Dado que o acto como substância precede sempre a
potência, cada movimento pressupõe já em acto a forma que é o seu
término final. Aristóteles admite quatro tipos fundamentais de
movimento: 1) o movimento substancial, isto é, a geração e a corrupção;
2) o movimento qualitativo, isto é, a mudança ou a alteração-, 3) o
movimento quantitativo, isto é, o aumento e a diminuição; 4) o
movimento local, isto é, o movimento propriamente dito. Todavia este
último é, segundo Aristóteles, o movimento fundamental a que todos os
outros se reduzem: com efeito o aumento e a diminuição são devidos ao
afluxo ou ao afastamento duma certa matéria; a mudança, a geração e a
corrupção supõe o reunirem-se num dado lugar ou o separar-se de
determinados elementos. Por isso só o movimento
276
local, isto é, a mudança de lugar, constitui o movimento fundamental
que permite distinguir e classificar as várias substâncias físicas.
Ora o movimento local é, segundo Aristóteles, de três espécies: 1)
movimento circular em torno do centro do inundo; 2) movimento do centro
do mundo para o alto, 3) movimento do alto para o centro do mundo.
Estes dois últimos movimentos são reciprocamente opostos e podem
pertencer às mesmas substâncias, as quais serão sujeitas à mudança, à
geração e à corrupção. Efectivamente, os elementos constitutivos destas
substâncias, podendo moverem-se quer do alto para o baixo quer do baixo
para o alto, provocarão com estes movimentos o nascimento, a mudança e
a morte das substâncias compostas.
O movimento circular, ao invés, não tem contrários; por isso as
substâncias que se movem com esta espécie de movimento são imutáveis
necessariamente e iningendráveis e incorruptíveis. Aristóteles sustenta
que o éter, o elemento que compõe os corpos celestes, é o único que se
move com movimento circular. Esta opinião de que os corpos celestes são
formados por um elemento diferente daqueles que compõem o universo e
que por isso não estão sujeitos às vicissitudes do nascimento, morte e
mudanças das outras coisas, durou longo tempo na cultura ocidental e só
foi abandonada no século XV por obra de Nicolau de Cusa.
Os movimentos do alto para baixo e do baixo para alto são ao contrário
próprios dos quatro elementos que compõem as coisas terrestres ou
sublunares: água, ar, terra e fogo. Para explicar
O mOviMento destes elementos, Aristóteles estabelece a teoria dos
lugares naturais. A cada um destes elementos cabe-lhe no universo um
lugar natural. Se a parte de um elemento está afastada do seu lugar
natural (o que não pode acontecer senão dum Modo violento, isto é,
contrário à situação natural
277
do elemento) ela tende a retornar com um movimento natural.
Ora os lugares naturais dos quatro elementos são determinados pelo seu
respectivo peso. Ao centro do mundo está o elemento mais pesado, a
terra; à volta da terra, estão as esferas dos outros elementos na ordem
do seu peso decrescente: água, ar e fogo. O fogo constitui a esfera
extrema do universo sublunar; acima dela está a primeira esfera etérea
ou celeste, a da lua. Aristóteles era levado a esta teoria por
experiências bastante simples: a pedra imersa na água afunda-se, isto
é, tende a situar-se sob a água; uma bolha de ar aberta na água vem à
superfície, por isso o ar tende a dispor-se ao cimo da água; o fogo
arde sempre para o alto, isto é, tende a juntar-se à sua esfera que
está acima do ar.
O universo físico, que compreende os céus formados pelo éter e o mundo
sublunar formado pelos quatro elementos, é, segundo Aristóteles,
perfeito, finito, único e eterno. A perfeição do mundo é demonstrada
por Aristóteles com argumentos apriorísticos, que não têm qualquer
referência à experiência, Invoca a teoria pitagórica sobre a perfeição
do número 3 e afirma que o mundo, possuindo todas e as três dimensões
possíveis (altura, largura e profundidade), é perfeito porque não tem
falta de nada. Mas se o mundo é perfeito, é também finito.
Efectivamente, “infinito” significa, segundo Aristóteles, incompleto: é
infinito aquilo que tem falta de qualquer coisa, portanto aquilo a que
pode juntar-se sempre alguma coisa nova. O mundo, ao contrário, não tem
falta de nada: é portanto finito.
Por outro lado, nenhuma coisa real pode ser infinita, segundo
Aristóteles. Com efeito, cada coisa existe num espaço e cada espaço tem
um centro, um baixo, um alto e um limite extremo. Mas no infinito não
pode existir nem um centro nem um
278
alto nem um baixo nem um limite. Portanto nenhuma realidade física é
realmente infinita. A ordem das estrelas fixas assinala os limites do
universo, limites para lá dos quais não há espaço. Nenhum volume
determinado pode ser maior do que o volume desta esfera nenhuma linha
pode alongar-se para lá do seu diâmetro.
Daqui deriva que não podem existir outros mundos para lá do nosso e não
pode existir o vazio. Não podem existir outros mundos, pois que toda a
matéria disponível deve já estar disposta ab aeterno neste nosso
universo que tem por centro a terra e por limite extremo a esfera das
estrelas. Dado que cada elemento tende naturalmente para o seu lugar
natural, cada parte de terra tende a juntar-se à terra que está no
centro e cada elemento tende a reunir-se à própria esfera. Deste modo o
nosso universo tem de recolher toda a matéria possível e fora dele não
há matéria: ele é único. Mas fora dele não existe tão-pouco o vazio. Os
atomistas haviam sustentado que, sem o vazio, não é possível o
movimento, pois que pensavam que, se os átomos (que são semelhantes a
pedrinhas pequeníssimas) fossem impelidos ao mesmo tempo sem intervalos
vazios entre um e outro, nenhum átomo se poderia mover. Aristóteles, ao
contrário, sustenta que o movimento no vazio não seria possível.
Efectivamente no vazio não haveria nem um centro, nem um alto, nem um
baixo-, por consequência não haveria motivo para um corpo se mover numa
direcção em lugar de outra e todos os corpos permaneceriam parados.
Nesta argumentação, como se vê, Aristóteles socorre-se continuamente da
teoria dos lugares naturais, fundada na classificação dos movimentos. E
vai ao ponto de produzir como argumento contra o vazio aquilo que nós
hoje chamaríamos o principio da inércia. No vazio, diz, um corpo ou
permanece-
279
ria em repouso ou continuaria em movimento, enquanto se lhe não
opusesse uma força maior. Este, segundo Aristóteles, é um argumento
contra o vazio; mas na realidade este argumento demonstra apenas que
Aristóteles considera absurdo o que constitui o primeiro princípio da
mecânica moderna, o princípio de inércia. Veremos que este princípio
encontrará reconhecimento na escolástica do século XIV e será formulado
depois exactamente por Leonardo.
Finalmente, como totalidade perfeita e finita, o mundo é eterno.
Aristóteles define o tempo como “o número do movimento, segundo o antes
e o depois” (Fis., IV 11, 219 b, 1): entendendo com isto que ele é a
ordem mensurável do movimento. Distingue além disso a duração infinita
do tempo, no qual vive tudo o que muda, da eternidade, que é a
existência intemporal do imutável. Mas ao mundo na sua totalidade é que
atribui verdadeiramente a eternidade neste sentido. Sustenta que o
mundo não se gerou nem pode destruir-se e abarca e compreende na sua
imobilidade total a infinitude do tempo e também todas as mudanças que
acontecem no tempo. Consequentemente, Aristóteles não nos deixou uma
cosmogonia, como fizera Platão no Timeu; e não podia deixá-la, dado
que, segundo ele, o mundo não nasce.
A esta eternidade do mundo é conjunta a eternidade de todos os aspectos
fundamentais e de todas as formas substanciais do mundo. São por isso
eternas as espécies animais e também a espécie humana, a qual, segundo
Aristóteles, pode sofrer vicissitudes várias na sua história sobre a
terra, mas é imperecível na medida que é ingerada.
A perfeição do mundo que é o pressuposto de toda a física aristotélica,
implica a estrutura finalística do próprio mundo: isto é, implica, que
no mundo todas as coisas tenham um fim. A consi-
280
deração do fim é essencial a toda a física aristotélica.
Viu-se que para Aristóteles o movimento de um corpo não se explica se
não admitindo que tende naturalmente a alcançar o seu lugar natural: a
terra tende para o centro e os outros elementos tendem cada um para a
sua própria esfera. O lugar natural de um elemento é determinado pela
ordem perfeita das partes do universo. Atingir esse lugar e ainda
manter e garantir a perfeição de tudo, é o fim de todo o movimento
físico. Já na lei fundamental que explica os movimentos da natureza
está presente a consideração do fim. Mas o fim é ainda mais evidente no
mundo biológico, isto é, nos organismos animais: daqui se explica a
preferência de Aristóteles pelas investigações biológicas, às quais
dedicou grande parte da sua actividade. “A divindade e a natureza-diz
Aristóteles (De coelo, i, 4,
271 a)-não fazem nada que seja inútil”. O acaso (autómaton),
propriamente falando, não existe. Dizemos que se verificam por acaso os
efeitos acidentais de certos acontecimentos que reentram na ordem das
coisas. Uma pedra que cai e fere alguém, fere-o por acaso porque não
caiu com o objectivo de feri-lo, a sua queda cabe no entanto na ordem
das coisas. A fortuna (tyche) é um espécie de acaso que se verifica na
ordem das acções humanas, como, por exemplo, vir ao mercado por um
motivo completamente diverso e encontrar lá um devedor que restitui a
soma devida. A acção deste homem afortunado era feita para um fim mas
não para aquele fim: por isso se fala de fortuna (Fis., 11, 5).06/12/2005 às 0:37 #80412Miguel (admin)MestreRoutdledge Enciclopedy of Philosophy, article Metaphysics by Craig, Edward
__________Metaphysics
Metaphysics is a broad area of philosophy marked out by two types of
inquiry. The first aims to be the most general investigation possible into
the nature of reality: are there principles applying to everything that is
real, to all that is? – if we abstract from the particular nature of existing
things that which distinguishes them from each other, what can we know
about them merely in virtue of the fact that they exist? The second type
of inquiry seeks to uncover what is ultimately real, frequently offering
answers in sharp contrast to our everyday experience of the world.
Understood in terms of these two questions, metaphysics is very closely
related to ontology, which is usually taken to involve both ‘what is
existence (being)?’ and ‘what (fundamentally distinct) types of thing
exist?’ (see Ontology).The two questions are not the same, since someone quite unworried by
the possibility that the world might really be otherwise than it appears
(and therefore regarding the second investigation as a completely trivial
one) might still be engaged by the question of whether there were any
general truths applicable to all existing things. But although different, the
questions are related: one might well expect a philosopher’s answer to
the first to provide at least the underpinnings of their answer to the
second. Aristotle proposed the first of these investigations. He called it
‘first philosophy’, sometimes also ‘the science of being’ (more-or-less
what ‘ontology’ means); but at some point in antiquity his writings on the
topic came to be known as the ‘metaphysics’ – from the Greek for
‘after natural things’, that is, what comes after the study of nature. This
is as much as we know of the origin of the word (see Aristotle §11 and
following). It would, however, be quite wrong to think of metaphysics as
a uniquely ‘Western’ phenomenon. Classical Indian philosophy, and
especially Buddhism, is also a very rich source (see Buddhist philosophy,
Indian; Hindu philosophy; Jaina philosophy).1 General metaphysics
Any attempt on either question will find itself using, and investigating, the
concepts of being and existence (see Being; Existence). It will then be
natural to ask whether there are any further, more detailed classifications
under which everything real falls, and a positive answer to this question
brings us to a doctrine of categories (see Categories). The historical
picture here is complex, however. The two main exponents of such a
doctrine are Aristotle and Kant. In Aristotle’s case it is unclear whether
he saw it as a doctrine about things and their basic properties or about
language and its basic predicates; whereas Kant quite explicitly used his
categories as features of our way of thinking, and so applied them only to
things as they appear to us, not as they really or ultimately are (see Kant,
I.). Following on from Kant, Hegel consciously gave his categories both
roles, and arranged his answer to the other metaphysical question (about
the true underlying nature of reality) so as to make this possible (see
Hegel, G.W.F.).An early, extremely influential view about reality seen in the most general
light is that it consists of things and their properties – individual things,
often called particulars, and properties, often called universals, that can
belong to many such individuals (see Particulars; Universals). Very
closely allied to this notion of an individual is the concept of substance,
that in which properties ‘inhere’ (see Substance). This line of thought
(which incidentally had a biological version in the concepts of individual
creatures and their species) gave rise to one of the most famous
metaphysical controversies: whether universals are real entities or not
(see Species; Natural kinds). In different ways, Plato and Aristotle had
each held the affirmative view; nominalism is the general term for the
various versions of the negative position (see Nominalism).The clash between realists and nominalists over universals can serve to
illustrate a widespread feature of metaphysical debate. Whatever entities,
forces and so on may be proposed, there will be a prima facie option
between regarding them as real beings, genuine constituents of the world
and, as it were, downgrading them to fictions or projections of our own
ways of speaking and thinking (see Objectivity; Projectivism). This was,
broadly speaking, how nominalists wished to treat universals; comparable
debates exist concerning causality (see Causation), moral value (see
Emotivism; Moral realism; Moral scepticism; Value, ontological status of)
and necessity and possibility (see Necessary truth and convention) – to
name a few examples. Some have even proposed that the categories (see
above) espoused in the Western tradition are reflections of the grammar
of Indo-European languages, and have no further ontological status (see
Sapir-Whorf hypothesis).Wittgenstein famously wrote that the world is the totality of facts, not of
things, so bringing to prominence another concept of the greatest
generality (see Facts). Presumably he had it in mind that exactly the
same things, differently related to each other, could form very different
worlds; so that it is not things but the states of affairs or facts they enter
into which determine how things are. The apparent obviousness of the
formula ‘if it is true that p then it is a fact that p’, makes it seem that facts
are in one way or another closely related to truth (see Truth, coherence
theory of; Truth, correspondence theory of) – although it should be said
that not every philosophical view of the nature of truth is a metaphysical
one, since some see it as just a linguistic device (see Truth, deflationary
theories of) and some as a reflection, not of how the world is, but of
human needs and purposes (see Truth, pragmatic theory of; Relativism).Space and time, as well as being somewhat elusive in their own nature,
are further obvious candidates for being features of everything that exists
(see Space; Time). But that is controversial, as the debate about the
existence of abstract objects testifies (see Abstract objects). We
commonly speak, at least, as if we thought that numbers exist, but not as
if we thought that they have any spatio-temporal properties (see Realism
in the philosophy of mathematics). Kant regarded his things-in-themselves
as neither spatial nor temporal; and some have urged us to think of God in
the same way (see God, concepts of). There are accounts of the mind
which allow mental states to have temporal, but deny them spatial
properties (see Dualism).Be all this as it may, even if not literally everything, then virtually
everything of which we have experience is in time. Temporality is
therefore one of the phenomena that should be the subject of any
investigation which aspires to maximum generality. Hence, so is change
(see Change). And when we consider change, and ask the other typically
metaphysical question about it (‘what is really going on when something
changes?’) we find ourselves faced with two types of answer. One type
would have it that a change is an alteration in the properties of some
enduring thing (see Continuants). The other would deny any such entity,
holding instead that what we really have is merely a sequence of states, a
sequence which shows enough internal coherence to make upon us the
impression of one continuing thing (see Momentariness, Buddhist doctrine
of). The former will tend to promote ‘thing’ and ‘substance’ to the ranks
of the most basic metaphysical categories; the latter will incline towards
events and processes (see Events; Processes). It is here that questions
about identity over time become acute, particularly in the special case of
those continuants (or, perhaps, processes), which are persons (see
Identity; Persons; Personal identity).Two major historical tendencies in metaphysics have been idealism and
materialism, the former presenting reality as ultimately mental or spiritual,
the latter regarding it as wholly material (see Buddhism, Yog#c#ra
school of; Idealism; Materialism; Materialism in the philosophy of mind;
Monism, Indian; Phenomenalism). In proposing a single ultimate principle
both are monistic (see Monism). They have not had the field entirely to
themselves. A minor competitor has been neutral monism, which takes
mind and matter to be different manifestations of something in itself
neither one nor the other (see Neutral monism). More importantly, many
metaphysical systems have been dualist, taking both to be fundamental,
and neither to be a form of the other (see S#>khya). Both traditions are
ancient. In modern times idealism received its most intensive treatment in
the nineteenth century (see Absolute, the; German idealism); in the
second half of the twentieth century, materialism has been in the
ascendant. A doctrine is also found according to which all matter, without
actually being mental in nature, has certain mental properties (see
Panpsychism).2 Specific metaphysics
There is also metaphysics that arises in reference to particular subject
matters, this being therefore metaphysical primarily with regard to the
second question (what are things ultimately like? – or, what kinds of thing
ultimately exist?) rather than the first. One of the most obvious cases, and
historically the most prominent, is theology; we have already mentioned
the philosophy of mind, the philosophy of mathematics and the theory of
values. Less obviously, metaphysical issues also intrude on the philosophy
of language and logic, as happens when it is suggested that any
satisfactory theory of meaning will have to posit the existence of
intensional entities, or that any meaningful language will have to mirror
the structure of the world (see Intensional entities; Logical atomism). The
political theorist or social scientist who holds that successful explanation
in the social sphere must proceed from properties of societies not
reducible to properties of the individuals who make them up (thereby
making a society an entity that is in a sense more basic than its members)
raises a metaphysical issue (see Holism and individualism in history and
social science). Metaphysics, as demarcated by the second question, can
pop up anywhere.The relationship with metaphysics is, however, particularly close in the
case of science and the philosophy of science. Aristotle seems to have
understood his ‘first philosophy’ as continuous with what is now called
his physics, and indeed it can be said that the more fundamental branches
of natural science are a kind of metaphysics as it is characterized here.
For they are typically concerned with the discovery of laws and entities
that are completely general, in the sense that everything is composed of
entities and obeys laws. The differences are primarily epistemological
ones, the balance of a priori considerations and empirical detail used by
scientists and philosophers in supporting their respective ontological
claims. The subject matter of these claims can even sometimes coincide:
during the 1980s the reality of possible worlds other than the actual one
was maintained by a number of writers for a variety of reasons, some of
them recognizably ‘scientific’, some recognizably ‘philosophical’ (see
Possible worlds). And whereas we find everywhere in metaphysics a
debate over whether claims should be given a realist or an antirealist
interpretation, in the philosophy of science we find a parallel controversy
over the status of the entities featuring in scientific theories (see Realism
and antirealism; Scientific realism and antirealism).It is true that there has been considerable reluctance to acknowledge any
such continuity. A principal source of this reluctance has been logical
positivism, with its division of propositions into those which are empirically
verifiable and meaningful, and those which are not so verifiable and are
either analytic or meaningless, followed up by its equation of science with
the former and metaphysics with the latter (see Demarcation problem;
Logical positivism; Meaning and verification). When combined with the
belief that analytic truths record nothing about the world, but only about
linguistic convention, this yields a total rejection of all metaphysics – let
alone of any continuity with science. But apart from the fact that this line
of thought requires acceptance of the principle about meaninglessness, it
also makes a dubious epistemological assumption: that what we call
science never uses non-empirical arguments, and that what we regard as
metaphysics never draws on empirical premises. Enemies of
obscurantism need not commit themselves to any of this; they can
recognize the continuity between science and metaphysics without
robbing anyone of the vocabulary in which to be rude about the more
extravagant, ill-evidenced, even barely meaningful forms which, in the
view of some, metaphysics has sometimes taken.Even the philosopher with a low opinion of the prospects for traditional
metaphysics can believe that there is a general framework which we in
fact use for thinking about reality, and can undertake to describe and
explore it. This project, which can claim an illustrious ancestor in Kant,
has in the twentieth century sometimes been called descriptive
metaphysics, though what it inquires into are our most general patterns of
thought, and the nature of things themselves only indirectly, if at all.
Though quite compatible with a low estimate of traditional metaphysics as
defined by our two primary questions, it does imply that there is a small
but fairly stable core of human thought for it to investigate. Hence it
collides with the view of those who deny that there is any such thing (see
Postmodernism).Routledge Encyclopedia of Philosophy, Version 1.0, London: Routledge
06/12/2005 às 0:44 #80413Miguel (admin)MestreTente também procurar pelo assunto no Argos aqui do site, você encontra bons resultados:
E tem essa dissertação aqui sobre a Metafísica de Aristóteles:
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