O Niilismo

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    Pessoal.

    Parabéns a todos pelo nível da discussão! Realmente, acho tudo muito esclarecedor.

    Há um aspecto de Niet que eu acho não ter sido ainda analisado: o nihilismo? O que vem a ser o nihilismo e, em particular, o nihilismo nietzscheano? Há alguma relação entre o nihilismo de Niet e o nazismo – como conclui Georg Luckács, entre outros?

    Gostaria de ter a opinião de vocês a respeito.

    Saudações filosóficas.

    #79265

    Olá Antônio Obrigado pelo elogio, na parte que me cabe.

    Como você propôs um novo tema, criei esse sub-tópico.

    Tentarei responder mais apropriadamente em breve.

    Você já leu esse texto aqui no nosso site?

    #79266

    Olá, Miguel e Antonio.

    Obrigado também pelo elogio, embora esclarecedor não seja sempre um atributo que me cabe hehe.

    Sobre a questão do niilismo em Nietzsche: Achei o texto do André Abbath interessante, principalmente a explicação da “tranvaloração dos valores” inserido na superação do niilismo.

    Como é dito no texto o niilismo em Nietzsche é uma faca de dois “legumes”.Nietzsche utiliza o termo de forma “pejorativa” ou negativa para condenar uma visão pessimista do mundo (o niilismo passivo) e o utiliza de forma construtiva para designar a dissolução dos valores inferiores (se bem que ha algo de negativo nesta construção hehe).Ferrater Mora usa o termo niilismo ativo.

    A origem do termo niilismo apresentado no texto do André, difere da apresentada no dicionário de Ferrater Mora.Ferrater afirma que foi William Hamilton o criador do termo, que era utilizado para designar a descrença numa “realidade substancial” (e um exemplo de tal descrente seria Hume).Ferrater cita também um trecho do Fausto de Goethe como exemplo de niilismo como “pessimismo radical”.

    Alias no texto é observado que o niilismo “percorre a maior parte de sua obra como uma crítica ao cristianismo e ao socratismo”.Creio que a observação esteja correta, mas não pode ser ignorado o pessimismo, ou o niilismo passivo de Schopenhauer como um importante interlocutor desta critica.Lembrando que a vontade para Schopenhauer “resvala para um nada vazio”.

    Sobre Luckács: Pessoalmente não procura abordar Nietzsche através de seu pensamento político, até porque Nietzsche não possui um pensamento político “acabado”.Também conheço pouco do pensamento de Luckács e dos marxistas em geral.Bem, o fato é que tenho uma certa cautela quanto ao pensamento político, ao contrário de Platão prefiro começar pelas letras miúdas!

    De qualquer maneira a leitura “luckácsiana” de Nietzsche é o tema de um texto de Mazzimo Montinari (um dos organizadores da ultima edição das obras completas de Nietzsche) chamado “Equívocos Marxistas”(cadernos Nietzsche, 12).(Vou tentar levantar os pontos principais do texto).

    O mote da critica de Luckács a Nietzsche é a “apologia indireta” a sociedade burguesa, que consiste na “difamação” de toda ação social, particularmente da tendência de mudar a sociedade”.No balaio dos “apologistas” se encontram também Kierkgaard e Schopenhauer estes “isolam o individuo e – aparentemente criticando a sociedade existente- colocam ideais tão altos em contraste com a realidade, a ponto de dispensar o próprio individuo de sua atuação, e induzi-lo a deixar como esta”.Nietzsche então seria membro do infame clube dos “reacionários”.

    A “apologia indireta” é refinada por Nietzsche através, dentre outras formas da utilização de mitos, como “vontade de potencia”, “eterno retorno”, etc.Montinari obviamente demonstra que não é o caso.Ao menos pressupondo que eram corretos esses conceitos eram científicos e(ou) filosóficos.

    Montinari (que diz ser um estudioso tanto de Nietzsche quanto de Marx e Engels) demonstra também que o conhecimento de Nietzsche sobre o socialismo era muito limitado (Nietzsche nunca tinha lido sequer uma linha de Marx) o que impossibilita uma dialogo consistente entre Nietzsche e o socialismo, embora Nietzsche criticasse o que efetivamente conhecia sobre este (principalmente a igualdade).

    Luckács utiliza também a carta de Nietzsche a sua irmã Elizabete como atestado de que Nietzsche era contra Bismarck, e portanto a favor do imperador Guilherme II.A carta dizia “O nosso imperador me agrada cada vez mais…a vontade de potencia como principio já seria compreensível para ele”.Montinari, no entanto, demonstra que a carta foi falsificada pela irmã de Nietzsche que procurava aproximar o irmão do imperador.(Ele descreve o processo filológico que o levou a tal conclusão).

    Sobre a ligação com o fascismo ela se dava também numa “apologia indireta” ao capitalismo, através de uma subjetividade idealista exagerada.Luckács no entanto não ligava a herança espiritual de Nietzsche ao Terceiro Reich.

    Creio então que o niilismo atribuído a Nietzsche por Luckács seria a negação dos valores políticos sociais.Mas, como bem ressaltou Montinari, é necessário entender Nietzsche dentro de seu campo, o campo do sujeito, desloca-lo deste campo seria privar-se de tudo que é útil em sua leitura (o que inclui a critica da cultura burguesa).Absurdo equivalente, alias, seria ler Marx no “campo” do sujeito.

    #79267

    Meu caros.

    Se eu bem entendi, o nihilismo de Niet é diferente do nihilismo de Dostoiévski – muito embora o primeiro tenha sido leitor e admirador do segundo. Para Dost, nihilismo era pressuposto para uma postura anarquista, pelo que me consta. Enquanto para Niet é um pressuposto para a “transvaloração dos valores”.

    Concordo plenamente com a crítica à crítica de Luckács ao nihilismo de Niet como um dos fundamentos do irracionalismo. Em Niet o nihilismo é uma postura filosófica, enquanto para Luckács teria uma ressonância política: acho que ele não entendeu Niet.

    Gostaria de entender um pouco melhor a expressão “campo do sujeito”.

    #79268

    Olá Antonio,

    Vou transcrever a passagem do texto do Montinari que trata dessa diferença de “campo” ou terreno(como é aexpressão do autor)

    “Certamente o fato de que um filosofo como Nietzsche, que sempre pôs no centro de suas reflexões as exigencias do individuo contra a coletividade,da cultura contra o estado, tenha sido também um anti-socialista, não é casual, mas isso requer por certo, o deslocamento do debate para o terreno escolhido por Nietzsche, lá onde ele pode ainda tem a alguma coisa a dizer. E este terreno certamente não é o terreno politico.Trata-se muito mais de tentar uma avaliação de Nietzsche que não considere como unica realidade a sociedade ou a classe, mas que, ao contrario também de peso ao homem como individuo e a sua maior infelicidade ” depois da destruição dos mitos religiosos e humanistas”(S.Timpanaro).É esse pois o terreno do pessimismo da inteligencia e do otimismo da vontade(…)”

    Espero ter sanado a falha :-)

    #79269

    Foucault nega ou tenta negar o sujeito. Não seria uma leitura um pouco antiga essa de Niet, procurando situar o “campo do sujeito”? Não sei. Posso estar dizendo uma grande bobagem. Em caso positivo: desculpem-me. Em caso negativo: qual a originalidade da leitura foucaultiana de Niet? Seria válido você transferir Niet de seu campo para o meu campo e, assim, analisar sua filosofia? Ou, no limite, não temos outra alternativa, pois sempre estaremos entendendo algo dentro de nosso campo? Bem… é algo que me ocorreu. Como o nível está alto neste debate, espero dar alguma contribuição. Nessa última alternativa, teria alguma validade a análise de Luckács… embora ele tenha feito uma leitura “marxista” de Niet, partindo do pressuposto de que nada existe deslocado do contexto social, logo: há que se encaixar as idéias filosóficas no contexto social onde surgiram e, ainda, no atual…

    #79270

    Olá Antonio,

    Não entendi bem o que vc quis dizer com Nietzsche procurando situar o campo do sujeito.Acho que o caso é que Nietzsche constrói sua filosofia através do terreno subjetivo (ou da perspectiva do sujeito).

    Alguem que fundamenta sua filosofia no terreno “social” poderia,por exemplo, considerar valido o fato de alguns individuos serem sacrificados para o bem daqueles que viverão no futuro.No caso de alguem mais voltado para o terreno subjetivo isso seria menos toleravel.

    Claro, não existe (pelo menos pelo q me consta) um filosofo totalmente “social” ou totalmente “subjetivo”, até porque naturalmente esses campos se imbricam.

    Quanto a leitura de Foucault: Para Foucault a “sacada” de Nietzsche foi inventar uma nova ferramenta de interpretação, onde não mais fosse visada os significados ultimos dos signos (pois estes não existem, os signos já são uma interpretação), mas sim sua proveniencia.A pergunta seria então “Quem fala?”.A moral, a linguagem, a estética seriam “estruturas” a serem dominadas.Atraves da historia os valores seriam então transvalorados inumeras vezes, dependendo de “quem interpreta”, algo como uma luta continua.

    Foucault no entanto (segundo a leitura de Scarlett Marton) ignora que Nietzsche introduz um crivo nesses valores.Os valores afinal de contas não se equivalem, alem da questão “quem interpreta” devemos inquirir se o valor em questão é ascendente de vida ou descendente.

    Aqui no site tem uma tese de mestrado sobre Foucault/Nietzsche que trata dessa questão da “morte do sujeito”,caso voce tenha lido e queira explicar algo seria de grande valor. :-)

    Inté Mais!

    #79271

    O que o poema PARAÍSO NIILISTA tem a ver com NIILISMO?

    Existe outro poema que você indique que também tem a ver com NIILISMO?

    Obrigado!

    #79272

    O site da fundação Ferrater Mora colocou afortunadamente a transcrição do verbete do dicionário. O URL é http://www.ferratermora.org/ency_concepto_kp_nihilismo.html
    Outro livro que vi recentemente e contextualiza bem o assunto é o Nietzsche: Civilização e Cultura, de Carlos Alberto Ribeiro de Moura (Martins Fontes). Tem um capítulo somente para a questão do niilismo.

    #79273
    Dämmerung
    Membro

    O que o poema PARAÍSO NIILISTA tem a ver com NIILISMO?   Existe outro poema que você indique que também tem a ver com NIILISMO? Obrigado!

    Eu li um texto de Fernando Pessoa que, ao meu ver, detém uma carga sentimental niilista muito semelhante à qual coompreendo com a sobreposição dos valores atuais: Vivo sempre no presente. O futuro, não o conheço. O passado, já o não tenho. Pesa-me um como a possibilidade de tudo, o outro como a realidade de nada. Não tenho esperanças nem saudades. Conhecendo o que tem sido a minha vida até hoje - tantas vezes e em tanto o contrário do que eu a desejara -, que posso presumir da minha vida de amanhã senão que será o que não presumo, o que não quero, o que me acontece de fora, até através da minha vontade? Nem tenho nada no meu passado que relembre com o desejo inútil de o repetir. Nunca fui senão um vestígio e um simulacro de mim. O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto. Não quero mais da vida do que senti-la perder-se nestas tardes imprevistas.(Livro do Desassossego, 100.,  F. Pessoa)

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