Mitologia da Alemanha
OS NIBELUNGOS
O RENO corre entre risonhas terras de vinhedos, e dizia-se que guardava ouro em seu leito. Entretanto, ninguém fora fazer a experiência, e aquilo mais parecia falatório de velhas crédulas, ou invenção de loucos e jograis. Um ser havia na terra, apesar disso, para o qual aquele ouro era uma obsessão. Tratava-se de um dos anões, chamados NIBELUNGOS, que moravam numa selva próxima do rio, e mostravam-se hábeis em trabalhos de forja. Seu nome era Alberico.
Cobiçava tanto aquele ouro, o anão, que não teve receio de descer ao fundo das águas. Ali estava, com efeito, o ouro sonhado, cuja guarda fora confiada a três ninfas. Não se tratava, realmente, de uma guarda das mais seguras, embora as ninfas não se esquecessem de adverti-lo de que aquele que se apoderasse do ouro obteria o poder, mas nunca seria favorecido pelo amor.
O anão conservou-se firme em seu desejo, apesar da advertência. Conformava-se com a condição, pois preferia o poder.
De posse do ouro, e voltando à sua gruta, Alberico passou a comportar-se como um tiranete. Obrigou seu irmão Mime a fabricar-lhe um elmo que o fizesse invisível e o habilitasse a adquirir diversas formas, bem como a transportar-se num instante de um lugar para o outro. Do ouro do Reno fez um anel, símbolo que lhe devia dar o poder.
Quando os deuses tiveram conhecimento de que o anão roubara o ouro, acabava de surgir ali, exatamente, sério litígio.
Os dois ‘gigantes, Fafner e Fasolt, tinham terminado a construção de um castelo maravilhoso, o Valhala, e por êle Votan, ou Odim (34), deus dos deuses, prometera entregar-lhes Fréia, a deusa da imortalidade, a encarregada de servir maçãs de ouro, aquelas com que os imortais mantêm-se eternamente jovens.
Votan não estava muito disposto a cumprir sua promessa, e recomendara a Loge, deus do fogo, que procurasse alguma coisa em substituição, a fim de obter que os dois gigantes renunciassem a Fréia. Aquele deus, porém, voltou dizendo que nada encontrara que se pudesse igualar a tão formosa criatura.
Foi com satisfação, portanto, que Votan tomou conhecimento do roubo do ouro. Poderia apoderar-se dele e dá-lo aos gigantes, em lugar de entregar-lhes Fréia.
Assim, êle e Loge encaminharam-se para a gruta do nibelungo. Encontraram Alberico, e este falou-lhes, excitado e vaidoso, nas virtudes de seu elmo. Votan e Loge, porém, mostraram-se incrédulos, dizendo-lhe:
— Poderias, por exemplo, transformar-te agora num sapo?
A vaidade perdeu o nibelungo. Produziu a metamorfose pedida, e, imediatamente, o pé de Loge pousou-se sobre o animalzinho. Suplicou êle, inutilmente, que o soltassem. Os outros dois ficaram com o elmo e obrigaram-no a entregar o anel.
(34) Odim é o outro nome de Votan, o primeiro e maior dos deuses escandinavos. Morava em Asgard, cidade celeste, e baixava à terra etraves de uma ponte de três cores, que os homens chamavam arco-íris. Dos seus três palácios, o Valhala era o maior e melhor, moradia deliciosa, onde se reuniam as almas dos heróis mortos no campo da honra. Eram seus filhos: Bálder, deus da eloqüência e do saber, Tir, o da coragem, e Tor, o mais valente.
Possuído de cólera tremenda, Alberico exclamou: — Maldito seja esse anel, e todos quantos o possuírem! Êle levará a desgraça a quem o usar! Seu poder mágico voltar-se-á contra os que dele esperam utilizar-se em benefício próprio!
Votan mandou chamar os gigantes e ofereceu-lhes todas as riquezas que o nibelungo havia acumulado, valendo-se do anel, contanto que renunciassem a Fréia. Eles aceitaram, com uma condição: tais riquezas deveriam ser em quantidade tal que cobrissem totalmente Fréia, da cabeça aos pés.
Os tesouros foram sendo empilhados, e Fréia ficou, realmente, de todo rodeada por eles. Inclusive o elmo mágico ali estava. Votan havia reservado para si apenas o anel, mas, como por uma pequena fresta ainda era possível ver a deusa, até isso êle foi obrigado a entregar.
Passou assim o anel para a mão dos gigantes, mas em má hora para eles, pois assim que dele se apoderaram tiveram início as provas de que a maldição de Alberico seria cumprida exatamente. Com efeito, na ocasião de repartir o tesouro que Votan lhes entregara, os dois gigantes desentenderam-se, começaram a brigar, e a briga de tal maneira acirrou-se, aquecida pela ambição e pelo ódio a ela conseqüente, que Fafner veio a matar Fasolt.
O anel voltou ao poder de Votan, mas aquele deus, compreendendo que à jóia estava ligado um malefício, resolveu que êle ficasse no bosque, guardado pelo gigante homicida, ao qual transformou em dragão.
Logo depois, Votan, com sua esposa, Friga, mudou-se para o Valhala, recentemente construído.
Votan tinha filhas — as Valquírias — deusas de inefável beleza, coração forte e nobre proceder, cuja incumbência era acompanhar até o Valhala as almas dos mortos que iam entrar para o serviço pessoal de seu pai.
Também a dois mortais Votan dera o ser: Sigismundo e Sigilinda, que tinham sido separados um do outro desde pequeninos. Sigilinda casara-se com Hunding, guerreiro de costumes bárbaros e maneiras brutais, que a levou a morar numa cabana rústica, no meio do bosque. Essa cabana estava construída em torno de uma árvore, em cujo tronco, desde tempos imemoriais, havia uma espada cravada.
Sigismundo, por sua vez, levava existência de constante agitação. Ao fim de alguns anos resolveu procurar repouso no bosque, e dirigiu-se exatamente para aquele em que morava sua irmã. Ali chegado, em uma de suas peregrinações através das árvores encontrou a cabana de Hunding e Sigilinda. Os irmãos não se reconheceram, mas as imagens de dragão, que em certos momentos parecem refletir-se nas pupilas deles, desde seu nascimento, terminam por identificá-los.
Sigilinda, desde o momento em que reconheceu o irmão, já não consegue mais suportar a companhia de Hunding. Dá-lhe, então, uma beberagem que o mergulha em profundo sono, e incita Sigismundo a arrancar a espada da árvore, com o que ficará ela em condições de acompanhá-lo. O irmão faz o que lhe pede Sigilinda, e ambos fogem dali.
Hunding, despertando, compreende logo tudo quanto se passou, e corre em perseguição de sua desleal esposa. Entre êle e Sigismundo vai haver uma luta, cujo resultado não é indiferente ao Valhala, pois que se relaciona com a sorte do célebre anel arrancado por Alberico ao fundo do Reno, e sobre o qual pesava a maldição do nibelungo.
Votan deseja a vitória de seu filho Sigismundo, mas Friga, sua esposa, está revoltada com a ilícita separação de Sigilinda. Quer que o irmão dela seja castigado, e o deus dos deuses não se atreve a negar-lhe isso. Recomendara à valquíria Brunilda que auxiliasse Sigismundo, mas, por fim, êle próprio dificulta o cumprimento de sua ordem.
Começa a luta, e a espada que está nas mãos do filho de Votan quebra-se contra a lança de Hunding.
Brunilda, desesperada, pede conselho às outras valquírias, e elas resolveram levar Sigilinda para o bosque onde está o anel de ouro, e onde nem Votan nem os demais deuses podem entrar.
Ali chegando, Sigilinda recebeu de Brunilda os pedaços da espada de seu irmão.
— Deves dá-los a teu filho, pois êle tornará a compô-la — disse-lhe a valquíria. — Neste bosque hás de dá-lo à luz, e êle se chamará Sigefredo.
O anel de ouro permanecia no bosque encantado. Votan ali o deixara na esperança de que chegasse o predestinado, que o recolheria e o devolveria à sua origem, ao fundo do rio, ao seio da Natureza, fora da qual a jóia só servia para despertar toda a sorte das mais terríveis paixões e arruinar a paz entre os deuses e os homens.
O dragão guardava-o zelosamente, e assim passaram-se anos e anos. Entretanto, todos quantos conheciam a existência do anel não conseguiam esquecê-lo, pois êle lhes envenenara o coração.
O bosque é um lugar cheio de tocaias, de olhos que a todo o momento observam o dragão, que espiam os movimentos dele e querem adivinhar qual é seu ponto vulnerável. Sente-se rumor surdo de passos, estalar significativo de galhos. Quem ali penetrasse teria a sensação de que atrás de cada árvore podia haver um ouvido atento, e entre as moitas punhais assassinos, dispostos a tudo.
Sigilinda tinha sido deixada ali pelas valquírias, e depressa nunca mais ninguém a viu.
Ao cabo de muitos anos o bosque apresentava um hóspede insuspeitado: um homem jovem, vigoroso, altivo, audaz. Era como que um raio de esplendoroso sol naquela densidade de sombras que guardavam segredos profundos. Para êle, o bosque era permanente oferenda, e magnífica, apresentada a seus braços e mãos, colocadas junto à sua boca. Havia ali ursos e cervos para que êle os perseguisse, e aves, que eram alvos difíceis para suas flechas, e árvores gigantescas sobre as quais êle subia, arroios de água fresca onde saciava sua sede ou gozava as delícias de um banho confortador.
Êle ignorava quem era, e morava com um homenzinho defeituoso, um anão, de caráter mau, que não podia ser seu pai, já que os filhos dos animais seguiam fielmente a forma daqueles que lhes tinham dado o ser. E êle não era anão, aquela cabeçorra asquerosa não se reproduzia na sua. Perguntou ao anão:
— Quem era tua mãe?
O anão respondeu que ela já morrera. Mas as mães dos animais morrem ao dá-los à luz? O anão preocupava-o. Tinha uma forja, e passava o dia inteiro fazendo espadas. Qualquer delas serviria para ferir, cortar, atravessar corpos de animais, mas o anão atirava-as para o canto, com gesto mal-humorado, assim que acabava de fazê-las. Que pretendia êle? As interrogações iam amontoando-se na cabeça do jovem, até então despreocupada.
O próprio bosque, que êle outrora tão ingenuamente gozara, transformara-se num motivo de inquietação. Por que estava ali? Por que, se cada animal vivia entre seus semelhantes, êle não tinha com quem comparar-se?
Freqüentemente, acreditava ouvir, no canto de uma ave, no murmúrio de um manancial, algo diferente de simples manifestação da sua alegria de viver. Parecia-lhe que lhe diziam alguma coisa, que aves, feras e águas sabiam de alguma coisa que a galharia espessa lhe ocultava.
Azucrinava o anão com perguntas, mas aquele respondia sempre com evasivas, até que um dia o levou, com rosto preocupado, até um recanto da gruta e mostrou-lhe uma espada em pedaços. Contou-lhe, então, uma história comprida.
Aquele anão era Mime, o nibelungo irmão de Alberico, e o jovem era Sigefredo, filho de Sigilinda, que morrera ao dá-lo à luz.
Mime raptara a mãe, com o fim de que o filho, destinado como estava a realizar grandes façanhas, se apoderasse do anel. Isso, porém, só se poderia fazer valendo-se da espada que Sigismundo quebrara contra a lança de Hunding. Aquela mesma espada em pedaços, que Mime apontava agora a Sigefredo e a qual, não tenho podido recompor, tentara durante tanto tempo imitar.
Com a explicação de Mime tudo adquiriu para Sigefredo um sentido novo, um sentido que diferia completamente do de sua vida anterior. Via-se chamado a uma alta empresa, a êle destinada pelos deuses, antes mesmo dos tempos. Conheceu, finalmente, seu Destino.
O que o anão durante anos não conseguira, foi, para Sigefredo questão de momentos. A espada ficou reconstituída, e o coração do jovem enchia-se de prazer só de contemplar-lhe o brilho. Além disso, ela era grande, afiada, poderosa.
Com ela foi Sigefredo em busca do dragão. Toda a selva estava cheia de rumores, como o de um hino dedicado àquele que ela esperava e que devia libertá-la de seu encantamento de tantos anos.
Subitamente, porém, fèz-se absoluto silêncio. Mime, que tinha conduzido Sigefredo até aquele momento, não quis continuar.
— Adianta-te sozinho — disse-lhe.
Sigefredo deu uns passos, obedecendo. Afastou uns galhos, e, então, fauces enormes, rubras e espumantes, e o olhar sanguinolento de olhos exorbitados, apareceram ante ele. Estava enfrentando o dragão.
Sem vacilar, Sigefredo foi colocar-se diante dele, brandindo sua espada. Tomou fôlego, deu uma pequena corrida, e meteu-lhe o ferro pela boca, atravessando-lhe a garganta e indo cravar-lhe a ponta no coração, derrubando a fera, que tombou, vencida.
Antes de apanhar o anel, Sigefredo bebeu um pouco do sangue do monstro. Depois, apanhou a jóia mágica e o elmo que fazia invisível aquele que o usasse.
Ia ter com o anão, quando uma ave, pousada num galho, dirigiu-lhe a palavra:
— Não confies em Mime, não confies em Mime.
Este o esperava, o rosto radiante.
— Estás suando, cansado, precisas recuperar tuas forças. Bebe desta água prodigiosa — disse êle, oferecendo uma taça ao jovem.
Nada mais pôde dizer. Sigefredo descarregou a espada sobre a cabeça aêle, dividindo-a ao meio. A taça rolou pelo chão, derramando o líquido que continha. Tratava-se de uma beberagem venenosa, que teria provocado a morte instantânea do jovem.
A ave foi acompanhando o herói, de galho em galho. Fala-lhe, agora, de Brunilda, a adormecida, encerrada num círculo de fogo: a que lhe estava reservada, se êle se atrevesse a cruzar tal barragem ígnea. A própria ave o acompanharia até a rocha onde ela jaz, há muitos e muitos anos.
O fogo traçava uma auréola de chamas em dança frenética. Levantavam-se com o dobro da altura de um homem e lançavam tamanho brilho e calor que seria impossível alguém acercar-se dela, mesmo a muitos metros de distância.
Ainda assim, Sigefredo avança para as chamas, e cruza-as, impertérrito. Nãò temera o dragão, nem o fogo. Por que, pois, agora as pernas lhe tremem e seu pulso se acelera?
Brunilda ali aparecia, deitada, branca, formosíssima. Pela primeira vez, uma mulher surgia diante dele.
Estava profetizado: "se um mortal beijar-te tu te tornarás de sua mesma condição". "Eu sou tu próprio" — disse ela, ao seu libertador. E também: "Desde sempre te amei". Mas teria preferido que seus lábios não se encontrassem. Era, porém, querer o impossível. Sigefredo soube o que era a paixão. E ela, dali por diante, iria conhecer a doença, a velhice e a morte.
Como Mime, Alberico tinha estado espionando pelo bosque do anel de ouro, mas sem conseguir aproximar-se tanto da posse dele quanto estivera seu odiado irmão.
Morreu com aquela dor, mas a obsessão do anel se conservava intacta em seu filho Hagen, que era, se possível, ainda mais cruel do que o pai.
Hagen tinha maquinado um plano diabólico para apoderar-se da cobiçada jóia. Para isso, servia-se de dois irmãos, que com ele moravam: Gunther e Gutruna.
Sigefredo e Brunilda moraram durante alguma tempo na gruta em que vivera Mime. Ali gozaram as delícias de um amor correspondido e verdadeiro, mas chegou a ocasião em que a própria valquíria compreendeu que não devia retè-lo na ociosidade de uma vida retirada e doméstica. Incitou-o, inclusive, a tomar seu cavalo e a empreender as façanhas a que estava destinado.
O herói entregou-lhe o anel, como prenda de amor, e partiu, levando o cavalo e o escudo dela, e o elmo que o fazia invisível.
Em seu caminho pelo bosque, Hagen e Gunther saíram–lhe ao encontro. Mostraram-se como amigos que desejam prestar auxílio, e Sigefredo aceitou-lhes o convite para passar
com eles uma noite, ficando, entretanto, vários dias. Gunther era jovem, e depressa os dois fizeram-se camaradas, e tanto que chegaram a celebrar o Pacto de Sangue, -que consiste em jurar fidelidade mútua, misturando, como selo dessa amizade, o sangue de ambos.
Hagen se regozijava com tudo aquilo. Seus planos caminhavam lindamente, e, para completá-los, fez com que Gutruna oferecesse a Sigefredo uma beberagem que o levasse a esquecer Brunilda.
Tanto efeito produziu o filtro que Sigefredo não podia recordar nada do que se passara posteriormente à morte do dragão. Brunilda ficava totalmente nas trevas de um passado que se apagara em sua memória. E, assim, enamorou-se de Gutruna.
Hagen traçara seu plano e ia realizando-o de maneira implacável. Fez com que Gunther dissesse que estava apaixonado por Brunilda. Sigefredo não só não se ofendeu, como se ofereceu para ir, pessoalmente, obtè-la, e trazê-la para seu amigo. Para tanto, usaria de um processo que consistia em adotar o aspecto de Gunther, mediante a intervenção do elmo mágico.
Apresentou-se, pois, diante de sua antiga amada, que sentia imenso pavor. Usava Brunilda o anel que nela reforçava a lembrança de Sigefredo, mas a chegada de um estranho com o elmo que o outro levara ao partir, desconcertou-a ao extremo. Deixou-se levar para a casa de Hagen. Uma vez ali descobriu a atroz mistificação. O próprio Sigefredo fingira ser Gunther, para levá-la aos braços do amigo!
Sua primeira reação foi um grito aos deuses, pedindo-lhes justiça. Mas como viu que Sigefredo agia sem nada compreender, jurando com a maior tranqüilidade que jamais atraiçoara as pessoas com as quais estava ligado, isto é, Gunther e sua irmã, percebeu Brunilda que ele era sincero, ao afirmar não conhecê-la, e que algo de misterioso e profundo havia em tudo aquilo.
Enquanto tudo isso se passava, a conspiração de Hagen continuava, preparando-se para um desenlace que seria fatal a alguém.
Organizou ele uma caçada, à qual deviam assistir Sigefredo e Gunther. Inteirara-se de que o primeiro era invul-
nerável em todo o corpo, a não ser em certa região das costas. Tudo dependia de esperar o momento propício para apunhalá-lo.
A caçada decorreu agitadamente. Ao meio-dia, os homens repousavam, enquanto o seu jantar era preparado, Hagen colocara-se por trás de Sigefredo, que se mostrava animado, com disposição para a conversa. Contava êle sua vida a partir de quando soube da existência do dragão, e falava em como chegou a matá-lo. Agora relataria o momento em que conhecera Brunilda. Hagen esperava, impaciente, e Gunther ia fazendo-se sombrio.
Nessa altura, Hagen espreme o suco da recordação na taça do herói, e êle lembra-se da conquista de Brunilda. Imediatamente, dois corvos levantam vôo, de um arbusto próximo.
— Entendes a linguagem das aves? — pergunta Hagen a Sigefredo.
O jovem levanta-se para vê-las, e um punhal vem cravar-se, à traição, em suas costas, brandido pela mão de Hagen. Gunther atira-se sobre o amigo moribundo, e ainda consegue recolher-lhe a última palavra: "Brunilda!"
Hagen também quer atirar-se sobre o cadáver, com a intenção de arrancar-lhe do dedo o cobiçado anel, mas Gunther corta-lhe o passo. Brigam, os dois, e nesse momento ouve-se um cavalo que chega. Quem o cavalga é Brunilda. Vai, solenemente, para junto de Sigefredo, e contempla-o durante muito tempo. Depois, ordena que levantem uma pira. Coloca sobre ela o cadáver, e acende o fogo. Quando as chamas alcançam bastante altura, a própria Brunilda atira-se entre elas.
O fogo cresce de forma desmesurada, e nuvem negríssima de fumo eleva-se, tendo Loge, mesmo lá no alto, no mundo dos deuses, rodeado com seus braços ardentes o próprio Valhala.
Esboroam-se as paredes poderosíssimas, o esplêndido trabalho dos tetos esculpidos, as arcadas e os pavimentos de material precioso. As magníficas torres despedaçam-se, como que feitas de palhas frágeis. Cúpulas douradas, imensas, racham e se desagregam, transformadas em pó. Dentro, os deuses queimam-se no mesmo fogo que envolve Sigefredo e Brunilda.
É o fim de tudo: a última conseqüência da soberba sem limites, da avidez de riqueza e poder.
Embaixo, na terra, a pira dos dois amantes já se extinguiu. Dela só existe um rescaldo entre branco, avermelhado, e côr de fuligem. Nele, apenas um pequenino objeto se destaca, fortemente iluminado pelo derradeiro fulgor: é o anel. Seu brilho conserva-se bem claro, durante toda a noite.
Ao amanhecer, algumas brasas ainda vivas soltam suas últimas fagulhas. Não se apagam sozinhas. Água, vinda não se sabe de onde, vai aos poucos cobrindo os restos do braseiro.
É a água do rio. Sim, a água do Reno, que vem buscar seu ouro. Do Reno, que devolve à natureza o que jamais lhe deviam ter tirado.
Fonte: Maravilhas do conto mitológico. Adaptação de Nair Lacerda. Cultrix, 1960.
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