A RIVALIDADE ANGLO-FRANCESA, A POLÍTICA COLONIAL E O ESPÍRITO FILOSÓFICO

História da Civilização – Manoel de Oliveira Lima

Idade Moderna. CAPÍTULO IV

A RIVALIDADE ANGLO-FRANCESA, A POLÍTICA COLONIAL E O ESPÍRITO FILOSÓFICO

Características político e social do século XVIII. Formação do império colonial britânico

A história européia do século XVIII distingue-se, politicamente pela formação do império britânico e socialmente pelo advento na França da idéia de igualdade, sem a qual a democracia não passa de uma palavra vã. O crescimento colonial da Inglaterra operou-se às custas da França, como a sua organização em grande potência se fizera às custas da Espanha e Portugal. Das descobertas ibéricas veio ela a colher o fruto opimo, disputando-o primeiro com seus corsários, depois com sua marinha real. Se esse fruto não foi propriamente o territorial, foi o senhorio dos mares. O senso prático dos governantes britânicos cedo percebeu que a condição insular, em vez de constituir uma inferioridade, representava uma vantagem, contanto que lhe correspondessem os meios de garanti-la. Para isto era mister não consentir da parte das potências continentais qualquer superioridade naval, nem tolerar nas costas dos Países-Baixos o estabelecimento de uma nação de primeira ordem. A ameaça da Invencível Armada, completada como fora projetado pela invasão do solo britânico por uma expedição comandada por Alexandre Famésio e partida do Escalda, dera o sinal de alarma para os séculos a vir.

Com a Espanha a luta só aparentemente fora religiosa; de fato era a primeira das lutas econômicas pelas quais a Inglaterra iria firmando seu poderio. Com a França, cuja ambição nunca deixa de ter uns toques levianos, foi que se revelou por inteiro calculista a sua rival. Uma vez que a Inglaterra teve preparados todos os meios de expansão colonial, concebeu a urgência da guerra oceânica para conquistar os mercados necessários à sua indústria e comércio, ambos de vento em popa. Escreve Driault que a França entrou na guerra dos Sete Anos por efeito de incoerentes negociações diplomáticas, ao passo que a Inglaterra entrava nela por virtude de um plano maduramente concebido, em que a Prússia lhe serviu de instrumento precioso. O capitão, depois almirante Mahan, autor do famoso livro The Sea power in hisiory, apesar de todo o seu fervor anglo-saxônico, não esconde que a Grã-Bretanha edificou sua grandeza sobre as ruínas dos seus inimigos e também dos seus amigos, uma vez que lhe fizessem concorrência.

Da aliança com Portugal, iniciada no século XIV, resultou com efeito a ruína das indústrias portuguesas. Pelo tratado celebrado em 1703 por lorde Methuen, reinando D. Pedro II, a troco de uma redução nos direitos sobre os vinhos portugueses, as mercadorias britânicas tiveram entrada livre no reino, o qual assim se tornou para slas um mercado privilegiado. As indústrias na Inglaterra tinham-se desenvolvido sob a égide de uma pauta aduaneira proibitiva depois que as fundaram artífices estrangeiros, suprindo a deficiência da sua mão-de-obra. Foram na verdade artífices flamengos, alemães e franceses que ensinaram à Inglaterra as artes industriais da fiação de tecidos, dos panos finos, da mineração, dos artigos de ferro,das máquinas e da tinturaria, tudo aquilo de que ela depois se soube servir para angariar riqueza à sombra das suas esquadras, anexando territórios e conquistando saídas para sua produção manufatu-reira.

O constitucionalismo inglês. Rei e primeiro ministro

Na Inglaterra do século XVIII, andou o governo confiado a uma aristocracia de moralidade duvidosa e hábitos grosseiros porém sagaz e previdente em política, a qual ia sempre renovando seus quadros pela incorporação de novas capacidades. Essa aristocracia, so-bretudo whig até Jorge III, quando os toríes, simpáticos aos Stuarts, viram no trono um monarca com vontade própria e disposições para fazê-la prevalecer, foi um fator decidido da obra da elevação bri-tânica. A realeza nunca mais deixara de ser constitucional. O alheamento dos dois primeiros Jorges dos negócios públicos ingleses, mercê da sua ignorância até da língua da terra sobre que tinham sido chamados a reinar e à qual sempre preferiram o seu Hanover, favoreceu singularmente a extensão da autoridade do primeiro ministro. Quando Jorge III quis reagir, já era tarde: o primeiro minis-tro foi-se gradualmente convertendo no verdadeiro soberano, dominando o Parlamento do qual é aliás o gabinete a expressão, impon-do-se à coroa pela confiança da maioria da representação.

Sir Robert Walpole

Essa maioria era porém, então, o fruto por excelência da corrução eleitoral. Sir Robert Walpole por vinte anos se sustentou no poder (1721-1742) à custa de processos pouco edificantes, comprando votos e consciências. Êle foi entretanto um fautor importante da pros-peridade material da Inglaterra, indicando ao país desde a fala do trono de 1721 à necessidade de estender o comércio britânico por todo o mundo, aproveitando as circunstâncias que tanto o vinham favorecendo desde a decadência, no Mar do Norte e no Báltico, da Hansa germânica prejudicada pelas guerras de religião, e no grande Atlântico das nações ibéricas, da Holanda e por fim da França.

Chatham

Tudo, inclusive as guerras continentais do século XVII, fatais para as indústrias, ajudou a boa fortuna do capitalismo britânico que, ao chegar o momento preciso, entrou a fabricar e a vender mais barato, afastando toda concorrência, porque seu aparelho econômico fôra montado para esmagar, e as suas ramificações por toda parte se estendiam. Quem mais ainda do que Walpole encarnou a nova Inglaterra nas suas aspirações utilitárias e também nas suas liber-dades políticas — os direitos de reunião e de palavra nos comícios e nos clubes, de imprensa e outros que constituem os usos da liberdade — foi o grande commoner William Pitt, depois lorde Chatham, cuja palavra acendia as energias e que foi primeiro ministro de 1757 a 1761, os anos de destruição do império colonial francês.

A decadência francesa

A França fora constantemente baixando de nível político à medida que subia a maré da imoralidade. A regência do duque de Orléans — que durou de 1715 a 1723 — foi escandalosa com seu ministro, cardeal Dubois, e durante o reinado de Luís XV, que terminou em 1774, miséria e corrução andaram emparelhadas em marcha vertiginosa, governando a França as favoritas reais, uma das quais, a Pompadour, tinha a paixão da política e dava ordens a ministros de certo valor como Choiseuil.

A Inglaterra e o equilíbrio europeu

Ligando-se a algumas das potências continentais contra outras, sempre no intuito de destruir alguma que se avantajasse consideravelmente às demais, a Inglaterra soube valer-se muito das forças continentais para promover seus interesses especiais: Marlborough, por exemplo, comandava tropas mais alemãs do que inglesas. Nenhuma nação lucrou tanto com a fórmula política do equilíbrio dos Estados, pela qual não devia caber a preponderância a um só. O resultado fora que cada qual tratava de romper o equilíbrio para implantar seu predomínio, sem que jamais todos se combinassem para assegurar a decantada equivalência. Daí a necessidade de guerras continuadas, mesmo porque para que semelhante primado pertencesse à Ingalterra, era indispensável que a Europa nunca atravessasse uma quadra de paz e de prosperidade tais, que outras nações, que não a britânica, pudessem organizar a sério seu poder marítimo. O equilíbrio representava um ideal político e não. uma doutrina correspondente à realidade ou a ser posta imediatamente em prática.

As vantagens britânicas

Entre os elementos que davam vantagem à Inglaterra nessa luta pela vida, tanto mais intensa e trágica entre as nações que entre os indivíduos, conta-se a sua capacidade mercantil, que faltava no mesmo grau aos outros países de expansão. Também o século XVIII foi na Inglaterra o de um pasmosa revolução industrial, em virtude da qual as artes industriais galgaram em dezenas de anos um progresso de muitos séculos. Três inventos contribuíram particularmente para a transformação da manufatura dos tecidos: o fuso mecânico de Hargreaves (1676), o tear de Cartwright (1785) e a máquina a vapor de James Watt (1785) que se diz haver permitido à Grã-Bretanha resistir à pressão napoleónico e sustentar as guerras que a libertaram desse pesadelo.

Com o seu espírito de negócios, a Inglaterra, onde não podia entrar dominando, entrava mercadejando. No século XVIII ela era a maior traficante de escravos e pelo Tratado dei Asiento, incorporado nos Tratados de Utrecht e firmado com a Espanha (1713), coube-lhe o exclusivo do tráfico negreiro para as colônias espanholas, bem como o privilégio de expedir anualmente um navio de 500 toneladas carregado de mercadorias inglesas para a grande feira de Portobelo, na América Central, onde se dava o intercâmbio da metrópole com suas possessões. Esse navio convertia-se num verdadeiro entreposto, renovando sem cessar o seu carregamento com as mercadorias que outros navios ingleses iam buscar à Jamaica e São Domingos. Era o verdadeiro tonel das Damaides. Assim entrou a Inglaterra a participar do comércio legal do Novo Mundo, e onde não mercanciava, apossava-se. Na guerra de Sucessão da Espanha ficou-lhe um salde em presas do valor de 2 milhões esterlinos e, antes de declarada a guerra dos Sete Anos, já os ingleses tinham capturado, só na Baía de Biscaia, 300 embarcações mercantes francesas.

Guerra da Sucessão da Áustria

A Inglaterra combateu ao lado de Frederico Magno quando lhe descobriu o grande valor militar, e que instrumento precioso podia ser o seu gênio estratégico. A princípio pelejara contra êle na guerra da Sucessão da Áustria (1740-1748).

No mesmo ano em que subiu ao trono Frederico, falecia o imperador Carlos VI, deixando como herdeira dos seus domínios integrais hereditários, a saber, os reinos da Hungria e Boêmia, o arquiducado da Áustria, etc, sua filha Maria Teresa. A lei de sucessão austríaca excluía as mulheres do trono, mas, antes de falecer, o monarca a revogara pela chamada Pragmática Sanção, que a Europa reconheceu como deliberação afetando a economia interna de um Estado soberano.

Não obstante esse reconhecimento, surgiu uma chusma de pretendentes aos territórios legados à arquiduquesa e Frederico, mais expedito do que o eleitor da Baviera, que se fêz coroar imperador em Francfort — dignidade que teve depois de abandonar — em 1741 ocupou a Silésia, defendeu-a e nunca mais a devolveu. Foi uma conquista cínica, mas não única. Uma vez mais se generalizou a guerra, ajudando a Inglaterra, a Holanda e a Sardenha, e também a Rússia, a causa de Maria Teresa que a Hungria estava sustentando galhardamente contra a Prússia, a França e a Baviera. A Prússia contudo abandonou a partida logo que a sua conquista lhe foi assegurada, e garantida ficou mesmo depois que a paz de Aquis-grão, em 1748, fêz retornar a situação territorial dos beligerantes ao que era antes do rompimento, com exceção de uns ganhos do Piemonte (ou Sardenha, que era o título usado pela Casa de Sabóia) no Norte da Itália.

Intervalo diplomático

Maria Teresa, entretanto imperatriz da Áustria e partilhando seu trono com o duque Francisco de Lorena, não se conformou porém com o esbulho e durante oito anos preparou contra a Prússia, rival que se levantava dentro mesmo da Confederação Germânica, uma coalizão em que entravam a França, a Suécia, muitos Estados alemães e a Rússia. O século XVIII pode dizer-se o século áureo da diplomacia, se por diplomacia se deve entender a arte de enganarem-se os governos uns aos outros ao sabor das conveniências do momento político. E a tal apuro e perfeição se levou essa arte, que dentro mesmo de cada país se opunha manejo contra manejo. Os ministros combinavam certa política com seu soberano e neste sentido davam instruções no estrangeiro, não sendo no entanto para sur-preender que o soberano clandestinamente os contrariasse e fomentasse planos diversos dos assentados. O duque de Broglie descreveu numa obra memorável a ação dessa contradiplomacia que êle denominou le secreí du Roi. El-rei D. João IV de Portugal, um século antes de Luís XV chegara a empregar o famoso jesuíta Antônio Vieira em missões secretas, cujo alcance se dissimulava aos próprios embaixadores do país, os quais ficavam ipso íacto sujeitos a uma fiscalização suspicaz de quem era portador e executor do fiel pensamento do monarca. Poder-se-ia chamar a essa a diplomacia secretíssima.

A guerra dos Sete Anos. Estratégia de Frederico II

A guerra que se seguiu àquela urdidura diplomática foi a chamada guerra dos Sete Anos por ter durado de 1756 a 1762, e foi a Prússia quem sustentou o maior peso das campanhas, mas os resultados mais vantajosos foram os da Inglaterra, que soubera habilmente jogar a partida da qual devia sair a liquidação do patrimônio colonial francês. Frederico II colheu entretanto valiosos louros porque foi forçado a exibir todos os seus talentos militares, que eram de primeira ordem. Sua estratégia, que Napoleão, seu discípulo, mais tarde firmaria, consistia em iniciar a agressão pela invasão do território inimigo e em bater separadamente os adversários, quando eram vários, obstando a todo transe a que eles lograssem congregar suas forças para úm golpe decisivo.

Já na guerra da Sucessão da Áustria, Frederico II operara com felicidade um movimento dessa natureza quando se lançou sobre a Boêmia, obrigando os austríacos a evacuarem a Alsácia que pretendiam arrancar à França juntamente com a Lorena. A Inglaterra chegara a isolar a sua grande rival, desligando-se a Prússia da coalizão pelo Tratado de Breslau, mas a França fê-la retomar as armas e, graças à diversão executada por Frederico, o exército anglo-ho-landês foi batido em Fontenoy (1745) pelo marechal Maurício de Saxe, filho natural do rei da Saxônia e comandante das forças francesas. O rei da Prússia, cansado de arcar sozinho com a guerra na Alemanha, fêz de novo a paz em Dresde reconhecendo como Imperador Francisco I, o consorte de Maria Teresa. A França ficou em campo apenas para conquistar um tratado, na expressão da Prévost-Paradol.

Suas campanhas

Por ocasião da guerra dos Sete Anos, o golpe dado por Frederico II foi na Saxônia, que invadiu, tomando Dresde e derrotando os austríacos (1756). O fito dos tratados secretos celebrados era a partilha da Prússia entre os aliados, como antes o fora a partilha da Áustria e depois o seria a partilha da Polônia. As partilhas estavam em moda como nunca. Frederico sustentou por assim dizer, com o seu gênio, — o que um historiador apelida a elasticidade dos seus recursos — a luta contra mais de metade da Europa, porque sua aliada britânica mais se ocupou com o que lhe importava, que era a França no ultramar. A guerra dos Sete Anos custou a vida a um milhão de homens.

Em 1757 Frederico invadiu a Boêmia; vitorioso a princípio, foi depois derrotado em Kolin pelos austríacos e aí começou uma série de infortúnios: a Silesia devastada, os russos entrando por leste, os suecos pela Pomerânia, os ingleses batidos pelos franceses no Ha-nover e ameaçando a Saxônia. A doença da imperatriz Isabel da Rússia deteve a marcha do seu exército, chamado para trás, e Frederico aproveitou o ensejo para precipitar-se outra vez sobre a Saxônia com 20 000 homens apenas e ganhar sobre o exército austríaco-francés, três vezes maior, a batalha afamada de Rossbach, infligindo nova derrota aos austríacos em Leuthen, na Silesia, e recuperando esta província (1757).

Os russos, que tinham sido batidos em Zomdorf, voltaram em 1759 e por sua vez bateram os prussianos em Kunersdorf. Dresde foi retomada pelos austríacos e um exército prussiano de 20 000 homens foi empurrado para os desfiladeiros da Boêmia, onde teve que capitular. Em 1760 Frederico via-se cercado por forças que se elevavam a 200 000 homens. Com um arranco desesperado ganhou a batalha de Torgau, que salvou a monarquia prussiana da destruição, mas faltavam-lhe os meios de empreender a ofensiva e teve que permanecer no seu campo fortificado no coração da Silesia até que a morte de Isabel da Rússia veio muito oportunamente, no raiar de 1762, modificar a situação em seu favor. O novo imperador, Pedro III, primo da defunta soberana e casado com uma princesa de Anhalt que foi Catarina II, era amigo de Frederico e, em vez de hostilizá-lo, mandou-lhe até reforços. Seu assassinato no decorrer do mesmo ano não mais alterou as condições, tendo-se Catarina declarado pela neutralidade e deixando também de pelejar a Suécia, à qual a Prússia fechara o acesso da Alemanha e que fora ela própria objeto de uma tentativa de partilha entre a Rússia, a Dinamarca e a Polônia, de que a livrara Carlos XII. 3

A paz de 1763 e a de 1764. A posição da Prússia

Em 1763 a Inglaterra e a França firmavam a paz em Paris, com • o resultado de que a América do Norte seria anglo-saxônica e não latina, e no ano imediato a Prússia, tendo recobrado vantagem, celebrava com a Áustria a paz de Hubertsburgo que lhe assegurava a igualdade enquanto não vinha a supremacia. Frederico Magno, que herdara um reino de 2 milhões de habitantes e um tesouro de 6 milhões de tálers, deixou ao falecer, em 1786, territórios com uma população superior a 6 milhões — população contente e feliz no dizer de um historiador americano — e 72 milhões de tálers no erário. Longe de mostrar tendência à prodigalidade, o que não seria para estranhar em quem fora criado a meio de rigorosa poupança, Frederico II agregava a uma excepcional competência militar, q espírito burocrático peculiar aos príncipes da sua casa e que lhes dá na paz a clara visão das necessidades da administração. De resto a corte prussiana, cultivando muito embora a etiqueta, nunca sacrificou ao fausto, antes conservou sempre sob as pompas da realeza certa singeleza guerreira.

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A Espanha sob os Bourbons.

A Espanha sob os Bourbons não se resignara facilmente a um papel apagado e passivo que jamais fora o seu, mesmo quando com Filipe III entrara em decadência política. De Filipe IV, que fora pela lisonja denominado o Grande, até se dizia que lembrava um poço porque quanto mais terra se lhe tirava mais crescia. Filipe V, rei de 1700 a 1746, era de uma natureza inerte e ralavam-no as saudades da corte do avô: o palácio de Santo Ildefonso, na Granja, foi um ensaio de reprodução do esplendor arquitetônico de Versalhes. Sua segunda esposa, Isabel Farnésio, era porém uma mulher ambiciosa e resoluta, que pretendia que seu filho Carlos não ficasse também sem um trono, e seu primeiro ministro, o cardeal Alberoni (1664-1752), era um italiano de grandes projetos e de abundantes recursos, temperamento trêfego e flexível que imaginara, depois de Utrecht, reconquistar diplomaticamente para o seu soberano uma alta situação européia, ocupando a regência da França, ao mesmo tempo queà Espanha se devolviam suas possessões italianas.

Os projetos de Alberoni

Alberoni jogava, para distrair a atenção da Áustria, com uma invasão turca, e para arredar a Inglaterra, com uma tentativa do pretendente Stuart, Carlos Eduardo, cujo prestígio ainda daria para fomentar uma rebelião na Escócia e bater o exército inglês. A vitória porém do príncipe Eugênio sobre os otomanos e uma aproximação entre a França e a Inglaterra trazida pelo regente duque de Or-léans e pelo seu ministro Dubois, que tanto tinham ambos de astutos quanto de imorais, tinham reduzido a nada aqueles planos de anacrônica megalomania. O pretendente foi afinal vencido em Cul-loden em 1746 e o único resultado prático para a Espanha da política de Alberoni fora meramente dinástico, a saber, assegurar à descendência de Filipe V o ducado italiano de Parma e a Toscana.

A Lorena

Esta passara pouco depois para o duque de Lorena, sendo a Lorena dada como compensação em 1738 a Estanislau Leczinski, rei da Polônia destronado pela Rússia e cuja filha desposara o rei de França Luís XV, que estivera para consorciar-se com a infanta da Espanha. Estanislau tinha sido colocado em 1706 no trono instável da Polônia por Carlos XII quando este monarca venceu Augusto II, ao mesmo tempo que Pedro Magno se apossava da Livônia, da Estônia e da Ingria, a saber, das províncias suecas do Báltico oriental.

Parma e Nápoles. O Pacto de família

O ducado de Parma figurou até a unificação da Itália entre os apanágios da Casa de Bourbon, sendo como tal reconhecido no tratado de paz de 1748 e participando do chamado Pacto de família medíante o qual a França, em 1761, quis ainda opor à Inglaterra vitoriosa uma última resistência. O seu primeiro titular, o infante D. Carlos, mais tarde Carlos III da Espanha, onde reinou de 1759 a 1788, recebera porém em 1738 outro governo que foi o. reino de Ná poles e Sicília, determinando este arranjo de família a cessação da já longa desavença austríaco-espanhola. À França, dirigida pelo car deal Fleury e que com êle obtivera contra os austríacos sucessos militares no Milanês e no Reno, foi concedida eventualmente a Lo rena, para depois da morte do rei Estanislau.

Quão precária era contudo a paz européia nesse fervilhar de ambições, depressa o demonstrou então a conflagração provocada pela sucessão da Áustria, que aliás rebentara num meio já em guerra, pois a Inglaterra em 1739 aproveitara o primeiro pretexto, o da repressão do contrabando inglês no Novo Mundo, para assumir a defesa da liberdade de comércio e procurar destruir a esquadra espanhola, a qual, apesar de secundária, poderia num dado momento contribuir para disputar-lhe o almejado domínio marítimo. Já vimos que não foi outro seu fito senão assegurar essa supremacia nas diferentes lutas que sustentou no século XVIII, século de muitas guerras não obstante constituir uma feição interessante do mesmo o governo de soberanas com a ação preponderante de algumas na política da Europa, ou melhor dito, do mundo.

Governo dos Soberanos.

Logo nos começos do século, de 1702 a 1714, ocupou o trono britânico a rainha Ana, sob cujo cetro a Escócia verdadeiramente se fundiu com a Inglaterra formando a Grã-Bretanha (1707), unindo-se seus parlamentos e estabelecendo-se entre ambas as nações comércio livre, que trouxe à Escócia o direito e com êle a vantagem de entrada nos mercados coloniais ingleses. A Irlanda já fazia sob coação parte integrante da união, mas em 1782 aproveitou-se dos embaraços ingleses na América para reclamar sua independência legislativa e com efeito a alcançou, durante contudo pouco tempo esse primeiro home-rule porque a corrução exercida pelo governo britânico fêz cessar a autonomia irlandesa por meio do ato de União (1800).

A Rainha Ana

Ana era uma princesa sem beleza e sem talento, pesada de corpo e de espírito, sob nenhum aspecto interessante e que entretanto, por ser boa e virtuosa, exerceu salutar influência sobre uma condição nacional de brutalidade e licença de costumes, traduzindo-se entre outras manifestações pelo vício geral da embriaguez e pela zombaria da fé religiosa. Se o seu reinado não mereceu ser adjetivado como as eras elisabetham e vieforian, foi dos mais afortunados da história inglesa e moralmente preparou o terreno para o movimento metodista de 1730, organizado dentro do protestantismo por Wesley e levado a cabo em Oxford, da mesma forma que aí surgiria nos meados do século XIX o movimento neocatólico de Newman e de Manning.

O Metodismo. O abolicionismo

Naquela regeneração do anglicanismo se deve ir buscar a nascente da corrente filantrópica que no final do século XVIII determinou o movimento abolicionista da escravidão encarnado em Clarkson (1760-1846) e Wilberforce (1759-1833) e cujo primeiro triunfo foi, em 1807, a extinção do tráfico que a Dinamarca proibira em 1802.

 

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Imperatrizes russas

Outras soberanas que deixaram recordação perene dos seus feitos foram no século XVIII, além de Isabel Farnésio (1692-1766) e de Maria Teresa (1717-1780), que ambas abalaram tanto a Europa com seus interesses dinásticos, Isabel Petrovna, filha de Pedro Magno, a qual reinou de 1740 a 1762, e as duas imperatrizes que antes dela se sentaram no trono e que foram Catarina I, uma prisioneira da Livônia que o grande monarca desposara, e a sobrinha deste, Ana. As idéias ocidentais implantadas foram cultivadas por essas sucessoras de Pedro Magno até que veio continuar-lhe a obra política uma alemã de gênio, Catarina cognominada a Grande, cuja vida tanto teve de dissoluta quanto de enérgico seu governo. Seus favoritos, Potemkin e Suwaroff, generais felizes, granjearam-lhe louros sem contudo se assenhorearem do seu espírito. Ela pelo contrário os dominava. No seu remado, que durou de 1762 a 1796, os turcos foram batidos, a Criméia de todo conquistada, apagado o último traço do domínio tártaro, o Mar Negro tornado acessível às frotas russas e a Polônia destruída como nação independente.

Catarina II. Os planos de Pedro Magno

Catarina II seguia pois em tudo a orientação de Pedro Magno, o qual, iniciando a ocupação do litoral do Mar Negro, voltando-se para o Cáucaso e estendendo sua fronteira, às custas da Pérsia, até c litoral do Mar Cáspio, apontara os objetivos principais da atividade exterior russa: Bizâncio, o Bósforo e o Mediterrâneo, e por outro lado o domínio da Ásia, que uma potência então obscura, o Japão, se levantaria para disputar-lhe no limiar do século XX.

A lição de Carlos XII

Para ser em tudo um precursor, Pedro Magno indicou à Rússia de Alexandre I o modo de inutilizar o ímpeto napoleónico. Carlos XII declarara arrogantemente, como mais tarde o imperador dos franceses, que só ditaria a paz em Moscou. A estratégia do seu adversário foi simples e eficaz: à medida que se internava, o rei sueco encontrava nos seus passos a devastação e a desolação. Na impossibilidade de superar as privações, dirigiu-se para a Ukraina aonde o convidava o chefe cossaco rebelde Mazeppa. Os russos interceptaram-lhe o comboio e os reforços esperados da Lituânia e a campanha prosseguiu, entre as neves de um inverno tão descaroável que dois mil homens morreram logo gelados quase às vistas do rei, numa antecipação da passagem do Berezina. Foi então que ocorreu o episódio dramático de Pultava. Carlos XII pusera-lhe cerco, sendo ferido; Pedro Magno acudiu a levantá-lo; o rei sueco adiantou-se numa liteira para embargar-lhe a marcha, deixando atrás a artilharia e dando aos canhões russos a oportunidade de decidirem da sorte da batalha. Carlos XII só logrou congregar em redor de si para a retirada trezentos homens. Logo depois, pelo tratado que se seguiu à coalizão formada contra ela, sempre em nome do equilíbrio europeu, perdia a Suécia mais a Pomerânia, em proveito da Prússia, e o Schleswig, em proveito da Dinamarca.

A anarquia polaca

Atribui-se a Frederico Magno a iniciativa da dissolução da Polônia e conta-se que Maria Teresa foi a única que relutou em anuir a esse atentado famoso contra o direito das gentes. O rei da Prússia observava porém com mordacidade que ela chorava, mas não enjeitava o quinhão. A Polônia tornara-se na verdade o teatro de uma constante e perigosa agitação provocada pela sua irrequieta aristocracia, ainda feudal, que reduzira a coroa a uma sombra de poder, prestando-lhe um juramento condicional de fidelidade dependente do cumprimento das condições impostas ao rei. As próprias potências interessadas no desaparecimento dessa nacionalidade que territorialmente se agigantara, convertendo-se numa das maiores da Europa, mas não ganhara robustez política, estavam sempre prontas a fomentar ali a anarquia, obstando a que se concretizasse qualquer projeto de reforma orgânica. Quando a Polônia, sob o influxo das idéias da Revolução Francesa, elaborou em 1791 uma nova e adequada constituição, já se achava amputada e era tarde para impedir a consumação do crime, só agora redimido pela conveniência para os aliados de 1914 de isolar a Alemanha vencida da Rússia revolucionária, levantando entre ambas uma barreira que dificulte sua aproximação e a identificação dos seus interesses políticos.

Desmembramento da Polônia

As partilhas da Polônia foram três e deram-se respectivamente em 1772, 1792 e 1795. A primeira teve por causa a revolta católica contra a influência cismática representada por Estanislau Augusto Poniatowski, que era um dos favoritos de Catarina II, por ela elevado ao trono da Polônia. Nessa ocasião anexou a Áustria a Galícia, Frederico Magno a Prússia ocidental e a Rússia parte da Lituânia e a Livônia polaca. Por efeito da segunda partilha, realizada sob a increpação do entendimento dos patriotas polacos com os jacobinos franceses, a Rússia ficou com as províncias orientais — Podolia, Volhynia, etc. — e a Prússia com Thorn e Danzig, isto é, a saída para o mar. A república da Polônia já estava reduzida a um terço do antigo reino e os polacos revoltaram-se às ordens do heróico Kosciuszko, trazendo a supressão da sublevação o terceiro desmembramento, no qual a Áustria recebeu os territórios de Cracóvia e Lublin, a Prússia os da margem esquerda do Vístula e a Rússia o resto da Lituânia e a Curlândia.

A Rússia, grande potência

Instalada em Varsóvia a tirania russa, Catarina, a Grande, podia bem dizer que a Polônia lhe ia servir de capacho para a porta de entrada no Ocidente. Com a incorporação não só da Criméia como do Cáucaso, e o direito reconhecido pela Turquia de sua intervenção em favor dos cristãos gregos espalhados pelo império otomano, o imperio russo passava decididamente à categoria de grande potencia e potencia de continua interferencia nos negocios públicos da Europa.

As reformas domésticas e os déspotas esclarecidos

A época era também de reíormas domésticas, de um extremo ao outro da Europa cristã. A Espanha dos Bourbons distingue-se no decorrer do século XVIII pelo incremento das suas indústrias e da sua agricultura, liberalizando-se mesmo o seu comércio marítimo no reinado de Carlos III, de uma fecunda atividade. Frederico II e Catarina II destacam-se no primeiro plano dos que foram chamados "déspotas esclarecidos". Ambos protegeram igualmente as ciencias e as artes na sua modalidade do tempo, que era a francesa. Francesa era a língua das cortes e da diplomacia; francesas a filosofia e as letras. Diderot e Voltaire foram protegidos dessas testas coroadas contra as quais eles próprios e seus discípulos arrojariam dardos venenosos. Diderot escreveu contudo de Catarina, provando que também sabia ser cortesão, que ela tinha a alma de Bruto dentro do corpo de Cleópatra. Voltaire desvanecia-se da hospedagem de Pots-dam, onde por varias vezes Frederico Magno o recebeu, amenizando com seu convívio espirituoso o dos oficiais e funcionarios de elevada hierarquia com os quais privava e discreteava sobre seus planos de campanha e suas reformas administrativas. Potsdam mesmo mar-cava o triunfo do rococó francês.

Frederico II Catarina II

Escritor e soberano acabaram por brigar porque eram ambos extremamente vaidosos e de letras enfatuadas. Frederico Magno timbrava em ser filósofo e acreditava ser poeta, como era flautista. Carlyle escreve dele que foi herói porque não era mentiroso nem charlatão como os outros do seu tempo: decerto não é lícito rebaixá-lo, escreve um historiador americano, ao nível dos Jorges e dos Luises porque, se bem que politicamente desonesto nas relações internacionais, teve a peito a grandeza e também as virtudes domésticas do seu povo. Segundo este historiador, em tal matéria seu código moral era admirável e o dever foi o seu lema. O historiador inglês Morse Stephens coteja seu despotismo com o de Luís XIV: ao passo que este dizia ou pensava ser êle o Estado, Frederico considerava-se o primeiro servidor do Estado.

O reinado do monarca prussiano pode dividir-se em 23 anos de guerras e 23 anos de paz, sendo que depois de Hubertsburgo êle se dedicou por completo aos melhoramentos materiais e aos progressos do governo. Construiu estradas; abriu canais; dessecou pântanos; distribuiu mais equitativamente os impostos; fomentou indústrias e respeitou os escrúpulos da justiça. O socialismo de Estado alemão dos nossos dias encontra-se em embrião na organização dessa monarquia a um tempo militar e paternal, servida por um exército eficiente, uma burocracia diligente, uma magistratura honesta e uma ciência não só teórica como aplicada às artes e às indústrias. Que o soberano era o primeiro a acatar as decisões dos tribunais, exemplifica-o o caso do moleiro de Sans Souci, que é uma das mais conhecidas anodotas históricas. A confiança manifestada pelo cam ponôs nos "juízes de Berlim" constitui para uma autocracia um títul de honra tal como o invejariam muitas democracias. Assim se con tituiu a Prússia o núcleo de cristalização da nacionalidade alemã.

 

O paternalismo.

Catarina resgatou o desregramento do seu viver privado e as violências ocasionais do seu temperamento pela sabedoria e elevação do seu governo, no qual foram abolidas a pena de morte e a tortura, estabelecidas a tolerância religiosa e a igualdade de legislação para todos os domínios, ampliadas as relações comerciais, edificadas cida-des como Odessa e Sebastopol no Mar Negro, fomentada no sul a cultura do trigo e introduzido na Rússia o elemento estrangeiro, isto é, iniciada a colonização por imigrantes que mais eficazmente do que qualquer outro fator podiam servir de veículo a uma civilização mais adiantada. A Rússia só se ocidentalizou porém na sua camada superior, que se tornou um pastiche da francesa. A grande massa permaneceu russa e nunca se afeiçoou de coração àquela cultura importada. O maximalismo deste momento assenta sobre a grande reação contra esse sistema de progresso por imitação e à força.

Luís XVI e as reformas

Catarina, a Grande, que dizia governar pelos cânones da filosofia, de fato legislava segundo seu próprio arbítrio e administrava como melhor lhe parecia na ocasião, faltando à doutrina quando era preciso. Algumas vezes a tarefa assumida pelos soberanos de aplicar pessoalmente as idéias de reforma preconizadas pelos publicistas, fundava-se não só na razão como no espírito de justiça e mesmo na bondade — casos estes em que se originava um regime autêntico de paternalismo. Assim foi José II da Áustria, filho de Maria Teresa irmão de Maria Antonieta, que trabalhava como um mouro que se exibisse, emancipou os servos, deu liberdade aos cultos, suprimiu a censura, não deixando entretanto de mandar esbordoar camponeses da Boêmia que se tinham declarado deístas, não por o serem, mas por não entenderem o que eram. Assim foi o grão-duque Leopoldo da Toscana, também austríaco, filho segundo de Maria Teresa, que até se mostrou pacifista, licenciando o seu pequeno exército; despediu a corte, vivendo com uma simplicidade espartana; aureolcu a justiça, e acabou não só com execuções capitais e torturas como até com confiscos de bens. e Luís XVI teria tido grande desejo de ser igualmente um monarca paternal e ao subir ao trono, com 20 anos, em 1774, chamou para seus ministros Malesherbes, que era um magistrado de notória honradez, e o economista Turgot, que apresentou um programa de economias tornadas absolutamente indispensáveis pela condição precária das finanças, arruinadas pelos gastos desordenados e ainda mais comprometidas pelo tratamento de Law, um escocês entre visionário e especulador que em Paris e Londres arquitetou companhias fantásticas e pretendeu com emissões de papel-moeda restaurar as finanças francesas, oneradas por uma dívida de 21/2 milhares de milhões de francos.

Às economias agregava Turgot a liberdade de comércio e indústria, a igualdade de impostos, a formação de conselhos comunais e provinciais de proprietários para colaborarem com o funcionalismo dentro de certos limites — reformas que empreendeu de 1774 a 1776, mau grado a oposição de todos os interessados. Acabou entretanto o rei por se ver obrigado a despedir Turgot e Malesherbes, ainda que suas idéias tivessem de frutificar, sobretudo o princípio da representação política. Não permitiram ao soberano ir mais longe, nem os reacionários da corte, nem os energúmenos da plebe, que uns e outros o levaram ao cadafalso.

Os ministros do absolutismo e do regalismo

Ministros houve mais afortunados nos seus esforços progressivos, realizados dentro da esfera do absolutismo, cuja essência acatavam e até realçavam com suas doutrinas regalistas, de primazia da coroa sobre a autoridade pontifical. Os ministros de Carlos III — Tanucci em Nápoles, os napolitanos Esquilache e Grimaldi e os espanhóis Campomanes, Aranda e Flórida Blanca na Espanha — cooperaram todos em melhorar as condições nacionais. A simples extinção do monopólio mercantil de Cádis e Sevilha, portos de Castela, à qual coubera a iniciativa dos descobrimentos, quase decuplou o comércio com as colônias. Todos esses estadistas, sem quererem despojar o soberano do mínimo dos seus direitos, entendiam, e aí está a razão do êxito relativo da sua obra, que os reis deviam servir-se da sua autoridade para o bem dos seus súditos, empregando sua atividade em coisas úteis e não em frioleiras.

Pombal e sua obra

Em Portugal reinou de 1750 a 1777 D. José, príncipe sensual como o pai, D. João V, menos supersticioso em matéria de religião, que o outro a tinha exagerada em tudo, até nas pompas, mas ainda mais avesso ao labor de governar. Teve porém por ministro um homem que tinha a paixão da administração, servida por uma vontade de ferro que não recuava mesmo diante da iniqüidade e do crime. Esse homem chamou-se Sebastião José de Carvalho e Melo, marquês de Pombal (1699-1782). O terrível terremoto de Lisboa em 1755 pôs em evidência sua energia e seu sangue-frio e o monarca nele entrou a confiar cegamente.

Pombal ligou seu nome a uma infinidade de reformas: a uma tentativa de regeneração da indústria portuguesa, que a Inglaterra matara com exceção da vinícola, empregando o processo do protecionismo, rigoroso ao ponto de permitir a exportação de sedas manufaturadas, mas proibir a da lã como matéria-prima; à melhoria dos vinhos nacionais, cuja qualidade se aviltara com o forçado aviltamento dos preços impostos pelo comprador estrangeiro, substituído por uma companhia nacional gozando do exclusivo; à igualdade civil dos índios do Brasil, até então sujeitos a resgates que eram a troca de uma escravidão quase sempre inventada para tal fim, por uma escravidão verdadeira; à reforma do exército, entregue ao comando de um instrutor militar alemão, o conde de Lippe, que tão bem o disciplinou e instruiu que diante dele recuou o exército franco-espanhol Invasor do Trás-os-Montes por ocasião do Pacto de famí lia; ao fomento da agricultura e à proteção do comércio, limitado na Europa à exportação de Lisboa para Londres do ouro das minas do Brasil, que no século XVIII emprestou a Portugal uma riqueza fictícia.

Para governar sem entraves, Pombal fêz guerra à nobreza e aos jesu’tas, comprometendo-os no atentado, mal explicado ainda, contra o\vida do soberano. O duque de Aveiro, o marquês de Távora, sua mulher e seus filhos, o conde de Atouguia e outros réus de regicídio foram barbaramente supliciados (1759), sem que contra os Távoras pelo menos se haja aduzido no processo sombra de prova, e dois anos depois fazia êle estrangular e queimar como herege um virtuoso jesuíta italiano, o padre Malagrida, antigo missionário no Maranhão que assistira aos últimos momentos de D. João V e, meio visionário, levava seu misticismo religioso tão longe quanto o padre Antônio Vieira levava o seu misticismo político. Um dizia privar com o céu; o outro, na História do Futuro e no Quinto Império do Mundo, fazia arrojados vaticínios sobre os destinos de Portugal.

Abolição da Ordem de Jesus

O nome de Pombal acha-se identificado na história européia do seu tempo com a expulsão dos jesuítas, geral nos países católicos, exceção feita dos Estados da Igreja, onde o papa os acolheu com bondade, assim como Catarina II os recebeu na Rússia e Frederico II na Prússia com simpatia. À Companhia de Jesus devia o catolicismo inestimáveis serviços e para os índios brasileiros representavam os padres o único penhor de liberdade e de civilização. Não falta quem acuse a Ordem de se ter deixado contaminar pelo amor das riquezas temporais, ainda que para fins espirituais, e de se ter tornado produtora e comerciante, aspirando nas cortes a uma demasiada influência. É assunto grave, cuja história verdadeira ainda está por escrever; parece, porém, certo que a alta direção da Ordem e o seu espírito foi sempre o da primitiva fundação, não obstante alguns erros e desvios de um ou outro dos seus membros. A intriga contra ela movida foi prolongada e nela andaram interessadas as cortes de Madrid, Paris, Nápoles e outras italianas, sendo porém Pombal a alma da maquinação, o mais ativo e inexorável dos inimigos da Companhia, que acabou por ser abolida em 1773 pelo papa Clemente XIV (cardeal Ganganelli, eleito no conclave com tal compromisso).

A reação em Portugal

A Universidade de Coimbra, de espírito jesuítico, foi reformada num espírito leigo, o ensino tomou outro caráter, mas a reação depressa inutilizou as reformas pombalinas. D. Maria I e seu esposo D. Pedro III eram ambos beatos e os remorsos pelos pecados paternos tanto atormentaram a fraca cabeça da bondosa rainha que ensandeceu, o que trouxe em 1792 a regência do príncipe, depois rei D. João VI. A reação fora de natureza antes religiosa, não afetando o progresso puramente material, que continuou a afirmar-se com a lentidão da época, nem mesmo o progresso intelectual, pois que data do reinado de D. Maria I a organização da Academia Real das Ciencias, com uma classe de ciencias matemáticas, físicas e naturais e outra de ciencias morais e políticas e de belas-letras.

A feição colonial. As possessões ibéricas

Foi no século XVIII que a atividade econômica da Europa assumiu plenamente a feição colonial iniciada no século XVI e desenvolvida no século XVII. O monopolio ultramarino, a saber, o comércio exclusivo das drogas e especiarías que a princípio significou atividade colonial, deixara porém bem depressa de pertencer às potências ibéricas, cujo apogeu de domínio ocorreu sob os Filipes, quando as possessões hispânicas estiveram reunidas sob um mesmo cetro. Faltavam a essas potências os meios materiais de defenderem seus tesouros: eram vários os hércules prontos a medir-se com o dragão de guarda ao jardim das Hespérides. Ainda assim Espanha e Portugal conseguiram conservar íntegros seus impérios americanos até que estes, organizados social e juridicamente pelas suas metrópoles, procuraram eles próprios a independência.

A Espanha apenas perdera a lamaica. O resto, que era imenso, dividia-se ao findar o século XVIII em quatro vice-reinados: México, Santa Fé de Bogotá, Lima e Buenos-Aires. O império português dividia-se pelo mesmo tempo em dois: Brasil e Maranhão. A África, em grande parte portuguesa pelo menos no seu litoral, nada representou, até a segunda metade do século XIX, senão um viveiro de escravos. Nas colônias hispânicas imperavam os mesmos traços de intolerância religiosa e de exclusivismo mercantil. O comércio era defeso aos estrangeiros, constituindo Lisboa e Cádis grandes entrepostos onde os navios do norte se vinham abarrotar de gêneros tropicais e trazer as manufaturas que os mercadores ibéricos por sua vez transportavam para as colônias, sendo que a Espanha igualmente centralizava o mercado ultramarino na feira de Porto Belo, na América Central.

As companhias de comércio

O sistema das companhias de comércio foi muito adotado no século XVII e elas eram na verdade um instrumento adequado ao tráfico mercantil da época. A burguesia holandesa teve as suas, uma das quais, a das índias Ocidentais, se afoitou em 1642 até o Pacífico com a expedição ao Chile, e a outra, das índias Orientais, fundou a colônia do Cabo da Boa Esperança para aguada dos seus navios; arrebatou aos portugueses parte das costas de Coromandel e do Malabar e as ilhas de Sonda; fêz de Batávia, na Ilha de lava, construída em 1619, o mais considerável entreposto do Extremo Oriente descobriu com o seu navegador Tasman as costas da Austrália (Nova Holanda) e as da Nova Zelândia e estabeleceu com o Japão o pequeno escambo regular de artigos que se operava anualmente em Deshima.

Holanda e Inglaterra

A posse da foz do Escalda, garantida às Províncias Unidas Tratado de Münster (1648), arruinou por dois séculos o porto ds tuérpia em proveito de Amsterdam. A Holanda entrou a enrique auferindo grandes lucros da indústria dos transportes, para isto lhando os mares de embarcações e estabelecendo de fato um m pólio do comércio marítimo entre a Europa ocidental e a seten nal. A Inglaterra não pôde porém suportar essa atividade em c corrência, que prejudicava sua crescente marinha nacional: daí ] veio, em tempo de Cromwell (1651), o Ato de navegação pelo q ficou vedado aos navios estrangeiros trazerem para a Inglate outros produtos que não os dos seus próprios países, obrigando p tanto os navios ingleses a irem eles próprios buscá-los, especi mente os coloniais. A Holanda imaginou impor a lei nesta questâ mas teve que se sujeitar (1654).

A atividade francesa no ultramar

A França quis em tempo de Colbert fazer outro tanto, imponc taxas extraordinárias sobre a navegação estrangeira; mas como ser pre, em matéria de expansão ultramarina, ficou a meio caminhe abaixando aqueles impostos pela paz de Nimégue (1678). Driault di que ela "não teve logo uma consciência muito nítida dos seus inte rêsses marítimos e começou colonizando ao deus-dará, segundo c inspiração dos seus navegantes ou as idéias particulares de alguns dos seus ministros". Colbert foi o mais sagaz destes, fazendo derivar sua política colonial da sua política econômica, isto é, procurando assegurar nas possessões, mercados para os produtos da indústria francesa que êle fomentava. Para isso fundou cinco grandes companhias de comércio: das índias Orientais, das Ocidentais, do Norte, do Oriente e do Senegal, as quais, como quaisquer outras, procuravam comprar barato os gêneros coloniais para vendê-los caro, afastando com seu monopólio a concorrência e animando o contrabando.

A Índia e Dupleix

O império colonial francês nos fins do século XVII tornara-se importantíssimo e mais ainda do que a América inculta, atraía a atenção do governo a índia, onde a França possuía feitorias excelentes: Pondichéry, na costa meridional do Golfo de Eengala, e Chander-nagor, perto de Calcutá, na entrada da bacia de Bengala. Dupleix (1697-1763) encarnou na primeira metade do século XVIII a grandeza passageira do domínio francês no Hindostão. Aproveitando a confusão resultante da dissolução em 1707 do império ,do Grão-Mogol de Delhi, fundado no século XVI por um neto do Tamerlão dos cronistas portugueses, fase anárquica em que veio à tona uma espécie de feudalismo rubro sobre o qual os ingleses mais tarde assentariam seu mando, desde que aos olhos dos hindus os rajás vassalos da Grã-Bretanha representavam a tradição local, Dupleix arvorou-se êle próprio em nababo e pôs-se a entreter relações com os outros príncipes indianos, diz-se que muito ajudado pela esposa, que conhecia bem a península hindostânica e falava vários dos seus dialetos, sendo viúva de um conselheiro da companhia e até portuguesa pela mãe, da família Castro.

 

O resultado dessa política, a que servia de instrumento um pequeno exército de cipaios ou soldados hindus, disciplinados à européia por oficiais franceses, foi o protetorado da França sobre a maior parte do Decan, a saber, sobre 30 milhões de habitantes. Dupleix foi porém destituído em 1752 porque a Companhia de comércio achava que a sua administração custava muito e não rendia bastante. Os ingleses naturalmente, que no Tratado de Utrecht tinham iniciado a derrocada do império colonial francês, apoderando-se da foz do São Lourenço e obstando por esse lado a qualquer surto da sua rival, achavam incômoda a presença de Dupleix, cuja influência junto aos potentados indígenas podia haver conservado à França o seu patrimônio asiático. Foi o caso de Maurício de Nassau em Pernambuco com a companhia holandesa de comércio.

A Companhia Inglesa das Índias e Lally-Tollendal

Quando pouco depois a companhia inglesa das índias Orientais, que durou de 1600 a 1858 sob formas diversas, entrou em luta com a companhia francesa (1758), foi mandado de França, Lally-Tollen-dal, sem lhe darem contudo forças para a emergência e não sabendo êle empregar os hindus, por quem nutria desprezo. Nestas condições e posto que bom militar, defendeu-se mal em Pondichéry, pelo que foi mandado decapitar pelo governo francês, sempre inclinado a fazer recair sobre uma vítima expiatória a responsabilidade de qualquer fracasso. Voltaire pouco depois promoveu a sua reabilitação.

Cliven e Warren Gastys

Entretanto Clive, que iniciou a ocupação metódica da bacia do Ganges e alcançou brilhantes sucessos militares, conquistando como escreve um historiador, numa só batalha o reino de Bengala, acusado de concussão, foi absolvido "em razão dos seus serviços". Não achando bastante a razão, suicidou-se. A verdade é que os funcionários britânicos de então fizeram fortunas escandalosas com suas exações e tiranias, procurando o governo inglês remediar a situação por meio da nomeação de um governador-geral seu representante, xficando à companhia o monopólio comercial. Os governado-res-gerais prosseguiram porém nas conquistas e no peculato. O governador Warren Hastings alargou o domínio de Bengala, ocupando Benares, a cidade sagrada; unificou a administfação pondo sob sua dependência, com sede em Forte William ou Calcutá, num braço do Ganges inferior, as feitorias de Bombaim e de Madrasta; pugnou contra as populações belicosas do interior, que conseguiu subjugar porque a índia nunca foi uma nacionalidade coesa, antes um composto de fragmentos sem vínculo de raça, religião ou governo uniforme. Ficou lendário o nome do último nababo de Mysore, Tippo-Sahib (1749-1799), filho de Haider Ali que, expulso de Bengala, ocupara as costas do Malabar e de Coromandel e resistira encarniçadamente às armas da companhia.

Warren Hastings foi mandado julgar pela Câmara dos Lordes em 1785 pelos abusos praticados no seu governo, ao qual não foi estranho o peculato. Absolvido, teve uma velhice respeitada se bem q houvesse gasto com o processo o melhor dos seus haveres adqui dos com suas extorsões.

 

 

 

 

A renovação das idéias. Adam Smith e Jean Jacqued Rousseau

O século XVIII foi essencialmente inovador no tocante às idéi sobretudo as econômicas e as sociais: foi o século de Adam Smi (1723-1790), o criador da economia política moderna, e de Jc Jacques Rousseau (1712-1778), o fundador da filosofia natural, a sab a que professa a teoria de que o homem nasce bom e é tornado m pela sociedade, bem como que os direitos lhe são ingênitos e s iguais para todos, podendo êle cedê-los a bem da coletividade ou antes discipliná-los, fundi-los e harmonizá-los por meio de um "contrato social". Por outras palavras a doutrina de Rousseau é a doutrina da liberdade, infensa à regulamentação severa pelo Estado das fábricas e do tráfico, às corporações operárias e aos monopólios mercantis das companhias, ao jugo dos governos, das religiões e da propriedade individual.

A soberania do povo e o individualismo

Em vez da soberania dos reis, temos pois a soberania do povo, ao eleito do qual caberá a autoridade absoluta que assim continua a parecer indispensável, mas passava a representar uma delegação e não uma imposição. O individualismo tomava o lugar do Estado manufatureiro e comercial, que antes tudo dispunha, ensinava e prescrevia. Jean Jacques Rousseau, ousado e apaixonado como justamente o descrevem, exerceu uma extraordinária influência porque, como escreve um historiador, "renunciando às frias abstrações, deu nova voga ao sentimento e fecundou os ensinamentos da razão pura com o calor da sensibilidade".

A economia política

Adam Smith, cujas opiniões foram refletidas em França por Tur-got (1727-1781) e eram opostas à concepção do "fundo comum" que deveria pertencer à humanidade, em lugar de propriedade pessoal sempre injusta no mesmo conceito, fêz ver como a riqueza cresce pela divisão do trabalho e explicou quais as relações entre o salário e o capital, mostrando que a indústria particular gera a fortuna tanto quanto a terra. O princípio diretor devia ser a franquia de produção e de circulação: antes dele o francês Quesnay o expressara na fórmula — laissez íaire, laissez passer, proclamando a sua doutrina fisiocrática ou do domínio da natureza, que significa que o melhor regime é deixar as coisas seguirem seu curso natural pelo sistema da livre concorrência, útil ao’ produtor e ao consumidor.

A tributação

A economia política logicamente dedicava muita da sua atenção à questão do imposto, chegando à conclusão de que a tributação devia ser igual para todos em virtude da lei, e equitativa, portanto não percebida arbitrariamente pelos que fixavam e arrecadavam as taxas, redundando o processo contrário no abandono do trabalho e no despovoamento do solo. Os livros que primeiro se ocuparam deste assunto foram queimados pelo executor de alta justiça em 1709. No decorrer do século caminhou-se todavia rapidamente para uma concepção diferente, e é apenas justo referir que os filósofos franceses contribuíram ainda mais do que os ingleses para a elaboração e disseminação das novas doutrinas.

A Enciclopédia

O século XVIII é o século da enciclopédia, a obra monumental em que Diderot (1713-1784) e d’Alembert (1717-1783) deram um balanço às aquisições do espírito humano até então e_ rasgaram os horizontes às possibilidades da inteligência e da razão. A publicação desse dicionário em 28 volumes durou mais de 20 anos (1751-1772), e não se fêz sem que a censura e a polícia levantassem obstáculos que foram sobrepujados pela proteção de Choiseuil, o ministro mais esclarecido de Luís XV. Os colaboradores da obra eram numerosos, entre eles contandc-se Helvécio e o abade Raynal, ultra-rebeldes no pensamento, indo alguns até ao niilismo, pois que pretendiam abolir leis e religiões como constituindo freios à felicidade humana, declarando-se eles ateus e materialistas.

Os dois espíritos mais representativos da cultura francesa nesse período não pertenciam, como o fogoso Diderot e o rancoroso Jean Jacques Rousseau, às classes populares e sim às classes elevadas, que tinham aliás concebido igual espírito de oposição à Igreja e à monarquia, revelando-se ambos com uma ponderação que era neles espontânea e uma elegância e clareza que pertencem bem ao gênio literário francês. Aqueles espíritos eram os de Montesquieu (1689-1755) e de Voltaire (1694-1778), o primeiro nobre, o segundo burguês, dessa classe que sob Luís XIV deu à administração o seu melhor pessoal, e que estava sendo sob os seus sucessores o agente capital de transformação mental.

Montesquieu e Voltaire

Montesquieu e Voltaire precederam a geração mais agitada da segunda metade do século e beberam sua inspiração nas "teorias inglesas", primeiro introduzidas sob disfarces literários, depois desenvolvidas nas suas conseqüências e ampliadas nas suas deduções. De ambos se pode dizer que foram antes reformadores do que revolucionários. Voltaire era um deísta muito preocupado com a liberdade de consciência e que, à força de verberar a intolerância da Igreja — 1’iníâme como êle chamava —, acabou sendo um inimigo acérrimo do cristianismo. Foi um polígrafo dos mais fecundos, como aliás o foi Diderot, escrevendo livros de história, contos, poemas, dicionário de filosofia. Seu sistema religioso era, na frase de um crítico, despido de dogmas, de mistérios e de símbolos, confinado à moral que deve conter a alma imortal. Montesquieu, pelo contrário, ocupou-se mais de política que de religião e fê-lo até entre os romanos e os persas. O Espírito das Leis é o estudo da constituição inglesa fundada sobre a divisão dos poderes e praticada por um soberano estranho a arbitrariedades, uma aristocracia liberal despida de privilégio? excessivos, uma assembléia com responsabilidades e uma magistratura independente.

 

 

Frontispício do "Systema Naturae", de Linnaeu.

Outros espíritos notáveis do século XVIII. Os salões

Muitos outros foram os espíritos notáveis do século XVIII: o astrônomo Fontenelle, o moralista Marmontel, o comediógrafo Marivaux, o espirituoso conversador Rivarol, em França. A época foi por excelência a dos salões, onde se cultivava a arte da palestra, se fazia política de oposição, se divulgavam os conhecimentos enciclopédicos, se poliam os corolários do engenho humano. Driault chama-lhes a aliança da filosofia e das damas, algumas célebres, como Madame de Tencin, a entusiasta de Montesquieu, Madame du Châtelet, a amiga de Voltaire, Mademoiselle de Lespinasse, a confidente de d’Alembert, dè Turgot e de Malesherbes, Madame Geoffrin, a protetora de tantos sábios, literatos e artistas.

A cultura brilhou também fora de França. Grimm (1723-1807) foi um alemão de Paris, como no século XIX o seria Heine. Era porém puramente alemã a trindade augusta: Lessing (1729-1781), cheio dé erudição, Schiller (1759-1805), dramaturgo apaixonado, Goethe (1749-1832), gênio universalista, escritor de imaginação, sábio e pensador.

Na Italia o napolitano Vico (1668-1744) formulou os princípios verdadeiros da filosofia da história e, tendo a aspiração de estender a felicidade a todo o gênero humano engendrando a filantropia, o toscano Beccaria (1738-1794) reformou o direito penal com o seu Tratado dos Delitos e das Penas (1764), que obedeceu à mesma corrente de humanizar e suavizar a justiça que flui na legislação leopoldina, moralmente adiantada de um século, e que levou Tanucci em Nápoles a redigir o código carolino, precursor do napoleónico. Nem devem ficar esquecidos o físico italiano Galvani (1737-1798) e o botânico sueco Linneu (1707-1778).

Ensino obrigatório e direitos dos neutros. A paz de 1783

Na Dinamarca fundou-se a instrução gratuita e obrigatória, expressão do adiantamento da raça teutónica da Escandinávia; e em 1780 a grande Catarina formou no Báltico, para defesa da liberdade comercial dos neutros, uma liga de não beligerantes firmando qs princípios de que a bandeira cobre a mercadoria e o bloqueio deve ser efetivo e não apenas notificado — princípios depois consagrados, mas violados no decorrer da grande guerra de 1914-1918. A referida liga organizou-se durante a chamada guerra americana, em que a França e a Espanha ajudaram os Estados Unidos, então colônias que se batiam pela sua independência, contra a Inglaterra. Pela paz de 1783 recuperou a França o Senegal e alguns territórios na índia, e a Espanha a Flórida, que em 1763 cedera à Inglaterra tendo além disso, pela sua participação ativa no Pacto de família, sofrido os ataques das esquadras inglesas em Cuba e nas Filipinas. Em compensação recebera a Espanha da França em 1763 a Louisiana, que por sua vez voltou à França.

Arte e ciência. A pintura

A arte mesmo do século XVIII reflete a evolução mental operada. A pintura por exemplo, que nos últimos tempos de Luís XIV, durante a Regência e sob Luís XV sacrificou à mitologia galante com Wat-teau (1684-1721), à libertinagem com Boucher (1703-1770) e à graça feminina com Latour, o pastelista das belezas (1704-1788), entregou-se às cenas de família e às composições de uma ingênua moralidade de Chadrin (1699-1779) e de Greuze (1725-1808). Com esse regresso à simplicidade natural coincidiu uma crise de empirismo científico produzido por fenômenos elétricos, hipnóticos e outros ainda mal estudados e compreendidos. Foi o tempo do magnetismo de Mesmer (1733-1815), da frenología de Gall (1758-1828) e da fisiognomía de Lavater (1741-1801). O fundo era sem dúvida experimental: datam de então o pára-raios de Franklin (1706-1790), as descobertas químicas do alemão Scheele (1742-1786), do francês Lavoisier (1743-1794) e do inglês Priestley (1733-1804) e a vacina de lenner (1749-1823).

A música

Se não era só francesa a inteligência, tampouco o era o gosto: a música sinfônica foi alemã com Bach (1685-1750), Gluck (1714-1787), Haydn (1732-1809), Beethoven (1770-1827) e Mozart (1756-1791), nos quais a ciência da harmonia rivaliza com o vigor da inspiração e a profundeza do sentimento.

 

 

 

 

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