Oliveira Lima
DEPOIS DO PLEITO
Sinto por Pernambuco que o resultado da eleição tenha sido contrário ao Sr. Barão de Suassuna. Aliás só por um milagre — e é artigo que já desaperecera muito do mercado antes da guerra — poderia êle vencer a situação que se lhe deparou no último momento, tendo contra si tanto o borbismo ou bezerrismo, isto é, o elemento oficial e o dantismo, isto é, uma facção organizada e ruidosa, como o rosismo, que à última hora, por telegramas dos seus chefes do Rio (porque é partido agora com chefes cm toda a parte), descarregou o grosso da votação no candidato do governo do Estado. Não foi uma abstenção, equivalente a um suicídio: foi uma manobra pela calada da noite, o que é pior, e não deixando por isso de ser um suicídio porque o partido se desfez quand même. O conselheiro sumiu-se Deus sabe onde, e o Sr. Estácio Coimbra passou de herdeiro presuntivo de um bastão de marechal político a coronel de um regimento desfalcado, às ordens de outro general.
Outros elementos dispersos ou soltos procuram, como era de esperar, suas conveniências pessoais, no que fizeram bem, porque o candidato independente era-o no nome e de fato: não admitia tutores ou mesmo mentores e com êle não seria possível entrar em conchavos para uma partilha das vantagens sem as responsabilidades do poder. Contaram-me que alguém dissera que antes a bubônica em Pernambuco do que o Barão de Suassuna no poder. É fácil de compreender. Da bubônica muitos escapam e com a alta moralidade do Sr. Barão de Suassuna ninguém levaria a melhor. Cada tentativa era um caso de antemão perdido. O seu cargo êle o exerceria como um sacerdócio.
Para não faltar adversário, até o operariado, mesmo o dos sindicatos, que se diz o consciente, mostrou uma singular falta de compreensão dos seus interesses imediatos, a menos que não haja demonstrado uma singular habilidade guiando-se pelo princípio do — quanto pior melhor, a saber da vantagem da desordem política para favorecer a revolução social.
Nestas condições, candidato independente de elementos exclusivamente independentes, a votação do Sr. Barão de Suassuna foi muito considerável e como é toda ela própria e genuína, significa que poderia ainda ter sido superior se não fosse a trapaça oficial que com ter sido talvez mais discreta do que doutras vezes, não deixou de exercer-se por esses estratagemas comezinhos de retirar títulos a eleitores, dificultar a expedição de novos títulos c quejandos que já representam todavia um progresso sobre a pressão pelo terror e pelo sangue, que não houve felizmente. A não ser numa localidade do sertão, a eleição correm numa ordem que não se esperava: os tiros propalados foram tiros mudos do cinematógrafo, as pistolas sacadas dentro e fora das sessões^não dispararam c os aspirantes a assassinatos se portent á merveille, seja o Senhor louvado.
Se não houve terror, não deixou de haver temor — o temor das represálias imediatas ou futuras, afastando eleitores das urnas ou levando-os a votarem contra a sua consciência. Em todo o caso não se pode dizer que a coação fosse sanguinária, e por êsse lado é grande a minha satisfação, vendo comprovado que o bom exemplo, como o mau, é contagioso, c que de alguma coisa serviram a disciplina e a cordura de uma propaganda isenta mesmo de discursos explosivos. O que deveras sinto, conhecendo bem as idéias despidas de egoísmo e os propósitos sãos e regeneradores do Sr. Barão de Suassuna, é que Pernambuco não venha a conhecer o Governo probo, esclarecido e tolerante que o aguardava. Quem sabe porém se o partidarismo o apreciaria devidamente?
Na comédia de Molière deliciosamente traduzida pelo Visconde de Castilho, a mulher de Sganarello diz ao intromedido que a quer defender que se meta com a sua vida, porque ela gosta do seu marido tal qual é, gosta mesmo que êle lhe dê pancada. Há gente que só acha um governo bom quando é brutal e que estranharia um regímen em que lhe não fosse facultada essa voluptuosidade do sofrimento alheio. São gostos. . . Eu porém tenho felizmente um ponto-de-vista diverso: não me regozija a perseguição nem me posso acomodar com a violência. Era uma razão mais que me atraía para o candidato independente.
Do ponto-de-vista geral, a saber da evolução social, não foi porventura um mal q resultado do pleito que elegeu o Sr. Senador José Rufino. A situação fica quiçá melhor estabelecida para a contenda premente de amanhã, ou antes de hoje. De um lado o trabalho, do outro o capital, sem que nenhum dos dois trate de chegar a um acordo. O governo do Sr. Barão de Suassuna poderia retardar a solução do grave problema com o abrandá-lo, despi-lo das asperezas, humanizá-lo numa palavra; não estaria no seu alcance, nem do de ninguém, deslocá-lo ou removê-lo. Noutras mãos, menos delicadas, corre a bomba o risco de estourar mais depressa, e se fosse para o bem da humanidade, poder-se-ia dizer que antes assim. Mas não é. Eu creio, talvez por temperamento, que uma composição é mais fecunda que uma ruptura.
Eis porque desejo, embora aqui não assista, que aproveite o Estado de Pernambuco o sacrifício que o Sr. Barão de Suassuna se quis impor para cumprimento de um dever cívico. Toda a gente no Brasil diz fazer sacrifício aceitando qualquer cargo ou função; mas nalguns casos a chapa há de ser verdadeira. Tachavam muitos, amigos mesmo do candidato independente, de egoísmo ou pelo menos de comodismo a sua abstenção das lutas partidárias, dados os predicados que o ornam e recomendam. Tanto o disseram que êle resolveu descer à liça e em tão boa hora o fêz que do seu ato res-sultará a fundação de um partido de Governo.
Toda sociedade política carece de uma oposição que fiscalize e moralize o Governo. As oposições não têm mesmo outra alternativa senão serem moralizadas. Esta porém o será pela sua própria essência, pelo modo por que surgiu, pelo que representa como ideal e pelo que se traçou como programa — pouco definido talvez na urgência da luta eleitoral travada, mas bastante para ter formado entre os seus adeptos uma consciência coletiva, senão absolutamente pura, porque estamos na terra, pelo menos a mais despida de motivos subalternos.
Fonte: Oliveira Lima – Obra Seleta – Conselho Federal de Cultura, 1971.
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