História Universal de Césare Cantu
CAPÍTULO XXXI
Filosofia, política e jurisprudência
Tão singulares desconcertos, que se sucederam à vista dos homens, necessariamente desviaram sua atenção das vãs abstrações, para a fixar sobre a realidade poderosa, e lhes fazer aplicar a moral, não mais unicamente ao indivíduo, mas à sociedade, para procurar as regras, descobrir as causas, apreciar o direito dos acontecimentos cuja bulha enchia o mundo.
Já vimos, na Itália, Maquiavel e Guicciardini reduzirem à doutrina uma política que os poderosos tinham começado por botar em prática. Ao mesmo tempo que os acontecimentos arrastavam os povos para a monarquia absoluta, e que os reis, sem moralidade na escolha dos meios, se esforçavam por destruir os privilégios feudais, quatro idéias gerais, independentemente das circunstâncias particulares, a isso obstavam: primeira, as recordações de Roma e da Grécia, que, se algum tempo tinham produzido o pensamento do poder central, faziam nascer então o da liberdade e do ódio aos tiranos; segunda, as reminiscências dos limites postos às monarquias na Idade Média: terceira, as doutrinas de nivelamento pregadas pelos calvinistas; finalmente, as pretensões da igreja, que tratava com tanto mais orgulho de restaurar a sua dominação quanto mais ameaçada era, assim como de ensinar aos reis seus deveres e aos povos seus direitos.
Francisco Hotman sustenta, na Franco-Gallia, a falsidade e o perigo do direito de hereditariedade para a transmissão das coroas, e cita uma multidão de passagens de autores antigos para provar que o povo deve tomar parte na soberania.
Estêvão de la Boetie, escritor católico, ligado intimamente com Montaigne, aue coligou e publicou seus papéis quando morreu ainda muito moço. mostrou-se, mais do que o seu amigo, virtuoso, espontâneo, crente, ativo, de uma gravidade aue não é falta de doçura nem de imaqinação. No Contra-Senso, ou discurso sobre a servidão voluntária, êle fulmina, com uma ousadia extraordinária para um francês, os abusos da autoridade, principalmente no tempo de Henrique II. A liberdade, na sua opinião, é o direito das nações, que às vezes se encaminham por si mesmas para a servidão por diferentes vias, que o autor assinala. Os tiranos são homens como os outros, que porém tiram a sua audácia da longanimidade dos súditos, os quais são contudo suas mãos, seus pés e seus olhos (1).
(1) "Aquele que tanto vos domina tem só dois olhos, duas mãos, um corpo, nada mais de que o menor homem do grande e infinito número de vossas cidades; o que êle tem mais do que vós todos, é a vantagem que vós lhes conferis para vos destruir. Onde foi êle buscar tantos olhos com que vos espreita, a não lho dardes? Como é que êle tem tantas mãos para vos bater, se as não recebe de vós? Os pés que êle pisa vossas cidades, onde os foi buscar senão aos vossos? Como é que êle tem poder algum sobre vós, se não estivesse de inteligência convosco? Que vos poderia êle fazer, se vós não fôsseis os encobridores do ladrão que vos rouba, cúmplices do matador que vos tira a vida, e traidores de vós mesmos? Vós semeais vossos frutos, para que êle os desperdice; mobiliais e encheis vossas casas, para dar ocasião a seus latrocínios; alimentais vossos filhos para que êle os leve, por melhor que faça, em suas guerras, para que os faça ministros de suas cobiças; matai-vos com trabalho, para que êle possa nadar em delícias, e enlo-dar-se nos imundos e vis prazeres; enfraquecei-vos para o tornar mais forte e rijo em vos encurtar ainda mais a rédea. E de tantas indignidades, que as bestas mesmo não experimentarão, ou não sofreriam, vós podeis livrar-vos se tentardes, não libertar-vos, mas tão-sòmente querer fazê-lo. Resolvei não servirdes mais, e sereis livres. Não quero que lhe toqueis, mas que o não sustenteis mais, e vê-lo-eis, como um grande colosso a que se houvesse tirado a base, baquear mesmo por seu peso, e despedaçar-se."
La Boetie é portanto um republicano, e o precursor remoto da revolução, como outros escritores deste tempo, que, depois de terem negado a autoridade da igreja, atacavam a dos reis. Êle permaneceu nas fileiras dos católicos, mas seus livros foram de grande socorro para os calvinistas, auando eles proclamaram as doutrinas democráticas. Hulberto Languet, natural de Borgonha, amigo de Melanchton (Vindiciae contra tyrannos), empreendeu demonstrar que a tirania era contrária à religião, que a revolta era legítima, e aue não havia soberania verdadeira senão a do povo. O príncipe, na sua opinião, não é o delegado de Deus, porém o seu vassalo. A iniciativa pertence-lhe somente quando se trata de paz e de guerra; êle deve contudo, mesmo nesses casos, consultar as câmaras; se acaso se faz tirano, todos podem matá-lo.
O alemão João Althausen sustentou que os Estados de um reino, mas não um simples particular, tinham o direito de resistir ao tirano; nisto refutava Alberico Gentile, Barcay e outros escritores que tinham proclamado a obediência passiva. A seus olhos, o jus majes-tatis reside no povo, mas não no seu primeiro magistrado, que é sempre o seu administrador. A assembléia mesmo não pode alienar esse direito, assim como um homem não pode alienar o direito de viver.
Temos visto que o assassinato, neste século, não era somente um acontecimento ordinário, mas um direito por meio do qual se decidia grande número de questões; os escritos de circunstâncias, feitas por emigrados dos diferentes reinos, abundam em panegírico do regicídio. O inales João Poynet o declarou conforme com o juízo de Deus. Poltrot, assassino do duque de Guise, foi absolvido pelos protestantes.
Estes escritores não eram contudo inspirados por um liberalismo sincero, isto é, pela vontade de aiudar o povo e de o libertar das servidões feudais. Eram movidos, pelo contrário, por paixões, por pretensões aristocráticas; e, mesmo os que estão de boa-fé, são animados de um patriotismo inexperiente, que detesta o mal sem suspeitar a dificuldade de lhe dar remédio. No tempo da liga, principalmente, cada um dos atos de Henrique III era infamado de cima do púlpito, como hoje aconteceria nos jornais; e a desobediência recebia animações: muitas vezes a voz do pregador assinalava o alvo à faca do assassino ou ao cutelo do algoz.
Quando os "bons burgueses e habitantes de Paris" consultaram a Sorbona a respeito da resistência que eles opunham a Henrique III (1589), ela emitiu a opinião, apesar de ter constantemente defendido os direitos reais, de que o povo estava desligado do seu juramento, e que podia em consciência reunir-se, armar-se, arrecadar impostos, para preservar a religião católica dos atentados dos reis.
Então a doutrina do tiranicídio, apesar de ter sido condenada pelo Concílio de Constança, achou protetores mesmo entre os católicos e entre os jesuítas, não como uma teoria que lhes fosse própria, mas como uma opinião acreditada nesta época. Ela é tão velha como a admiração por Harmódio e por Bruto, e muitos teólogos a sustentaram até o meado do último século. Ora, os que se têm dado ao incômodo de os contar têm achado que neste número apenas se encontram catorze jesuítas, o primeiro dos quais escreveu em 1596 e o último em 1669.
Os teólogos sustentavam a prerrogativa do pontífice sobre o poder político, por isso que ela é de direito divino: aos que objetavam que o direito dos príncipes devia ser também de origem divina, se não qual seria o seu obstáculo, eles não hesitavam em responder: O povo, cuja soberania assim estabeleciam. Segundo Belarmino, Deus não concedeu a autoridade a pessoa alguma em particular, mas a todos em massa, isto é, ao povo, que a confia a um só ou a mais de um, reservando-se o direito de mudar as suas formas. No Manual dos Confessores, Saa discute se o povo pode destruir o rei quando se faz tirano ou despreza os seus deveres, e se pode eleger outro à pluralidade de votos.
Mariana (1554-1624) de quem já temos falado, publicou o livro De rege et regis institutione, obra dedicada a Filipe III, e vivamente recomendada pelo censor real que a examinou. Êle julga que a melhor forma de governo é a monarquia, contanto todavia que o rei chame, para o conselho, os cidadãos mais recomendáveis, e que tome parecer de um senado. Êle diz que a autoridade do povo é superior à dos reis, e ergue-se centra os tiranos. É, na sua opinião, tão imprudente para um povo entregar seus direitos a um rei, como a um rei aceitá-los; e êle se mostra constantemente zeloso partidário da liberdade, assim como do bem público, até a exageração.
No XVÍ capítulo, em que estabeleceu esta pergunta: An turannum opprimere [as sit? êle pinta de um modo dramático Jacques Clemente apunhalando Henrique III, com a evidente intenção de o justificar. Depois enumera as razões porque qui tyranni partes tuentur reprovam o regicídio. Porém populi patroni non pau~ ciora neque minora proesidia habent; e sustenta que é lícito matar um verdadeiro tirano (1).
(1) Coisa singular, êle nega o direito de o matar com veneno. Dir-se-ia que êle quis impor assim ao tiranicida a coragem de saber afrontar a morte.
Como porém provar que o príncipe é verdadeiramente tirano? O melhor meio é reunir-se o povo, que tem vontade de fazer justiça a si mesmo, em assembléia, para pronunciar, e as suas resoluções terem força de lei. Porém se não fôr possível reunir a convenção nacional? Se o Estado estiver à borda do precipício? Aqui Mariana hesita; mas acaba por concluir nestes termos: Haitdqiiaqnam inique eum fecisse existimabo quem matar o tirano.
Estas doutrinas fizeram condenar o seu livro em França. Êle foi preso na Espanha, não por ter publicado essa obra, mas por ter revelado a desordem das finanças, a alteração das moedas, e os males que ameaçavam o país. Quando morreu, o presidente do conselho de Castela exclamou: O nosso conselho perdeu hoje o seu freio.
O jesuíta italiano Santareli sustenta também que o papa pode infligir aos reis penas temporais, e desligar, por causas justas, seus súditos do juramento de fidelidade. Foi em vão que seus confrades retiraram imediatamente essa obra: o parlamento de Paris e a Sorbona, a quem o livro tinha sido denunciado, o condenaram, e ele foi entregue às chamas. Os jesuítas foram além disso obrigados a reconhecerem esta condenação, e a declararem a independência do rei.
As mesmas idéias animaram outro membro dessa companhia, Francisco Soares de Granada, que todavia soube fugir e tirar delas essas ousadas conseqüências. As Provinciales nos têm habituado a metê-lo a ridículo: todavia Grotius confessa que, entre esses teólogos e filósofos, dificilmente se acharia quem o igualasse. Em seu tratado De legibus ac Deo legislatore, êle enunciou a distinção entre o que se chama direito natural e os princípios concordados entre as nações. Precedeu Grotius e Puffendorf, tratando completamente todas as partes do direito geral, e foi o primeiro que descobriu que êle não se compõe somente dos princípios de justiça aplicados às relações que existem entre os Estados, e depois reconhecidos como costumes. Todo o poder legislativo e paternal, diz êle, vem de Deus, por isso que mesmo quando esse poder é humano, o homem não é mais do que o vigário de Deus. Se pertence ao príncipe fazer as leis, é unicamente porque o povo lhe tem cometido esse cuidado; a essência das leis é tenderem para o bem público, se não obrigam a consciência: no entanto a insurreição só é permitida contra um usurpador.
O livro Dos dois poderes, por Edmundo Richer, síndico da Faculdade de Teologia de Paris fêz grande bulha em França. Êle proclama, sustentando os direitos da igreja galicana e combatendo a supremacia papal, que toda a comunidade tem o direito inalienável de se governar por si mesmo; que a jurisdição e o poder não lhe pertencem, mas a um indivíduo qualquer; e que, portanto, eles pertencem com maior razão à sociedade civil. Nem lapso de tempo, nem privilégio locais, nem dignidade de pessoas, poderão prescrever esse direito divino e natural; do que resulta que Henrique III, como traidor à fé por êle jurada aos Estados, foi com justiça morto. Os bispos reprovaram essa doutrina no Concílio de Sens: êle achou no entanto ardentes apologistas.
Não poderíamos deixar em silêncio o advogado francês João Pasquier (1560), que tinha estudado em Bolonha com Mariano Socino (1). Êle esclareceu em suas Observações sobre a França um grande número de pontos históricos, e expõe na Conferência do príncipe as suas próprias idéias sobre o governo, referindo tudo à utilidade pública, e indignando-se contra um interlocutor que diz que os povos foram feitos para os reis. Os jesuítas, tendo pretendido conferir os graus como a própria universidade, encontraram viva oposição, e Pasquier os combateu como perigosos para o Estado.
(1) Que, diz o próprio Pasquier, tinha adquirido tanto renome, que a maior parte dos italianos vinham sacrificar a seus pés, a espaço de cinco ou seis meses, para receber consulta.
Veneza, tendo-se desavindo por este tempo com o papa, e tendo sido posta em interdito, fêz publicar teses hostis às pretensões pontifícias, assim como várias consultas de Frei Paolo Sarpi, do padre Marco Antônio Cappelo e do frade João Marcílio, em que eles sustentavam contra o cardeal Belarmino que os povos estavam no direito de examinar as causas das excomunhões e das ordens pontificais.
As doutrinas liberais achavam favor ou oposição conforme os países. Holanda, Genebra e Escócia, que tinham estabelecido a reforma por oposição ao rei, aderiam às opiniões das Repúblicas: ao passo que a Inglaterra e a Escandinávia, tornadas protestantes por decreto real, sustentavam os princípios monárquicos. Em conseqüência, a Universidade de Oxford (1630) exigia dos aspirantes ao doutorado o juramento de não admitir nenhuma doutrina social contrária àquela que era professada em seu seio, a mesma que ali tinham ensinado Alberico Gentil. Nicolau Hemming, Barclay e outros mais, que, esquecendo que existia uma lei fora da sociedade e anterior a ela, caíam num absolutismo positivo ou na legalidade tirânica.
Jorge Buchanan, aplicando-se sobretudo aos negócios da Escócia (De jure regni apud Scotos), sustenta que o direito da realeza derivava da eleição popular; que o rei entronizado pela coroação reconhece recebê-lo do povo como um depósito, e que é permitido, segundo a escritura, matar os tiranos. É assim que Hooker, no tempo do despotismo de Isabel, proclamava a intervenção do povo (Constituição eclesiástica) com uma ousadia que conduzia diretamente à democracia.
Jamais se ensinou na Espanha nem no Oriente um despotismo mais desenfreado do que na Inglaterra, no tempo de Isabel e de Jacques I. Raleigh escrevia a este príncipe dedicando-lhe a sua obra: Os laços que prendem os súditos ao rei devem ser tecidos de ferro, e os do rei aos súditos de fios de aranha. Êle acrescenta que a lei não obriga o rei senão unicamente em seu interesse, e que, chegando a cessar esse interesse, êle pode violá-la.
Começou-se por este tempo a ensinar que uma autoridade patriarcal foi transmitida, por primogenitura, ao herdeiro legítimo, desde a origem da raça humana, de sorte que as nações estão ligadas à pessoa do chefe natural. Porém, como não é possível constatar qual êle é, o direito passa ao representante do primeiro que se pode provar historicamente ter reinado sobre um povo. Suarez reduziu a nada este sonho distinguindo o direito patriarcal (CEconomicum) do direito político.
Os protestantes acusavam os católicos de legitimarem a resistência aos atos arbitrários, de quererem que o poder, que eles concentravam todo nos príncipes, fosse partilhado com a igreja, e de suporem alguma coisa de superior às convenções sociais; ao passo que eles colocavam na autoridade a única origem de obrigação. Pode avaliar-se de que lado se achava o liberalismo.
Entre os publicistas mais nomeados, citaremos o piemontês João Botero, secretário de São Carlos e de Frederico Borromeu, depois mestre dos filhos de Carlos Manoel. Êle deu prova na Razão de Estado e nas Relações universais, de uma grande finura de raciocínio, de extensas leituras, de muita observação, e soube fazer uma feliz aplicação dessas vantagens ao tempo em que vivia. "O Estado, diz êle, é uma dominação estável sobre os povos; a razão de Estado é o conhecimento dos meios próprios para fundar, para conservar, para estender essa dominação. Os governos devem conservar-se a todo o custo." Em conseqüência, constituiu-se panegirista de São Bartolomeu. Condena o
duque de Alba por ter mandado matar tão estrondosamente Egmont e Horn, "em vez de se desembaraçar deles tão secretamente quanto possível". Finalmente, êle supõe o homem tal qual deveria ser, não tal qual é; por esse motivo falta oportunidade às belas instituições que êle propõe. Falando da população, acha inútil encorajar o matrimônio, desde que não é para temer que celibatos parciais diminuam a população, por isso que ela se equilibra com os meios de existência, teoria de bom senso que a ciência depois obscureceu e viciou. Êle desaprova as colônias dos espanhóis e dos portugueses, em que não vê senão esperanças romanescas e devastações reais, o que fará com que em vez de novos mundos se tenham novos desertos.
Pode dizer-se que Trajano Boccalini (1556-1613), homem dotado de um espírito agudo e de uma imaginação ardente, introduziu nos sistemas políticos as extravagâncias que seus contemporâneos introduziram no estilo. Êle tomou Tácito por tema, como Maquiavel tinha tomado Tito Lívio, e tirou desse autor a sua maneira severa de encarar as intenções humanas, com a diferença de que êle exprime suas cóleras por modo alegre. Nas Narrações do Parnaso, finge que Apolo ali estabelece seu tribunal para ouvir as queixas, decidir sobre toda qualidade de questões, tanto de literatura como de usos e de governo. Êle se aplica mais particularmente a esta matéria na Pedra de toque política, na qual revela com muita arte as chagas feitas pelos estrangeiros no belo corpo da Itália, e demonstra que não seria difícil para a Itália livrar-se de seu jugo, enquanto que será impossível ao estrangeiro conseguir jamais aí naturalizar-se, afazer-se ao clima e ao caráter dos habitantes.
O estudo dos escritores políticos é extremamente importante, porque eles são os juízes dos acontecimentos do tempo, e porque se vêem aparecer as causas desses acontecimentos em suas opiniões. Assinalaremos, pois imediatamente, Gabriel Naudé que, em seus Golpes de Estado, justifica todos os delitos, e até a matança de São Bartolomeu. Êle sustentou em suas Memórias dirigidas a Richelieu, que é necessário ir direito ao fim sem se prender a reflexões minuciosas, e que a única tarefa de um ministro é ser bem sucedido. Pontano, pelo contrário, em seu Tratado de príncipe, identifica a política com a moral, e quer que os governos tenham por base a liberdade e a clemência.
O inglês Selden (1640) (De jure naturali et gen-Hum juxta disciplinam Hebroeorum) examina qual era a opinião dos hebreus concernente à lei natural e ao direito das gentes; isto é, a respeito da obrigação moral enquanto distinta da lei mosaica.
A faca de Ravaillac demonstrou onde podia conduzir a doutrina do regicídio aplicada pelo juízo privado. Os poderes já se tinham firmado; os que sustentavam a supremacia da Santa Sé não eram vistos favoravelmente pelo povo, e já não tinham tão vivos debates com os reis, pelo que a política passou a ser mais tranqüila, e favoreceu melhor o poder absoluto, calando-se do que obrando.
Os estudos dirigiram-se então para a estatística que, nascida na Itália, tinha primeiro sido posta em prática nas relações dos embaixadores; e a aplicaram a analisar as forças dos governos antigos e modernos, a expor e a aplicar as suas instruções.
Os Elzevirs reuniram as constituições dos Estados europeus num mui pequeno volume, próprio para dar conhecimento dos fatos, sem lhes assinalarem a filosofia. Fizeram-se também descrições de países, que puseram em circulação notícias pouco espalhadas ainda.
Donato Giannotti, que tinha sucedido a Maquiavel no cargo de secretário do senhorio de Florença, examinou a fundo a magistratura veneziana e a República florentina. Os Médicis o viram excitar contra eles (1540-1598) seus concidadãos. O veneziano Paulo Paruta mostrou-se, em seus Discursos políticos, se não fino e vigoroso, pelo menos assaz ousado em sua maneira de julgar os romanos e seus contemporâneos. Se a forma não fosse tão grosseira, poder-se-ia tirar dela diferentes idéias com que é honrado Montesquieu. Êle espargiu também bosquejos políticos na sua História de Veneza, que escreveu todavia a soldo da República. Descreveu de uma maneira mais franca a guerra contra os turcos, verdadeira epopéia dessa reação católica, a que parece que o autor se tinha também abandonado, como resulta de um ensaio pouco conhecido que êle deixou sobre a sua vida, espécie de confissão de suas agitações internas.
Poderíamos acrescentar a estas obras as de Bernardo Sefni, de Francisco Lausovino e de Vida (De óptimo statu civitatis); João Bodin escreveu (1577) em francês a sua República, que depois verteu em latim. É uma obra concebida em proporções de que ainda não existia modelo algum. Maquiavel (1586) reunia as combinações de uma política sem freios; Bodin quis determinar seus verdadeiros fundamentos. O florentino adotou como princípio o interesse particular do príncipe, e Bodin o interesse geral da comunidade. O fim principal da associação política é, na sua opinião, o maior bem de cada cidadão, do que resulta o bem da
comunidade inteira. O exercício das virtudes próprias, ao homem, e o conhecimento das coisas naturais, humanas e divinas, conduzem a este fim. A família é o governo de diversos debaixo de um só chefe, como a República (nós dizemos hoje o Estado) é o de várias famílias. O governo patriarcal é o melhor de todos; a mulher deve depender da vontade do marido a ponto de poder ser repudiada. O autor mostra nisto que prefere a doutrina mosaica à lei cristã. É o que êle fez em diferentes outros pontos. Êle pensa que a escravidão pode subsistir com restrições, e que não deve resolver-se senão por meio de alforrias graduais.
A lei não cria o direito das pessoas, porque esses direitos existiam antes que a força, a violência, a ambição, a avareza ou a vingança armassem o homem contra o homem, e que a vitória tornasse uns indiferentes aos outros, o que deu origem aos senhores e aos servos, aos príncipes e aos súditos, numa palavra, à República.
O cidadão é um homem livre, obrigado a obedecer ao poder supremo de outrem. Se o súdito livre reconhece o soberano e é por êle protegido, a cidade está constituída. A conquista e a submissão não bastam portanto para isso, e os privilégios de cidadão não podem ser concedidos a qualquer indivíduo que chegue de fora. A unidade é conservada pela hereditariedade nas monarquias, governo o mais oportuno, apesar de seus inconvenientes, para manter a igualdade entre os súditos.
A soberania (majestas) é o poder supremo e perpétuo, desligado de toda a lei. É bom que se reúnam parlamentos, para dar o seu parecer e o seu assentimento; mas o rei não é obrigado a seguir as suas decisões. Sendo a soberania, isto é, o poder legislativo, indivisível. Bodin não admite governos mistos, e limita-se às três espécies capitais; porém, assim como Mon-tesquieu, não indica os matizes característicos que distinguem a monarquia do despotismo, por isso que a diferença depende unicamente do caráter do príncipe reinante. O magistrado é o oficial do soberano, que o investe numa autoridade pública. O juiz deve obedecer às ordens que não repugnam às leis da natureza; e quando mesmo essas ordens lhe repugnassem, vale mais obedecer do que dar ao povo o exemplo da oposição. A República não pode subsistir sem corporações e sem mestrados.
Êle segue melhor caminho quando trata do progresso, do estabelecimento completo, da decadência dos Estados, até que chegam à sua queda, termo inevitável das coisas humanas. A erudição histórica, nele tão abundante que às vezes abala o raciocínio, lhe é de grande auxílio para explicar estas revoluções. Os grandes desastres tendem a mudar o governo popular em aristocracia; a prosperidade produz um resultado contrário. Geralmente, a democracia conduz à monarquia; e se esse governo se faz tirânico, torna a trazer a democracia. Pode-se temer na aristocracia que um ambicioso arme o povo contra os grandes. Os pequenos Estados são mais susceptíveis de mudanças do que os outros, por isso que, nesses, o povo se divide mais facilmente em facções.
Tratando depois dos meios com que se podem prever as revoluções, Bodin julga que as estrelas não lhes são alheias, se bem que a ignorância dos observadores impeça de tirar proveito de suas indicações. Êle desaprova Copérnico, e entrega-se a conjecturas sobre os números, porque segundo o que Platão disse, os Estados caem por falta de proporção.
Nós vimos Hipócrates fundar a diversidade dos costumes e das instituições sobre a verdade dos climas. Bodin desenvolveu este princípio examinando os caracteres das nações debaixo do seu aspecto físico e moral, por meio de observações de uma generalidade suficiente. Êle vê prevalecer para os pólos a força corpórea, a força intelectual para os trópicos, e ambas misturam-se nas regiões intermediárias; a violência dominar no Norte, a superstição no Meio-dia, as razões nos países do meio. Êle precede, como se vê, Montesquieu; e, como êle, porém com mais desculpa, acumula casos falsos ou mal compreendidos.
No que respeita às propriedades, êle considera como injusta a abolição das dívidas, como absurda a partilha dos bens; os testamentos prejudicam a igualdade, e as mulheres não devem ser admitidas a tomar parte igual na herança, para que não hajam de pretender igual parte na sociedade doméstica. Ao mesmo tempo que trata das penas, ocupa-se também das recompensas, e compreende quão vantajosos são para uma nação os hábitos guerreiros e as fortalezas.
Percebe-se que Bodin confunde ainda a política com as questões de direitos, quando estes são anteriores àquela. No entanto, ainda que prolixo, de uma erudição afetada, e não obstante empregar fora de propósito uma linguagem matemática, êle possuía em eminente grau a história assim como o conhecimento das leis, c observava como filósofo. Êle é o primeiro depois de Maquiavel, que tratou de política com amplidão e originalidade, na idéia de que se deve procurar a filosofia do homem no seu passado, interrogado com independência. A forma caduca do seu livro faz com que êle seja pouco lido; porém exerceu no seu tempo uma alta influência: êle foi traduzido em todas as línguas, e ao mesmo tempo que serviu de exemplo para a discussão séria das questões políticas, excitou a compor obras que o eclipsaram mais tarde.
Pode encontrar-se na Utopia de Tomás Morus algumas das doutrinas recentemente pregadas por São Simão e por Fourier. O autor supõe ter encontrado em Antuérpia Rafael Hithlódeo, companheiro de Américo Vespúcio, e que se pôs a discorrer com êle acerca dos males da humanidade. Como Rafael os atribuísse ao direito de propriedade, e o autor lhe replicasse que isso é um inconveniente inevitável, o seu interlocutor entra a falar-lhe de um país a que tinha chamado Utopia, e situado onde colocam a antiga Atlântida, país que se rege sem conhecer a propriedade.
É uma República em que todos os lugares são eletivos, até o do rei, que não tem por sinal distintivo senão um punhado de espigas, assim como o pontífice um facho que é levado diante dele. Por cada trinta famílias há um filarco, e um protofilarco por cada dez filarcos; o número destes chefes de dezenas é de duzentos; eles se reúnem para eleger o príncipe de dois candidatos propostos pelo povo, e servem-lhe de conselho. Tudo é comum entre os habitantes, à exceção das mulheres; aquele que tem necessidade de um móvel pede-o ao magistrado. Viaja-se sem despesa alguma, porque a hospitalidade é dada aos estrangeiros, que em retribuição dão o seu trabalho. Ninguém é isento de se aplicar à agricultura, e cada cidade manda vinte mancebos para os campos, Todos os indivíduos devem saber uma arte, à exceção dos que mostram uma disposição especial para as ciências. Seis horas por dia são consagradas ao trabalho, e formam-se cortes públicas no intervalo destinado ao recreio. Durante as tardes de verão, os habitantes cultivam os jardins; no inverno divertem-se em jogos morais, principalmente com uma espécie de xadrez, em que combatem os vícios e as virtudes, única guerra que os utopistas conhecem. Os grãos que eles mandam para fora servem-lhes para manter uma guarnição nas fronteiras. O ouro é desprezado entre eles, e o empregam em cadeias para os forçados das galés, assim como em argolas para as orelhas, com que assinalam os malfeitores. As comidas fazem-se em comum, a uma boa mesa, onde os sentidos são docemente estimulados pelo toque dos instrumentos por cantorias, perfumes, aspectos agradáveis, como entre os [ocieristi; e os prazeres têm por único limite o que impõe a natureza, isto é, a obrigação de evitar o excesso.
Há portanto nesta feliz região prazeres sem abuso, trabalho sem fadiga, abastança sem luxo, recreios sem ociosidade. Se alguém cai gravemente doente, o filarco aconselha-o a tomar uma bebida calmante, que o manda para o outro mundo. Os esposos devem primeiro experimentar-se: casam-se, se convêm um ao outro: se deixam de sentir mútuo agrado, divorciam-se. O adultério traz consigo a escravidão, e no caso de reincidência a pena de morte, que só neste caso é aplicada. Rafael censura o rigor das leis inglesas, que pronunciam a pena capital pelo roubo, a prisão pela mendicidade. Na Utopia, todos sabem o manejo das armas, porém não se mantém exército; a tolerância é inteira para todos os cultos; são banidos unicamente os que perturbam a tranqüilidade da religião,
Este livro é, pois, como os do mesmo gênero, uma obra mais de imaginação do que de cálculo, com a censura habitual dos abusos então em voga. Porém êle mostra que se conhecia o mal, e que se tratava de achar um estado de coisas melhor. O nome dessa República imaginária ficou existindo na língua para designar esses projetos inexecutáveis que todavia deixam sempre alguma coisa na realidade, e que às vezes não são mais do que verdades intempestivas.
Encontra-se alguma semelhança com a Utopia na Cidade do Sol, por Tomás Campanella, que pensou reformar o gênero humano restabelecendo a integridade e a harmonia do poder, da sabedoria e do amor. Campanella faz, portanto, o quadro de uma sociedade dirigida por um chefe supremo que representa Deus, e de que dependem três ministros: um que preside ao uso das forças outro à propagação da ciência, o terceiro à união social e à conservação da vida. Não seria essa a monarquia universal da Santa Sé? Porém, êle prega a comunidade dos bens e das mulheres, a abolição da família e da servidão: quer que o serviço doméstico seja transformado em função pública; que o poder, ou, para falarmos mais precisamente, a direção dos trabalhadores, seja exercido em cada grau da hierarquia por um homem e por uma mulher.
Êle emite observações profundas e novas sobre a história e a alta política da corte de Roma. Do fundo da sua prisão escrevia (1598) a Filipe II, a lhe implorar licença para ir falar-lhe de coisas extremamente importantes para a Espanha; e, privado de livros, encerrado, havia dez anos numa estreita casinhola, reconheceu a causa que produziria a decadência desta potência, então no seu apogeu.
Êle assinala em primeiro lugar a insulação orgulhosa da raça espanhola, e aconselha por isso a favorecer os casamentos com os flamengos, os alemães e os napolitanos, a fim de fazer desaparecer as antipatias que estes povos nutrem para com os espanhóis, apesar de imitarem os seus modos; e como é impossível sujeitar esses ânimos orgulhosos aos usos dos estrangeiros, convém induzir estes a tomarem os hábitos espanhóis. Uma grande prova do seu orgulho é que ainda que avaliem fatos gloriosos, eles não pensaram em contá-los. "Vossos barões e vossos condes, diz êle ao rei, vos empobrecem empobrecendo vossos súditos. Eles não vão revestidos do título de vice-rei ou de governador senão para despender loucamente o dinheiro, adquirir criaturas, e se arruinar em prazeres; depois, exaustos pelo luxo, voltam à Espanha para se refazerem, roubam à direita e à esquerda; enfim, outra vez ricos, recomeçam e melhor, e sabem mil artifícios para comer os bens dos pobres súditos."
Essa falta de habilidade para conservar foi precisamente o defeito pelo qual a Espanha não atingiu à monarquia universal senão para cair no abismo. Porém, aquele que diz a verdade antes de tempo não é agradável nem aos reis, nem aos povos, que igualmente gostam de ser lisonjeados. Por conseguinte, os povos não escutaram, os reis perseguiram esse frade que revelava quanto a repartição dos impostos era má, porque os nobres os faziam pesar sobre os cidadãos, estes sobre os artífices e sobre a gente do campo. O sistema que êle sugere é semelhante às nossas contribuições diretas e indiretas, porque sujeita a uma leve taxa os objetos de primeira necessidade, e porque carrega principalmente os objetos de luxo ou de divertimento. Êle lamenta a capitação, e pede um imposto sobre os bens de raiz.
Não admira encontrar doutrinas econômicas tão sãs, tanto tempo antes de serem ensinadas magistralmente? Acha-se contudo também neste livro o conselho de criar um hospício para os inválidos, uma escola especial para os marítimos novos; de fornecer asilo e dotes às filhas dos soldados; de emprestar gratuitamente sobre penhor aos pobres; isto é, de fundar esses montes com justiça chamados pios; bancos para receber os capitais dos súditos, dando-lhes conta /do emprego dos fundos e dos interesses. O autor recomenda a comemoração de uma boa frota, porque a chave do mar é a chave do mundo; a não imitar nas colônias e nos países conquistados, os franceses, qui quum multa acquisiverint, nihil servaverunt, porque não sabem moderar-se: chamando a si por um lado liberdades de mais, e deixando por outro demasiadas liberdades, eles tratam hoje seus súditos com uma lhana bondade, amanhã com um rigor violento. Êle aconselha também dissuadir os espíritos das sutilezas teológicas, para os aplicar à história e à geografia, ao mundo real. Pede um código uniforme, a admissão nos empregos de todo aquele que para eles fôr capaz, menos favor para a nobreza de nascimento e para a fortuna. Finalmente, êle queria que se excitasse o amor da glória e o sentimento da honra; que se oferecesse um objeto elevado às ambições; que se tratasse de reconduzir as moedas à uniformidade, de animar as manufaturas, de tornar as minas mais produtivas.
Pensando depois nas grandes descobertas operadas, Campanella çonsolava-se na prisão representando-se com felicidade seguros progressos da humanidade. "A reforma da sociedade, dizia êle, será completa no século que vem. Destruição em primeiro lugar, depois reedi-ficação; uma monarquia nova, e uma mudança total das leis". A força do caráter do homem lhe inspirava essa confiança, ainda mais do que as descobertas: "Como é que, diz êle, o livre progresso do gênero humano pararia, quando quarenta e oito horas de suplício não têm podido domar a vontade de um pobre filósofo, nem mesmo arrancar-lhe uma palavra contra a sua vontade?"
No tempo das Repúblicas italianas, os homens que as administravam, acostumados à vida privada, conheciam o preço e a importância da economia e do trabalho, cujas regras eles aplicaram à família civil. Pode, portanto, dizer-se que a economia política, que já não fazia consistir unicamente na guerra a força dos Estados, nasceu na Itália. Quando as grandes monarquias foram formadas, os ministros elevados por cabalas e sustentados por intrigas não souberam mais do que dissipar os tesouros amontoados, para satisfazer os caprichos desconhecidos dos reis. Pela sua parte, os reis, chamando a si a direção geral do Estado, tiveram constante necessidade de dinheiro para pagar o salário dos funcionários e para a sustentação das tropas; e durante este tempo o comércio adquiria um desenvolvimento inteiramente novo.
A atenção dirigiu-se, portanto necessariamente para a ciência das riquezas, e os italianos produziram, no que foram os primeiros, obras em que a economia das nações é reduzida a sistema. Antônio Serra de Cosença, estando preso na Vigaria (1 ó 13) como cúmplice de Campanella, dirigiu ao conde de Lemos um tratado sobre as Causas que podem fazer abundar os
Estados em ouro e em prata. As fontes das riquezas são, segundo ele, quer naturais, como as minas, quer acidentais e comuns, ou acidentais e particulares, isto é, podem achar-se em todos os países ou somente em alguns. As diversas manufaturas, o caráter dos habitantes, um comércio extenso, um governo circunspecto, entram nas condições comuns; e a fertilidade do solo, uma posição favorável, nas condições particulares. Êle prefere a indústria à agricultura, porque ela pode multiplicar indefinidamente os produtos. Um terreno capaz de receber cem alqueires de trigo não dará mais se o semearem com cento e cinqüenta; enquanto que as manufaturas podem centuplicar mesmo seus produtos, sem que as despesas aumentem na proporção.
Serra é, portanto, um desses italianos pouco numerosos que se declararam a favor do sistema industrial, e isto num tempo em que semelhantes verdades eram inteiramente novas. Como todos os homens políticos na península, êle admirava Veneza, que falta de tudo, excedia Nápoles em riqueza, em virtude do seu comércio e da estabilidade de suas acertadas instituições, enquanto que o governo mudava, no reino com cada vice-rei, e, no Estado pontifício, com cada papa.
As idéias mercantis e exclusivas dominavam na prática. Sendo a quantidade do numerário considerada como a riqueza do país, ocupavam-se de a aumentar em detrimento dos outros produtos, de se apoiar sobre privilégios, de pedir ao governo disposições protetoras a uma ação incessante. Henrique VII, da Inglaterra, fixa o preço dos panos, dos chapéus, dos jornais, e Bacon louva-o por isso: Henrique IV, da França, não só confirma os editos de Carlos IX sobre os mestrados, mas, além dos mercadores, sujeita a eles também os artífices.
Carlos V sobretudo arruinou a economia política, procurando riquezas nos eventos da guerra como nos tempos feudais: êle introduziu na administração os erros e as rotinas ignorantes que se perpetuaram à sombra do seu nome; declarou legal o tráfico da escravatura dos negros, fêz reservar o trabalho para certas classes, e sacrificou as colônias à metrópole por exclusões absurdas.
A falsificação das moedas tinha sido considerada muitas vezes pelos governos como um outro meio de se enriquecerem e eles continuaram a recorrer a esse meio, apesar dos funestos resultados que êle produziu. Carlos V fêz desaparecer as moedas italianas espalhando os escudos de ouro de Castela e outros mais de baixa liga. Começava-se, todavia, a estudar cientificamente esta matéria; e o conde Gaspar Scaruffi (1579) propôs, em seu Discurso sobre as moedas, e da verdadeira proporção entre o ouro e a prata, uma reforma geral para as reduzir a um tipo e a um valor uniformes, pensamento muitas vezes produzido, mas que até aqui tem ficado em projeto.
Bernardo Davanzati tratou (1588) também das moedas e dos câmbios, mas sem profundidade. Diversas dissertações de João Donato Turbolo têm por objeto as desordens particulares às moedas do reino de Nápoles.
Não obstante os juristas práticos considerarem como uma profanação a introdução da literatura na jurisprudência, esta ciência pôde fazer progressos logo que a filosofia veio associar-se-lhe para fazer conhecer o verdadeiro valor dos termos legais e técnicos entre os legistas romanos; o milanês André Alciato (1492-1550) é considerado como o seu restaurador. Êle
professava o direito em Bourges, mediante seiscentos escudos; como quisesse ausentar-se desta cidade, o rei acrescentou-lhe trezentos escudos, o Delfim fêz-lhe presente de uma medalha que valia quatrocentos, e aconteceu muitas vezes a Francisco I tomar lugar entre seus ouvintes. Alciato, ainda não satisfeito, deixou a França, e veio professar em Pavia por mil e quinhentos escudos, depois sucessivamente em Bolonha e em Ferrara, sem nunca se achar suficientemente recompensado. Letrado e ao mesmo tempo erudito, ele arroteou o campo do direito romano, coberto de citações impróprias da história, de raciocínios complicados; e lhe introduziu um bom estilo, uma marcha regular, e uma filosofia sem pedantismo. Assim penetrou mais adiante no espírito das leis do que seus intérpretes de ordinário faziam, posto que não vissem como suas composições positivas se ligavam ao direito natural e dele derivavam.
Os advogados e os professores o desaprovavam como homem de letras; porém Cujacio de Tolosa, marchando sobre seus passos, deixou atrás de si todos os juristas civis, desembaraçando o direito do estorvo das intermináveis glosas, dizendo tudo quanto tinha podido ser dito antes dele, e substituindo uma erudição geral às sutis interpretações da escolástica: por isso êle desprezava a jurisprudência prática e a aplicação das leis modernas.
Guilherme Budé, de Paris (1467-1540), aplicou convenientemente a filologia e a história ao direito romano. Dumoulin, protegido por l’Hôpital, estudou a fundo a matéria dos feudos. Os reis tinham destruído o feudalismo político; Filipe Augusto tinha-lhe tirado o direito de fazer a guerra; São Luís a jurisdição; Filipe, o Belo, o direito de cunhar moeda; mas a coroa tinha adquirido assim mais autoridade do que poder. Henrique III, em seu edito de 1579, ordenou ao ministério público que informasse sobre as usurpações dos senhores, mas recomenda-lhe que proceda em segredo, dando assim prova ao mesmo tempo de autoridade e de fraqueza.
Tinha-se feito também uma revolução nas classes elevadas. Quanto ao povo, jazia ainda inobservado debaixo do pesado jugo dos feudatarios, cuja injustiça tinha sobrevivido ao seu poder. Dumoulin quis fazer chegar até êle as conseqüências da revolução política (1566), respeitando sem dúvida, no sentido legal, os direitos adquiridos; porém determinava o seu limite. Êle não obteve grande resultado; porém felizmente diminuiu os direitos senhoriais que pesavam sobre todos os atos de vassalo, e foi buscar-lhe limites nas leis romanas, assim como na razão. Dumoulin deveu maior celebridade a suas Observações sobre as pequenas datas, escritas na intenção de abater as pretensões de Júlio II, no que êle foi de tal modo feliz, que Francisco I disse ao condestável Anneo de Montmo-rency: O que não conseguiram os vossos trinta mil sol-dados, alcançou-o este homenzinho com este livrinho. Talvez que êle adotasse as doutrinas dos reformados, que nessa hora apoiava, e que lhe causaram tantas vicissitudes. Êle escrevia, no princípio de suas consultas: Eu, que a ninguém sou inferior, e a quem ninguém pode ensinar coisa alguma.
Os protestantes tinham reagido contra o ideal dos católicos, entronizando a força, o fato, a dominação sobre a inteligência. A sua jurisprudência continuou a ser a estatística dos fatos sociais que são do domínio da gente; porém eles tendiam contudo a constituir o direito da natureza, a fim de adquirir alguma legitimidade. Este direito, julgavam eles achá-lo no código
Romano, e imaginaram que as relações sociais que aí são estabelecidas eram a sumidade da ordem civil. O princípio metafísico não foi a necessidade moral de realizar a perfeição da humanidade, mas o desejo comum do bem; em conseqüência, como o justo e o injusto eram definidos, o que convém ou não à felicidade, foi o sentimento individual que, em vez da razão geral, ficou juiz competente da questão.
A segunda metade do décimo-sexto século foi chamada idade de ouro da jurisprudência (1525-1575). Bastará mencionar os franceses Duaren e Barnabé Brisson, enforcados em Paris por ordem dos Dezesseis; o português Gouveia; Júlio Claro, de Alexandria, no Piemonte, que publicou o Sententiarum receptarum opus e a Prática civil e criminal; Tiago Menocchio e outros mais, cujas obras não estão inteiramente esquecidas; Vinnius, que cimentou as Instituías; o romano Farinacio, e, finalmente, Godofredo, cujo Corpus júris civilis se tornou clássico.
Não só se corrigiram os erros dos copistas, mas remediaram-se também as alterações devidas a Tribo-niano. Antônio Favre, nascido na Sabóia, pretendeu com mais ousadia que a lei estava mutilada e corrupta a tal ponto, que convinha abandoná-la; êle tem o mérito de a ter compreendido largamente, e de ter aventurado opiniões diferentes daquelas que eram comumente recebidas. Hotman (Antitribonianus) (1567) imputa a Triboniano o ter causado a perda dos legistas originais, de ter mutilado e invertido as passagens; apesar de louvar o mérito dos jurisconsultos romanos, êle não admite o da compilação de Justiniano, e, indicando tudo quanto o tempo tem feito envelhecer dessa obra, declara que é loucura conservar essas fórmulas caducas.
Alexandre Turamini, de Siena. professor em Roma, depois na sua pátria, em Nápoles e em Ferrara, compôs um tratado do Legista das Pandectas, que os historiadores da ciência têm injustamente olvidado. Afastando-se de Ulpiano, chama, com Santo Tomás, à lei da natureza uma participação da lei eterna na criatura racional, e dá-lhe assim por fundamento a vontade do Criador, manifestada por meio da razão, do que se segue que ela é a mesma em todos os povos, tão imutável em seus princípios como variada em seus resultados. Mas, visto que, munida só da sanção interna, ela é insuficiente contra as paixões, e não estabelece nem a medida, nem as modificações dos direitos, é preciso para a suprir uma lei civil, que se acomode com os tempos, com os climas, com os hábitos; por conseguinte, mesmo as leis que dizem respeito a objetos particulares estão em harmonia com o sistema político da nação. Êle quer que as leis sejam simples, em pequeno número, breves, possíveis, e que a crueldade do homem não se dê a conhecer nas penas, mas na balança da lei. A eqüidade civil corrige a lei, ou quando, nimiamente geral, ela abrange um caso que não devia examinar, ou quando, nimiamente particular, ela lhe não dá atenção. É ela que dita a maioria das prescrições romanas que Turamini demonstra, para honra delas, serem derivadas da lei natural.
Pio IV concebeu o pensamento de fazer corrigir o Decreto de Graciano que tinha misturado o falso com o verdadeiro, confundindo ou mutilando os cânones, e cuja cronologia era errônea. iÊle nomeou para esse fim (1582) uma congregação que acabou o seu trabalho no pontificado de Gregório XIII. Fêz-se então uma edição magnífica do Corpo de direito canónico, edição que oferece melhoramentos sem dúvida, mas cujos erros ainda são numerosos, assim como as falsas decretais.
A jurisprudência alargou-se quando se chegou a estabelecer o direito internacional, que, apoiando-se primeiramente sobre casos teológicos, sobre as analogias do direito positivo e local, sobre os costumes, exemplos e algumas antigas recordações, como o direito feciaí, se constituiu então sobre uma eqüidade bem entendida; reconheceu-se o direito ao inimigo, e admitiu-se o raciocínio político de preferência ao precedente das conquistas anticristãs. Os principais autores são também aqui os teólogos: assim Francisco de Vitória, frade dominicano, professor em Salamanca, em suas Praelectiones theologicae, declara o governo de instituição divina: do mesmo modo que, diz êle, a maioria de uma nação escolhe o seu rei, a maioria dos cristãos elege o imperador. A seu exemplo, Domênico Soto, seu discípulo, sustenta que os índios podem dispor de suas propriedades e da soberania; êle se levanta contra o tráfico da escravatura dos negros, e emprega constantemente essa justiça e essa humanidade tão comum entre os teólogos espanhóis quão rara entre os ministros desse povo. Baltasar Ayala (1581), juiz advogado do exército espanhol nos Países-Baixos, no tempo de Far-nese, em sua obra intitulada Direito e dever da guerra e da disciplina militar, trata da injustiça da guerra: êle nega o direito que há de a fazer aos infiéis só por motivo religioso, ainda que com autorização do papa, por isso que a infelicidade não priva da dominação.
Alberico Gentile, protestante italiano, professor em Oxford, do qual já temos falado diferentes vezes, não se limitou ao direito romano, único sistema ensinado então cientificamente na Inglaterra, onde o código municipal estava abandonado à disciplina bárbara das escolas de direito comum (Inns of Court); porém submeteu a exame a jurisprudência natural (de Legationibus, 1533). Êle demonstra a importância e a santidade das embaixadas; sustenta que a diferença de religião não priva do direito de as enviar; e que as ações civis contra os funcionários públicos podem ser levadas perante os tribunais ordinários. Êle foi o primeiro que discutiu sistematicamente, no seu tratado de Jure Belli (1589), essa parte do direito das gentes, e sugeriu talvez a idéia, mas seguramente a ordem da sua obra, a Crócio, que excedeu todos os escritores precedentes.
Este eminente engenho apareceu (1583-1645) no momento em que Maquiavel, Lutero, Calvino, Carlos V e Richelieu tinham minado o antigo direito público. As guerras ferozes e as desordens de que êle foi testemunha lhe inspiraram o desejo de buscar remédio a tantos males, e de refutar, diz êle, os que sustentam que não existe nenhuma obrigação recíproca entre os povos, e que tudo é lícito em tempo de guerra.
É talvez por isso que êle intitulou o seu livro Direito da Guerra, em vez de Direito das gentes, e que se coloca no campo de batalha para ensinar o direito internacional. Porém, como conciliar as nações entre as quais a variedade das opiniões religiosas tinha produzido uma tão grande diversidade de interesses políticos, e uma maneira tão diferente de entender a justiça? Se havia um ponto em que elas concordassem era o respeito pela antiguidade. Portanto, Crócio ‘ligou-se a ela para confirmar as deduções da idéia do direito; e, mesmo se ela se acha na consciência humana, não lhe dá apreço, senão quando tem por base a história antiga. Êle vai portanto procurar em Homero, em Virgílio, em Tácito, em Tucídides, que obrigações impõem a paz, que abusos permitem a guerra, sem lhe importar as novas relações de uma sociedade cristã fundada sobre a indústria e liberdade de todos, ao passo que a sociedade antiga assentava sobre a ociosidade e sobre a escravidão.
As conseqüências não podiam deixar de ser atrozes; mas como as idéias com que êle fora educado assentavam besn diversamente sobre as inspirações da consciência, êle se achou reduzido a estabelecer uma distinção inteiramente estranha ao seu ponto de partida, e a admitir, com o direito natural derivado da sociabilidade do homem, um direito das gentes propriamente dito; a distinguir a obrigação jurídica da moral; a justiça nascida do consentimento dos povos, da moderação que faz com que uma alma generosa tenha repugnância em cometer o mal sem uma necessidade absoluta.
Êle divide, em conseqüência disso tudo, o direito, em direito natural e em direito voluntário. O direito voluntário provém das leis e é humano ou divino; este último concorda plenamente com o direito da natureza, e é geral ou particular. O direito geral foi revelado por Deus, a todo o gênero humano, primeiro depois da criação, posteriormente depois do dilúvio, finalmente por Cristo; o outro é próprio ao povo hebraico, e os cristãos não lhe estão obrigados. O direito humano é depois civil, ultra-civil e das gentes. O primeiro nasce de leis emanadas da autoridade soberana; ao segundo pertencem o direito patrimonial, o direito senhorial e outros direitos submetidos à autoridade de que se acaba de falar; o último é tornado obrigatório pela vontade unânime de vários povos. Crócio dispõe assim uma transição para passar às obrigações da paz e da guerra. Êle reconhece a independência das nações, mas não a liberdade dos povos; supõe um poder absoluto, a transmissão patrimonial dos reinos, a soberania tirando a sua origem não da natureza, mas da organização política; e, discutindo se os reis são obrigados a cumprir as suas promessas, acha a moral absoluta em oposição com a opinião dos tempos.
O direito não deriva, portanto, para êle de uma fonte única, mas umas vezes da sociabilidade, outras do hábito ou das máximas gerais da natureza. Por esse motivo falta-lhe precisão e firmeza, e vê-se às vezes obrigado a confessar que não pode dar a derivação científica das excelentes conclusões a que é levado pelo sentimento. Mackintosh, o único publicista clássico do nosso tempo talvez, e grande admirador de Crócio, admite que o seu método não é nem conveniente, nem científico. Ao passo que a ordem natural demonstra que nós devemos procurar primeiro os elementos da ciência na natureza humana, depois aplicá-los a regular a conduta dos indivíduos, e recorrer a eles enfim para decidir as questões complicadas nas relações de nação para nação; Crócio, pelo contrário, atende primeiro ao estado de guerra e de paz, e não examina senão acidentalmente os princípios primitivos, à medida que eles surgem das questões de que êle trata. Em conseqüência, êle não desenvolve suficientemente essas regras fundamentais, e não as conduz ao ponto em que a sua discussão seria mais instrutiva. Algumas vezes dogmático, à maneira de Tácito, o que o torna obscuro, seu estilo torna-se prolixo em outras ocasiões, quando se lança na ciência; e suas discussões, posto que doutas e sutis, estorvam a sua marcha, que, pecando pela clareza, tem mais do erudito que do filósofo.
Seja como fôr, a sua influência sobre o mundo prático e político foi igual à que exerceu Bacon sobre a maneira de pensar, A primeira cadeira de direito natural e das gentes foi criada em Heidelberg para o explicar. As Universidades da Holanda e da Alemanha quiseram também que suas doutrinas fossem ensinadas em seu seio; e êle teve a honra, reservada aos clássicos, de ser impresso Cum commentariis variorum. Crócio restaurou assim uma ciência arruinada pelas paixões violentas. Êle chamou a atenção dos sábios sobre as questões que não decidia, e publicou um código de regras deduzidas de princípios arbitrários e faltos de sanção, mas contudo salutares. Uma vez despedaçado o laço religioso, aquele que se lhe queria substituir não podia ser perfeito; o melhor contudo devia ser a inclinação inata no homem para o estado social. Este princípio, que se opõe aos teoremas desapiedados de Maquiavel e de João Jacques, foi adotado por Puffendorf e pelos outros publicistas até Gerardo de Rayneval, dando sempre parte maior à autoridade da consciência humana e aos fatos históricos. Desde então, o direito das gentes tornou-se racional com a filosofia, e em alguns modernos tem mesmo sido confundido com o direito natural propriamente dito.
Quando esta nova ciência da jurisprudência natural foi aplicada a determinar a conduta dos indivíduos na sociedade, ela se estendeu aos princípios que devem dirigir os Estados considerados como entes morais, vivendo em uma sociedade comum sem leis positivas. Resultou daí a ciência mista do direito natural e internacional; e muitas vezes a opinião pública, formada por estes novos professores, obrigou os reis a respeitarem a justiça e a humanidade melhor do que o faziam os antigos, e forneceu aos fracos auxílio contra a oposição.
Crócio era filho do burgomestre de Delft; nomeado advogado geral da Holanda, da Zelândia e de West-frisia, publicou o Mare liberum para defender a propriedade comum deste elemento, e por conseguinte o comércio holandês nas índias. Êle esteve detido muito tempo em prisão, por causa das questões sobre a graça; depois viu-se acolhido favoravelmente por Cristina, da Suécia, que o enviou à França na qualidade de embaixador. Incapaz de se sujeitar aos usos das cortes e de sofrer com paciência a servil espera das antecâmaras, viam-no retirar-se a um canto para ler o Novo Testamento em grego.
Fonte: Edameris. Trad. Savério Fittipaldi.
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