Por que "deus deve ser bom"?

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  • #75650

    Oi Marcio,

    acho que vou fazer cooper no campo minado…

    Interessante o texto por vc citado, da revista Galileu. Contudo, mesmo esse texto nao esgota o assunto sobre um tema tao polemico qt procurar a plena compreensao da experiencia existencial de outra pessoa – aqui no caso, Einstein. Mas, uma vez que palavras sao limitadas para expressar uma experiencia religiosa, interpretar o sentido mais profundo do dito por Einstein é partir para as mais diversas conjecturas. Por outro lado, se nao quisermos ficar simplesmente no silencio sobre o assunto, só nos resta mesmo voltar para as palavras dele. Que seja:

    Sobre o “Deus de Spinoza”, parece indicar a crença num “deus-causa-última” que explica e dá consistência a um sistema fechado de pensamento. A “liberdade” espinosiana não é o reconhecimento da necessidade? É livre quem age movido pela razao. Deus é base do sistema. A natureza é Deus.

    Os dados parecem apontar mais uma vez para aquele “Deus” conhecido pelo termo cunhado por Pascal qd criticava a razao iluminista: o chamado “Deus dos filosofos”. De fato, essa distinção já antiga na filosofia: a diferença entre (1) o “Deus dos filósofos”, criado aos moldes da razao para justificar ou explicar um sistema de pensamento – coisa bastante anterior a Spinosa, noutra forma já aparecia no motor imóvel de Aristóteles, por exemplo -; e (2) o Deus de Abraão, Isaac e Jacó recordado por Pascal.
    Mas, partir daí para falar em ateísmo é dar um salto e tanto (compreensivel, já que Spinoza foi acusado de ateismo diversas vezes), esse tipo de afirmação não é completamente correta, mais certo seria falar de um tipo de panteísmo filosófico.

    Alias, nao surpreende que Einsten veja com bons olhos o Deus de Spinosa, basta recordar a dificuldade que tinha com o pensamento de Bohr, no sentido de nao conseguir aceitar algo que ferisse o necessitarismo mecanicista derivado da corrente de pensamento herdada desde Newton. Era uma metafísica pobre, e a experiência de certo modo mostrou que Bohr tinha razão, a impossibilidade de prever a posição de um elétron coloca o determinismo numa sinuca.

    Falar de “deus dos ateus” nao ajuda muito, acho. Melhor evitar coisas do gênero
    A questão de Deus é tema pra lá de complexo, e, especialmente, contemporaneamente tornou a ser campo dos mais ferteis.

    De certa forma, assunto que tem a ver é que a razao vem sendo constantemente colocada contra a parede e nao tem conseguido responder satisfatoriamente aos questionamentos que lhe são colocados. A fé, em outros tempos, foi colocada no banco dos réus; mas logo depois foi a vez da razao. Ao criticar a razão, alguem poderia perguntar: mas, “de que razao vc está falando?”. Ora, isso, por si só, já é exemplo do problema: quando alguem começa a perguntar “que razao?”, é sinal de que ela não está tão bem como antes.

    Acho engraçado (ou triste) qd alguém afirma: “sou ateu, não tenho fé”. Parece puro contra-senso.

    Também qd alguém diz: “não acredito em Deus, pq existe o mal”. Ora, em que tipo de “deus” se pensa num caso assim? Dá a entender que a procura é por algo do tipo de um “Deus da lousa”… algo ou alguém que explique o que não consigo entender.

    Outro – para complicar – poderia afirmar justamente o contrario: se Deus tivesse sido descoberto seria a maior prova de que Ele não existe. O Deus transcendente não existe para explicar nada, não poderia ser alcançado por esforço, mas somente recebido como dom, e explicar é problema nosso.

    E já que chegamos até aqui:
    O conhecimento de Deus não é da ordem do saber, é existencial.
    Deus não só não explica tudo como ainda é espaço para o mistério.
    E a razão corre atrás do próprio rabo.

    Mesmo correndo o risco de parecer dogmatico ou contraditorio, estou usando a razao para mostrar que a razao nao funciona (sempre). Ops! Pareceu isso? Ruim com ela, pior sem. Como no caso da liberdade, encontrada por alguns no reconhecimento da necessidade, o ápice da razao talvez esteja justamente no reconhecimento da sua limitaçao.

    Ainda tenho as duas pernas?

    []´s

    #75651
    márcio
    Membro

    Sim, claro que tem.
    Curioso o ataque a razao. Nunca tinha pensado por esse lado.
    Fé = crença incondicional. Nao quer dizer o ateu nao tenha fé em nada. Eu, por exemplo, tenho fé que estamos em um processo de descobrimento continuo, praticamente infinito. Nao que esse processo seja linear, acho que estamos dando voltas , mas avançando.

    Mais importante que achar a fé é achar a felicidade. Pode alguem sem fé em nada, ser feliz. Nao sei, talvez sim, porque nao ? Pode um ateu ser completamente feliz. Sem duvida.

    Abracos

    #75652

    Penso que quando falamos da existência de deus, quer se trate de ateus ou crentes, o nível é sempre o da crença…sim, crença. Não há “conhecimento” da existência de deus ou da sua não existência..falamos, por isso, de crença, de adesão ao “sim” ou ao “não” adesão essa que pode implicar mais ou menos argumentos de carácter “racional”.Quanto à Fé…não creio que ela tenha de ser incondicional, entendendo aqui “incondicional” no sentido de “cega”…

    abs.

    #75653

    Bem, essa palavra “cega” com que vc adjetivou a fé nao parece ser muito adequada nao

    Acho que entendi o ponto, mas acho que falar de “fé cega” já traz em si uma conotaçao negativa, nao? De alguma forma, mesmo a fé é (deve ser e é) avaliada pela razao (mais ou menos adequadamente, de acordo com a capacidade de cada um). A razao nao é um instrumento de que eu possa abrir mao quando nao quero usar, faz parte de mim, entao, mesmo o ato mais absurdo (aos olhos de outro) faz algum tipo de sentido para quem o comete. Por outro lado, o uso da razao tb envolve uma experiencia de fé, já que o sonho de um conhecimento “puro”, que nao parta de nenhum pressuposto, é bem inocente (embora muitos ainda se esforcem para cultiva-lo). Isso acaba gerando uma dialética interessante… razao-fé trabalham juntas. Melhor que tentar acabar com essa tensao pela exclusao ou achatamento de um desses polos seria “afinar a corda” para buscar conseguir uma musica melhor.

    Como coloquei acima, pareceria que nao há lugar para o ateismo, o que poderia soar bastante estranho (!). Mas a Isabel lembrou que algum tipo de crença sempre há, e o ateismo nao está excluido disso. E doutra forma acabaria por apresentar a fé pragmaticamente, o que seria ao fim descalifica-la como fé. O tema da relaçao (ou nao) entre razao/fé é sempre complexo, pq trabalhamos no limiar do conceito de razao. Na filosofia da religiao costuma-se falar, além do racional, no razoável. É mais alguma coisa para se pensar…

    Esse assunto, a importancia da fé, tem sido retomado por alguns filosofos contemporaneos noutros termos, o que traz novos aportes interessantes. Só para citar um filosofo mais conhecido, vale lembrar Derrida, que fala da importancia da religiao (e da fé), como algo que nao pode ser colocado a parte se se quer pensar a experiencia humana. Nesse contexto ele alerta contra a tentaçao de se colocar religiao como alguma coisa descartavel, e fala da importancia da “experiencia do fiduciário e do fiável” (fé como confiança ?!) para a possibilidade de qq processo de socializaçao. De fato, sem a confiança, é obvio, nao conseguiriamos conviver juntos.

    O que ocorre com frequencia é que muitos ainda vivem uma religiao como algo “infantil”, uma fé nao amadurecida, e que nao suporta dialogar com algo que a questione. Acaba em fundamentalismo. É a tentativa de resolver (destruir) a tensao (que apontei acima no exemplo razao-fé) pelo achatamento/silenciamento da razao (ou de qualquer outra coisa que surja como negaçao).

    Outro lado do mesmo problema é que muitos atacam toda religiao como se ela pudesse ser sempre reduzida, necessariamente, a alguma coisa do tipo descrito no paragrafo anterior. O que é, mais uma vez, buscar resolver (destruir) a tensao pelo achatamento/silenciamento agora da fé. Fundamentalismo da razao?

    Nao se encontra muitos com um conhecimento filosofico razoavel, e menos ainda com conhecimento teologico. Por razoes historicas, a teologia ficou muito associada com uma vertente ontoteologica. O que poucos parecem saber é que a religiao contemporanea (da qual o cristinismo é, evidentemente, o carro chefe por diversas razoes, e entre outras uma historica) evoluiu tanto que muitas da criticas antigas passam a kilometros do alvo. Pena (será?) que essa religiao dos teologos esteja ainda fora do alcance da grandississima maioria. Alguns teologos hoje sao mais criticos do que muitos filosofos antes tidos como ameaça.
    Mas, evidente, buscam resolver o problema da fé pela procura da sua maturidade, e nao atraves da sua morte.

    []´s

    #75654

    Olá Walace….

    Tem toda a razão quando diz que a religião evoluiu e que muitas críticas estão descontextualizadas. Tem havido, efectivamente, por parte de muitos teólogos um esforço de reflexão e uma tentativa de mudança.

    No entanto,quando referi a expressão “fé cega” estava a reportar-me à forma como, de um modo geral, a fé é entendida, ou seja, como um domínio que se encontra afastado da razão, onde a razão não tem lugar. Mas atenção, não estou a dizer que são domínios opostos ou que se auto-excluem…limito-me a referir aquilo que é lugar comum e o nosso papel é, justamente, desmontar esse lugar comum. Muitos dos equívocos que existem em relação às relações Fé/Razão, provêm da compreensão da fé como “fé cega” e ESSE é o problema…a fé não tem de ser cega, não pode ser cega até porque, de uma forma ou de outra, ela está presente a partir do momento em que aderimos

    Aliás, penso que a verdadeira Fé é esclarecida pela razão…

    abs.

    #75655

    Oi Isabel,

    De certo modo eu tinha entendido que vc tinha colocado algo parecido já antes, o que escrevi nao foi destinado especialmente para vc mas obrigado por esclarecer ainda mais.

    Essa relação fé-razão foi tema constante na filosofia medieval. Entrou em crise com o iluminismo, depois das guerras de religiao, com a fé sob suspeita. E agravou-se com o assoberbamento da razao, que se tornou totalitária e “produziu” varios absurdos. Com o holocausto, o sistema marxista-anti-religioso da extinta URSS do pós-guerra, o sistema marxista-anti-cultura-burguesa de Mao, por exemplo, alguns começaram a perceber que algo nao ia bem… Mas mesmo antes algumas vozes mas esclarecidas já percebiam que havia algo de podre no reino da dinamarca, e nesse contexto se entende melhor as obras de Kierkegaard, Freud, Schopenhauer, Kafka, Bergson, Nietzsche e outros. De qualquer modo, esse tema tem retornado com força enorme, e, especialmente, na midia sempre atrasada, depois do ataque as torres no dia 11 de setembro.

    Entre os que tem se aventurado mais recentemente nesse assunto estao nomes do porte de Gadamer, Vattimo, Derrida, Rorty, Levinas, Wittgenstein, Jaspers, Habermas e muitos outros.

    Coloquei isso só para, como vc disse, colaborar no desmonte do lugar comum

    E, falando de lugar comum, o tema de origem dessa lista: “por que deus deve ser bom?”. Essa pergunta tem (ou teve) algum sentido?

    []´s

    #75656

    Olá Walace…

    Se calhar a pergunta não faz muito sentido a não ser que nos coloquemos numa perspectiva cartesiana do génio maligno!!!

    Penso que o atributo “bondade” sempre foi um atributo da divindade…o que poderá ser discutido é se deus é sumamente bom..mas isso é outra coisa…e como isso é ou não conjugável com a perfeição é outro assunto ainda…

    abs.}

    #75657
    márcio
    Membro

    Interessante. Olhei no dicionario sobre a palavra Fé, mas nao me ajudou muito: Fé aponta para Crença e Crença aponta para Fe.

    A associacao que eu tenho da palavra Fé é com Crença incondicional, que para mim, acaba passando por ausencia de questionamento (que pode estar associado a “cegueira”).

    A principio tenho dificuldade em imaginar uma … “fé racional”. Se num processo racional, chego em uma bifurcação intransponivel, posso escolher um deles num ato de Fé. Mas nao foi uma escolha racional. Foi uma escolha baseada em Fé.

    Vejo Fé e Razao como antagonicos. Entretanto, a Fé é util (entre outros motivos) quando a Razao se encontra … perdida.

    #75658

    Olá Márcio!!!

    A relação Fé/Razão é uma relação complexa..sempre o foi!!! Agora, quanto ao facto de serem antagónicas..bem..não concordo Márcio..mas eu explico porquê!!! A razão é insufuciente, como todos sabemos e bem deixou antever…nem sempre possuimos elementos de carácter racional que justifiquem atitudes, escolhas,etc. Todavia penso que razão e fé não se excluem! Acho que uma fé onde a razão esteja ausente não é fé mas “crendice”…julgo que a fé só é digna desse nome quando ela se reconhece nos seus limites e na sua especificidade. Uma fé cega vira crendice na medida em que se torna, com facilidade dogmática (no sentido de “cega”)e inconsequente. Ter consciência de que a fé é um domínio, apesar de tudo, distinto da razão e reconhecer os seus limites, ter consciência do que ela significa é assumi-la com racionalidade, eu penso. É evidente que ter fé seja no que for, significa aderir, sem que para isso existam razões de carácter racional, mas uma coisa é reconhecer isso mesmo (fé esclarecida) e outra coisa é negar que existam outras formas de atingir os mesmos objectivos (fé cega=crendice)…fui confusa????

    S Tomás de Aquino, por exemplo, diz-nos que o saber da fé não é um saber evidente e, como tal, convive com a dúvida, com a suspeita, com a opinião..estas perguntas e estas dúvidas que acompanham a fé impedem-na de ser “cega” e ao fazê-lo, humanizam-na liberatando-a de cair no fundamentalismo…

    Termino com uma citação de J. Antonio Estrada a propósito: haveria que fazer um elogio da dúvida em relação com as crenças. Só quando há capacidade de crítica é que a adesão ao religioso adquire valor. Pelo contrário, a identificação com uma religião determinada carece de validade última, quando não é possível expressar a dissidência ou indagar criticamente o valor das crenças assumidas.

    abs.

    #75659
    márcio
    Membro

    Oi Isabel, entendi, mas permita-me argumentar um pouco ainda em favor da tal antagonice fé-razao.

    1. Todavia penso que razão e fé não se excluem!
    Tambem concordo. (o exemplo que eu coloquei procura ilustrar isso … racional ate bifurcaçao, fé para transpo-la)

    2. Assumir a fé com racionalidade.
    Fico imaginando como ilustrar isso. Por exemplo, se eu tenho fé que existe vida em Marte, eu simplesmente tenho essa fé. Quem vai me dizer se ela é racional ou nao? Idem se eu tenho fé que existem dragoes.

    3. S Tomás de Aquino, por exemplo, diz-nos que o saber da fé não é um saber evidente e, como tal, convive com a dúvida, com a suspeita, com a opinião
    Isso é muito forte. Me permite fazer a sequinte associacao: Ter fé em Deus é conviver com a duvida.

    4. Só quando há capacidade de crítica é que a adesão ao religioso adquire valor.
    Como todo bom brasileiro, minha formacao infantil passou pela adesao ao religioso. Eu me permiti a capacidade de critica e … ca estou.

    Abraços

    #75660

    Olá Márcio (outra vez!!)

    “2. Assumir a fé com racionalidade. “…o que é assumir a fé com racionalidade??? Apresentar razões para a crença, por exemplo, como referiu..eu tenho fé que existe vida em Marte porque..etc,etc…não tenho como provar, acredito que existe, mas apresento razões para acreditar!!

    “3. S Tomás de Aquino, por exemplo, diz-nos que o saber da fé não é um saber evidente e, como tal, convive com a dúvida, com a suspeita, com a opinião “…sim, ter fé em Deus é conviver com a dúvida…penso que um “bom exemplo” disso é o segundo a Bíblia se haveria passado aquando da crucificação de Jesus…a pergunta final, sem resposta, a dúvida da fé: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste??”…(não estou a dizer que acredito…penso que já fui clara ao “declarar” a minha “liberdade” no que concerne a assuntos religiosos!!)

    “4. Só quando há capacidade de crítica é que a adesão ao religioso adquire valor. “…sim, mas não apenas como brasileiro..penso que essa ideia de que a fé é adesão “cega” prespassa a maioria das pessoas e dos crentes que não sabem de que são crentes…daí a importância da crítica…é ela que vai permitir a abertura ao diálogo, às questões…essa capacidade de crítica que refere Márcio ( e ainda bem que deu esse salto!!) não tem de ser sinónimo de recusa, mas antes de consciência..trata-se de saber, no fundo, por que sou ateu? Por que sou crente? Quais as razões dessa minha posição? Quais as perguntas que pairam no ar?…a isso eu chamo a atl “fé esclarecida”…

    abs.

    #75661

    Sobre as “racionalidades da fé”, continuamos:

    Os termos “fé” e “crer” tem muitos significados, e os fenomenos correspondentes a estes diversos significados podem se distinguir em funçao de maior ou menor presença da:
    (1) confiança,
    (2) conhecimento (tanto dos motivos por que se crê como daquilo em que se crê).
    ______________________________________________

    Em sentido impróprio (que nao realizam bem os elementos constitutivos da fé) teríamos:

    (a) fé como opiniao: fé no sentido mais fraco – é um tipo de julgamento ou maneira de ver as coisas que se adota sem ter certeza de que é verdadeiro, por exemplo: “crei que o time A vencerá o campeonato”. Desde que nao seja absolutizada, pode até ser uma opiniao razoavel (no sentido de mais provavel), mas nao implica atitude existencial e a dimensao afetiva da confiança aparece como praticamente nula.

    (b) fé como crença: crenças sao opinioes (nao se fundam em evidencias) que nao resultam de decisao pessoal baseada na “avaliaçao” das razoes pró e contra de determinadas posiçoes. Sao assumidas espontaneamente por influencia do meio, mas tem adesao superficial enquanto nao resultam de evidencias pessoais nem de persuasao racional.

    (c) fé na informaçao: conhecimento indireto adquirido mediante testemunho alheio. Há algum tipo de racionalidade envolvida, na medida em que tenho razoes suficientes para considerar o testemunho aceitável (creio que a velocidade da luz é de 30 mil km/s pq aceito o testemunho de outros, creio que Jesus ressuscitou pq aceito o testemunho dos apostolos etc). Aparecem entao como irracionais tanto a atitude de excessiva desconfiança como a de excessiva credulidade: essa atitudes revelam pouco senso critico.
    ______________________________________________

    Em sentido proprio (fé que implica necessariamente confiança e conhecimento) teriamos uma compreensao intuitiva existencial da realidade. É sempre uma fé pessoal, que envolve a pessoa toda.

    (i) fé pessoal na pessoa: é um tipo de fé na informaçao, mas no campo da comunicaçao estritamente interpessoal. Por exemplo: confiança no médico que vai além da capacidade tecnica, mas abarca o seu interesse e seriedade; confiança da criança em seus pais, etc.

    (ii) fé pessoal radical: adesao da pessoa àquilo que dá sentido a sua existencia, isto é, àquilo que fundamenta e orienta sua vida toda. Implica, portanto, confiança, liberdade (é uma opçao livre necessariamente), lealdade. Enquadra-se aqui Camus, qd afirma que Sisifo precisa ser feliz?

    (iii) fé pessoal religiosa: é uma modalidade de fé radical que consiste em atribuir a Deus o sentido ultimo da existencia humano-mundana.
    ______________________________________________

    Entre os argumentos que podem ser invocados para procurar mostrar a racionalidade de uma fé bem constituida (e razoavel entao!) estao:
    (A) o carater hermeneutico da justificaçao,
    (B) a “fundamentaçao cumulativa” que busca demonstrar a coerencia interrna do conteudo da fé e da sua capacidade de interpretar a experiencia da realidade sem falseá-la,
    (C) a compatibilidade da fé com a investigaçao (nao se escandaliza com a duvida?!).


    Esse tema fé e razao sempre dá o que falar

    []'s

    #75662

    Sim, Deus existe! Foi criado a imagem e semelhança do Homem, pelo próprio Homem! Ora , existe coisa mais antropomórfica de um grande Pai, que a tudo controla e nos ama, apesar de todas as tristezas que vemos por aí( Sim, os crentes dirão que temos o tal de livre arbítrio). Claro, não se pode provar a não-existência de Deus, mas, convenhamos que os crentes, usualmente( há grandes exceções), são pessoas “ estreitas” intelectualmente. E tem mais…fala-se em Deus, ou seja refere-se as religiões monoteístas como o cristianismo, islamismo e judaísmo, e as politeístas, as animistas? Parece ser melhor, negar todos estes deuses, mas enfim…se tem gente que encontra consolo nisso…Abraços

    #75663

    Vitor,

    “Sim, Deus existe! Foi criado a imagem e semelhança do Homem, pelo próprio Homem!”

    essa ideia já foi melhor apresentada antes, e já nao conseguiu se manter muito bem antes… Feuerbach está longe de ser considerado o apice da filosofia. Curiosamente, ao postular a nao existencia de um absoluto, nao terá vc absolutizado a razao? E do mesmo modo se esse postulado disser respeito a O Absoluto transcendente. Estamos no campo da crença e, consolo por consolo, tambem já foi dito que o consolo do ateismo seria a ilusao de que é o homem o centro de tudo (humanismo ateu) ou de que nao há nenhum tipo de liberdade/ordem (“morte de Deus” que leva à “morte do homem”, com o paradoxo da ideia de que assim estariamos finalmente livres).

    “(Sim, os crentes dirão que temos o tal de livre arbítrio)”

    Que crentes? Parece que se confunde isso frequentemente por aqui, liberdade nao é exatamente a mesma coisa que livre-arbitrio. E os nao sao um bloco monolitico, mas em se tratando de cristianismo (sem incluir as outras religioes) já se falou até de “servo arbitrio” (Lutero), isso sem falar de outras correntes teologicas cristãs menos conhecidas.

    “convenhamos que os crentes, usualmente( há grandes exceções), são pessoas “ estreitas” intelectualmente”

    Melhor ficarmos nos argumentos, já vi nao-crentes com visao bastante estreita tambem. Alias, adjetivar algo como estreito costuma ser feito com base em algum termo de comparacao, o que torna tudo bem relativo. Maniqueismos que separam blocos estanques as vezes mais atrapalham que ajudam.

    O dogmatismo ateu nao é muito melhor do que o dogmatismo de alguns crentes.

    []'s

    #75664
    mauricio
    Membro

    Ser ateu é provocar grande polêmica, mesmo nos dias de hoje. Se considerarmos que toda a crença em entidades não fisicamente observáveis exige uma aceitação não racional de sua existência (fé), acredito que se deva tomar uma opção coerente com relação à aceitação ou não-aceitação de todas elas. Esse argumento chave tentará, seguindo premissas lógicas, mostrar porque a opção do ateísmo e do ceticismo é mais lógica do que a fé ou do que a dúvida.

    Antes de entrar no argumento principal gostaria de comentar que ninguém realmente se preocupa se uma pessoa é católica, budista, espírita ou evangélica. Ter uma religião, qualquer que seja, parece ser um comportamento bem aceito na sociedade de hoje. Entretanto, a falta de religião é vista como um radicalismo extremo, algo impensado e sem razão, afinal, como uma pessoa pode viver sem ter fé? O paradoxo é que é a fé que exige a falta de razão de um indivíduo.

    A fé é a crença máxima que uma pessoa pode ter sem que, para isso, necessite de qualquer prova ou fundamento. Eu posso ter fé que Adão e Eva existiram ou que existe o coelhinho da páscoa, papai-noel ou Deus. Em que esses exemplos são diferentes? No ponto de vista de um cético, nada. Afinal várias pessoas afirmam já terem visto papai-noel ou Deus, entretanto não temos qualquer prova física e irrefutável da existência (ou não-existência) de nenhum deles. Acho que a principal queixa contra o ateu é o fato de que os crentes os vêem como uma pessoa maligna e sem princípios, esquecendo-se que é possível ter uma moral e uma ética sem ter uma religião.

    Observando a história da humanidade podemos ver que muitos fenômenos naturais, antes de serem explicados cientificamente, eram tidos como obras de Deus. Em tempos mais remotos, os homens rezavam para que o sol nascesse no dia seguinte, índios dançavam para os Deuses da chuva e se amedrontavam com a fúria deles durante eclipses e outros fenômenos naturais. De fato, se você realizar bastante a dança da chuva, com certeza irá chover algum dia (mas será mais fácil se você o fizer no verão).

    Diversos mitos também foram aos poucos caindo por terra, logo que ficavam ridículos e completamente fora da realidade de seus tempos. Quem, nos dias de hoje, acreditaria realmente em uma pessoa que viu um duende, um minotauro, um elfo ou a fada sininho? A única coisa que as pessoas hoje em dia podem acreditar ou ver, para ao menos serem levadas em consideração, são espíritos e alienígenas (ou OVNIs). Mas há uma boa diferença entre esses dois seres. Os espíritos se enquadram no mesmo grupo onde já estão os duendes, unicórnios, dragões, papai-noel e Deus, ou seja, não se pode provar que existam ou que não existam. Já os alienígenas são realmente mais bem cotados, pois podem existir fisicamente e, portanto, não exigem que formulemos novas leis e conceitos científicos ou psicológicos para explicar sua existência. Entretanto parece que a grande maioria dos relatos sobre OVNIs e alienígenas são bastante incompletos e inconclusivos, o que os leva, nesse momento, para dentro do mesmo grupo anterior, constituído daqueles seres nos quais não se prova, ainda, a existência ou inexistência.

    Portanto considero que a escolha do ateísmo é, por si só, uma escolha coerente. Por que acreditar em Deus, mas não acreditar em elfos, duendes, fadas, vampiros, no capeta ou qualquer outro ser que eu acabar de inventar? Para todos eles não há nada que comprove ou não suas existências. Acredito que uma pessoa com um mínimo de coerência vai concordar que existem apenas duas opções racionais nesse caso: ou acredita-se em tudo pela fé, ou duvida-se de tudo até que alguém prove o contrário.

    Portanto chegamos agora a um ponto chave da questão do ateísmo. Da mesma forma que não se pode provar que Deus existe, não se pode provar, por outro lado, que Ele não exista. Devemos abrir um parêntese nesse momento para discutir a dificuldade que existe em provar uma negação. Poderíamos facilmente provar que dragões existem se, para isso, encontrássemos apenas um exemplar em algum lugar e pudéssemos examiná-lo de forma completa, certificando não se tratar de uma fraude. O que é realmente impossível provarmos é a não existência de dragões, já que eles poderiam existir em qualquer lugar ainda não explorado, seja aqui mesmo na Terra, nas luas de Júpiter ou Saturno, ou em algum lugar fora do sistema solar. A questão intrigante que se observa nesse fato é que os crentes sempre exigem que o ateu lhes dê uma prova da inexistência de Deus, sendo que, o mais simples, seria provar a sua existência.

    Mesmo considerando que seria mais fácil provar a existência do que a inexistência não temos, no momento, qualquer prova de nenhuma das duas e, portanto, poderíamos pensar que a opção ideal e mais inteligente fosse, simplesmente, não ser nem ateu, nem crente, poderíamos ficar em cima do muro, não acreditando nem desacreditando. Essa filosofia de vida tem um nome, é a agnose. O agnosticismo está relacionado à negação das crenças e o agnóstico é um indivíduo que está definitivamente em cima do muro e não toma qualquer partido de uma ou outra causa.

    Entretanto gostaria de argumentar que o ateísmo é realmente uma opção mais racional do que o agnosticismo. O agnóstico está sim em cima do muro com relação à existência de Deus, mas, se for coerente, deve também estar em cima do muro com relação a todos os outros seres místicos dos quais não se prova a existência ou não, incluindo o papai-noel.

    É importante notar que, quando digo ateísmo, não estou me referindo ao ateísmo dogmático, aquele em que o indivíduo nega a existência de Deus de forma categórica e radical (se igualando, de forma contrária, aos teístas). Defendo o ateísmo não-dogmático, que duvida da existência de Deus até que se encontre alguma prova irrefutável desta. Se algum dia me apresentarem de uma prova irrefutável de que Deus existe desistirei de meu ateísmo e me tornarei crente.

    Acho que o mais fundamental com relação às crenças é o fato de se tomar uma atitude coerente com relação a todas elas, pois, na verdade, elas se baseiam no mesmo princípio. Portanto, parece-me que a opção mais coerente é manter-se cético com relação a qualquer tipo de crença não comprovada, até que essa crença seja de fato comprovada. Afinal, se um dia eu for capaz de ver um velhinho voando num trenó, puxado por renas, vestido de vermelho, cheio de presentes e falando “Hohoho”, minha crença mudará automaticamente e acreditarei na existência do papai-noel.

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