► Resumo de Maquiavel

Niccolò Machiavelli

por June Müller

I. Contextualização

1. Antiguidade Clássica


1.1 Gregos: idéia da sociedade natural: homem é
ser poítico: realiza-se pela vida na “polis“-vida em sociedade;
o homem é um animal político. Polis: componente social e
político. Como por exemplo em Aristóteles.


1.1.1 Não há conceito de indivíduo:
o cidadão grego representa a síntese do social e do político:
concepção holística, perfeição física,
moral e estética.


1.1.2 Perspctiva dinâmica: movimento cíclico
de dois termos


1.1.3 Pensamento dualista: mundo das formas ideais vs
mundo real (um pálido reflexo do mundo ideal) Em Platão e
no platonismo.


1.2 Helênicos: mantém a idéia da
sociabilidade natural, mas a referência já não é
a polis, mas a sociedade.


1.2.1 Surge a concepção de indivíduo:
homem como unidade distinta, dotada de valor próprio no seio da
universalidade humana.


1.2.2 Idéia do individualismo helênico:
diferente do conceito de individualismo possessivo do pensamento moderno


1.2.3 Individualismo associado ao universalismo


1.3 Cristianismo primitivo: individualismo e universalismo
se compõem na realização do projeto telelógico:
a construção do reino de Deus, a salvação do
homem e da humanidade.


1.3.1 Homem: acentua-se a idéia das contradições;
dualidade: humano vs divino; material vs espiritual; pecado vs graça


Maquiavel poder política fins justifcam os meios

2. Pensamento Medieval

2.1 Dualismo das concepções cristãs:
a Cidade dos Homens (autoridade política) e a Cidade de Deus (poder
divino)


2.2 Autoridade política: instrumento de Deus para
a promoção da justiça e do bem: o seu exercício
é humano, mas a sua origem e a sua finalidade são divinos.


2.2.1 Construir o Reino de Deus na Terra


2.2.2 Conduzir à salvação, corrigindo,
como castigo e remédio, a natureza decaída do homem


2.2.3 Instituir e fortalecer a fé e a moral cristã


2.3 Obediência: é obrigação
civil de ordem divina. Soberanos também têm limites de poder.


2.3.1 Homem medieval: deve obedecer ao governo terreno
até o limite do governo divido, através da idéias
de justiça. Define-se, assim, a diferença entre um suserano
e um tirano.


2.3.2 Suseranos também têm obrigações:
seu poder não é ilimitado: são responsáveis
perante Deus pela tarefa de instaurar o reinado da justiça e da
piedade.


2.4 Justiça é o que distingue tiranos dos
suseranos legítimos


2.4.1 Suserano medieval: é um juiz e não
um legislador.


2.5 Justiça: definida pela lei


2.5.1 Lei: conjunto de costumes baseados no direito
natural: inscritos pela fé no coração dos homens:
consciência coletiva


2.6 Ordem medieval: holística, tem natureza moral
e religiosa. O conceito que melhor a define é o de comunidade e
não de sociedade.


2.6.1 Fragmentação do poder: não
há Estado nacional com poder centralizado, mas grandes constelações
de poderes locais autônomos, articulados em redes de suserania e
vassalagem


2.6.2 Sociedade hierárquica: papéis sociais
são definidos por origem


2.6.3 Estamentos: códigos distintos de direitos
e deveres: relações contratuais: contratos comunitários
que obrigam mutuamente cada categoria social conforme o seu estatuto específico



3. Sociedade de Maquiavel (1469-1527)


3.1 Cristandade em decadência: conflitos entre o
poder divino (Igreja) e o poder temporal (Estado)


3.2 Processo de ascensão do capitalismo: mercantilismo


3.3 Desenvolvimento do Estado Nacional: soberanos locais
são absorvidos pelo fortalecimento das monarquias e
pela crescente centralização das instituições
políticas (cortes de justiça, burocracias e exércitos)


3.4 Estado absoluto: preserva a ordem de privilégios
aristocráticos (mantendo sob controle as populações
rurais), incorpora a burguesia e subordina o proletariado incipiente


3.4.1 Inglaterra e França: consolidam poder central


3.4.2 Itália não realiza unificação
nacional: é um conglomerado de pequenas cidades- estado rivais,
disputados pelo Papa, Alemanha, França e Espanha.



Concepção de homem em Maquiavel

4.1 Racionalidade instrumental: busca o êxito, sem
se importar com valores éticos


4.4.1 Cálculo de custo/benefício: teme
o castigo


4.2 Natureza humana:


4.2.1 Homem possui capacidades: força, astúcia
e coragem


4.2.2 Homem é vil, mas é capaz de atos
de virtude


4.2.3 Mas não se trata da virtude cristã


4.2.4 Não incorpora a idéia da sociabilidade
natural dos antigos


4.3 O homem não muda: não incorpora o dogma
do pecado original: natureza decaída que pode se regenerar pela
salvação divina.



5. Concepção da História em Maquiavel

5.1 Perspectiva cíclica, pessimista, de inspiração
platônica


5.1.1 Tudo se degenera, se sucede e se repete fatalmente


5.1.2 Todo princípio corrompe-se e degenera-se


5.1.3 Isto só pode ser corrigido por acidente
externo (fortuna) ou por sabedoria intrínseca (virtu)


5.2 Não manifesta perspectiva teleológica
humanidade não tem um objetivo a ser atingido


5.2.1 A política não admite a teleologia
cristã: o caminho da salvação, a construção
do Reino de Deus entre os homens.


5.2.2 Também não pensa a história
sob a perspectiva dos modernos: não menciona a idéia do progresso
à estrutura cíclica


6. Concepção de Política em Maquiavel

6.1 Política: pela primeira vez é mostrada
como esfera autônoma da vida social


6.1.1 Não é pensada a partir da ética
nem da religião: rompe com os antigos e com os cristãos


6.1.2 Não é pensada no contexto da filosofia:
passa a ser campo de estudo independente


6.2 Vida política: tem regras e dinâmica
independentes de considerações privadas, morais, filosóficas
ou religiosas


6.2.1 Política: é a esfera do poder por
excelência


6.2.2 Política: é a atividade constitutiva
da existência coletiva: tem prioridade sobre todas as demais esferas


6.2.3 Política é a forma de conciliar a
natureza humana com a marcha inevitável da história: envolve
fortuna e virtu.


6.3 Fortuna: contingência própria das coisas
políticas: não é manifestação de Deus
ou Providência Divina


6.3.1 Há no mundo, a todo momento, igual massa
de bem e de mal: do seu jogo resultam os eventos (e a sorte)


6.4 Virtu: qualidades como a força de caráter,
a coragem militar, a habilidade no cálculo, a astúcia, a
inflexibilidade no trato dos adversários


6.4.1 Pode desafiar e mudar a fortuna: papel do homem
na história



7. Concepção de Estado em Maquiavel




7.1 Não define Estado: infere-se que percebe o
Estado como poder central soberano que se exerce com exclusividade e plenitude
sobre as questões internas externa de uma coletividade


7.2 Estado: está além do bem e do mal:
o Estado é


7.2.1 Estado: regulariza as relações entre
os homens: utiliza-os nos que eles têm de bom e os contém
no que eles têm de mal


7.2.2 Sua única finalidade é a sua própria
grandeza e prosperidade


7.2.3 Daí a idéia de “razão de Estado”:
existem motivos mais elevados que se sobrepõem a quaisquer outras
considerações, inclusive à própria lei


7.2.4 Tanto na política interna quanto nas relações
externas, o Estado é o fim: e os fins justificam os meios



8. “O Príncipe”: não se destina aos governos
legais ou constitucionais


8.1 Questão: como constituir e manter a Itália
como um Estado livre, coeso e duradouro? Ou como adquirir e manter principados?

8.2 A tirania é uma resposta prática a
um problema prático


8.3 “O Príncipe”: não há considerações
de direito, mas apenas de poder: são estratégias para lidar
com criações de força


8.4 Teoria das relações públicas:
cuidados com a imagem pública do governante


8.5 Teoria da cultura política: religião
nacional, costumes e ethos social como instrumentos de fortalecimento do
poder do governante


8.6 Teoria da administração pública:
probidade administrativa, limites à tributação e respeito
à propriedade privada


8.7 Teoria das relações internacionais:


8.7.1 Exércitos nacionais permanentes, em lugar
de mercenários


8.7.2 Conquista, defesa externa e ordem interna


8.7.3 A guerra é a verdadeira profissão
de todo governante e odiá-la só traz desvantagens.




II. O Príncipe



Em sua obra “O Príncipe”,
Nicolau Maquiavel mostra a sua preocupação em analisar acontecimentos
ocorridos ao longo da história, de modo a compará-los à
atualidade de seu tempo



“O Príncipe”
consiste de um manual prático dado ao Príncipe Lorenzo de
Médice como um presente, o qual envolve experiência e reflexões
do autor. Maquiavel analisa a sociedade de maneira fria e calculista e
não mede esforços quando trata de como obter e manter o poder.

A obra é
dividida em 26 capítulos, que podem ser agregados em cinco partes,
a saber:


*capítulo I a XI: análise dos diversos grupo
de pricipados e meios de obtenção e manutenção
destes;


*capítulo XII a XIV: discussão da análise
militar do Estado;


*capítulo XV a XIX: estimativas sobre a conduta
de um Príncipe; *capítulo XX a XXIII: conselhos de especial
intersse ao Príncipe;


*capítulo XXIV a XXVI: reflexão sobre a
conjuntura da Itália à sua época


Na primeira parte (cap.I
a XI), Maquiavel mostra, através de claros exemplos, a importância
do exército, a dominação completa do novo território
através de sua estadia neste; a necesidade da eliminação
do inimigo que no país dominado encontrava-se e como lidar com as
leis pré-existentes à sua chegada; o consentimento da prática
da violência e de crueldades, de modo a obter resultados satisfatórios,
onde se encaixa perfeitamente seu tão famoso postulado de que “os
fins justificam os meios” como os pontos mais importantes.


Já na segunda
(cap.XII ao XIV), reflete sobre os perigos e dificuldades que tem o Príncipe
com suas tropas, compostas de forças auxiliares, mistas e nacionais,
e destaca a importância da guerra para com o desenvolvimento do espírito
partriótico e nacionalista que vem a unir os cidadãos de
seu Estado, de forma a torná-lo forte.

Do capítulo
XV ao XIV, vê-se a necessidade de uma certa versatilidade que deve
adotar o governante em relação ao seu modo de ser e de pensar
a fim de que se adapte às circunstâncias momentâneas-“qualidades”,
em certas ocasiões, como afirma o autor, mostram-se não tão
eficazes quanto “defeitos”, que , nesse caso, tornam-se próprias
virtudes; da temeridade dele perante a população à
afeição, como medida de precaução à
revolta popular, devendo o soberano apenas evitar o ódio; da utilização
da força sobeposta à lei quanto disso dependeram condições
mais favorárveis ao seu desempenho; e da sua boa imagem em face
aos cidadãos e Estados estrangeiros, de modo a evitar possíveis
conspirações.

Em seguida, constata-se
um questionamento das utilidade das fortalezas e outros meios em vistas
fins de proteção do Príncipe; o modo em que encontrará
mais serventia em pessoas que originalmente lhe apresentavam suspeitas
em contrarpatida às primeiras que nele depositavam confiança;
como deve agir para obter confiança e maior estima entre seus súditos;
a importância da boa escolha de sesu ministros; e uma espécie
de guia sobre o que fazer com os conselhos dados, estes, raramente úteis,
quando se considera o interesse oculto de quem os dá.

Na última parte,
que abrange os três capítulos finais, Maquiavel foge de sua
análise propriamente “maquiavélica” na forma de um apelo
à família real, de modo que esta adote resoluções
em favor da libertação da Itália, dominada então
pelos bárbaros.



Terminada a breve exposição
dos principais temas abordados no livro “O Príncipe” aqui sintetizado,
conclui-se ser tamanha a complexidade organizacional de um Estado, que
se recorre a todo e qualquer meio, justo ou injusto, da república
à tirania, par ter-se como consequência não um país
justo no sentido próprio da palavra- ao menos não se julga,
habitualmente, haver uma possibilidade de fazer-se justiça com relação
a todos os integrantes de uma sociedade ou grupo de extensão considerável,
já que os interesses são os mais variados-,mas estável,
governável e próprio de orgulho por suas partes e, principalmente,
de respeito perante aos demais países/nações, o que
certamente propiciaria um meio sadio e mais tranquilo de viver-se, tanto
ao Príncipe quanto aos seus seguidores.

III. Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio



“Discursos”, como
também é conhecida a referida obra, foi escrito por Maquiavel
quatro anos após haver concluído “O Príncipe”, o que
justifica suas perceptíves semelhanças com o primeiro. No
entanto, o que o distingue de “O Príncipe” é a análise
detalhada da república, em que o autoro claramente se coloca em
favor desta, a apontar suas principais características observadas
no decorrer da história e modos de melhorá-la, ou de ao menos
mantê-la. Assim, pode-se considerar Maquiavel como sendo, indubitavelmente,
um pensador indutivo-utiliza-se de inúmeros exemplos históricos
com o fim de sustentar suas afirmações. No entanto, seu propósito
não é sempre impecavelmente atingido, mesmo porque a realidade
não segue regras e é, portanto, muito mais complexa do que
se pode teorizar.


A obra é começada
com a citação da origem das cidades, que podem estabelecer-se
devido a um grupo de cidadãos juntar-se a visar maior segurança;
a estrangeiros que querem assegurar o território conquistado, a
estabelecer, ali, colônias; ou mesmo a fim de exaltar-se a glória
do Príncipe.


As repúblicas
nascem com o surgimento das cidades e, assim, constituem três espécies,
que são: a monarquia, aristocracia e despotismo. Três que
podem evoluir para o despotismo, oligarquia e anarquia, respectivamente.
É claro, neste ponto, o pessimismo de como a sociedade é
vista por Maquiavel: é a dialética de dois termos, que trata
da sucessão entre ascendência e decadência, a formar
um ciclo vicioso. Maquiavel acredita, ainda, que todos princípios
corrompem-se e degeneram-se, a ser possível ser corrigido somente
via acidente externo (fortuna) ou por sabedoria intrínseca (virtu).


A voltar-se às
espécies de repúblicas, chega-se à conclusão
de que a sua melhor forma seria o equilíbrio, dito como ser a “justa
medida”, segundo Aristóteles. Tal equilíbrio pode manter-se
através das próprias discordâncias entre o povo e o
Senado, já que estes, em conjunto, representam e lutam pelos interesses
gerais do Estado.


O Estado é, então,
definido como o poder central soberano; é o monopólio do
uso legítimo da força, como diria Weber. As leis são
estabelecidas nas práticas virtuosas da sociedade e com o cuidado
de não repetir o que não teve de êxito. Por isso, é
dito que não há nada pior do que a deixar ser desrespeitada.
Se isso ocorrer, tornar-se clara a falha do exercício do poder de
quem a corrompe. Em contrapartida, em se tratando de Estado, tudo é
válido, desde a violação de leis e costumes e tudo
mais que for necessário para atingirem-se as consequências
visadas: os fins justificam os meios.


Nessa visão
de poder do Estado, é clara a importância da religião,
pois em nome dela são feitas valer muitas causas em favor do Estado.
A religião é, sob a visão de Maquiavel, um instrumento
político-é usada de modo a justificar interesses os mais
peculiares e, também, como conforto à população,
que anda sempre em busca de ideais, a estar disposta até mesmo a
conceder sua vida em busca destes.


O êxito de
uma república, consoante o autor, pode ser estrategicamente obtido
através da sucessão dos governantes. Se se intercalar os
virtuosos com os fracos, o Estado poderá manter-se. Mas, se, diferentemente,
dois ruins sucederem-se, ou apenas um, mas que seja duradouro, a ruina
do Estado será inevitável, já que, desse modo, o segundo
governo não poderá utilizar-se dos bons frutos do governo
anterior. Destarte, cita a importância das república, já
que nela os próprios cidadãos escolhem seus governantes,
de modo a aumentar a chance de ter-se, consecutivamente, bons governos.


Com relação
à política de defesa, onde há pessoas e não
um exército, é notada um clara incompetência por parte
do soberano, pois é de sua exclusiva competência formar um
exército próprio para a defesa da nação. É,
também, de extrema importância saber-se a hora própria
para instituir-se a ditadura, que, em ocasiões excepcionais, é
necessária a fim de tomarem-se decisões rápidas, a
dispensar, assim, consultar as tradicionais instituições
do Estado. Contudo, ela deve-se instituir por período limitado,
de modo a não se corromper e deve existir até quando o motivo
o qual a fez precisar-se for eliminado. Após uma análise
teórica e comparativa-em termos históricos-é colocada
ainda a importância da fortuna, a qual tem contingência própria
e o poder de mudar os fatos. Assim, o autor define o papel do homem na
história: desafiá-la.


Com base na teoria do equilíbrio,
conclui-se, então, que o ideal é que se estabeleça
um meio termo entre as formar de governo a serem adotadas, a observar-se
que a combinação das já existentes pode mostrar-se
muito mais eficiente. A forma que se é administrado um Estado deve
adaptar-se ao seu contingente populacional, e não as pessoas às
suas leis.

IV. Bibliografia

  • 1. MAQUIAVEL, Nicolau. Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio.
  • Brasília, EdUnB, 1994, 3a ed, 436p.

  • 2. ____________________. O Príncipe. Brasília, EdUnB, 1992, 2a ed, 102p.

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