XANGÔ
XANGÔ era um negro enorme e conquistador. Passeava de tribo em tribo, pelos sertões, apoderando-se das mulheres alheias. De uma feita, encontrando a velha Olobá, da família dos Orixás, sob a ardência do sol, pedindo chuva, Xangô forçou-a e viveu com ela.
A velha era uma delícia e a todos recomendava o amor desse varão, fazendo-lhe o leito de anecrepê e abamudá, de folhas olentes de manjericão.
Mas Xangô era moço, ardente, cheio de seiva, e logo se aborrecera de Olobá. Uma noite em que a velha descendente do céu adormecera, ameaçando-o com as cóleras de Orixalá, Xangô fugiu e começou pelo mundo uma vida de pesares e de lutas. Em cada canto surgia-lhe um inimigo, em cada tribo uma guerra. Xangô, corrido, pelos vastos sertões de onde as cobras erguiam as cabeças escamosas, chegou a limpar o suor no seu saiote de fogo, dizendo, com desespero:
— E mim fopão vi-lê!
E atirou-se a bandalheiras, a roubos, a traficâncias. Quando se saía bem de alguma falcatrua, Xangô bradava:
— Agi foco soryí
Certa vez chegara êle a uma aldeia, roto, com o rosto ferido, e perseguido por uma tropa de guerreiros, quando a rainha Oxum o mandou chamar ao palácio.
Lá chegando, o pobre do homem ficou pasmado. Era uma alta casa, de cristal todo líquido. O sol abrasava as enormes colunas e os repuxos colossais, de cores estranhas. Dentro, a linda Oxum sorria, com seu mais doce sorriso.
— Xangô, tu és valente — disse-lhe ela. — Eu gosto de ti. Vem, a minha cama é larga…
O guerreiro, prudente, perguntou:
— Quem és tu?
— Eu sou Oxum, neta de Olobá, descendente dos Orixalás…
Xangô pensou, de pé na porta, sem querer entrar. Depois, disse:
— Oxum, tu és bonita, mas és neta de Olobá, a velha que me persegue com seus feitiços. Vejo que não me queres mal, mas só entro se mandares abrir uma porta nos fundos do palácio.
Oxum estendeu o braço. Ao fundo, um pano de água caiu e o guerreiro viu a floresta escura.
— Tu és boa.
Disse, e entrou. Nesse momento chegavam os inimigos, e, receosos de que Xangô tivesse fugido, foram consultar os babalãos, vinte e cinco matemáticos, dos quais o mais moço, Cancanfô, era tão sábio que até os santos o respeitavam. Os babalãos amarraram um boneco de gameleira para mostrar que Xangô não fugira, os guerreiros invadiram o palácio, e deram com a estátua do inimigo, de pau, em atitude hostil. Saíram, então, todos a bradar:
Oba y cossó Ola dô, fo-ó Y já lo ri uô
—O rei não se enforcou. Pôs a mão na cabeça para a guerra!
Quando reboou no céu enceguecedoramente azul um enorme trovão, o Xangô, num lampejo de fogo, surgiu, gritando:
E mim me o tiçá E mim, mim
Era uma divindade! Os guerreiros estarreceram, com as flechas nas mãos e os broquéis de couro de cobra pendentes. Os babalãos alçaram as mãos, e Xangô olhava-os com sobranceiro desprezo. De repente, no rio formou-se uma névoa, e apareceu a imagem de Oxum. A sua voz terna dizia:
Maman, maman, belo quê odô Oya cari le ú á
— Cá estou em cima do rio, vamos para casa…
O guerreiro atirou-se, mas teve de parar. Os babalãos erguiam os opelés.
— Tu és mais que um homem, mas só sais depois de fazer o ebó dos santos.
— Eu sou um guerreiro e não me sujeito. Ninguém é mais do que eu!
— Porque és grande, só uma opinião ouvirás. Cancanfô, o mais sábio dos homens e dos deuses, vai falar!
Cancanfô apareceu, então. Era muito alto e muito magro. Olhou os assistentes e olhou o céu.
— Andas mal, Xangô. Reprovo toda a tua vida. Fala na minha boca o teu bem. Se não fizeres um ebó, com um cágado e todos os bichos de quatro pés, nunca mais deixarás a vida errante e a vida assim é um tão grande mal para o teu corpo como para todos nós. Faze o ebó, guerreiro.
Havia tão grande doçura na palavra de Cancanfô, que Xangô curvou a cerviz.
— Faço.
— E comerás com os outros o amalá, sem entornares a erva?
— Comerei.
Cancanfô sorriu e atirou o opelé, para saber o futuro naquele instante, mas não teve tempo. Velha, carcomida, com o fogo da paixão nos olhos, chegava Olobá.
— Estou cansada de perseguir Xangô, — bradou ela, — mas é preciso saber que Xangô não chegaria ao que é se não fosse eu, Olobá, familiar de Orixalá. O meu ebó deve ser feito com o dele.
— Nunca, velha horrível!
— Só obedeço aqui à palavra de Cancanfô!
O jovem babalão não disse nada. Atirou o opelé, viu nas conchas o futuro, e, depois de longamente refletir, proferiu a -sentença:
— O ebó de Olobá deve ser à parte, porque ela é apenas avó de Oxum…
Ao mesmo tempo, Xangô atirava-se nos braços da rainha, uma nuvem tremenda enchia os céus, as árvores partiram-se, e, ao clangor dos trovões, toda a terra se embebeu, sequiosa do temporal…
Do enlace de Oxum e Xangô, nascera a chuva benéfica.
Fonte: Maravilhas do conto popular. Adaptação de Nair Lacerda. Cultrix, 1960.
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