Mimeses e o advento do estado no Leviatã de Thomas Hobbes

Mimeses e o advento do estado no Leviatã.

por Danilo Vaz Curado Ribeiro de Menezes Costa
Bacharel em Direito e Especialista em Ciências Política
E-mail: danilocostaadv (arroba) hotmail.com

RESUMO: O presente artigo objetiva lançar as bases e fomentar a discussão acerca de uma possível relação conceitual existente entre o processo de mimeses tal como descrito por Aristóteles em sua Arte Poética e o Fiat do nascimento do Estado em Hobbes. Procura-se demonstrar que para além de duas tradições políticas gratuitamente taxadas de opostas, a mimeses Aristotélica é parte dos elementos constituintes do Estado Hobbesiano tal como este se encontra pensado e estruturado no Leviatã.
PALAVRAS CHAVES: MIMESES, ESTADO, HOBBES, LEVIATÃ

ABSTRACT: The present essay launches the bases to develop a discussion of a possible conceitual relation between the mimeses process, as described by Aristoteles in his Poetic Art, and the Hobessian State fiat. beyond this oposed political traditions, the Aristotelic mimeses is a part of the Hobessian elements of the State, as thought on the Leviata.
KEY WORDS: MIMESES, STATE, HOBBES, LEVIATA

Introdução:

A tradição filosófica nos lega marcas indeléveis de que Thomas Hobbes foi um profundo conhecedor de Aristóteles, contudo, esta reconhece com maior ênfase a genial desconstrução operada por Hobbes das idéias Aristotélicas do homem como Zoon Politikon e de sua ética teleológica do bem. Todavia o sentido do presente se verificará ex opposito da tradição e se pautará em buscar aproximações, tendo como centro desta busca de sintonia a idéia de mimeses e sua importância em Hobbes na formatação do Estado desde uma leitura do lócus mimético conforme exposto na Arte Poética aristotélica, a partir de um viés analítico.

Este artigo buscará verificar em que medida o termo imitação utilizado por Hobbes no Leviatã corresponde a Mimeses, tal qual Aristóteles a utiliza no seu texto esotérico, da Arte Poética, e as conseqüências desta aproximação na explicação da estruturação e do advento do Estado no Leviatã e de uma poética política.

Desenvolvimento:

Resta claramente consignado na introdução ao Leviatã, principal obra de Thomas Hobbes, publicada em 1651, onde de forma compacta o filósofo Inglês estrutura seu sistema filosófico o qual depois tomaria sua forma completa com o De corpore de 1655 e o De homine de 1657, ambos antecedidos pelo De cive de 1642, que o processo de construção da passagem do estágio pré-político ao Estado, momento de culminância do político e gênese do homem social na obra de Hobbes, efetua-se através da imitação.

Ao iniciar o Leviatã, em sua introdução, Hobbes assim descreve o processo formal de constituição do ente político.

“Da mesma forma que tantas outras, a natureza, mediante a qual Deus fez e governa o mundo, é imitada pela arte humana também nisto: é possível fazer um animal artificial.”(HOBBES, 2002, p.15)

As aproximações entre o Fiat do Estado em Hobbes e o processo de configuração da realização estética em Aristóteles, não são explicitas no Leviatã, entretanto, o número de passagens a que o Filósofo Inglês remete à mimeses como téchne que permite o salto qualitativo do estágio natural pré-estatal rumo ao estágio político são recorrentes.

“A arte vai mais longe ainda, imitando a criatura racional, a mais excelente obra da natureza, o homem. Porque, pela arte, é criado aquele grande Leviatã a que se chama Estado…” (Ibid, p.15)

A vista de tantas incursões deste entrelaçamento ético e estético, buscaremos em Aristóteles o papel da mimeses e o faremos encontrar com o Fiat do Estado Hobbesiano de modo a tentarmos verificar em que medida a mimeses contribui com o advento do Estado e a estruturação do campo ético no Leviatã.

Advirta-se que Aristóteles em sua Arte Poética, não nos define exatamente o que seria a mimeses, assim, tentaremos construir a par de suas pistas o sentido deste termo que já no Estagirita não era apenas um recurso estético, porém também uma momento de efetivação ética.

A Mimeses na Arte Poética.

A Mimeses tal qual a propõe Aristóteles em sua Arte Poética é o meio de conhecimento do homem através das artes, o equivalente para o latim arte em grego é téchne, e as artes constituem o espaço por excelência em que o homem se descobre através da análise de si mesmo, pois a téchne permite ao homem ser o construtor de uma realidade a sua semelhança a diverso da construção operada pela natureza presa no reino da causalidade necessária.

Assim a mimeses constituiu-se como instrumento pelo qual o homem grego, através da techné, se apropria da natureza e a suprime através da criação artificial do reino da cultura, o processo mimético em Aristóteles se configura como o recurso de acesso ao auto-reconhecimento do homem como agente de seu destino.

A mimeses é um processo histórico-poético de autoconhecimento onde o homem se reconcilia através dos produtos da cultura, frutos de sua ação política, estética e social, ou seja, numa ação reflexiva o homem se sabe e se constrói pela arte, pois através da representação artística, essencialmente mimética o humano pode experienciar um outro de si mesmo.

O campo de efetivação da mimeses se constrói desde a atuação subjetiva, onde a figura do personagem desenvolverá o papel de trazer ao mundo, novo mundo por si vivido e imitado, as experiências e configurações simbólicas de seu tempo determinantes da mentalidade cultural e política predominante, permitindo à platéia encontrar na imersão estética o horizonte de sua realização, de modo que a imitação em Aristóteles é uma atividade de construção espiritual, e não apenas simulacro do mundo como proposto por Platão[1], por isso o Estagirita afirma que

“… a imitação se aplica aos atos das personagens e estes não podem ser senão bons ou maus (pois os caracteres dispõem-se quase só nestas duas categorias, diferindo apenas pela prática do vício ou da virtude)…” (ARISTÓTELES, 2003, p.26)

A Arte Poética deixa bem claro que a produção artística pode ser definida pela forma que toma o processo de mimeses, haja vista que a mimeses é em parte fruto da poiesis, assim um processo de imitação que busca o disforme e os maus costumes resulta numa produção artística como a Comédia, diversa de quando através da mimeses o ator busca a perfeição do metro e da actio como na tragédia.

“A mesma diferença distingue a tragédia da comédia: uma propõe-se a imitar os homens, representando-os piores a outra melhores do que são na realidade” (Idib, p, 27)

No contexto da Arte Poética, é o processo artístico que revela ao cidadão os aspectos mais peculiares de seu agir político, rememore-se que os gregos eram o “povo” por excelência da polis e que o povo era o coro na tragédia, e que a tragédia era o microcosmo interpretativo da sociabilidade grega e representava seu zênite político-religioso, e a interação arte-realidade entre os povos áticos tinha a função de transpor pela via da ação dialogal certos sentidos coletivos re-significando-os pela via da catarse.

A par desta possibilidade de desvelar ao cidadão da polis grega uma pedagogia catártica, de modo a distinguir o justo do injusto, a imitação era a forma por excelência que permitia a que o espírito grego atingisse prazer e desvelasse desde a obra de arte o sentido ético da existência, não sendo dispendioso afirmar que a análise dos três grandes tragediografos: Ésquilo, Sófocles e Eurípedes permitem uma figuração plena da evolução político social dos gregos. E não olvidou-se Aristóteles de mencionar em seu tratado do Belo esta função Político-pedagógica, pois

“Pela imitação adquire seus primeiros conhecimentos, por ela todos experimentamos prazer.” (Ibid, p.30)

Assim tanto a produção artística grega fruto da mimeses como a analisa Aristóteles como a narração da criação do Estado em Thomas Hobbes, respondem a duas premissas básicas: dotar o povo da consciência do sentimento ético-político e ser fonte e nascedouro de prazer, desde a obra de arte[2].

"O desígnio dos homens, causa final ou fim último – que amam a naturalmente a liberdade e o domínios sobre outros homens – …é o cuidado com sua própria conservação e com uma vida mais satisfeita.” (HOBBES, 2002, p.127)

E é nesta incessante busca pela estruturação do sentimento ético e da fundação do prazer através da construção artística operada pela téchne mimética enquanto destino da humanidade em sua inexorabilidade, que tanto Aristóteles como Thomas Hobbes, situam a importância da tragédia e do Estado, como momentos de afirmação do elemento humano sobre a perfectibilidade da natureza.

Mimeses e a formação do Estado Hobbesiano.

Hobbes, em seu Leviatã, descreve o processo espiritual de criação deste Deus mortal, fruto da ação humana como um processo, mimético, que objetiva a instituição da vida política através da constituição do Estado, o qual tem como função primordial permitir a vida e dar condições de prazer ao homem, neste processo de auto-constituição do Estado o mesmo é concebido como produzido artificialmente.

A Mimeses enquanto processo de desvelar-se da realidade racional através da incursão artística da imitação, encontra seu principal defensor em Aristóteles, que em sua obra “Arte Poética” trata e trabalha o processo de poiesis mimética[3], que no Leviatã será retrabalhada por Hobbes, agora, desde um viés restritamente político.

Ao relatar o processo de criação mimética do Estado, Hobbes fala do “governo de Deus sobre o mundo”, contudo, advirta-se que ao remeter ao governo do mundo por Deus, Hobbes não busca fundar seu projeto político a partir de bases teológicas, mas sim designar a representação, modo pelo qual Deus se faz presente no mundo de modo objetivo, enquanto misto de Igreja e Estado, exorbitando seu locus religioso e expraiando-se pelo mundo secular enquanto método e guia da ação.

Assim e através do Leviatã, Thomas Hobbes, objetiva a compreensão do por que da estrita necessidade do Estado enquanto momento de efetivação e realização da humanidade, porém a partir do pressuposto da sua completa laicização, sem espaços para o elemento religioso no momento do contrato-fundação.

De modo a não subsistir dúvidas quanto a não interferência do elemento religioso na fundação do Estado, Hobbes sente a necessidade de roteirizar o Leviatã e assim o minudencia:

“A fim de descrever a natureza desse homem artificial, examinarei: Primeiro, sua matéria e seu artífice; ambos os quais são o homem”. (Ibid, p.16)

Assim rompia o Filósofo com a tradição do jusnaturalismo que identificava em Deus a causa e fundamento último da razão humana, para encontrar no próprio homem o postulado da racionalidade e causa suficiente e eficiente de Si.

Ao discorrer sobre a natureza humana, o Leviatã a constituiu sobre a estrita igualdade entre os homens, a qual se subdivide em dois postulados: o da igualdade nas paixões e na razão; o primeiro causa da discórdia e da cobiça e fundamento do estado de natureza, o segundo causa fundante da razão humana e do direito natural.

E é mister rememorar, que o direito natural ou jus naturalis é

“… a liberdade que cada um possui de usar seu próprio poder, da maneira que quiser, para a preservação de sua própria natureza, ou seja, de sua vida. Conseqüentemente de fazer tudo aquilo que seu próprio julgamento e razão lhe indiquem como meios adequados a esse fim.” (Ibid, p.101)

Assim ao encontrar-se em extrema situação de igualdade, o homem não consegue fundar nenhuma forma de sociabilidade, haja vista inexistir o equilíbrio das relações na busca da preservação da vida, pois a união da igualdade formal com a igualdade material, impede a constituição de qualquer relação entre meu querer e o teu querer, tudo sendo de todos nada pode ser reivindicado por ninguém, e neste estágio impera o medo, a tensão e a incerteza, face a total impossibilidade de determinação.

Ao contradizer-se antinômicamente, o postulado do direito natural, o qual objetiva a preservação da vida, torna-se necessário o estabelecimento de meios e mecanismos de superar tal contradição, e a lex naturalis que consiste num

“… preceito ou regra geral, estabelecido pela razão, mediante o qual se proíbe a um homem fazer tudo que possa destruir sua vida, privá-lo dos meios para preservá-la ou omitir aquilo que pense contribuir melhor para preservá-la”. (Ibid, p.101)

pode ser a chave para a estruturação tanto do campo ético-político como para a própria consecução e efetivação do inalienável direito natural de preservação da vida. Assim e defluindo da própria definição da Lei natural, Hobbes define a primeira Lei natural como procurar a paz e segui-lá.

Todavia as Leis naturais de per si não são capazes de constituição de vínculos sólidos de sociabilidade, pois lhe falta aquele plus que Hobbes apenas encontrará no Estado e é enfático ao dizer

“os vínculos das palavras são demasiados fracos para refrear a ambição, a avareza, a cólera e outras paixões dos homens, caso não haja o medo de algum poder coercitivo.” (Ibid, p.106)

No projeto Hobbesiano, o homem dotado de razão deve buscar a sua preservação com todos os meio necessários, como postulado decorrente de seu direito natural à vida, mas sua busca deve conduzir necessariamente a alcançar a paz, sob pena de que meu querer torne-se óbice e causa material de fracasso de teu querer, e ambos se anulem reciprocamente.

Neste contexto traçado por Hobbes, deverá o homem no uso de sua racionalidade optar entre permanecer no estado de natureza, onde reina a insegurança e guerra potencial de todos contra todos ou utilizar-se da Mimeses e transpor pela via da imitação poiética a recriação de sua própria natureza através do postulado da razão de modo a atingir a condição de superação do bellum omnium contra omnes.

Porém como utilizar-se da mimeses e superar o bellum ominium contra omnes, se o próprio Thomas Hobbes, insistentemente adverte que

“Os pactos, sem a força, não passam de palavras sem substância para dar qualquer segurança a ninguém” (Ibid, p.127)

E as Leis naturais elencadas por Hobbes, em número de 18 não são capazes de fazer refrear a ambição, as paixões e desejos vis dos homens na sua busca irrefreável por prazer e deleite pessoal, como atingir a paz e a efetivação de meu direito à vida?

Neste ínterim, mesmo ciente da dificuldade de superação do estado de tensão natural, o homem deve se esforçar pela paz, todavia pactos sem a força da espada são inefetivos e não vinculam as partes, e é exatamente na impossibilidade de encontrar na natureza a realização da humanidade que Hobbes dá o salto sobre o Rhodes, utilizado-se da Mimeses, a qual irá se constituir-se como a recriação do elemento humano a partir da imitação da natureza em sua duplicidade inerente, qual seja a natureza interior e a exterior.

Nesta tarefa de recriação, poietica, o homem se auto-recriará, e terá como principal mister assemelhar a Deus, pois se a grandeza da tradição teológica se erige da crença no divino como artífice do homem, a teoria política retira a dignidade e autoridade do Estado na medida em que este é o fruto mais precioso da criação humana, assim para-nós se justifica as remissões ao elemento teológico no Leviatã.

A natureza humana em Hobbes já foi visto que se estrutura como um misto de paixão e razão, onde a razão é absorvida e utilizada para a busca do prazer e da confirmação da mecanicidade do corpo, e cabe ao homem optar entre o estado pré-político da guerra de todos contra todos e o estágio político, ou seja, o homem em Hobbes fundará a política a partir das insuficiências do mundo natural, e o campo simbólico se constituirá como segunda natureza, como produção de vida espiritual que negando a vida natural atingirá pelo processo do auto-reconhecimento mimético o Estado como superação e realização do elemento humano sobre a terra.

Dentro deste modelo de constituição-instituição do elemento político postulado por Hobbes, a arte consiste na imitação ou reprodução da natureza humana, através do reconhecimento da necessidade de superação do medo e da tensão generalizada do estado de natureza, onde a imitação levará à catarse e a descoberta da impossibilidade natural fazendo surgir o mundo da cultura como única saída viável ao projeto humano de preservação da vida.

Cioso da necessidade de superação das limitações oriundas da liberdade irrestrita do estado de natureza e consciente da necessidade de superações deste estágio como fruto da experiência do medo e da insegurança

“…Hobbes vai buscar sua originalidade na tarefa que a natureza lhe impõe, a de ser o artífice de sua própria humanidade: tarefa que exige, preliminarmente, que o homem saia justamente do “estado de natureza” e encaminhe-se para o “estado civil”, fazendo da sociedade e do Estado o terreno e o horizonte de sua realização humana”(LIMA VAZ, 2000, p. 86)

Ao discorrer sobre o processo de Mimeses em sua Estética, Hegel, nos dá pistas para uma melhor compreensão do por que da fundação estatal pelo Leviatã nestas bases. Hegel ao perguntar-se qual a razão da imitação para o homem, chega a estas conclusões:

Que pretende o homem ao imitar a natureza? Experimentar-se a si próprio, mostrar habilidade, e regozijar-se por ter fabricado uma coisa com a aparência natural.
O homem regozija-se, antes de tudo, por ter criado um artifício, por ter demonstrado a sua habilidade e por ter verificado de quanto era capaz; regozija-se com sua obra, regozija-se com seu trabalho, nos quais conseguiu imitar Deus… (HEGEL, 1999, p.45)

Ao pontuar que o processo mimético se estrutura em torno do campo existencial da busca do auto-reconhecimento e do gozo da criação pela utilização da téchne, o Filósofo do Conceito, atinge o cerne para a compreensão da mimeses em Hobbes, qual seja, a utilização da racionalidade como fator preponderante e inerente a constituição do Estado desde a experiência estética contida no desejo de ir além de si para se re-encontrar no mundo propriamente humano, a cultura, note-se que da experiência da tragédia no teatro grego é que fazia o cidadão se reconhecer como partícipe da polis.

Mediante o recurso a mimese, a anterioridade do indivíduo à sociedade, se justifica e o encontro do homem com o palco da cultura como causa eficiente do surgimento da civitas é condição inarredável, mesmo para uma explicação de base a-histórica como o é o estado de natureza em Hobbes.

È da experiência estética da tragédia contida no estado de natureza, onde o homem entregue a suas paixões é promotor do medo, da insegurança e impeditivo ao nascimento do social, que o ideal ético das leis naturais é incorporado como necessidade humana, e re-apropriado como produto social do qual procede a tentativa de saída do bellum omniu contra omnes pela via da instauração do pacto.

“Graças à autoridade que lhe é dada por cada indivíduo no Estado, é-lhe atribuído o uso de gigantesco poder e força que o terror assim inspirado o torna capaz de conformar as vontades de todos eles, no domínio da paz em seu próprio país….”(HOBBES, 2002, p.131)

E Aristóteles que bem conheceu a tragédia assim a definiu

“A tragédia é a imitação de uma ação importante e completa, de certa extensão… segundo as partes; ação apresentada, não com a ajuda de uma narrativa, mais por atores, e que, suscitando a compaixão e o terror, tem por efeito obter a purgação das emoções.” (ARISTÓTELES, 2003, p.35)

A tragédia é um todo completo que retira sua força e atração estética da unidade que se radica e legitima pelo reconhecimento da importância das partes na execução da experiência artística e é da importância das partes ao reconhecerem como válida a saída do estágio pré-político do estado de natureza para o Estado-Soberano que o Leviatã se funda.

A tragédia assim como a experiência do Estado de natureza Hobbesiano tem uma função ético-formativa, pois em ambas o dilaceramento provocado pela atuação individual, seja do ator ou do indivíduo, tem a função de suscitar o reencontro da relação harmoniosa que permite o acesso a paz e ao prazer.

Neste contexto de aproximação da mimeses Aristotélica e as razões da formação do estado em Hobbes, o Leviatã se afigura como o palco da tragédia onde o homem, individual, é o grande ator que se lança a tarefa de constituir o Estado, a partir de uma produção de sentido para sua existência de modo a alcançar a paz e a satisfação do prazer como meta e realização da razão inerente a sua natureza, através do esforço ético de viver segundo as Leis naturais que a Si mesmo se outorgou através da submissão e concessão da soberania nas mãos do governante.

A guisa de conclusão:

Thomas Hobbes, seguramente inscreve sua originalidade na fundação do conceito de Constituição Estatal com a mimeses ao suprassumir a dicotomia Aristotélica entre práxis e poiesis, ou seja entre fabricação e ação, tão cara a tradição filosófica continental, pois o Estado Hobbesiano enquanto fruto da ação radical e consciente dos súditos é uma ação voltada a fabricação deste animal artificial.

Ao aplicar os conceitos de práxis e poiesis na fundação do pacto, Hobbes confirma no plano político sua ruptura com Descartes e sua ética racionalista que davam primazia ao cogito, conferindo a primazia ao corpo e fundando um racionalismo empirista e fisicalista com ênfase na categoria do corpo e na busca a satisfação pessoal dos constituintes da sociedade civil.

Todavia, em que pese sua divergência com Descartes, Hobbes se utiliza de elementos da tradição Estético-Política oriunda de Aristóteles e a suprassume impondo e operando elementos não utilizados pelo Estagirita e promovendo uma construção conceitual impar onde o Estado é o resultado da ação individual é racionalmente direcionando a um fim coletivo, como única alternativa a realização e construção do social.

O Estado em Hobbes, especificamente no Leviatã, estrutura-se como a confluência ainda não superada de uma tradição filosófica, que inscreve o elemento humano no plano da historicidade enquanto artífice de sua existência, e o elemento mimético inscreve-se neste marco de ser a categoria que dá possibilidade a esta ação produtiva consciente da cultura enquanto produto da intervenção do homem na natureza e artífice de sua própria existência.

Referências Bibliográficas:

ARISTÓTELES. Arte Poética, Trad. Pietro Nasseti. São Paulo: Martin Claret, 2003.

DUCLOS, Miguel. Sobre o conceito de mimesis e katharsis na Poética de Aristóteles. Capturado no site www.consciencia.org/artigos.shtml. 2004.

HEGEL. Estética. Trad. Orlando Vitorino. São Paulo: Ed. Nova Cultural, 1999.

HOBBES, Thomas. Leviatã – ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil. Trad. Alex Marins. São Paulo: Martin Claret, 2002.

LIMA VAZ. Antropologia Filosófica. São Paulo: Ed. Loyola, 2000.

Escritos de Filosofia IV – Introdução à ÉTICA FILOSÓFICA 1. São Paulo: Ed. Loyola, 1999.

PLATÃO. A República. Trad. Pietro Nasseti. São Paulo: Martin Claret, 2002

RIBEIRO, Renato Janine. Hobbes: o medo e a esperança. In: Os clássicos da política, Francisco Weffort, V. I, São Paulo, Ed. Ática, 1989.

ZARKA, Yves Charles. Do direito de Punir. Trad. de Wladimir Barreto Lisboa. In Filosofia Política – Nova Série V. 5. pp. 156-177. Porto Alegre: LPM, 2000. (este texto corresponde ao capítulo X do livro Hobbes es te la pensée politique moderne. Paris, PUF, 1995)

WOLLMAN, Sérgio. O conceito de liberdade no Leviatã de Hobbes.Porto Alegre: EDIPUCRS, 1994.


[1] Sobre o tema da mimeses em Platão, cf. A República, Livro III.

[2] Obra de arte que em Aristóteles será a tragédia e em Hobbes será o Estado.

[3] Sobre o processo da Mimeses em Aristóteles, cf. Arte Poética, 2003, 15.

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