ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE A DEMOCRACIA BRASILEIRA: ENTRAVES E AVANÇOS

ALGUMAS REFLEXÕES
SOBRE A DEMOCRACIA BRASILEIRA: ENTRAVES E AVANÇOS

 

 

 

 

Francisco Fernandes
Ladeira

Email:
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Resumo:                                                                                                                  

 

Este trabalho realiza uma análise
sobre a democracia no Brasil. Entre os autores que se propuseram a trabalhar
com essa temática é corrente a idéia de que o país ainda não atingiu a
maturidade democrática, apresenta assim uma democracia incompleta. Dessa forma,
pretende-se apresentar os fatores que contribuem para dificultar a consolidação
dos preceitos democráticos no Estado Brasileiro.

 

 

Palavras-chave:
Democracia. Brasil. Política. Sociedade Civil. Estado.

 

 

Abstract:

 

 

This paper
provides an analysis about the democracy in Brazil. The idea that the country
has not yet reached the democratic maturity is common among who proposed to
work with this theme, so, the country presents an incomplete democracy. Thus,
we intend to present the factors that contribute to not consolidation of
democratic principles in the Brazilian State.

 

 

Key-words: Democracy. Brazil. Politics. Civil society.
State.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Introdução

 

 

O Brasil se tornou oficialmente independente de Portugal em 1822. No
entanto, ao contrário de seus vizinhos sulamericanos, não adotou o regime
republicano e os preceitos democráticos. O Estado Brasileiro era um império cercado de repúblicas por todos os lados, tendo
como líder um monarca nascido na ex-metrópole.                                                                     Em
1889, através de um movimento militar, foi proclamada a república. Porém, a
população em geral não participou da instauração do novo regime político. Como
bem registrou Aristide Lobo: “O povo
assistiu aquilo bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que
significava. Muitos acreditavam sinceramente estar vendo uma parada”.
                             Os
dois primeiros presidentes do país, Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, eram
militares e não foram indicados pelo voto popular[1].                        

Somente em 1894 ocorreu a primeira eleição direta para a presidência do
Brasil, vencida pelo paulista Prudente de Moraes. 

O período compreendido entre 1894 e 1930, também conhecido como
“República Velha”, apesar de aparentemente democrático, foi marcado pelo
domínio das oligarquias rurais, notadamente dos estados de São Paulo e Minas
Gerais. Na época, os grandes proprietários de terra mandavam e desmandavam no país,
sendo patente o uso de várias práticas persuasivas, como o “voto de cabresto”,
durante o processo eleitoral.

Nos acontecimentos que desencadeariam na Revolução de 1930, mais uma vez
a população esteve ausente. Realizado o processo revolucionário, antes que o
povo o fizesse, as oligarquias mineiras e gauchas desposaram a oligarquia
paulista do poder.

Terminada a revolução, Getúlio Vargas assume a presidência e impõe ao
país quinze anos de um regime autoritário.

Entre 1946 e 1964, enfim o Brasil atravessa seu primeiro período
realmente democrático, interrompido precocemente pelo Golpe civil-militar de
março de 1964.

Assim, durante quase vinte anos, o país esteve sob domínio de uma severa
ditadura, marcada pela censura, pela restrição de liberdades individuais e tortura
de inimigos do regime (qualificados como subversivos), entre outras atrocidades
contra os direitos humanos.

Desde 1985, com o término do Regime Militar, chegando aos dias hodiernos,
o Brasil atravessa seu maior período de estabilidade democrática. Contudo, isso
não quer dizer que ainda não existam resquícios autoritários e antidemocráticos.
Principalmente nos chamados “rincões” do país, práticas como a compra de votos
e a propaganda política ilegal ainda ocorrem com certa frequência.

Como se pôde constatar através deste breve histórico, a democracia no
Brasil foi mais exceção do que regra. Ao longo dos anos, a democracia
brasileira foi interrompida por consideráveis hiatos de autoritarismo.

Portanto, é corrente a idéia de que o Brasil ainda não atingiu a
maturidade democrática, apresenta assim uma democracia incompleta. Esta acepção
é encontrada em boa parte dos autores que se propuseram a trabalhar com tal temática.
                                            

Dessa forma, o presente artigo apresenta quatro possíveis causas que contribuem
para dificultar a consolidação dos preceitos democráticos no Estado Brasileiro:
1) as heranças do Estado Patrimonialista Português, 2) a falta de identidade
ideológica dos partidos políticos, 3) a modernização incompleta ocorrida no país
(o poder econômico passa para o centro industrial, porém o poder político não
passa completamente: uma elite agrária, decadente economicamente, manteve parte
do poder político) e 4) a ausência de uma democracia social (pressuposto para a
democracia política).

 

 

 

 

Heranças portuguesas

 

 

 

Influentes nomes da historiografia brasileira, como Sérgio Buarque de
Holanda e Simon Schwartzman, apontam algumas características herdadas pelo
Brasil do Estado Português (principalmente seu caráter patrimonialista) como
empecilhos para o desenvolvimento democrático brasileiro.

Em uma sociedade liberal, os conflitos de classe são resolvidos pelo
Estado. Já no Estado Patrimonialista, típico exemplo do caso brasileiro, o
poder público é o lugar onde a sociedade se constitui. O Estado é o próprio
patrimônio, “[…] é organismo a ser parasitado por grupos de interesses e
indivíduos dedicados a transformarem a coisa pública em coisa própria” (GOMES,
p.05).

Segundo Simon Schwartzman, o Estado como protagonista das ações sociais é
a causa do “autoritarismo brasileiro”. “Na tradição brasileira, todas as
questões – religiosas, econômicas, educacionais – passam sempre pelo crivo do
poder público” (SCHWARTZMAN). O Estado, marcado por uma burocracia pesada e
pouco ágil, sobrepõe à sociedade civil, fraca e pouco articulada.

Sérgio Buarque de Holanda, no clássico Raízes do Brasil, busca os
motivos que obstruem a democracia brasileira a partir de práticas culturais
herdadas dos portugueses. A própria dificuldade de associações entre comuns no
Brasil, calcadas mais em laços sentimentais do que ideológicos, seria uma
possível explicação para a ausência de partidos políticos consistentes em nosso
país.

 

Em uma sociedade de origens tão nitidamente
personalistas como a nossa […] os vínculos de pessoa a pessoa […] [são]
sempre os mais decisivos. […] O peculiar da vida brasileira parece ter sido
[…] uma acentuação singularmente energética do afetivo, do irracional, do
passional, e uma estagnação, ou antes, uma atrofia correspondente das qualidades
ordenadoras, disciplinadoras, racionalizadoras. […] Exatamente o contrário do
que parece convir a uma população em vias de organizar-se politicamente (HOLANDA,
1971, p. 30-31).

 

 

            Segundo
Fernando Henrique Cardoso (1988), o “fosso” entre sociedade civil e governo
também deve ser destacado como gene do caráter não democrático do Estado
Brasileiro.

 

Entre ambos, Estado e sociedade civil, ocorreu um
fosso, uma espécie de vácuo-tampão. A democracia teria, então, brotado no solo
virgem da sociedade, deixando o Estado embalado em seu esplêndido isolamento
autoritário (CARDOSO, 1988, p.460).

           

 

Seguindo essa linha de raciocínio, Werneck Vianna enfatiza a “[…]
dissociação entre instituições do governo e o conjunto de opiniões e interesses
na sociedade” (VIANNA apud CARVALHO, 2002, p.310).                                                                                                                   Já
para os pensadores ideólogos do liberalismo econômico só é possível atingir a
democracia de fato quando a influência do Estado nas escolhas individuais for
ínfima.

 

Nas sociedades onde vige a liberdade de contrato,
especialmente quando se está diante de leis autorizadas “que deixam tudo com o
acordo livre”, Weber distingue a coação econômica da extra-econômica, em que a
primeira, típica das sociedades de livre mercado, se abstém de todas as formas
autoritárias que caracterizam esta última, porque exercida em nome da
propriedade juridicamente garantida dos meios de produção e de aquisição.
(WEBER apud BURGOS e VIANNA, 2002, p.351).

 

 

 

 

Falta de identidade ideológica
dos partidos políticos brasileiros

 

De
acordo com Benjamin Constant, o partido político consiste em uma reunião
de homens que professam a mesma doutrina política. Hans
Kelsen, jurista contemporâneo, escreve que os partidos
políticos são organizações que congregam homens de semelhante opinião para afiançar-lhes verdadeira
influência na realização dos negócios públicos.                     Entretanto,
no Brasil, a atividade política é um negócio, não um meio para fazer valer os
interesses de determinada classe econômica ou grupo social. É com tal escopo
que surge a maior parte das organizações partidárias no país. “Com isso, são
partidos cuja alma é voltada para as eleições, tanto que, fora dos períodos
eleitorais, os partidos praticamente não têm vida partidária” (CABRAL, 2006,
p.60).                                                                                                 Para
Roberto Romano (2006), os quatro maiores partidos brasileiros (PT, PSBD, PMDB e
Democratas) não apresentam grandes divergências entre si:

Temos quatro partidos iguais, um quadro partidário de
imaginação política limitadíssima […] É o choque político no Parlamento que
gera idéias novas, que faz o país se desenvolver. Com […] quatro partidos
iguais, o debate político fica obstruído (ROMANO apud CABRAL, 2006, p.
59,60).                                        

Moreira Franco,
deputado federal pelo PMDB fluminense, reforça essa idéia:

 

Os quatro partidos se parecem porque têm uma visão
fisiológica do poder. […] Para os quatro, o essencial é manter no poder, sem
nenhuma preocupação pragmática. […] Essa característica dos partidos, de
querer o poder pelo poder, está na origem de todos os problemas da atual
legislatura […] (FRANCO apud  CABRAL, 2006, p. 60,61).

 

 

Modernização Incompleta

 

 

 

A passagem de sociedades tradicionais para sociedades modernas ocorre pela
transferência do centro do poder político econômico agrário para um centro
urbano e industrial. Este é o modelo clássico europeu, basicamente inglês.                                                 Deste
modo, há concomitantemente, a transferência do poder político das elites
agrárias para as elites políticas urbanas. Quando isso ocorreu em países que só
se modernizaram no século XX, como a Rússia, o “preço pago” foi ter de destruir
rapidamente, via socialização forçada, a antiga sociedade agrária.

            Já o
Brasil passou por uma modernização incompleta: o poder econômico passa para o
centro industrial, entretanto o poder político não passa completamente,
continua em grande parte vigente nas bases agrárias. É por isso que o estado de
São Paulo, por exemplo, tem poder econômico e político durante o século XX; e
os estados agrários nordestinos não têm poder econômico, mas têm um poder
político desproporcional à sua importância econômica. Ou seja, a modernização
brasileira não produziu 30 milhões de mortos como a modernização russa[2],
todavia manteve parte significativa do poder político nos setores agrários,
pouco importantes economicamente[3].

 

[…] As circunscrições eleitorais sub-representadas
correspondem, em geral, aos estados mais desenvolvidos e industrializados do
país. Ao contrário sensu, as zonas mais atrasadas, e por igual,
politicamente mais sujeitas ao jugo do coronelismo, acham-se super-representadas
em relação às primeiras (BRITTO, 1965, p. 242, 243).

 

 

Temos elites agrárias com grande poder político e sem importância
econômica: uma modernização incompleta. O Brasil para se modernizar precisa do
“arcaico”. Isso compromete o desenvolvimento das práticas democráticas no país.
Constitui-se assim um legislativo conservador, ligado aos interesses das elites
tradicionais do país.

Gláucio Soares (1973) corrobora essa linha de pensamento:

 

[…] A representação política de uma cultura política
tradicional, atrasada, dominada por líderes locais, freqüentemente
latifundistas, proprietários rurais, coronéis de todos os tipos, ou pessoas de
sua escolha ou confiança, o sistema eleitoral terminou por prejudicar a maioria
da população destas áreas. Ao aumentar o poder político da elite dirigente
desta cultura política rural, tradicional e pré-ideológica, ao
super-representar na Câmara e no Senado as áreas desenvolvidas social e
politicamente, a legislação diminuiu a possibilidade de aprovação, pelas duas
Câmaras, de reformas que viriam a beneficiar a maioria da população rural que
habita principalmente estas áreas subdesenvolvidas. Este foi o caso da reforma
agrária (SOARES, 1973, p. 27 e 28).

 

 

Quando a atividade econômica independe e prepondera
sobre a atividade especificamente política, o sistema de participação política
consiste, essencialmente, em formas de representação de interesse. Ao
contrário, quando é a atividade política que prepondera sobre a atividade
econômica, definido, inclusive, as oportunidades diferenciais de
enriquecimento, o sistema de participação política consistirá, essencialmente,
em uma disputa […]por acesso a posições governamentais, independente de uma
ideologia ou programa político explícito (SCHWARTZMAN).

 

           

Leonardo Avritzer observa, no âmago do Congresso Nacional, um conflito de
idéias entre as “oligarquias tradicionais”, mantedora de políticas anacrônicas,
contraditórias ao processo de democratização do Estado Brasileiro e os “setores
mais modernos”, vinculados a movimentos sociais favoráveis aos processos de
emancipação da sociedade civil frente ao poder estatal.                                                                                          

 

[…] Os setores mais modernos da política brasileira
têm encontrado dificuldades para tornar suas práticas e valores hegemônicos
dentro do Legislativo. O resultado é uma ambigüidade do Congresso enquanto
instituição em relação a tais práticas, o que termina por deslegitimá-lo frente
à opinião pública (AVRITZER).  

 

 

 

 

Democracia social como
pressuposto para a democracia política

 

 

Florestan Fernandes (1981) aponta a dominação burguesa (aliada ao capital
externo) sobre as classes sociais menos favorecidas como entrave para o
desenvolvimento democrático.

 

 

 

A democracia não só é dissociada da auto-afirmação
burguesa, como ela seria um tremendo obstáculo ao tipo de autoprivilegiamento
que as classes burguesas se reservaram, para poderem enfrentar a
industrialização intensiva e a transição para o capitalismo monopolista
(FERNANDES, 1981, p.348).  

 

 

Para a burguesia brasileira não seria conveniente a democracia, pois
assim teria que fazer concessões às classes baixas, principalmente fomentar uma
“democracia dos recursos econômicos”, o que pressupõe melhor distribuição de
renda. Dessa forma, Florestan Fernandes destaca que:

 

 

[O predomínio das elites] se impõe como ponto de
partida e de chegada de qualquer mudança social relevante; e se ergue como uma
barreira diante da qual se destroçam (pelo menos por enquanto) todas as
tentativas de oposição as concepções burguesas vigentes do que deve ser a
“ordem legal” de uma sociedade competitiva, a “segurança nacional”, a
“democracia”, a “educação democrática”, o “salário mínimo”, as “relações de
classe”, a “liberdade sindical”, o “desenvolvimento econômico” a “civilização”
etc. (IDEM, p.303).

           

 

Uma sociedade que permite a exploração do homem pelo homem, e tem a
exclusão das classes inferiores como apanágio de seu sistema produtivo, não
pode ser considerada democrática.

 

O autoritarismo social e as desigualdades econômicas
fazem com que a sociedade brasileira esteja polarizada entre as carências das
camadas populares e os interesses das classes abastadas e dominantes. […] Os
interesses porque não se transformam em direitos, tornam-se privilégios de
alguns. […] Uma carência é sempre específica, sem conseguir generalizar-se num
interesse comum nem universalizar-se num direito. Ora, a democracia é a criação
e garantia de direitos. Um privilégio, por definição, é sempre particular.
[…] Nossa sociedade, polarizada entre carência e o privilégio, não consegue
ser democrática. (CHAUÍ, 1995, p.436)

           

 

Dessa forma, de acordo com pensadores marxistas, o poder estatal consiste
em aparelho da dominação burguesa no Brasil.

             

 

Avanços democráticos

 

           

Por outro lado, alguns estudos apontam avanços na democracia brasileira.

            Wilson
Gomes cita a liberdade de imprensa como pressuposto fundamental para a
democracia. “A cena política mediática é predominantemente controlada por
agentes externos ao campo político”. (GOMES, p. 20). Destaca também a maior
visibilidade dada à esfera política por parte da imprensa, o que aumenta o
poder de fiscalização da esfera pública pela esfera civil:

           

Houve um tempo em que a esfera civil tomava
conhecimento das agendas do governo e das pautas do Congresso apenas através da
imprensa de opinião associada a grupos de interesse e a partidos políticos ou
através da imprensa oficial, que representava o interesse de quem governa […].
Hoje vivemos em uma sociedade de fluxo contínuo, intenso, acelerado e multidirecional
de informação política. […] Formulou-se um domínio multivariado, livre […]
e de fácil acesso composto de informações sobre a esfera política. (IDEM, p.
16,17).

               

 

Em contrapartida, Maria Tereza Garcia destaca a influência de
tradicionais famílias políticas brasileira sobre os meios de comunicação[4].
Nesse sentido, a mídia no Brasil não desempenharia um papel politicamente
neutro.

 

 

Partidos, políticos e candidatos que detém o poder
sobre algum canal televisivo, se aproveitam muito bem disso para fortalecer sua
imagem e para fazer campanha, mesmo que disfarçada de programas ou jornalismo
[…]. Com essa estratégia esses candidatos não apenas derrubam seus
concorrentes políticos, mas também desestabilizam os demais veículos existentes
em sua localidade, conseguindo obter duplo benefício (GARCIA, p. 07).

 

 

 

Dessa forma, a democratização dos meios de comunicação e a neutralidade ideológica
dos formadores de opinião consistem em importantes condicionantes para a
democracia política:

 

São do conhecimento de todos, os riscos e efeitos
negativos que uma monopolização dos meios de comunicação pode causar para a
democracia e a cidadania, no entanto, mesmo que se tenha uma livre concorrência
e proprietários diversos para veículos de comunicação, caso não haja isenção,
imparcialidade e responsabilidade na difusão de informação, os danos causados
aos interesses da população acabam sendo maiores, já que “enganada” por todos,
a população acaba por se sentir informada (GARCIA, p. 19).

 

 

Para Giovanni Sartori, “uma das condições para a democracia é um sistema de mídia
policêntrico, que não haja concentração da propriedade, e que o mercado de
mídia expresse e contemple, dando a possibilidade de expressão, as diferentes
opiniões que existem na sociedade” (SARTORI, apud LIMA, 2010).

Maria Kinzo (2004) aponta alguns avanços no cenário político brasileiro.
A autora afirma que o país ganhou características nítidas de uma democracia.
Cita o caráter predominantemente urbano do eleitorado, com o significativo
avanço das condições de livre exercício do voto. Destaca a atuação da Justiça
Eleitoral nesse processo e a eleição de Lula, “líder político de esquerda,
oriundo das camadas populares”, para a Presidência da República em 2002. Luis
Werneck Vianna (2002) acrescenta a essa lista a utilização do sistema de urnas
eletrônicas.

             Em reportagem às vésperas das eleições presidenciais de 2002, a revista britânica The Economist apresentava uma possível vitória de Lula como “triunfo
da democracia brasileira”. O êxito do candidato petista derrubaria o mito de
que a democracia na América Latina é um jogo marcado para privilegiar as
elites. A aliança com o Partido Liberal comprovava a maturidade política do
Partido dos Trabalhadores. “[…] O PT só obteve sucesso eleitoral e viu-se
dotado de chances de governo quando assumiu um modelo de política efetiva
deixando de lado o modelo de aliança por visão de mundo” (GOMES, p.11).

            Por outro lado, João Machado (2004) descreve a
aliança entre o PT (partido que em sua fundação tinha o propósito de defender
os interesses da classe trabalhadora) e o PL (partido “nitidamente burguês e de
direta”) como “uma mudança negativa na linha política oficial do PT”.

 

Pela primeira vez, Lula teve como vice-presidente um
grande empresário. […] A idéia era que sem isso era impossível ganhar as
eleições, e ainda impossível governar. […] Ganhar a confiança do grande
capital foi o objetivo central da imposição da aliança com o PL. […] As
eleições de 2002 selariam o destino do PT: sua morte como partido autenticamente
socialista tornou inevitável (MACHADO, 2004).

Segundo Olavo Brasil de Lima Junior (1999), a aliança entre partidos
ideologicamente antagônicos é perniciosa para as práticas democráticas:

 

Há aspectos gerais relativos às condições conjunturais
das eleições que apontam para o enfraquecimento das raízes sociais dos
partidos, para a redução da diferença entre eles e para a necessidade
inexorável de se formar um esquema de alianças […] criando uma rede pouco
nítida do ponto de vista ideológico […]. Todos esses aspectos apontam para a
“banalização” dos partidos, levando ao desaparecimento de suas diferenças
essenciais, com base nas quais os eleitores optam por uma ou outra agremiação
(LIMA JUNIOR, 1999, P.20).

 

 

 

 

 

Considerações finais

 

 

            Infelizmente
no Brasil boa parte da população possui certo asco em relação à esfera política.
É lugar-comum acreditar que todo político é desonesto e que todos os que
enveredam por essa atividade possuem objetivos ilícitos.                                                                        Também
é corrente a idéia de que não se discute sobre política, futebol e religião. Porém,
ao contrário das discussões futebolísticas e religiosas, debates sobre política
raramente estão presente no cotidiano da população em geral. Essa “distância” entre cidadão comum e política é de vital importância para se
entender a questão do desenvolvimento da cidadania no Brasil.

Os preceitos democráticos, e toda a gama de instituições e atores sociais
que as envolvem, devem ser considerados como práticas que possam ir além do voto
em ocasiões periódicas.

É preciso um maior engajamento por parte da sociedade como um todo, e
também implantar uma cultura política de fato no país, para que todos os
cidadãos conheçam seus deveres e reivindiquem seus direitos.         

Assim, torna-se absolutamente necessário conceder ao povo uma soberania
autêntica e não apenas retórica, como a atualmente existente. Dessa forma um
povo é realmente soberano quando possui o poder de referendar toda e qualquer
emenda constitucional ou lei votada pelo Poder Legislativo.

Por outro lado, não há no Brasil um espaço público realmente estruturado,
a atividade política é restrita, com raríssimas exceções, às classes dominantes
que se apossam do aparelho estatal.                                                                                                                           Também
é absolutamente controverso falar em democracia plena em um país onde é
desigual o acesso aos bens matérias, à educação de qualidade (que valorize a
formação de cidadãos conscientes) e onde ainda persiste um vertiginoso oligopólio
dos meios de comunicação.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


NOTAS

 

 

 

[1] Período intitulado “República das Espadas”.                                                                                          

[2]
No Brasil não foram registrados “derramamentos de sangue”, porém a vertiginosa
e seletiva forma como nosso Estado absorveu os mecanismos inerentes à
modernidade acabou por gerar milhões de excluídos.

 

[3]
Essa linha de pensamento pode ser entendida dentro da lógica da política
patrimonialista relativa. Sobretudo na  primeira fase do século XX, de
fato, no Brasil se operava uma lógica na qual o poder tradicional de regiões
economicamente decadentes mantinha grande influência, vide o grande poder
político do nordeste, desproporcional ao seu poder econômico. Nos dias de hoje
as coisas são mais complexas e o poder econômico não precisa de proximidade
geográfica para influir nas decisões.
De qualquer forma, é
importante notar que em todos os países que atingiram alto grau de
desenvolvimento o poder econômico também controla o poder polí­tico e no Brasil
somente ao final do século XX esse processo se estabelece com mais clareza.

 

[4]
(…) É fácil imaginar que diversas informações de grande interesse para os
estados deixam de ser informadas em virtude do comprometimento do dono dessas
emissoras. Por exemplo, canais de TV no Maranhão estão nas mãos de José Sarney
e Roseana Sarney; em Alagoas, nas mãos de Fernando Collor; em Sergipe, de
Albano Franco; na Bahia, de Antonio Carlos Magalhães, no Ceará, de Tasso
Jereissati, no Rio Grande do Norte, de Garibaldi Alves, sem contar Jader
Barbalho, Orestes Quércia e diversos outros políticos que têm seus nomes
ligados à direção da mídia televisiva. (GARCIA, p. 14).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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    UFMG, Rio de Janeiro: IUPERJ / FAPERJ, 2002.
  • Vitória de Lula seria triunfo
    para a democracia, diz “The Economist”.
    Disponível em: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2002/021003_economistdi.shtml.
    Acesso em: fev. 2008.
  • WEFFORT, Francisco C. (1985), Por
    que democracia?
    3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1985.

 

 

 

 

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