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05/10/2007 às 7:04 em resposta a: Porque falamos “americanos”, quando queremos nos referir aos estadunidenses? #81422XoroMembro
Lembro-me há alguns anos já quando numa prova de Geografia escrevi “estadunidense” e para minha surpresa recebi a prova com um grande “x” vermelho sobre a palavra, com a correção ao lado: “americano”.É dose?E olha que eu estudei no Colégio Bandeirantes...
XoroMembroOlá, Brasil, são 3 da manhã e acabei de chegar em casa, ainda estou muito cansado portanto responderei aos seus questionamentos amanhã, sexta-feira, na parte da tarde, tudo bem? Mas antes de tudo gostaria de saber quais livros de Nietzsche você já leu, e se já teve contato com obras de comentadores ou de autores que influenciaram ou foram influenciados por Nietzsche. Todas essas citações por você levantadas e que você (para minha tristeza :'() chamou de não-filosofia seriam facilmente compreensíveis com um contato mais profundo com a filosofia dele. Amanhã, quando lhe for responder propriamente, tentarei explicar a maioria delas =)De qualquer forma, mantenha em mente que estudar Nietzsche é estudar um filósofo muito complicado, não só por suas fases, mas também pelo fato de ele ser um filólogo e um poeta, ele escrevia usando e abusando de neologismos, ironias, aliterações e assonâncias (em alemão, é claro, imperceptíveis no português) e por aí vai, daí a leitura ser muitas vezes dificultada por isso. Lembre-se de que Nietzsche, se não me engano no Ecce Homo, diz que para se ler a filosofia dele deve-se "ruminá-la", lê-la várias vezes, ele não escreveu de forma ordenada ou cadenciada, cada livro complementa o outro numa ordem quase desordenada =)Enfim, amanhã à tarde responder-lhe-ei, até lá! Um abraço!
XoroMembroOlá, Brasil! Gostei muito deste seu post, esta é minha primeira mensagem neste fórum, mas pretendo freqüentá-lo ainda muito mais vezes. Não me considero um nietzscheano, ou defensor de Nietzsche, tenho-o como meu filósofo preferido, e de quem mais gosto de estudar, portanto creio que se fazem necessárias algumas asserções sobre seus levantamentos.Responderei (ou tentarei responder) primeiramente a algumas das suas objeções e questionamentos levantados por você. Vamos lá então:*Cada número corresponde, na ordem temporal, a um comentário seu, sendo o primeiro o seu comentário que começa por "Além do bem, do mal e da cognoscibilidade humana!"*1) Creio que você tenha puxado um pouco a barra ao afirmar que pelo fato de o juízo servir para a conservação da espécie ele deve ser necessariamente inato, essa afirmação é perigosa pois vai de encontro não só com a história da Filosofia como também com a da Lógica. Atendo-me apenas à filosofia de Nietzsche, o que ele quis dizer com a sua exposição sobre a imprescindibilidade dos juízos foi que mesmo os homens tendo consciência da provável falsidade de um juízo, como os juízos sintéticos kantianos ou a relação de causa e efeito, isso não significa que eles devam ser abandonados sumariamente. Nietzsche inclusive, textualmente, afirma a total necessidade do princípio de causa e efeito para a organização da vida humana, sem ela não viveríamos. Ele não chega a cogitar que se abandonem esses juízos, mas sim que tenhamos consciência dos perigos que corremos ao hipostasiarmos esses juízos e noções, ou em outra palavra, o perigo que corremos ao extrapolarmos essas noções para algo maior e metafísico. Nietzsche nos oferece um exemplo, demonstrando o risco que corremos ao pegarmos a noção de causa e efeito e a entronarmos, gerando assim a necessidade de uma "causa sui" (causa de si mesmo), ou seja, Deus. Portanto, não se trata, em Nietzsche, de abandonarmos juízos ou noções pelo fato de eles serem metafísicos ou não demonstráveis, mas sim tratarmos as mesmas com a devida parcimônia e precaução, para que elas não transcendam o seu "domínio".
2) Na sua opinião pode não haver diferença entre crer numa entidade metafísica indemonstrável ou viver na incerta realidade, mas na opinião de Nietzsche, há, vamos a ela então! =) Ontologicamente falando, ambas são incertas e não deveriam oferecer suporte à existência humana, mas vejamos porque uma implica niilismo e outra não, para Nietzsche. Niilismo vem do latim, "nihilum", significando, grosso modo, negar. Para se ter uma melhor noção do que significa a palavra Niilismo e sua raiz etimológica, remeta-se à palavra inglesa "annihilation", sinônimo para aniquilação. Para Nietzsche, viver sob uma ilusão, sob os ditos e promessas de uma entidade metafísica, implica negar o estado da sua vida terrena, da vida real, da realidade. Negar a vida para se entregar a uma outra vida superior é reconhecer o estado desconfortável e inquietante da vida terrena para se deixar amortizar pela promessa de um futuro melhor no além-mundo. Nesse aspecto, isso se difere completamente do viver sob uma realidade incerta, incerta na medida em que nem tudo pode ser explicado lógica ou cientificamente pelo homem, mas significa também viver não só na realidade, mas viver a realidade, a vida enquanto vontade de potência, enquanto disputa, enquanto polemus (grego para disputa, luta; creio que a grafia não esteja correta, peço perdão) incessante. Dessa forma, não se transferindo o objetivo da vida para algo além dela, mas mantendo-a dentro dessa realidade incerta, não se tem o niilismo e nem a renúncia à vida, mesmo ainda se mantendo, estritamente falando, numa realidade tão incerta quanto à existência ou não de realidades supra-sensíveis. É nesta esfera em que se mostra o "desejo de viver" e as coisas sucederiam "de outra forma", como enunciou o filósofo.
3)a. Schelling A crítica de Nietzsche a Schelling está na mesma chave da crítica a Kant, a Platão, a Hegel e inclusive a Schopenhauer (quando da maturidade de Nietzsche, obviamente). De fato Nietzsche não é muito sutil quando critica a tradição da Filosofia, lembro-me de um professor meu que o comparou a um "elefante numa loja de cristais". Mas antes de descartarmos completamente as críticas de Nietzsche por conta de sua falta de sutileza, faz-se necessário que a entendamos na sua origem. A crítica de Nietzsche a Schelling, Kant, Platão, etc. se faz dá mesma forma, pois em todos os filósofos Nietzsche detectou a existência do que ele chamou de "edifícios metafísicos", especialmente no caso de Platão, o "primeiro cristão", segundo Nietzsche. Todos estes filósofos destacaram, descolaram, separaram duas realidades, dois mundos, duas razões, etc., e é aí que está o erro de todos, segundo Nietzsche. No caso de Schelling, Nietzsche textualmente ainda o critica como sendo um "seguidor" do que fizera Kant após ter descoberto uma nova faculdade no entendimento humano. Diz Nietzsche que logo depois dessa descoberta, todos os alemães seguiram como se procurassem bichos no mato, procurando aflitos novas faculdades da razão, faculdades obviamente supra-sensíveis. De fato a crítica de Nietzsche a certos filósofos não é aprofundada, pois ele os ataca no cerne de seus pensamentos, no fato de que todos esses distinguiram dois (ou mais) mundos, realidades, etc..3)b. CompaixãoA compaixão é o "maior pecado da humanidade", segundo Nietzsche, e está sim, de certa forma, relacionada à vontade de potência, enquanto vontade de dominar, enquanto vontade de colocar a sua perspectiva acima da perspectiva do(s) outro(s). A compaixão é a base do processo de "nivelamento da humanidade por baixo", do tornar iguais "os zeros" em vez de se admirarem "os uns", como diz Nietzsche, creio que na Aurora, se não me engano. A compaixão é parte integrante e imprescindível da moral dos fracos (dos escravos), na moral judaico-cristã pois na medida em que ela coloca o sofrimento como respeitável e passível de louvor (pela compaixão), ela nivela fortes e fracos, torna os fracos como sendo tão potentes como os fortes, e, num período posterior, torna os fracos como fortes, e os fortes tornam-se fracos e repreensíveis. A moral da compaixão torna os padres os respeitáveis da sociedade, torna, nas palavras de Nietzsche, "os que não gozam" aqueles que devem ser respeitados e seguidos.Portanto, a compaixão se relaciona à conservação da espécie, sim, mas à conservação num sentido negativo, de defesa ao que vem de fora, dos mais fortes. Conservação no sentido não de afirmação da sua vida e da sua força, mas no sentido de se proteger do jugo dos fortes e dos que se afirmam. É nessa medida que a compaixão (e sua valoração) foi crucial para o estabelecimento da moral judaico-cristã.
4) Nesta sua observação pude notar um erro substancial sobre a filosofia de Nietzsche, permita-me elucidá-lo. Você escreveu: "Concordo que se deva considerar o ângulo moral ao avaliar, tentar definir e explicar a vontade, o querer e o sentir, porém esse não deve ser o único ângulo a se considerar. Vê-se claramente que Nietzsche tem uma ótica centrada no “querer”, por um ângulo político-hierárquico-social, na “vontade” associada às questões de ordem sociológica. Contemplando somente as relações sociais, esquecendo-se da vontade relacionada a outros fatores pessoais.". Não é bem por aí, amigo. Nietzsche é não só um filósofo de impacto como também serviu de base para quase tudo que se seguiu a ele (existencialismo, filosofia do século XX, Heidegger, etc.), e um dos que bebeu da fonte de Nietzsche é Freud. Freud inclusive em uma carta confessa a um amigo ter "atrasado suas leituras de Nietzsche" para prolongar o sentimento de que "escrevera algo novo". No que ele baseou essa confissão? Exatamente na exposição nietzscheana sobre a vontade. Nietzsche não se esqueceu do que você chama de "fatores pessoais" em sua análise sobre a vontade, ele não deu importância apenas a fatores "político-sociais-hierárquicos", ele baseou sua filosofia da vontade em critério biológicos e psicológicos (ele mesmo usa a palavra psicológico, por isso a uso). Nietzsche era um assíduo leitor de biólogos e físicos, principalmente entre 1881-82, o que se atesta em seus fragmentos póstumos e suas exposições sobre força, vontade e vontade de potência. Inclusive na "Aurora" ele escreveu um de seus aforismos mais curiosos e sonoros na minha opinião, em que ele identifica como sendo da mesma ordem a tolice que seria dizer "Eu quero que o sol se ponha" com "Eu quero aquilo e não isso". Essa escolha não faz parte de um ato deliberado do homem, ou de uma ponderação racional, a vontade já brota no sujeito, assim como é tolo querer um homem escolher no que ele vai pensar, já que não é o homem que pensa, mas o pensamento que assalta a mente do homem. É nesse aspecto que a filosofia de Nietzsche serviu como referência à filosofia do inconsciente de Freud, e portanto espero ter-lhe demonstrado como Nietzsche não ignorou "fatores pessoais" ao elaborar sua filosofia da vontade.
5)Se possível gostaria que você elaborasse sua tese sobre Nietzsche ter sido parco em sua crítica ao instinto de conservação da espécie, a filosofia dele é amplamente desenvolvida neste ponto e poderíamos abrir uma discussão muito interessante sobre isso.
6 Ver asserção 1 sobre a crítica nietzscheana à entronização da noção de causa e efeito =)
7 Repare como ele não propõe, como você insinou, que tentemos viver sem esses princípios, mas apenas aludiu ao risco que seria hipostasiá-los. Ver asserção 1! =)
8A "causa primeira" é invenção da metafísica, e, no limite, da moral judaico-cristã (claro que a "causa em si" foi exposta por Aristóteles antes do cristianismo), enquanto invenção da metafísica advinda da vontade de verdade, vontade essa criticada por Nietzsche textualmente em muitos livros de sua obra, principalmente no começo de "Para Além do Bem e do Mal". A invenção da causa primeira é exatamente o resultado da entronização da noção de causa e efeito, tornando ela mais do que ela é: um princípio regulador da existência terrena dos homens.Nesse aspecto cria-se uma mitologia (mitologia = história da criação), primeiro passo para criação e estabelecimento de uma religião.9Isso não "implicaria em (sic) nada mais nada menos que ignorar a Matemática". Nietzsche não é maluco a ponto de propor que abandonemos as noções de causa e efeito, de sujeito, da Matemática, etc.. O que Nietzsche ambiciona nessa sua crítica é que tomemos consciência do risco que corremos ao torná-las maiores do que elas são, enquanto apenas princípios reguladores da vida. É por isso que ele propõe a pergunta "Por que é necessário" que acreditemos nesses juízos e assertivas, mesmo tendo consciência de que eles sejam falsos, na medida em que são criações humanas para tentarem propor uma explicação do mundo terreno. Ou seja, não importa que os juízos sintéticos a priori sejam mentirosos ou verdadeiros, o que importa é que eles são uma tentativa de explicação do mundo que lança mão de uma explicação metafísica e que enquanto teoria deve permanecer como tal, sem passar por nenhuma super-valoração.
10Não creio que podemos tentar nos negar a pensar, pois ao tentar negar estaremos pensando em negar =) -
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