Lendas Matogrossenses Cristãs – A imagem de nossa Senhora do Livramento

NOSSA SENHORA DO LIVRAMENTO

Isto se dera no venturoso povoado, hoje Vila do Livramento, rodeado de ribeiros e regatos, atacado de águas e matacões penetrantes.

Empolgado, ao Sudoeste, pelos cerros ondulosos que derivando da fonte perenal do Bamba, vão encrespando quase toda a região benéfica e produtiva que se expande entre os Cocais e o Santana, até se esbarrarem à ourela da faixa mimosa que orla o Cuiabá.

Emparaisado, ao Norte, pelos terrenos adaptáveis a toda a sorte de plantações, por bastos e curiosos arvoredos e por festivas campinas que vão sitiar o monte da Candonga, o ponto culminante de todo aquele vasto termo com a sua superfície de cerca de trezentas e oitenta léguas quadradas e que*tem por limite, desse lado, a montuosa região da Morraria e o ribeirão Pari.

Ostentando ao Poente o luxo magnífico de seus matacões e cantando aos ventos, ao luar e ao sol a poesia daquele trato do termo, pela voz sonora do salto do Brumado que agita o grande lenço de suas águas, como em um adeus, festivo adeus da terra formosa ao viajante que passa.

O dia derivava gloriosamente.

Um viajante humilde e desconhecido, que se não sabe de onde vinha nem para onde ia, seguindo, a tocar um muar cargueiro, havia vadeado os ribeirões Formigueiro, Pilões, Cocais e João Leme e atravessava a então povoação do Livramento, tendo-se, à entrada, provido de alguma cousa que já lhe faltava.

Dirigia-se pela larga estrada que leva a Poconé, Cáceres e à lendária Vila Velha.

Passou pela rua Mataria e já havia atravessado todo o largo que se fazia logo adiante, sem que ninguém lhe houvesse ligado a mínima importância.

Era um transeunte qualquer, dentre os muitos que chegavam ou que atravessavam a pacífica localidade: boiadei-ros e tropeiros, emigrantes e imigrantes.

O viajante, escarrapachado em sua cavalgadura, levando à garupa o seu ponche e saco de mala, trazendo ao arção da sela, a sua boa espingarda, tocava o seu burro cargueiro e ia olhando por todos os lados, dando a conhecer a humilde localidade.

Ao chegar perto da encruzilhada dos caminhos bifurcantes, por onde derivam hoje as pequenas ruas do Retiro e do Tanque, estacou o muar cargueiro.

Toca-o a muxoxos o seu dono; ameaça-o com a táca, chegando a dar-lhe, em seguida, algumas tacadas, mas, o burro empacado, não dava para diante.

Toca-o para todos os lados, mas êle só abana a cauda, bate as patas ao chão e se não move.

Crianças e um ou outro desocupado se aproximaram do lugar.

O viajante desceu da sua cavalgadura para puxar, pelo cabresto, o cargueiro estacado e o puxou para um e outro lado sem que êle ainda se movesse.

Não era por fome nem por sede, pois havia pastado até poucos momentos antes e descansado durante a noite, a pouca distância do povoado.

Chegaram alguns mais, ao lugar, julgando estes que o animal estivesse sofrendo de alguma pisadura e aqueles, que estivesse mordido de cobra, mas nada notaram, depois de terem examinado o animal.

O viajante começou a dar de chibata no pobre cargueiro e deu-lhe muito, e o animal somente gemia mas não desatava os passos.

— Mas, afinal de contas, que é que leva o cargueiro? — perguntou um dos moradores.

— Uma imagem de Nossa Senhora, respondeu o viajeiro.

— Descarregue, pois, o animal, disse ainda o morador, no que foi aplaudido por todos os presentes.

E o burro, depois de descarregado, deu logo de andar para diante, a toda pressa.

Carregado novamente, outra vez empacou.

Tiraram então a imagem do surrão em que vinha e puseram, em seu lugar, muitas pedras, que formavam um peso muito maior que o da imagem e da matalotagem que ia de sobrecarga e o burro, logo que se lhe largou o cabresto, tomou espontaneamente, a marcha do costume.

Feito parar o animal e substituído o novo peso pela imagem, estacou ainda, como antes e não cedeu nem a chibatadas, nem a bordoadas, caindo, desta vez, por terra, gemebundo…

O viajante, depois de muito lidar e de algumas vezes chegar ao mesmo resultado com a repetição da troca e destroca da carga, resolveu ficar no lugar a imagem, ainda envolta em palhas, com que vinha encapada, para evitar estragos na viagem, e foi ela recebida respeitosamente, pelos habitantes do lugar.

O viajante continuou o seu caminho e desapareceu, sem que jamais se tivesse dele nem a mais vaga notícia.

Desencaparam, cheios de respeito, a imagem.

Que olhos! duas miniaturas do céu da pátria, dois mimosos mensageiros, castos mensageiros de Deus, vindos como para arrebatarem ao jardim de além nuvens, das eternas sinfonias, a alma simples e sempre boa da serena povoação sertaneja.

Prepararam então um altar condigno à bela imagem que pôs ali termo à sua certamente longínqua viagem e que viu, naturalmente, a população tranquila daquela terrinha feliz.

Erigiram-lhe uma capela, hoje transformada em belo templo, o maior de todos os das vilas matogrossenses.

E, quando os sinos da torre branca convidam de todos os arredores os bons filhos à prece, lhes parecem os seus sons como o virginal acento da voz da Santa padroeira a dizer-lhe:

"Filhos, meus bons filhos, deixai vossas enxadas, vossas roças, vossos engenhos; deixai vossos bois e cavalos, deixai vossas casas e chegai-vos a mim, quero ver-vos;

"Aproximai-vos de mim, meus bons filhos, para que me conteis vossas necessidades, para que me narreis vossos sofrimentos;

"Quero enxugar-vos as lágrimas, quero alegrar-vos o coração;

"Povo, meu bom povo, deixai vossas usinas, vossas pequenas fazendas, vossos ranchos, vossas roças e aproximai–vos de mim".

Então, o povo inteligente, verdadeiramente cristão, aflui, de todas as cercanias e enche a bela e querida igreja, e, com toda a devoção e respeito, dirige suas preces à Senhora do Livramento e lhe entoa um hino de amor, de súplica e de louvores…

Feliciano Galdino: Lendas Matogrossenses. Tipografia Calháo & Filho, Cuiabá, 1919, pp. 47-52.

Fonte: Estórias e Lendas de Goiás e Mato Grosso. Seleção de Regina Lacerda. Desenhos de J. Lanzelotti. Ed. Literat. 1962

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