MUITO ABAIXO DO PETRÓLEO
mar 11th, 2010 | Por Nei Duclós | Categoria: ContosNei Duclós
O ministro Linóleo Bólio foi recebido em caráter de urgência pelo presidente Prospectus Erectus. O assunto era explosivo: tinham descoberto, muitos quilômetros abaixo da sueperfície totalmente tomada pelo petróleo, algo parecido com o Mar, entidade mítica que existia nos relatos muito antigos. A alta tecnologia desenvolvida para procurar água no planeta oleoso era considerada caríssima pela oposição, totalmente fundamentalista, que não admitia a mudança de paradigma da civilização petrolífera. O mundo era petróleo e nada iria mudar. Nem mesmo uma grande descoberta:
– Mas me diga, Linóleo, o que descobriram de fato?
– Uma gigantesca reserva de água salgada, totalmente azul, com ondas brancas, que banha lugares de areia fofa e fina, tudo com um cheiro agradável, cheio de peixes, cheio de vida!
– Como pode ter certeza disso? Não existem peixes, apenas nos arquivos.
– Foi tudo fotografado, excelência. Os peixes saltam para fora da superfície. Há de tudo: golfinhos, baleias, algas marinhas, uma maravilha.
– Mas isso tudo está soterrado embaixo da rocha?
– Sim, será preciso desenvolver mecanismos seguros para explorarmos esse tesouro oculto nas entranhas da Terróleo. Poderemos vender Mar para quem quiser e puder comprar.
– Mas o que há de proveito no Mar que nós, da civilização do petróleo, não tenha? Temos tudo: carros, caminhões, máquinas de todos os tipos, tudo movido a diesel, gasolina. Para que Mar? Não vejo utilidade nenhuma.
O ministro suspirou. Era difícil convencer o estadista que aquela descoberta iria revolucionar tudo, que as pessoas descobririam como é chato viver com a pele suja de petróleo. Todos iriam querem Mar, Mar, Mar. E praia, meu Deus, como dizem os livros antigos. Mas a dúvida tinha fundamento: como transformar isso em ouro? Há muito que existia uma grande crise, pois o petróleo dominava e era praticamente de graça. Tinham conseguido extrair todo o petróleo da terra e ela tinha virado uma coisa só, pegajosa, imunda, que acabou endurecendo e soterrando fontes, planícies, lagos, e desconfiava-se até o antigo Mar. E que agora se revelava de maneira bizarra, oculta, mas intacto, a sete quilômetros da superfície.
– Podemos inaugurar uma colônia de férias no subsolo. Venderíamos caríssimo o privilégio de navegar no Mar e tomar banho na praia. As pessoas iriam adorar se livrar dessa merdalhada toda que nos envolve.
– Você acha ruim Linóleo? O petróleo está no seu sangue, você é o petróleo! Não, não iria dar certo. Vamos esquecer isso.
– Mas excelência, poderíamos repartir os royalties advindos dessa riqueza.
– E quem iria pagar os royalties?
– Ora, os marcianos, eles sonham com o Mar. Odeiam nos visitar e só ver petróleo. Um mergulho lá e eles pagariam os tubos para nós, que acha?
– Metade para mim, metade para vocês?
– Fechado!