Gottfried Heinrich Handelmann (1827 – 1891)
História do Brasil
Traduzido pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. (IHGB) Publicador pelo MEC, primeiro lançamento em 1931.
TOMO II
CAPÍTULO X
A capitania geral do Rio de Janeiro
(continuação)
* * *
Passamos agora para as duas dependências da antiga capitania do Rio de Janeiro, as duas províncias mais meridionais do império do Brasil. Com isso chegamos a um território que, embora melhor se preste entre todas as terras do Brasil, por seu clima temperado, por toda a sua constituição natural, incondicionalmente melhor, para as colônias agrícolas européias, foi, não obstante, relativamente tarde povoado pela colonização portuguesa; todavia, explica-se essa negligência, quando nos lembramos de que no Brasil o colono na verdade não tencionava tanto cultivar plantas da zona temperada, porém muito antes preferia a cultura dos denominados "produtos coloniais", e estes, o açúcar, o algodão, embora prosperem igualmente no trecho da costa de Santa Catarina, não se desenvolvem com igual qualidade, como ao norte, nas latitudes tropicais.
Além disso, a posse de terras era aqui também contestada: segundo a linha divisória de 7 de junho de 1494, como podemos atualmente verificar, cabiam aos portugueses apenas as ilhas e uma estreita tira de costa de Santa Catarina; porém, o interior desta província e toda a de São Pedro do Rio Grande do Sul eram possessão espanhola. Contudo, para o bem do Brasil, ainda não se havia sabido determinar com matemática exatidão o meridiano divisório; muito tempo ficou o território intermediário entre os extremos postos da fronteira, os portugueses Cananéia e Paranaguá (São Paulo) e o espanhol Buenos Aires, sem ser tomado em consideração, nem reclamado; finalmente, foi o direito dos fatos o que decidiu a tomada de posse e colonização portuguesa, e este desenvolvimento foi ratificado em ulteriores tratados de limites.
A província de Santa Catarina, com 2.200 léguas quadradas de superfície, é limitada a oeste, em geral, por aquelas montanhas que formam o divisor de águas das bacias do Prata e do Uruguai e Paraná; abrange a vertente do Atlântico oriental, que de um planalto de mediana elevação pouco a pouco vai descendo até à baixada da costa e, embora aqui e acolá interrompido com campos, todavia em geral é coberto de matas virgens; além disso, pertencem-lhe muitas pequenas ilhas e duas grandes, São Francisco do Sul e Santa Catarina, e de fato é esta última o verdadeiro território principal, o cenário de preferência da história da província.
112 A primeira seção foi inaugurada a 29 de março de 18.58. (Nota do autor.)
Primitivamente o território (ilha e costa) fazia parte da capitania hereditária de Santo Amaro (depois chamada São Vicente), e com esta reverteu (a 18 de setembro de 1711) ao imediato domínio da coroa de Portugal. Todavia, no intervalo, no reinado de d. Filipe IV ou Afonso VI, esta região foi concedida em feudo intransferível, como recompensa, por serviços prestados durante a invasão holandesa, a Luís Barbalho Bezerra ou seu filho Agostinho. A 4 de março de 1665.0 donatário Agostinho prestou o juramento feudal às mãos do então governador-geral da Bahia; porém, parece que ele nunca tomou realmente posse do domínio, pois daí em diante não há memória de atividades, nem de reivindicações da família Bezerra.
A colonização por estes lados se estabeleceu em geral por si mesma, sem auxílio oficial algum. A princípio foram náufragos, foragidos da justiça e traficantes de índios, que aqui se domiciliaram, ora por pouco tempo, ora mais demorada-; mente, uma gente que de boca reconhecia a soberania portuguesa, porém, de fato, pouco se importava com as autoridades nem com a lei; também os contrabandistas e corsários de nações estrangeiras, quando, como costumava acontecer, precisavam de um esconderijo, na ilha de Santa Catarina achavam acolhimento amigo e todo o auxílio possível.
Além desses, desde fins do século XVI vinham freqüentemente missionários jesuítas e cuidavam, ora com menor, ora com maior sucesso, de converter os indígenas; em 1624 foi mesmo erguida na ilha uma permanente casa de missão; porém, grandes resultados não alcançaram, porque o modo de vida anárquico dos colonos brancos perturbava a ação eficaz dos santos padres, e os índios, que se viam sem defesa contra a caçada ao escravo e sujeitos a toda sorte de opressões, preferiram, finalmente, trocar as suas habitações da ilha pela mata virgem no continente.
Somente em meados do século XVII se cuidou de fundar uma colônia verdadeiramente agrícola, quando os paulistas Francisco Dias Velho Monteiro e José Tinoco passaram para a ilha de Santa Catarina com seus parentes e um certo número de índios civilizados, aliados ou escravos, em 1651; durante alguns anos tudo andou bem; em seguida, porém, Monteiro, se por sua própria culpa ou não, não se sabe ao certo (dizem que ele havia assaltado e roubado um navio holandês, que, carregado de tesouros, voltava do Peru e em caminho ali havia ancorado), brigou com os contrabandistas e corsários e foi morto na contenda, ao que os seus companheiros, desanimados, voltaram à província de São Paulo, sua pátria.
De novo a ilha, com isso, se tornou presa da antiga anarquia; por outro lado, surgiu nesse tempo, na terra firme da província, junto da laguna Camacho, uma nova colônia, fundada, em 1654 ou 1656, pelo paulista Domingos Peixoto de Brito, que dentro em breve cresceu, tornando-se uma povoação regular, a vila da Laguna; ali colocou então o capitão-general do Rio de Janeiro um lugar-tenente, cuja tarefa consistia em vigiar a população da ilha e, tanto quanto possível, impedir o comércio dos navegantes estrangeiros. Todavia, a princípio isto pouco adiantou; a antiga situação continuou sem modificação, também a colonização pouco progrediu, até que, finalmente, o governo se resolveu a intervir diretamente com vigor.
Em primeiro lugar, os capitães-generais de São Paulo, a cuja jurisdição, temporariamente, também o território de Santa Catarina era sujeito, mandaram da sua província colonos para a ilha de igual nome; ao mesmo destino também chegaram, de 1723 em diante, por várias vezes, grandes levas de açorianos e madeirenses, que em conseqüência de uma convocação régia se haviam resolvido a transmigrar, recebendo da coroa passagem gratuita e doação de terras.
Assim aconteceu que a ilha, onde, naturalmente, com o crescimento da população, se estabeleceu ordem pública regular, dentro em breve superou as velhas colônias vizinhas da terra firme, em número de habitantes e produção: de agora em diante era considerada o coração da nova província; e a sua principal povoação, que tem o nome da igreja de Nossa Senhora do Desterro, e já em 1726 recebia os foros de vila e a 20 de março de 1823 os da cidade, foi, desde 1739, em lugar da vila de Laguna, a sede do governo provincial.
Também com o correr do tempo obteve a ilha de Santa Catarina, em parte por dádiva da natureza, em parte pela boa vontade da coroa, muitos favores; ainda diversas vezes para ali imigraram, à custa do Estado, colonos dos Açores e da Madeira; outros lucros produziu a pesca da baleia113 e 1I3_A; que, especialmente de 1765 a 1789, era feita nas águas da vizinhança, com grande sucesso; por fim, foi-lhes destinado um beneficio certamente duvidoso.
A fim de assegurar à recém-florescente província um ininterrupto afluxo de novos braços de trabalho, resolveu o governo da mãe-pátria dirigir daí em diante exclusivamente para Santa Catarina as levas de criminosos deportados, que até então eram divididos, primeiro por todo o Brasil e depois pelo Estado do Maranhão (30 de junho de 1794). Assim se tornou essa província, na ordem cronológica dos lugares de exílio luso-americanos, a terceira; todavia, felizmente, não por muito tempo. Já ao cabo de três anos acharam as autoridades que o clima da ilha era "saudável demais" para criminosos; um novo decreto, de 20 de novembro de 1797, ordenou por isso a transferência dos condenados para as regiões menos favorecidas do remoto oeste, as atuais províncias de Mato Grosso e Alto Amazonas; e assim ficou sendo, até que, com a declaração da independência do Brasil, se extinguiu para sempre esta imigração portuguesa forçada.
Estes foram mais ou menos os principais fatos da história da colonização portuguesa em Santa Catarina; desistimos naturalmente de acompanhar o seu curso em pormenores e observamos apenas que ela tomou posse somente das mais próximas vizinhanças da costa do mar, c isto muito espaçadamente; a maior parte do "paraíso terrestre do Brasil", como os santa-catarinenses com justo orgulho gostam de chamar a sua província, é ainda ocupada por matas virgens. Em compensação, os trechos de terras colonizadas acham-se, pelo estalão do Brasil, densamente povoados; desde os últimos cinqüenta anos a população triplicou (1795 somente 23.865 almas; 1818, 44.041; finalmente, 1840, 66.218, sendo 12.511 escravos) e deve atualmente contar mais de 80.000 habitantes; o mais novo relatório oficial, para 1856, dá 109.400; é, em todo caso, muito exagerado.
Por outro lado, a produção é ainda muito escassa; em geral, até hoje a população só cultiva para as próprias necessidades e de preferência plantas alimentícias indígenas e aclimadas, e com elas, sobretudo com farinha de mandioca, Santa Catarina também abastece as províncias vizinhas. Por outro lado, para o comércio de exportação, ela fornece relativamente pouco; durante o ano financeiro de 1854-5 5. fora módica quantidade de arroz, mate (chá do Paraguai) e aguardente de cana, apenas 12.292 1/2 arrobas de café; todavia, promete este último considerável progresso, e sem dúvida tornar-se-á no futuro um importante artigo de exportação; a cana-de-açúcar, ao contrário, não dá muito bem neste clima temperado, e, se o cultivo da mesma, que já havia sido começado no século XVII, ainda continua, é somente em pequena escala e exclusivamente para o fabrico da aguardente.
Esta diversidade das condições agrícolas, que podia ter influído aqui desde o princípio na região tardiamente colonizada, produziu um povoamento diverso do das partes do Norte do Brasil. Ao passo que nas províncias costeiras centrais, as atuais ou antigas províncias açucareiras, Pernambuco, Bahia, Rio de Janeiro, os escravos e a população livre, mais ou menos, se equivaliam, a estatística para 1840 diz-nos que em Santa Catarina cerca de um quinto somente do total da população traz os grilhões da escravidão; portanto, os escravos não formam de todo aqui, como lá, a classe de trabalho exclusiva ou preponderante, e, pelo contrário, aqui, dadas as condições climatéricas e outras, poder-se-ia prescindir de todo da sua cooperação.
No que diz respeito à escravidão, está atualmente Santa Catarina, portanto, mais ou menos no mesmo ponto, como nos séculos precedentes, os atualmente Estados livres, porém naquele tempo ainda escravocratas, da Nova Inglaterra e da Nova Holanda; e, como então ali, temos aqui hoje um primeiro exemplo prático, diante dos olhos, de um futuro movimento abolicionista.
Isto é, durante o decênio precedente, o presidente provincial Antero José Ferreira de Brito apresentou à legislatura o projeto de lançar à província um imposto de 40 mil réis sobre cada negro que fosse importado, e por outro lado conceder um prêmio de igual valor pela exportação de cada escravo. O projeto não encontrou no momento consideração alguma; todavia, parece que o seu objetivo será conseguido por outro caminho; por um lado, como se sabe, foi, entretanto, proibida para todo o império do Brasil a importação de africanos (4 de setembro de 1850); organizou-se, depois, um comércio interno de escravos, que compra negros por toda parte do império para os arredores do Rio de Janeiro; e assim, com provável segurança, pode antecipar-se para Santa Catarina um contínuo decrescimento, mesmo uma final extinção, dos seus escravos, de resto, de exíguo número.
Outro aspecto etnográfico: pela natureza dos produtos locais de comércio, as grandes fazendas não são de todo uma necessidade econômica nacional, e o escasso número de escravos prova que somente poucas existem; portanto, mesmo não deixando de haver alguns grandes possuidores de terras, falta aquela aristocracia rural (como repetidas vezes se mencionou), que nas províncias costeiras do centro acumula nas suas mãos todos os braços de trabalho e todo o solo de valor, e conserva a restante parte do povo em contínua dependência.
Assim, em Santa Catarina, mesmo em pontos bem situados, e mesmo na costa da terra firme, existem ainda grandes trechos férteis desocupados e sem dono, dos quais o governo até hoje (assim, por exemplo, para o dote da princesa brasileira d. Francisca, irmã do imperador d. Pedro II, no seu casamento com o príncipe francês de Joinville, a l9 de maio de 1843) ainda pode dispor livremente. Por outro lado, nas partes de colonização antiga, na ilha de Santa Catarina e nas cercanias de Laguna, a terra está muito retalhada; e, embora as porções isoladas sejam, com boa administração, sempre bastante grandes para assegurar uma média de geral bem-estar, infelizmente não satisfazem, na atualidade, por fazer-se ali cultura exaustiva, coisa geral no Brasil; somente a muito rendosa pesca nas águas próximas e a contínua, embora escassa, emigração para oeste, para as selvas, de certo modo remedeiam esse inconveniente.
Devemos, finalmente, notar que aqui a mistura das raças não é tão pronunciada como nas restantes partes do Brasil; aqui a raça africana sempre foi representada em escasso número; os indígenas, logo nos primeiros tempos, se retiraram às profundezas das matas virgens ou abandonaram de todo a província; e, como a maioria dos colonos açorianos trouxe consigo mulheres e crianças, não houve ocasião para grande número de casamentos de sangue mesclado. Ao passo que, por conseguinte, a população brasileira apresenta alhures um conjunto variado, dos mais diversos matizes e cruzamentos, conservou em Santa Catarina (e ao lado, na província vizinha de São Pedro do Rio Grande do Sul) o sangue branco decisiva preponderância, e a gente de cor, que nas outras províncias prevalecia por toda parte, aqui ficava mais para o segundo plano.
É o que há sobre o desenvolvimento interno da província de Santa Catarina; quanto à história exterior, pouco há para relatar.
A província foi a princípio anexada à capitania geral do Rio de Janeiro; depois, a partir de 1709, à capitania geral de São Paulo, e, finalmente, desde 11 de agosto de 1738, de novo anexada à capitania geral do Rio de Janeiro; porém, tinha o seu próprio subgovernador. Estes subgovernadores tentaram, como em toda parte, também aqui, emancipar-se dos seus imediatos superiores, para se colocarem em direta subordinação e diretas relações com o gabinete de Lisboa; as rivalidades, que se manifestavam em toda sorte de questiúnculas, tornaram-se particularmente violentas cerca de 1750, até que, afinal, em 1760, a coroa tomou decidido partido pelo vice-rei do Rio de Janeiro e reconduziu o lugar-tenente à categoria restrita de simples comandante militar. Somente no que diz respeito à justiça, que era dispensada por um próprio ouvidor, com sede no Desterro, conservou Santa Catarina uma posição particular autônoma, e assim persistiu até fins do século.
Nesse ínterim, havendo, como se sabe, diversas vezes hostilidades pela posse da foz do Prata, entre Portugal e Espanha, também esse território do Brasil (além de outros) foi tocado uma vez pelas tempestades da guerra.
A 20 de fevereiro de 1 7 77 apareceu uma poderosa esquadra espanhola diante da ilha de Santa Catarina, onde somente lhe fizeram frente obras de defesa incompletas e uma guarnição fraca, e, ainda mais, as autoridades portuguesas perderam completamente a cabeça; assim, os espanhóis, na noite de 23 para 24 de fevereiro, puderam efetuar desembarque, e já a 5 de março obrigavam à capitulação incondicional. O então vice-rei de Buenos Aires, dom Pedro de Cevallos, que se achava em pessoa a bordo da esquadra triunfante, soube evidentemente dar o devido valor à excelência dos portos e à grande importância marítima da ilha, assim como à vizinha costa continental, e, segundo todas as aparências, ele tencionava incorporar todo esse território ao reino colonial do Prata, de modo permanente; ele exigiu não somente o juramento de fidelidade da ilha conquistada, em nome dos reis católicos, seus senhores, como mandou com as mesmas pretensões um navio de guerra para Laguna, na terra firme de Santa Catarina, onde foi tentado um desembarque, porém impedido por um punhado de soldados portugueses (fins de abril de 1 777).
E, imediatamente depois, fez ele uma expedição militar espanhola contra a vizinha província de São Pedro do Rio Grande do Sul. Todavia, os seus planos não acharam apoio algum em Madri; no tratado de paz de 1? de outubro de 1 777, a coroa de Espanha consentiu na restituição da ilha de Santa Catarina, e essa restituição foi realizada a 30 de julho de 1778.
Trinta anos depois, ocorreu uma importante mudança na organização política da província: um decreto real, de 25 de fevereiro de 1807, separava ambas as províncias do Sul do Brasil, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, do vice-reino do Rio de Janeiro, e estabelecia ali a capitania geral de São Pedro, à qual ficava subordinado o governo provincial de Santa Catarina. Todavia, não chegou essa ordem à realização completa, pois, logo em seguida, depois da transmigração da família real, em princípios de 1808, foi ela alterada, ficando as duas províncias e os seus governadores com iguais poderes e sob a direta e imediata autoridade do poder central. Somente em relação à justiça tinham que se sujeitar a uma fusão, em prejuízo de Santa Catarina, pois o ouvidor comum a ambas estabeleceu sede em Porto Alegre (província de São Pedro). Era, portanto, apenas meio passo para a autonomia provincial; tornou-se esta completa, somente quando o rei d. João VI restabeleceu a antiga ouvidoria no Desterro, Santa Catarina, a 12 de fevereiro de 1821.
Nos movimentos do subseqüente período das revoluções brasileiras, pouca parte tomou a província de Santa Catarina; ela própria, fraca demais para por si mesma empreender um levante, protegida pelo mar, pelas matas virgens e desertos, quase por toda parte, contra a influência de fora, conservou a tranqüilidade quase inalterada. Somente uma vez, durante a guerra civil em São Pedro do Rio Grande do Sul (1836-1845), um bando de revoltosos, sob Davi Canabarro, penetrou até Laguna, apoderou-se desta cidade e ameaçou com as suas embarcações a própria ilha (julho de 1839); todavia, logo acudiram do Rio de Janeiro tropas e navios, em socorro, e depois de um violento combate foi de novo içada a bandeira imperial na vila de Laguna (em 15 de novembro de 1839)114.
Para conclusão, ainda algumas palavras sobre a colonização moderna, que sucede quase logo à antiga.
A transmigração de súditos portugueses, sobretudo dos Açores,-às expensas do Estado, continuou ainda no reinado de d. João VI, de tempos a tempos, e sob o mesmo rei começaram também os primeiros esforços para atrair a emigração européia em geral, especialmente a alemã. Contudo, somente depois da declaração da independência deram esses esforços frutos no Sul do Brasil.
No ano de 1829 fundou o imperador d. Pedro I, defronte da capital Desterro, na terra firme da província de Santa Catarina, cerca de cinco léguas da costa, a colônia São Pedro de Alcântara, onde se estabeleceram 634 alemães, na maioria católicos, da região do Reno. Os inícios desta colônia foram muito tristes; como era costume então, muito se prometera, jornais e outros auxílios, e na verdade foram aplicados para isso 17:798$00O no primeiro ano; porém, pela lei de 15 de dezembro de 1830115, foi repentinamente proibida qualquer despesa em favor da colonização estrangeira, e os pobres colonos, no meio dos pesados trabalhos das roçadas, ficaram entregues a si mesmos.
Além disso, aconteceu mais uma outra desgraça: o governo havia-lhes dado a posse de uma grande extensão de terras, com matas virgens; porém, somente quando ali ficou feita a roçada, resultou de improviso que, ao menos numa parte das mesmas terras, cidadãos brasileiros natos possuíam mais antigos direitos de posse; começou um processo de longos anos, que finalmente se ap’aziguou por meio de acordo e compra por parte dos alemães. Nestas condições, muitos abandonaram a colônia e se estabeleceram noutros sítios; todavia, a maior parte trabalhou com coragem e perseverança, e venceu, felizmente, todos os obstáculos. A freguesia de São Pedro de Alcântara contava, segundo dados oficiais, no ano de 1850, uns 1.050 habitantes, e dispunha de importante lavoura, criação de gado e lacticínios.
Embora pouco haja para gabar nesta primeira tentativa, sempre devemos apontar com elogio que Santa Catarina, como nenhuma outra província, tomou a peito não somente atrair para ali a imigração estrangeira, porém oferecer-lhe, igualmente, garantias razoáveis.
Aqui foi o primeiro lugar em que se publicou uma lei provincial de colonização, a de 15 de julho de 1836, que definia de modo razoável as relações entre os colonos de um lado, os empreiteiros da colonização e o governo, do outro lado. Além disso, para evitar acontecimentos semelhantes aos de São Pedro de Alcântara, um decreto, de 2 de maio de 1837, ordenava que, quando na fundação de colônias pelo governo provincial acontecesse mais tarde achar-se lesada a propriedade particular inculta, devia o possuidor prejudicado reclamar,não do colono, porém do governo provincial, e esperar deste último a indenização.
Além disso, em conseqüência dessas leis, onde quer que se requeressem terras para fins coloniais, houve aqui muita liberalidade nas concessões; certamente sempre sob condição de imediato cultivo, porém esta cláusula foi pouco observada e pouco fiscalizada; e deste modo caíram em mão morta provisoriamente, por desgraça, consideráveis porções de terras de valor, e ficou muito reduzido o domínio do Estado. Contudo, conseguiram-se muitos resultados, e a província conta diversas colônias estrangeiras que, na verdade, a princípio tiveram uma fase de provação, cheia de fadigas e confusão, em parte por culpa de uma malvada burocracia; atualmente quase todas se elevaram a permanente prosperidade.
Na ordem cronológica, elas assim se sucederam: primeiro, a colônia de Itajaí, povoada parte por imigrantes alemães, parte por brasileiros natos; consiste propriamente de duas fundações, Itajaí Grande, que deve a sua origem já a d. Pedro I, e mais para o interior Itajaí-mirim, fundada em 1835-1836 pelo governo provincial, como posto avançado contra as tribos índias inimigas; sobretudo a última teve que sofrer a princípio encarniçadas guerras, de sorte que os colonos fugiram, em bandos, da perigosa vizinhança e tiveram que ser reconduzidos e detidos por guardas; atualmente esta região é segura, e a colônia havia atingido a 347 habitantes, em 1850.
Depois, a colônia Nova Itália, ou d. Afonso, no rio Tejucas, fundada em 1836, pelos empreiteiros Demaria e Schuttel; foi em 1838 terrivelmente devastada por um furacão e tromba-d’-água; entretanto, restaurada, conta atualmente umas 200 almas. O mesmo empresário Schuttel projetou além disso segunda colônia, Leopoldina, na bacia do Tejucas, para onde foram repetidas vezes levados colonos, por último, no ano de 1852; todavia, pelo fato de vagarem índios inimigos na vizinhança, eles tiveram que se retirar de novo.
A terceira, colônia Vargem (Várzea) Grande, fundada pelo governo provincial em 1837, forma uma dependência de São Pedro de Alcântara e foi em grande parte povoada com habitantes dali; agora conta mais de 100 almas.
Em seguida, estabeleceu-se no rio Saí uma colônia que se baseava nos princípios do socialismo francês, sancionada por uma lei do império, de 11 de dezembro de 1841; fundada em começo de 1842, com cerca de 100 participantes, e em breve aumentada com mais reforços, estabeleceu-se ali, de início, uma grande atividade; contudo, como sói acontecer com colônias desta ordem, não tardou a declarar-se descontentamento, e dentro em breve estava na mais completa desorganização o apenas começado estabelecimento.
A colônia Bélgia, fundada em 1845, por Van Lede, Fontaine e Lebon, com 80 belgas, não demorou muito a extinguir-se, e dispersaram-se os habitantes, na maioria para as antigas colônias.
No ano de 1847 foi também encaminhada, por instigação do imperador d. Pedro II, uma parte da então imigração alemã (a Delrue), que se destinara ao Rio de Janeiro, para Santa Catarina e aqui estabelecida em duas colônias; uma delas, Piedade, à qual tocou terreno estéril, arenoso, já está em decadência; começando a princípio com 150 almas, contava em 1851 apenas 104 e em 1855 só 64 habitantes. A outra, D. Isabel, distando apenas cinco léguas da capital da província, tomou a princípio grande desenvolvimento; nos anos 1847-51, a sua população subiu de 307 para 412; contudo, segundo o relatório oficial de 1855, havia decaído para 287; parece também haver aqui começado o período de dispersão, sem que esteja ameaçada de modo absoluto a existência da colônia. Da Piedade ramificou-se em 1848 terceira colônia, Leopoldina, que, porém, conta apenas 40 almas.
Em todo caso, prometem muito mais duas novas colônias alemãs; o sistema sobre o qual se baseiam (aqui cada um dos colonos teve que fazer as suas despesas de passagem e comprar a terra, ao passo que até então as recebiam de presente) lhes dá grande apego e, como em ambas estão à testa alemães exclusivamente, foram elas poupadas de muitos inconvenientes, que outras tiveram que sofrer com uma diretoria brasileira; referimo-nos às colônias de Blumenau e D. Francisca. A primeira contava, logo em seguida à sua fundação (fins de 1850), 20 habitantes, porém, em fins de 1856, uns 468; chefe e fundador da mesma foi Hermann Blumenau, que, parte por compra, parte por doação, alcançou a posse de um território de cerca de dez léguas quadradas, na bacia do rio Itajaí.
Ainda em melhores condições está a colônia D. Francisca, na bacia do rio São Francisco do Sul; foi fundada pela Sociedade Hamburguesa de Colonização, de 1849, sob a presidência do senador Chr. M. Schröder, que recebeu da proprietária e de seu esposo, a princesa brasileira d. Francisca e o príncipe de Joinville, a concessão livre de despesas de uma parte, nove léguas quadradas, do dote em terras dessa princesa, em compensação, porém, obrigando-se a colonizar as mesmas, no primeiro ano com 100, no segundo com 200 e nos três seguintes com 400 colonos anualmente, de ambos os sexos e de qualquer idade, assim como lhes prestar provisoriamente todos os auxílios para a alimentação. Os avultados recursos da sociedade de acionistas permitiram-lhe cumprir estas promessas; a 7 de maio de
1851 desembarcaram os primeiros colonos e fundaram o primeiro estabelecimento, Schrõdersort, que depois se tornou cidade capital da colônia, Joinville; imigraram em 1851 uns 484 colonos alemães, suíços e noruegueses; 409 em 1852; 124 em 1853; 495 em 1854, num total de 1.512, dos quais até fins de 1854 morreram 111 e 252 se retiraram; daí em diante a afluência completou o número convencionado de 1.500, e mesmo o superou; por outro lado, muitos se retiraram, de sorte que a colônia nos fins de 1856 só contava 1.428 habitantes, dos quais 142 católicos, 1.286 protestantes.
Desde o ano de 1853, D. Francisca é município autônomo; goza de um bem-estar florescente e tem duas escolas que, com ambos os párocos, um protestante e um católico, são sustentadas em comum pela colônia e pelo governo.
O sucesso feliz desta primeira tentativa animou a Sociedade Hamburguesa de Colonização e o associado príncipe de Joinville a novas empresas de colonização; infelizmente eles para isso fizeram contrato de subsídios, como aconteceu também com H. Blumenau, com o governo brasileiro, o que serviu somente para deitar luz muito desfavorável sobre toda a transação; a saber, era-lhes concedida preferência de compra das terras da vizinhança e, o que é o principal, uma quantia por cabeça, para cada imigrante — 30 mil réis para os de 10-45 anos, 20 mil réis para os de 5-10 anos — e em troca o empreendedor obrigava-se a fazer estradas e outras construções públicas, e de mais a mais o governo exercia interferência.
Em conclusão, temos ainda para relatar que em todas as fundações coloniais é expressamente proibido ao empreendedor, assim como aos colonos, todo emprego ou posse de escravos; assim, em todo o Brasil, foi aqui em Santa Catarina, nas colônias de língua alemã, a primeira região organizada com trabalho exclusivamente livre e como tal legalmente garantida.
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