Organização Política do Brasil antes da Independência

Gottfried Heinrich Handelmann (1827 – 1891)

História do Brasil

Traduzido pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. (IHGB) Publicador pelo MEC, primeiro lançamento em 1931.

TOMO II

 

CAPÍTULO XIII

A colônia e o reino absoluto (continuação)

 

* * *

Agora, volvamo-nos para a organização política do Brasil. Como se sabe, consistia o império colonial português sul-americano em uma série de regiões, que primitivamente eram parte colônias feudais, parte colônias régias, porém pouco a pouco passaram, sem exceção, para a imediata soberania da coroa; excluindo-se algumas que se fundiram com as suas vizinhas, ao passo quê outras se desmembraram, sempre conservaram as províncias separadamente a sua individualidade independente e a sua própria administração local.

A soberania sobre essa série de Estados residia na coroa e no gabinete de Lisboa; todavia, tinha este criado, desde 1549, um órgão intermediário, uma autoridade colonial central, o governo-geral do Brasil, na Bahia, que exercia a superintendência sobre todas as províncias brasileiras e assegurava as relações oficiais com o governo da mãe-pátria. Esse poder central da colônia subsistiu, consoante o seu nome, até ao fim da era colonial, 1549-1760 na Bahia, 1763-1807 no Rio de Janeiro, e de 1720 em diante usou mesmo permanentemente do título mais brilhante de vice-reino; porém a sua autoridade sofreu sempre novas restrições: em primeiro lugar, perdeu sua ação sobre o Norte do Brasil, o denominado Estado do Maranhão, que foi subordinado diretamente ao gabinete de Lisboa (1621); e, se nominalmente lhe restava autoridade sobre as demais porções de terra, era só na aparência, sem significação real.

Por último, desde meados do século XVIII, existiam no Brasil nove governos de primeira ordem, que eram completamente independentes uns dos outros e revestidos de iguais direitos: o vice-reino dos Estados do Brasil ou capitania-geral do Rio de Janeiro, além disso as capitanias gerais do Pará, do Maranhão, de Pernambuco, da Bahia, de São Paulo, de Minas Gerais, de Goiás, de Mato Grosso. Fora esses, existiam ainda nove governos de segunda ordem, as capitanias do Rio Negro (Alto Amazonas), Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Sergipe, Espirito Santo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, cujos governadores eram por direito subordinados ao vizinho capitão-general, porém o laço dessa dependência era frouxo e vacilante; muita vez se limitava apenas a fazer passar a correspondência oficial e relatórios pelas mãos do capitão-general, e até dessa obrigação procuraram emancipar-se os governadores das capitanias, freqüentemente com êxito.

Recapitulemos o que se disse até aqui, num resumo: o império colonial brasileiro, no seu desenvolvimento final, era composto de um certo número de províncias, cada uma das quais somente de direito se relacionava com a mãe-pátria, ao passo que entre si não tinham ligação orgânica alguma, eram vizinhas entre si independentes. Os governadores provinciais, só dependentes da corte de Lisboa, comportavam-se uns para com os outros como príncipes soberanos, atentos a observar qualquer usurpação e a brigar, principalmente a respeito dos limites do território de sua administração, com uma violência tal, como se fossem potências inimigas; na época do descobrimento do ouro, aconteceu um deles ocupar militarmente um distrito aurífero da fronteira e logo declarar ao seu vizinho que só cederia à força das armas. E as medidas desta ordem podiam sempre contar certo com o aplauso das populações provinciais locais; a disseminação filiforme nas extensões gigantescas de terras, a imensa distância entre as diferentes colônias haviam naturalmente determinado no povo um forte bairrismo, que se comprazia na mentalidade provincialística; calando os ciúmes mesquinhos e atritos, lembremos somente aquela guerra encarniçada que os paulistas fizeram contra os denominados Em-boabas, para a posse das Minas Gerais.

O império colonial do Brasil formava, portanto, apenas uma unidade geográfica, porém não um corpo de Estado organizado; o seu centro político ficava além dos mares, em Lisboa, onde o príncipe herdeiro da coroa de Portugal, desde 27 de outubro de 1645, usava o título de "Príncipe do Brasil", e onde tinha a sua sede o denominado "Conselho Ultramarino" (organizado a 14 de junho de 1642), em outras palavras, o ministério das colônias.

A forma do governo era a monarquia absoluta; sem dúvida ainda vigorava reconhecidamente em Portugal uma constituição, na época em que começou a colonização, e as cortes dos três Estados somente desde 1698 caíram em desuso; todavia, nada disso passou às novas colônias sul-americanas.

Aos primeiros imigrantes eram concedidos, além dos direitos de cidadania, somente as regalias municipais que eram de uso na mãe-pátria, portanto uma certa autonomia do governo e de administração dos municípios, reservando-se, porém, importante influência aos governadores (ou capitães-gerierais), mormente nas eleições.

E, se depois algumas províncias e cidades obtiveram ainda maiores privilégios, também estes não lhes davam quaisquer direitos políticos propriamente; por exemplo, o grande privilégio da cidade do Porto, de l9 de junho de 1490, transplantado primeiro ao Rio de Janeiro (10 de fevereiro de 1642), depois ao Maranhão e Pará (20 de julho de 1655), mais tarde à Bahia e a São Paulo, só dava proteção contra certo despotismo, eximindo o cidadão da tortura judicial, exceto em casos especiais, assim como de prisão arbitrária, dispensando-o e aos seus servos do recrutamento e, finalmente, dando-lhe o direito de usar armas.

Também os privilégios das diversas classes eram inteiramente do domínio do direito privado, e um regime político de classes privilegiadas, no sentido europeu de então, nunca existiu no Brasil. Em primeiro lugar, não existia nobreza; de fato imigraram muitos titulares portugueses, muitos outros obtiveram, na verdade, privilégios pessoais de nobreza, por meio de carta de mercê ou por serviços públicos, e, além do mais, o desenvolvimento natural do país criou uma aristocracia detentora de terras, uma fidalguia de fazendeiros; porém, por outro lado, esses elementos jamais se associaram em corporação regular, nem era de uso o direito de primogenitura, de sorte que daí não podia resultar uma classe de nobreza propriamente dita.

O clero, por seu lado, era sem dúvida organizado em classe; porém, os sacerdotes seculares, sem bens próprios da Igreja, nomeados e assalariados pelo Estado, eram inteiramente dependentes do poder civil, e as ordens claustrais, por mais importante que fosse o papel desempenhado, sobretudo pela Companhia de Jesus, deviam, justamente pelo conjunto da sua feição, conservar-se alheias a toda a vida política propriamente dita.

Assim faltava, pois, qualquer órgão legal e qualquer classe fechada, autônoma, que, em nome e por delegação do povo, se opusesse à coroa e aos seus funcionários, e pudesse exercer alguma influência sobre as suas determinações.

A participação do povo na vida do Estado só se podia manifestar de modo extraordinário, por meios fora da lei, rebelando-se contra qualquer medida do governo, que desagradasse. E, para oposição deste gênero, serviam de órgãos as autoridades eleitas dos municípios, principalmente nos grandes municípios das capitais de província; aí o Conselho Municipal, a Câmara, apoiada na massa do povo, ocupava posição forte e respeitada, sobretudo nos tempos mais antigos; bastantes vezes citamos, na nossa narração, como as câmaras municipais, não só na ausência ou no caso de morte do governador da coroa, assumiam as funções de governo provisório da província, mas também como faziam oposição violenta aos governadores malquistos e mesmo depunham algum deles do seu cargo. As vezes, também em casos tais, de geral descontentamento, era por demagogos arrancado o poder das mãos da câmara; o povo revoltado elegia então o seu juiz do povo, procurador do povo, e, diante dessa autoridade da revolução, todos tinham que se curvar.

Agitações desta ordem nunca duravam muito, de resto, e, em geral, não se estendiam além da imediata vizinhança da cidade; assim, eram quase sempre suplantadas, sem especial esforço, pelo governo, sem deixarem efeito duradouro atrás de si. E, desde cerca do terceiro decênio do século XVIII, quase não aconteceram mais tais tumultos locais; mesmo, as maiores municipalidades jaziam em completa apatia, vencidos o gosto e força para resistir.

O nome de juiz do povo, outrora tão temido, havia passado agora em muitos lugares para um funcionário subordinado do município, que, sem verdadeira significação, só representava papel nos préstitos festivos; as câmaras limitavam-se a uma atividade exclusivamente municipal. De fato, ainda existia um funcionário do povo, que dispunha de alguma influência, o denominado juiz ordinário, leigo (correspondente ao atual juiz de paz), que, além de suas atribuições propriamente judiciais, presidia à câmara e executava as suas decisões; ele era, como o conselho municipal, nomeado por eleição indireta dos cidadãos, porém sob a influência preponderante do governo, e ele se sentia, assim, inteiramente como funcionário deste úldmo; dependente humilde para com os de cima, era não raro tirano para com os de baixo.

Nestas condições, o poder dos funcionários da coroa não encontrava barreira alguma; e, como o capitão-general na província, assim procediam os funcionários inferiores, cada um na sua esfera, como déspotas absolutos, com tanto maior desembaraço, quanto, em geral, reuniam na sua pessoa ao mesmo tempo autoridade judicial, policial e administrativa; assim, na comarca o ouvidor, no termo o juiz de fora (assim chamado porque nunca um nacional podia exercer este cargo), formado em direito.

Por esta forma, não cabia aos súditos nem o beneficio de uma fiscalização, como resultaria da concorrência hierárquica entre funcionários da justiça e da administração, uns sobre os outros; e o caos da legislação luso-brasileira, que, desde a codificação de Filipe II (12 de janeiro de 1603), outra não recebeu, o segredo dos debates judiciários e a resolução da sentença por juiz singular, tudo deixava excessiva margem para grandes injustiças.

Podia-se recorrer, sem dúvida, dos funcionários subalternos para mais altos, até ao ministério colonial, e, quanto à justiça, foi criada uma sucessão de instâncias na magistratura: existia na Bahia na relação de 2? instância, fundada a 7 de marco de 1609, renovada a 12 de setembro de 1652, e, desde 15 de julho de 1751, estabeleceu-se no Rio de Janeiro, para as províncias a sudoeste, segunda relação, de cuja decisão havia uma apelação facultativa para o Supremo Tribunal de Lisboa; porém, mesmo no interior de cada província, dadas as enormes distâncias, era tão penoso e dispendioso para o cidadão procurar justiça, que ele, além disso, diante do duvidoso resultado, preferia sofrer a injustiça. E justamente esses inconvenientes, que oprimiam os cidadãos ordeiros, favoreciam o criminoso; a este era sempre fácil acertar-se com o único funcionário que reunia nas suas mãos todos os poderes, e, não o conseguindo, era-lhe muito fácil na vasta extensão do país escapar pela fuga ao castigo; o Brasil carecia, portanto, em absoluto, da indispensável segurança da justiça155.

 

 

 

155 Infelizmente, isso ainda nada melhorou até hoje: o culto do direito é ainda, sempre, defeituoso na sua organização, e desmoralizado, ao menos na sua execução para com os inferiores.

À testa da justiça e no lugar do Supremo Tribunal de Lisboa, existia, desde a transmigração da Casa Real, um Tribunal superior no Rio de Janeiro, a Casa de Suplicação, instituída por decreto real de 10 de maio de 1808, suprimida pelo decreto das cortes de Lisboa, de 29 de setembro de 1821, o que de resto não foi efetuado. De conformidade com o art. 163 da Constituição do Império, e pela lei de 18 de • setembro de 1828, foi esse tribunal reorganizado com o nome de Supremo Tribunal de Justiça, com 17 ministros.

Além dos dois mais antigos tribunais de 2? instância acima mencionados, institui o rei d. João VI mais dois — a Relação de São Luís do Maranhão, a 13 de maio de 1812, e a de Recife (Pernambuco), a 6 de fevereiro de 1821; e estes quatro são até atualmente os únicos, embora o art. 158 da Constituição previsse uma relação para cada província; é evidente, portanto, que na maioria dos casos a apelação é de fato ali impossível.

Nas províncias, cada comarca tem ainda o seu juiz de direito, cada município ou termo o seu juiz municipal (juiz policial), que em geral também trata dos negócios do juiz de órfãos e, como tal, é curador dos direitos de órfãos e ausentes; para todos esses cargos se exige o grau jurídico de doutor e a nomeação é feita pelo governo. Finalmente, os juízes de paz, nos distritos ou freguesias, são eleitos por voto direto, do mesmo modo que os membros do Conselho Municipal, e por quatro anos; limita-se a sua competência fundamentalmente a mediações e pequenos casos de polícia, segundo os arts. 161 e 162 da Constituição e leis de 15 de outubro de 1827 e 3 de dezembro de 1841. Para a polícia executiva, cada província tem o seu chefe de polícia, auxiliado por funcionários subalternos, os delegados e subdelegados (lei de 3 de dezembro de 1841).

Ao passo que, nas causas cíveis em primeira instância, o juiz singular julga só, nas causas crimes é aplicada, conforme prevê o art. 151 da Constituição, a cooperação dos jurados (Código Penal de 1830 e Regulamento Processual Criminal de 1833), sendo que se reúne o júri na capital da comarca, sob a presidência do juiz de direito; os jurados devem saber ler e dispor de certa renda; somente com unanimidade absoluta no quesito principal, ou dois terços de maioria nos quesitos acessórios, podem pronunciar sentença de morte.

Tal é a atual organização da Justiça; vejamos como ela funciona. Todos os viajantes e observadores são unânimes a este respeito, que os juízes e funcionários da polícia, mormente nas instâncias inferiores e nos pontos distantes do pais, são ainda tão acessíveis ao suborno e tão arbitrários, quanto o eram os seus antecessores portugueses; o direito não é somente torcido, porém diretamente vendido, e só em casos muito excepcionais consegue justiça o pobre contra o rico, o estrangeiro contra o nacional.

Quem quiser investigar esses pormenores não terá dificuldade alguma em os achar; contentamo-nos em citar referências feitas por alguns alemães. "Não existe povo na terra tão inclinado a abusar do poder oficial, como o brasileiro. Quem tem dinheiro, tudo pode permitir-se impunemente, isto é, fica impune por parte das autoridades. Porém, em muitos casos, o culpado é ferido pela vingança particular, que, nas regiões remotas, degenera em formais guerras de família. A conseqüência é a absoluta falta de segurança pessoal. Certamente, e embora possa parecer inverdade, no Brasil é menos arriscado matar alguém do que lhe dar uma bofetada. "Coitado de quem morre"! diz o rifão, para definir a situação: os mortos não se podem vingar, nem se queixar. Nestas circunstâncias, a adoção do júri foi uma verdadeira desgraça. Quem é que, nas condições sociais existentes, pode atrever-se a declarar culpado um assassino, e, com isto, incorrer no risco de ser a seguinte vítima, que ele matará?" (Helmreichen).

É da mesma opinião Burmeister: "Considera-se por toda parte com olhos desconfiados a administração da justiça, e sabe-se que o dinheiro e as relações de famílias são as alavancas na decisão da sentença; ninguém ousaria contestá-lo; ninguém conhece um meio para reprimir esses abusos; o homem probo, que se atrevesse a votar diversamente da maioria corrompida, viveria como a coruja no meio das gralhas, e não tardaria a cair nalguma tocaia. Quem não foi condenado é tido por completamente irrepreensível, e qualquer é absolvido, desde que pague para a absolvição. Ainda mais comumente acontece deixar-se escapulir antes dos debates o criminoso, cuja culpabilidade é bem patente. Para tudo isso concorre especialmente a independência dos processos judiciais de cada uma das províncias; nenhum tribunal de uma pode julgar o criminoso de outra; todo ladrão, assassino ou velhaco, é livre no momento em que ele pisa o solo de outra província, onde ainda não cometeu um delito. Alguns temerários desafiam francamente a lei; andam armados por toda parte e ameaçam de morte, a qualquer que ousar pôr-lhes a mão".

Como já se disse acima, no texto, todos esses males, em parte, resultam necessariamente das condições naturais de um país ainda meio deserto; a maior parte da culpa cabe, todavia, aos homens; de um lado, à completa desmoralização do funcionalismo, que trata aos pobres com o máximo despotismo, como escravos, e aos ricos, que para isso pagam, com a máxima contemplação; por outro lado, à relaxação moral do povo que, embora lhe seja concedida tão considerável participação na distribuição da justiça, não faz esforço algum para estabelecer uma ordem judicial organizada.

E costume agora no Brasil, porém injustamente, acusar de toda culpa ao povo e sua participação na justiça; vejamos, por exemplo, como o presidente da Bahia se exprimiu sobre o júri, no seu Relatório à Legislatura provincial, de 1′ de março de 1855: "Um juiz encanece na prática de dirigir processos e julgar com acerto e justiça, pensa e repensa no sossego da noite e treme de cometer um engano, quando tem que pronunciar um julgamento sobre vida, liberdade e posses de seu próximo; um jurado, qualificado mais por seus haveres do que por seu entendimento reto e sua cultura, depois de ter ouvido discursos apaixonados, na maioria falsos e sofísticos, isola-se por alguns minutos para deliberar; ele é enternecido por lágrimas, influenciado por considerações pessoais, e mesmo, quem sabe, estimulado pela fome. Eu reclamo, pois, a abolição do júri! Reclamo antes de tudo uma reforma e melhor qualificação dos jurados; se isso não bastar, então reclamo a abolição, pois as leis devem ser adaptadas aos costumes e ao grau de cultura dos povos; não quero instituições de luxo, nem as posso compreender. Se o júri é em países constitucionais uma garantia indispensável, que subsista para os crimes políticos e da imprensa, porém não deve servir para proporcionar liberdade e impunidade aos assassinos, incendiários e ladrões". (Nota do autor).

 

 

 

 

Na verdade era o resultado, em não pequena parte, das condições naturais; porém, grande parte da culpa cabia também aos homens.

Certamente, houve muitos funcionários honrados; porém, no seu conjunto, o funcionalismo luso-brasileiro estava afundado em grande corrupção; descuidan-do-se dos deveres e da honra do seu cargo, só cogitava de enriquecer. E este alvo alcançava-se com tanto maior descaramento, quanto os cargos eram ocupados na maioria (porque não podia ser adquirida no Brasil a cultura jurídica exigida para o serviço do Estado) por portugueses natos; estes, entretanto, não ligados à colônia nem à sua população por laço algum, nada tinham para tomar em consideração; só tratavam de fazer fortuna, a fim de regressar a terra o mais depressa possível. Rapacidade e corruptibilidade eram no Brasil, por conseqüência, o vício geral do funcionalismo.

Já no princípio do século XVII, antes da invasão holandesa, dizia o irmão Manuel do Salvador que "pesavam quatro caixas de açúcar bastante para inclinar o fiel oscilante da justiça". Uns cinqüenta anos depois, repetia o famoso jesuíta Antônio Vieira, no seu "Sermão do bom ladrão", uma sentença do apóstolo das índias, São Francisco Xavier: "Nas índias Portuguesas é o verbo rapio (roubar) conjugado em todos os modos"; e estendia o mesmo com franca referência ao Brasil: "porém agora se usa da mesma conjugação também neste lado do cabo da Boa Esperança, c não somente em todos os modos, mas também em todos os tempos e pessoas".

De novo, cem anos passados, exprime-se o vice-rei, marquês do Lavradio, nas suas instruções ao seu sucessor (19 de junho de 1779), sobre as mesmas condições, do seguinte modo: "Em geral, quanto a minha experiência alcança, os magistrados, que para aqui vêm, só pensam em acabar o tempo fixado do seu serviço, para poderem depois exigir promoção; e, durante a sua estada aqui, só têm uma única preocupação: ajuntar o mais possível, a fim de levar, ao regresso, com que dar à sua família boa vida. Nem um só fala do beneficio exercido por ele; porém todos lamentam a miséria e pobreza do território de sua jurisdição, lástima produzida somente pela insignificância dos proventos do seu cargo. Como o seu ordenado é pequeno, eles procuram aumentar as espórtulas, promovendo discórdias e contendas; eles tornam os súditos turbulentos, impõem-lhes pesadas custas e os detêm fora dos seus trabalhos, só para favorecerem o seu baixo interesse pessoal e os dos seus funcionários subalternos. Perto de doze anos governei na América e nunca ouvi falar de um só juiz que houvesse procurado reconciliar os partidos litigantes; jamais encontrei atlguma providência útil promovida por um magistrado".

Está claro que, uma vez arraigado tal estado de corrupção oficial, não se remedeia depressa, nem facilmente. Muitas vezes, na verdade, funcionários superiores, especialmente zelosos, procuraram fazer reformas, porém sempre sem duradouro resultado. É interessante o que a este respeito J. C. A. de Oyenhausen, que governou, como capitão-general, Mato Grosso e São Paulo, referiu ao viajante francês Saint-Hilaire, cerca de 1820.

"Existem, — disse ele, — nas funções do cargo de um capitão-general, três épocas: febre com delírio, febre sem delírio e esgotamento. Um governador chega ao seu território, sem o conhecer; porém ele sabe que lhe confiaram a administração de um país, onde tudo é novo, onde tudo está por fazer; ele tem. na mente a idéia de arrancar da barbárie um país colossal e tornar-se famoso por grandes obras. Cheio de planos de toda espécie, chega ele; mas, após tomar conhecimento das localidades, ele percebe que as suas idéias, nascidas na Europa ou no Rio de Janeiro, não se adaptam ao interior do Brasil. Em breve cessa o delírio; ele modifica os seus planos, adapta-os melhor ao país e trata então da realização; porém não havia contado com os obstáculos. Os homens e as circunstâncias contrapõem-lhe uma resistência passiva, que é mais insuperável do que a mais violenta oposição; ele cansa-se da causa e deixa-se cair na mesma apatia, em que estão afundadas todas as pessoas do seu círculo!"

Assim acontecia aos melhores capitães-generais, que chegavam possuídos da melhor vontade e atividade; porém a grande maioria deles nem assim era; só vinha animada da mesma avidez que os funcionários inferiores, e trazia consigo também um bando de parasitas, que todos deviam ser nutridos pelo governo. O famoso Antônio Vieira, da Companhia de Jesus, compara, por isso, numa fantasia satírica, a transmigração de Um capitão-general com a viagem de um tubarão que, aonde quer que se dirija, tem de levar consigo uma porção de sugadores; "sem dúvida — diz ele — aprendeu a pequena rêmora nos tempos modernos, o seu ofício, dos tais parasitas".

E, quanto à maneira pela qual se havia o representante da coroa, em plena posse do poder civil e militar, com livre disposição do tesouro da província, da milícia e das tropas regulares, garantido, pela enorme distância do soberano, contra qualquer responsabilidade, coisa é melhor de imaginar que de descrever; o seu despotismo assemelhava-se ao de sultões orientais156. Mesmo entre os capitães-generais dignos de respeito, já se tornara pelo menos uma verdade, que, sem um certo despotismo esclarecido, sem o absoluto afastamento de toda a influência popular, não se podia governar.

"Os primeiros habitantes do Brasil, — assim se exprimiu, mais ou menos, Oyenhausen, falando a Saint-Hilaire, — eram na maioria homens de baixa origem, acostumados à mais incondicional sujeição; eles transmitiram o servilismo aos seus descendentes, e este espírito ainda é alimentado pela contínua imigração de Portugal, que não é de melhor qualidade que a dos antepassados. Num superior, que se aproxima deles, julgam ver um homem que não sabe dignificar-se devidamente, e o desprezam".

E o marquês de Lavradio, nas suas já mencionadas instruções, diz: "Eu sempre fui fiel ao meu sistema, de não tomar, em absoluto, conhecimento das murmurações do povo. Sempre procurei certificar-me se realmente ele era oprimido, mas sem que o deixasse perceber de todo; e, se descobria que tal era realmente o caso, procurava alterar o meu plano, de modo que não chamasse a atenção; aparentemente, porém, sempre eu sustentava inalteradas as minhas resoluções e fingia ignorar de todo a voz do povo".

Como se sabe, no correr do século XVIII, existia também no continente europeu absolutismo, e nos países melhor governados era um despotismo esclarecido o sistema geral do governo; contudo, já cintilavam através de todo o sistema as fagulhas incendiárias do liberalismo e da consciência nacional, que pela primeira vez irromperam em chamas claras na Guerra da Independência norte-americana e depois na Revolução Francesa. Por elas, porém, não foram ainda tocados os brasileiros; de um lado, dominados pela força do hábito, de outro pela indolência natural da gente do Sul, suportavam o pesado jugo com tranqüila resignação. Assim, não podia o elemento oposicionista do liberalismo desenvolver-se de dentro para fora; e, para que não se infiltrasse do exterior, disso cuidou solícito o governo português: o sistema proibitivo colonial, cuja ciosa severidade já descrevemos, não se limitava somente às pessoas estrangeiras, também visava idéias estrangeiras.

156 Também na administração atual, mormente nas províncias remotas, parece que ainda se oferecem circunstâncias idênticas; a julgar pelo que se ouve no parlamento brasileiro, muitos presidentes provinciais não são melhores que os velhos capitães-generais. (Nota do autor).

Já mesmo em Portugal reinava, nesse sentido, rigor exagerado; ler ou possuir escritos proibidos, era um crime, cujo castigo competia à Santa Inquisição; e o que não era proibido? Para imprimir novos livros, era preciso solicitar três licenças: a da censura real, a do bispo e a dos inquisidores, e a importação de livros estrangeiros era ainda mais dificultada; somente o governo do marquês de Pombal criou algum alívio para essa situação, pois, pelas leis de 2 e 5 de abril de 1768, estabeleceu um Colégio Real de Censura, de exclusiva competência na matéria, composto de teólogos e juristas157.

Muito pior era no Brasil: para aqui não se desgarrava quase nunca um livro estrangeiro, e, durante três séculos inteiros, o governo da mãe-pátria nem ao menos concedeu à colônia a instituição de uma imprensa.

De instrução pública nem se fale; fora talvez alguns seminários religiosos, não existia no Brasil nem um só estabelecimento de ensino superior, e quem quisesse adquirir cultura científica tinha que buscá-la em Coimbra, a única universidade em todo o reino português; tratando-se de escolas primárias, existia, quando muito, uma só nas cidades maiores; a gente do povo cifrava a sua instrução exclusivamente ao ensino religioso dos padres, o qual, além disso, se limitava na maioria das vezes aos ofícios do culto e se entremeava das piores crendices.

Não existiam, portanto, nem os mínimos princípios de instrução pública generalizada, ainda menos de ilustração política; os mais simples conhecimentos elementares eram tão pouco espalhados, que, não raro, ricos fazendeiros do interior encarregavam seus amigos do litoral de lhes arranjar um genro que, em vez de quaisquer outros dotes, apenas soubesse ler e escrever158.

 

158 O estado de ignorância é ainda hoje preponderante no Brasil, e, excluídos inteiramente os escravos, como já se vè, dois terços da população livre não sabem ler nem escrever; todavia, para isso concorre em maior parte a indolente indiferença do povo, ao passo que o governo, de seu lado, tomou louvável iniciativa.

Primeiramente, depois da transmigração da casa real para o Rio de Janeiro, foi fundada, pelo decreto de 13 de maio de 1808, a primeira Imprensa Real e surgiu o primeiro jornal, um órgão oficial da corte; a segunda imprensa foi concedida, por decreto de 5 de fevereiro de 1811, à cidade da Bahia; a terceira funcionou em Pernambuco, durante a revolução de 1817, porém deixou de existir com esta. Assim, ficaram aquelas duas primeiras imprensas as únicas até ao ano de 1821, quando a incipiente atividade da vida política também trouxe consigo progresso para a imprensa; já em 1828 eram publicados 25 jornais; agora se publicam uns 90 de toda espécie, científicos, políticos e literários. Também começaram a tornar-se evidentes os inícios de uma literatura propriamente brasileira, independente da portuguesa; porém não é aqui o lugar para discorrer a este respeito.

Quanto à instrução pública, o art. 179, §§31 e 32, da Constituição, assegurava à população os necessários institutos de ensino superior, e, além disso, instrução elementar gratuita; todavia, agora, segundo as disposições do Ato Adicional de 1834, somente os primeiros estão a cargo do governo do império, ao passo que as escolas populares estão aos cuidados dos governos provinciais.

Na verdade, com um zelo digno de nota e grandes sacrifícios, estabeleceu-se daí em diante a instrução elementar gratuita, que, porém, não podendo ser de outro modo nas circunstâncias naturais, é bastante defeituosa e, ao que parece, é pouco utilizada pelo povo; segundo dados oficiais, existiam em 1-854, em todo o império, 1.506 escolas primárias, com 61.700 alunos, 20 liceus e 148 escolas secundárias, com 3.713; finalmente, freqüentavam 23.641 alunos escolas particulares de toda espécie. Além disso, existiam, quanto a institutos superiores (fora 11 seminários eclesiásticos), duas Faculdades de Direito, em Recife e São Paulo, criadas pela lei de 11 de agosto de 1827, com 584 estudantes; duas Faculdades de Medicina, na Bahia e Rio de Janeiro, organizadas pela lei de 3 de outubro de 1832, com 572 estudantes; ainda no Rio de Janeiro, uma Academia de Medicina, uma Escola de Comércio, com 27 estudantes, uma Escola de Belas-Artes, com 60, e o colégio d. Pedro II, com 137 alunos.

Somamos, portanto (em 1854), uma freqüência escolar de 90.000 alunos para uma população livre de três milhões de almas, isto é, 3 96 (nos Estados Unidos da América do Norte, a freqüência é de 20 96: segundo o recenseamento de 1850, quatro milhões em vinte milhões de habitantes).

Uma universidade, na acepção alemã, não possui ainda o Brasil, embora tenha sido diversas vezes objeto de cogitação fundar uma tal no Rio de Janeiro, já em 1823 e mais tarde conserva-se o sistema de faculdades separadas, e, ultimamente, pela lei de 10 de setembro de 1854, foi providenciada a fundação de duas faculdades de teologia católica.

O que mais se aproxima da concepção européia de academia de ciências é o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, fundado no Rio de Janeiro, a 21 de outubro de 1838, sob a imediata proteção do Imperador d. Pedro II, e que, em 1854, contava 54 sócios efetivos, 101 honorários e 438 correspondentes. (Nota do autor).

 

 

Justamente essa geral ignorância dava, a todo aquele que dispusesse de alguma cultura, tal preponderância e tal influência, que toda a vizinhança se deixava facilmente levar e dominar por ele, como se pôde verificar em repetidas revoltas, não de caráter político, simplesmente locais. E para esse mal não sabia o marquês de Lavradio, por exemplo, de outro remédio, senão o seguinte:

"Devia-se impedir de todo modo que se estabelecessem ali advogados, letrados e outros de espírito irrequieto; pois o povo, em geral mal educado, logo que é adulado e instigado ao atrevimento, por esses perturbadores da ordem, esquece os seus deveres e se põe sob as bandeiras deles".

Tinha disso experiência, continuava ele, porém havia atalhado as maquinações com um meio eficaz, pois, à primeira agitação, prendia aqueles agentes perturbadores, e conservava-os na mais rigorosa prisão; e, quando, finalmente, os soltava, dava-lhes a entender que daí em diante seriam responsabilizados por qualquer perturbação da ordem. E este foi em absoluto um dos mais bem intencionados e mais esclarecidos capitães-generais, que, por seu governo do Rio de Janeiro, granjeou incontestável benemerência! 159.

 

 

 

 

 

Compreende-se que, apesar de tudo, o novo espírito da época não podia ser reprimido inteiramente; os grandes acontecimentos que abalaram o mundo, como a guerra da Independência norte-americana e a Revolução Francesa, deviam despertar a atenção também no Brasil; e, embora, em geral, não fossem devidamente compreendidos, todavia deles resultou a primeira semeadura de fórmulas e pensamentos liberais, que a princípio, de resto, não ameaçava de perigo algum o existente sistema de governo. Limitadas a certos círculos de classes mais ilustradas, tais idéias de um liberalismo indistinto, de todo, não tinham as qualidades necessárias para acionar um movimento; quando muito se manifestavam, às vezes, em palavras altissonantes: mencionamos, apenas, a denominada Inconfidência Mineira (ano de 1790), segundo parece, uma simples declamação feita a uma mesa bem provida, que somente se assinalou com significação política pelo circunstanciado processo de alta traição.

Por este lado, não havia, portanto, muita coisa para temer, a princípio; existia, contudo, no Brasil, já desde antigamente, segunda circunstância, que poderia suscitar grandes dificuldades. Ouçamos como o marquês do Lavradio instrui a este respeito o seu sucessor: "Os traços gerais do caráter dos habitantes destas regiões americanas, tanto quanto eu os conheço, são — indolência, humildade e obediência. Eles são moderados nos seus hábitos, todavia possuem ao mesmo tempo muita vaidade e soberba; mas estes defeitos facilmente se refreiam. São robustos, sabem trabalhar e obedecem às ordens recebidas; porém, quando não acionados pelas ordens, ficam de boa vontade, e freqüentemente, em completa ociosidade, até caírem na mais profunda miséria. Em si e por si, são, portanto, esses homens fáceis de governar. Contudo, muitas vezes eles se tornam ingovernáveis e suscitam muitos distúrbios, por causa dos europeus (isto é, os portugueses), que aqui estão estabelecidos. Muitos destes últimos são naturais da província do Minho, gente ardorosa, desassossegada e pouco segura, que, embora na pátria tanto se adiantassem na agricultura, aqui, neste sentido, para nada prestam; antes, parecem tão ignorantes na lavoura, como a gente do país. Apenas chegam aqui, associam-se aos seus compatriotas, que já se apoderaram de todo o manejo do comércio; eles o monopolizam (pequeno comércio e de comissões) e não admitem um nacional nas suas casas, nem como escrevente, a fim de que mais tarde ele não venha a ser também comerciante. Como esses residentes constituem exclusivamente a classe comercial, os pobres nacionais são de tal modo recalcados para situação subalterna, que recorrem a excessos, tão contrários ao seu gênio"160 e ,60_A.

Portanto, existia no Brasil uma viva oposição entre os descendentes dos antigos imigrantes, os brasileiros propriamente ditos, e os imigrantes mais recentes, os "portugueses de Portugal", ou "filhos do reino", como gostavam de os chamar os portugueses residentes. Eram os primeiros inteiramente da lavoura, os outros essencialmente comerciantes; eles haviam açambarcado todo o comércio pequeno e de comissões, e, como eram superiores aos filhos do país em cultura geral, em habilidade, em atividade, tornava-se quase impossível a um negociante nacional prosperar ao lado deles, tanto mais porque os portugueses residentes continuavam unânimes a fazer-lhe oposição. Assim, os imigrantes portugueses geralmente alcançavam em breve grande bem-estar e atraíam sobre si o ódio e a inveja dos brasileiros; a gente pobre considerava-os a sanguessuga estrangeira (como antes o povo europeu considerava os judeus); a aristocracia dos fazendeiros, pelo menos, não perdoava que a nova aristocracia do dinheiro se quisesse fazer valer, equiparar-se a ela.

E, além disso, o que, sem dúvida, muito menos entrava em conta: tanto quanto o comércio, monopolizavam os portugueses natos igualmente os serviços do Estado e tinham quase todos os cargos oficiais nas suas mãos; na verdade, não podiam, afinal, os brasileiros queixar-se por essa preterição, pois, para o serviço do Estado, se exigia o diploma de jurisprudência, e esse não o possuía nenhum deles, visto só poder ser adquirido na universidade, em Portugal; porém, por outro lado, vendo como esses funcionários consideravam o seu cargo somente como mina de ouro, e depois regressavam a Portugal com o roubo, então devia naturalmente crescer justa indignação contra eles.

Desenvolveram-se deste modo os inícios do estremecimento nacional entre os ramos da mesma raça, o velho português-europeu e o português-brasileiro. Certamente, eram somente prelúdios; todavia, essas oposições já se haviam combatido no ano de 1710, na luta, de armas na mão, dos pernambucanos contra os denominados Mascates, do Recife; e, se esses sentimentos haviam adormecido na apatia geral, contudo mais força tinham ganho nesse sono do que perdido; continuamente, traíram-se por pequenas convulsões. E ainda iam, de fato, representar importante papel161.

 

 

161 Já repetidamente chamamos a atenção, na Segunda Seção, quando tratamos das províncias individualmente, sobre essa oposição, e apontamos como, especialmente nas províncias afastadas, ela deu a todos os movimentos revolucionários modernos uma feição específica (Nota do autor).

Tal era o estado de coisas no Brasil, em princípios do século XIX; em conjun to, um estado de tranqüilidade apática; e, se, sob o véu da mesma, se escondia al gum elemento perigoso, todavia não era de esperar, por ora, qualquer mudança e dentro para fora. Foi, então, dado do exterior o impulso.

Basta-nos aqui lembrar, com algumas palavras, como da conflagração da Re volução Francesa se acendeu uma guerra de gigantes, que durou vinte anos, entre Inglaterra e a França, e como as chamas devastadoras se transmitiram gradualmen te aos restantes membros do sistema de Estados europeu-americanos. Tambm Portugal foi envolvido nas mesmas; apertado pela corte de Londres, aliada, ela associou-se logo à primeira coligação contra a República Francesa (1793); retirou-se, porém, da guerra, já em 1795, sem formal conclusão da paz e, depois, foi ainda uma vez, de passagem, no ano de 1801, implicado na mesma, conseguindo, afinal, com muitos trabalhos e sacrifícios, conservar, de um lado, a velha aliança de amizade com a Inglaterra, e, de outro, a paz e neutralidade com a França.

Porém tal posição dúbia tornou-se insustentável, quando o imperador Napoleão, de 1806 em diante, estabeleceu o seu sistema de bloqueio continental. Portugal tinha então que optar irrevogavelmente; e, como ele ainda continuasse a vacilar, indeciso, entre um e outro, achou-se, afinal, ameaçado, de um lado por uma esquadra inglesa de bloqueio, e de outro por exército francês de ocupação, que transpunha as suas fronteiras.

Todavia, continuava, sempre a corte de Lisboa a hesitar, até que, afinal, a folha oficial do império francês, o Moniteur, de 13 de novembro de 1807, em palavras secas, declarava que a casa de Bragança havia incorrido na perda de seu trono. A 25 de novembro, chegou esta notícia aterradora a Lisboa; o exército francês de ocupação estava agora a poucas horas de distância, a resistência pelas armas era impossível. Assim não restava escolha: chegava o momento em que a casa real de Bragança tinha que pensar no testamento político de seu antepassado d. João IV, e obedecer-lhe.

Numa proclamação de 27 de novembro, o príncipe regente d. João VI, que governava em nome de sua mãe demente, d. Maria I, despedia-se dos seus súditos europeus e participava a sua resolução de retirar-se para o Brasil, Rio de Janeiro, até ao restabelecimento da paz mundial. A esquadra portuguesa, tudo quanto se achava em condições de navegar, oito navios de linha, quatro fragatas, doze brigues, ancorava no Tejo, pronta para levar a casa real e o seu numeroso séquito civil e militar; muitos navios mercantes e cargueiros se ajuntaram à esquadra. As âncoras foram levantadas a 29 de novembro de 1807, e a poderosa frota de emigração, a primeira que conduzia um rei ao Novo Mundo, singrou através da esquadra inglesa de bloqueio, saudada e comboiada por esta, respeitosamente, até fora, em pleno oceano Atlântico; no dia imediato, faziam os franceses a sua entrada em Lisboa (30 de novembro): estava Portugal completamente perdido.

O tempo e os ventos não favoreceram a transmigração da família principesca fugitiva; uma tempestade dispersou a esquadra, e a parte mais importante da mesma se viu forçada a arribar primeiro à baía de Todos os Santos; foi ali, pois, que também o príncipe regente, com toda a família real, pisou primeiro o solo do Brasil (21 de janeiro de 1808).

Por um momento, a velha cidade de Salvador teve a esperança de recuperar agora a antiga posição de capital do Brasil, que desde quarenta anos havia perdido; os cidadãos receberam os augustos hóspedes, com ilimitado regozijo e ofereceram, se quisessem ali permanecer, construir à sua custa um palácio condigno; porém o príncipe regente declinou desse oferecimento, e, depois de curto repouso, embarcou de novo, prosseguindo para o Rio de Janeiro, onde ele entrou a 7 de março de 1808. Pode-se imaginar que a recepção aqui, na sede régia, recém-escolhida, São Sebastião, não foi menos pomposa, recebendo as boas-vindas do conde dos Arcos, o 159 e último vice-rei do Estado do Brasil, que nas suas mãos depositou o bastão do poder; viu-se o monarca português, quando pôs o pé em terra, saudado pela população com aclamações de júbilo, tão vivas quanto sinceras; um solene Te-Deum foi celebrado na catedral e, durante nove dias, a iluminação festiva da cidade renovou-se todas as noites.

Estava, portanto, o Brasil, pela marcha histórica dos acontecimentos, separado da mãe-pátria, Portugal, e tornava-se, com a transmigração da casa real para o Rio de Janeiro, um reino autônomo; era evidente que, daí em diante, havia de cessar naturalmente a opressão colonial, à qual ele estivera submetido em favor de Portugal.

E assim foi: numa carta régia do próprio prunho, que o príncipe regente, durante o seu repouso na Bahia (28 de janeiro de 1808), dirigiu ao cap i tão-general dali, conde da Ponte, havia por bem, em consideração às circunstâncias sobrevindas, que provisoriamente todos os portos do Brasil ficariam abertos, para importação e exportação, aos navios de todas as nações que se achassem em paz e amizade com a sua coroa; tinham, em geral, as mercadorias estrangeiras, porém, que pagar 2496 de direitos de entrada, e os produtos do país os já usuais direitos provinciais de exportação, ao passo que, relativamente à exportação e importação de certos artigos, eram tomadas disposições especiais; todas as leis, decretos e outras instruções, que até então haviam proibido nos Estados do Brasil o mútuo comércio e navegação entre súditos e estrangeiros, deviam ser daí em diante suspensos e não mais vigorar.

Em breve, seguiu-se a este um segundo decreto, talvez de não menor importância: no Rio de Janeiro, a 1° de abril de 1808, revogava o príncipe regente todas as leis proibitivas que até então haviam reprimido a atividade industrial de seus súditos brasileiros, e dava-lhes incondicional liberdade para toda espécie de indústrias e fabricações.

Com isso era abolido o antigo duplo monopólio da mãe-pátria, que anulava completamente o comércio e a indústria; livremente podia agora o brasileiro usar de suas mãos, e o tráfico internacional que, até então, passava indiferente ao largo da América do Sul, ia incluir na sua esfera de ação a costa, tanto tempo fechada, e, com o vivificante sopro de sua incessante atividade, despertá-la do sono 162.

162 Apreciamos devidamente, no texto acima, a significação fundamental dessas leis emancipadoras, das quais data o princípio de nova época para a história do Brasil; aqui vem a propósito acrescentar algumas observações sobre a eficácia prática das mesmas. Em primeiro lugar, a carta régia de 28 de janeiro de 1808 abriu sem dúvida os portos e a costa francamente ao comércio do mundo, sem exceção; porém, ainda anos depois, procurava o governo, no que diz respeito ao interior, conservar de pé o antigo sistema proibitivo contra os estrangeiros; e, se, por exemplo, permitiu aos acadêmicos bávaros Spix e Martius (1817-1820) viajar por terra, do Rio de Janeiro até ao fim do vale do Amazonas, foi somente em consideração às especiais recomendações que traziam e expressamente qualificada como prova de uma "mercê sem exemplo e sem seguimento". Esse estado de desconfiança já declina nos anos seguintes, sob o imperador d. Pedro I, e o viajante estrangeiro, uma vez munido de seu passaporte, pode viajar desembaraçado por toda parte, nos domínios do império; nas autoridades não encontrará facilmente entraves, e na hospitalidade do povo achará muito auxílio. Por outro lado, nega-se ainda sempre o Brasil a franquear o seu grande sistema fluvial a todas as nações do mundo, para a navegação e o comércio, embora não possa com as próprias forças utilizá-lo; somos certamente autorizados a reconhecer nessa resistência os últimos restos do antigo exclusivismo desconfiado, ao qual recorreram os portugueses no tempo da pouca segurança internacional do direito, e ao qual os brasileiros, conscientes da própria fraqueza, não podiam renunciar diante de possível rapacidade dos estrangeiros.

Além disso: quanto ao desenvolvimento do comércio brasileiro, a carta régia de 28 de janeiro de 1808, completada pelo decreto de 18 de junho de 1814, franqueava-o certamente a todas as nações e bandeiras; a conseqüência dessas leis foi, entretanto, a princípio, estabelecer-se, em lugar do legítimo monopólio da mãe-pátria portuguesa, o monopólio, de fato, da bandeira inglesa. Era isso em parte devido às circunstâncias gerais; a Inglaterra superava de muito em comércio e indústria a todos os outros Estados europeus; já desde muito ela tomava, de modo indireto, grande participação no comércio brasileiro, pois, se era feito sob pavilhão português, em geral era com dinheiro inglês e com mercadorias inglesas que ele se fazia; de sorte que havia criado aqui muitas relações. A tudo mais acrescia que a Inglaterra, durante a guerra de então, sustentava o incondicional domínio dos mares, e, pelo bloqueio do continente europeu, mantinha arredados quase todos os outros concorrentes; favorecida por todas essas circunstâncias, lançou-se essa nação, então, desde 1808, com tal energia no mercado brasileiro, que muito em breve o dominava completamente. Na verdade, quis o governo assegurar uma certa preferência à bandeira e à indústria nacional, determinando, com o decreto de 11 de junho de 1808, que as mercadorias portuguesas em navios portugueses só pagariam 16% de direitos de entrada; mas em breve tudo mudou, e mesmo foi invertido. Ê que a Inglaterra havia, nos primeiros tempos, aumentado a sua importação, no Brasil, de modo tão imprudentemente improdutivo, que as mercadorias inglesas caíram aqui à metade do preço, ao passo que, com a formidável procura de carga de retorno, os produtos brasileiros subiram ao dobro; assim, sofreram os negociantes ingleses o mais sério prejuízo (tal como atualmente na Califórnia e Austrália). Embora isso fosse então o bem merecido castigo da própria falta de tino, interveio o gabinete de Londres em favor de seus súditos, e obrigou a corte do Rio de Janeiro a aceitar um tratado de comércio (19 de fevereiro de 1810), por quinze anos, dando preferência à bandeira inglesa até sobre a nacional; isto é, a Inglaterra pagaria doravante somente 15% de direitos de entrada. Em conseqüência desse tratado, e de mais outros decretos, de 28 de janeiro de 1809, 13 de maio, 18 de outubro de 1810, etc, apresentava a tarifa da alfândega brasileira as seguintes disposições; mercadorias estrangeiras, que já houvessem pago direitos em Portugal, e produtos da maioria das colônias portuguesas, tinham entrada inteiramente livre; mercadorias inglesas sob bandeira inglesa e mercadorias inglesas sob bandeira portuguesa, pagavam 15%; mercadorias portuguesas sob bandeira portuguesa, em geral, 16%; porém todas as outras mercadorias em navios de nações amigas pagavam 24% do seu valor, como direito de entrada. , .

Dificilmente se pode imaginar mais completo monopólio do que este que a Inglaterra conseguiu no Brasil com tais favores, e teve quinze anos para criar raízes firmes.

Somente depois da declaração de independência isso mudou um pouco; na verdade, teve o Brasil que renovar, a 17 de agosto de 1827, o antigo tratado de comércio com a Inglaterra, por quinze anos; porém a mesma concessão dos 15% de direitos de entrada era agora estendida às seguintes nações mais favorecidas: a Portugal, pelo tratado de 29 de agosto de 1825; à França, 8 de janeiro de 1826; a Áustria, 16 de iunho de 1827; à Prússia, 9 de julho de 1827; às Cidades Hanseáticas, 17 de novembro de 1827; a Dinamarca, 26 de abril de 1828; aos Estados Unidos, 12 de dezembro de 1828; à Holanda, 20 de dezembro de 1828- à Bélgica, 22 de setembro de 1834. Finalmente, quando expirou o prazo de todos esses tratados, adotou o Brasil, como já uma lei de 30 de novembro de 1841 havia previsto, uma tarda geral, de 12 de agosto de 1844, que entrou em vigor a 11 de novembro do mesmo ano, a qual impunha, em geral, um tributo de 30% de entrada para a importação estrangeira, ao passo que a contribuição sobre certos artigos subiria até 60% e sobre outros desceria até 2% de seu valor.

Com isso no que diz respeito aos direitos de entrada, todas as bandeiras da terra estavam de novo inteiramente equiparadas, como sempre haviam estado, no tocante aos impostos de exportação; estes montavam (segundo a lei de 31 de outubro de 1835 e outras) a 7% para a maioria dos produtos brasileiros os mais importantes, para outras, desde 1/2 até 17% do seu valor. Esta nova legislação do comercio, por meio de tratados e decretos, anulou, sem dúvida, o antigo monopólio convencionado da Inglaterra e também tornou possível às outras nações negociarem com o Brasil; porém, apesar de tudo, a Inglaterra sempre conservou decidida preponderância, pois que continuou a encarregar-se de mais da metade da importação e de quase um terço da exportação. . . ,

Os decretos de 1» de abril de 1808 e 11 de agosto de 1815, os quais franquearam a exploração de toda espécie de indústrias, ficaram até aqui sem o mínimo efeito. Em alguns ramos, na verdade, o governo tomou a frente com o seu exemplo, como seja com a fundação de uma indústria nacional do ferro, na qual empregou muito dinheiro e esforços; porém o minguado resultado, que colheu, não convidou ninguém à imitação. Não está ainda o Brasil em condições para a atividade industrial; a sua escassa população e os seus capitais podem ser mais vantajosamente aplicados em tornar produtivo o seu solo, inculto e na lavoura; e, assim, aqui só podem criar raízes, além dos ofícios manuais, os ramos de indústria que se relacionam intimamente com a lavoura; em todos os demais artigos, ainda muito tempo ficará dependente da importação estrangeira. Não obstante, traduzia-se já na tarifa de 1844 uma tendência para o protecionismo. Certamente essa tarifa foi, em geral, somente inspirada nas necessidades financeiras, visto que, à falta de outras fontes de recursos, os direitos da alfândega são os que, quase só, devem cobrir as despesas do Estado; assim achamos expresso o pensamento e provado pelos fatos: "Trata-se de proteger os capitais nacionais, que se têm dedicado à indústria, e convidar outros a igual aplicação". Até aqui consiste, porém, a indústria nacional, que se procura, deste modo, artificialmente criar, em embriões quase que insignificantes, e já basta o exame das listas oficiais da importação e exportação para caracterizar o Brasil como um estado inteiramente agrícola. (Comparar estas notas com as tabelas II e III, fim do cap. XI). (Nota do autor).

Todavia, todas essas tão benéficas inovações para o Brasil, conforme o decreto de 28 de janeiro de 1808 expressamente declarava, eram a princípio simplesmente de caráter provisório; foram feitas quando e porque o império colonial ficava, de fato, separado da sua mãe-pátria. Porém, essa separação efetiva durou apenas pou co tempo; ainda no mesmo ano, entrava de novo a dinastia de Bragança, pelo sucessos das armas luso-britânicas, na posse de Portugal (capitulação de Cintra, a 30 de agosto de 1808), e na paz geral, em Paris, a 30 de maio de 1814, era a mesmo definitivamente reconhecida.

A família real, fugitiva da pátria, teria, portanto, podido regressar a Lisboa e de novo rebaixar o Brasil, inteiramente ou em parte, à antiga dependência colonial. Tal, porém, não aconteceu; dom João VI preferiu permanecer no Rio de Janeiro, ao passo que se fazia substituir em Lisboa por uma regência, e, muito ao invés de revogar o que estava feito, completava ele agora a iniciada emancipação política de suas possessões sul-americanas.

Um decreto de 18 de junho de 1814 ordenava que daí em diante, depois de restabelecida a paz mundial, os portos luso-brasileiros deviam ser abertos a todas as nações sem exceção, e outro de 11 de agosto de 1815 revogava a última medida proibitiva contra as indústrias, pelo que daí em diante também era permitida no Brasil a profissão de ourives, desde cinqüenta anos vedada. Daí em diante subsistiram, apenas, ainda a extração dos diamantes, até ao ano de 1832, e a do pau-brasil, como monopólio extraordinário do governo.

E, além disso, ainda no mesmo ano de 1815, com a carta de lei de 16 de dezembro, levantou e equiparou d. João VI as últimas diferenças de direito público entre os seus reinos de aquém e de além-mar.

"Faço saber aos que a presente carta de lei virem, que, tendo constantemente em meu real ânimo os mais vivos desejos de fazer prosperar os Estados, que a Providência divina confiou ao meu soberano regime; e, dando, ao mesmo tempo, a importância devida à vastidão e localidade dos meus domínios da América, à cópia e variedade dos preciosos elementos de riqueza que eles em si contêm; e, outrossim, reconhecendo quanto seja vantajosa aos meus fiéis vassalos, em geral, uma perfeita união e identidade entre os meus reinos de Portugal e dos Algarves, e os meus domínios no Brasil, erigindo estes àquela graduação e categoria política, que pelos sobreditos predicados lhes deve competir, e na qual os ditos meus domínios já foram considerados pelos plenipotenciários das potências que formaram o Congresso de Viena, assim no tratado de aliança concluído aos 8 de abril do corrente ano, como no tratado final do mesmo Congresso: sou, portanto, servido e me apraz ordenar o seguinte:

I) Que, desde a publicação desta carta de lei, o Estado do Brasil seja elevado à dignidade, preeminência e denominação de Reino do Brasil.

II. Que os meus Reinos de Portugal, Algarves e Brasil formem dora em diante um só e único reino, debaixo do título de Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves" 163.

Esta carta foi dada no palácio do Rio de Janeiro e assinada pelo príncipe regen te e seu ministro, marquês de Aguiar.

Em segunda lei, de 13 de maio de 1816, João VI, agora rei pela morte de sua mãe, deu ao novo reino do Brasil armas próprias, e as reuniu com as armas de ambos os mais antigos reinos num escudo único, de sorte que as armas dos Reinos Unidos tinham o seguinte brasão: em campo azul uma esfera armilar dourada, que era coberta com a coroa real, e acima desta o antigo brasão português, com as cinco quinas de Portugal e as sete torres de Algarves.

Terceira lei, finalmente, de 9 de janeiro de 1817, revogou o antigo título do herdeiro do trono português, "Príncipe do Brasil", que caducara, e estabeleceu que, para o futuro, o sucessor do trono devia usar o nome de Príncipe Real dos Reinos Unidos.

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