O ROMANTISMO NA LITERATURA BRASILEIRA – Silvío Romero

Silvio Romero (Lagarto, 21 de abril de 1851 — 18 de junho de 1914) – História da Literatura Brasileira


Vol. III. Contribuições e estudos gerais para o exato conhecimento da literatura brasileira. Fonte: José Olympio / MEC.

TERCEIRA ÉPOCA OU PERÍODO DE TRANSFORMAÇÃO ROMÂNTICA — POESIA (1830-1870)

CAPITULO I

O ROMANTISMO

O momento histórico aberto agora diante dos olhos dos leitores, o romantismo, representa só por si quase toda a literatura do século XIX, e, todavia, ainda não tem sido bem apreciado. Distendido entre dous inimigos, dous rivais poderosos, tem levado golpes à direita e à esquerda. Nós os homens do último quartel do século não assistimos à sua luta com o classismo, pugna brilhante de que saiu vitorioso: presenciamos em compensação seu pelejar com o naturalismo e dez outras teorias, que o pretenderam definitivamente enterrar.

Estas em seu entusiasmo juvenil acreditam nada dever ao velho sistema… Pernicioso erro histórico. Deviam reparar que a literatura se rege pela lei da evolução, é uma verdadeira organização de filogênese das idéias. Nada existe sem antecedentes, mesmo na evolução ceno-genética, e os antecedentes das doutrinas de hoje são justamente o próprio romantismo… Mas que é, que foi o romantismo? Há vinte respostas a esta pergunta. Apreciem-se algumas delas.

O romantismo foi uma reação religiosa contra a filosofia do século XVIII. Assim pensam alguns, iludidos pelo primeiro momento da romântica francesa, a fase tolamente denominada emanuélica. Não pode haver maior engano em história literária.

A par de alguns poetas católicos, o sistema produziu, por exemplo, poetas de um materialismo sem mescla. O mesmo na crítica, na filosofia e no resto. Byron, Edgar Poe, Balzac, Sainte-Beuve, Baudelaire, para não falar em Goethe, não foram católicos. Vejà-se outra.

O romantismo, se não foi uma volta ao cristianismo puro, foi certamente uma reação contra a Renascença, um retorno às cenas e à vida da Idade Média… Existe aí muito escrevinhador de momento, que possui da literatura do XIX século essa mísera noção e traça-lhe tão acanhada característica. Um erro, uma triste vista superficialíssima dos fatos intelectuais.

Que têm que ver Leopardi, Musset, Shelley com a Idade Média?

Os movimentos de reação e retorno em literatura e em política são sempre movimentos negativos, e seria um despropósito que o século XIX, o grande criador dos estudos históricos, o introdutor em todas as ciências do princípio da historicidade, viesse alentar-se de uma poesia anacrônica, emperrada, reacionária contra as leis do desenvolvimento progressivo das idéias. Impossível.

Não podendo as duas fórmulas lembradas conter e explicar todos os fenômenos literários do tempo, imaginaram-se outras. O romantismo era o cepticismo, a dúvida filosófica e religiosa levada para a poesia. Byron, injustamente, foi inventado para simbolizar esta tendência.

Digo inventado; porque o grande Byron, ao menos cá pelo nosso mundo latino, é menos o valente poeta inglês do que um certo tipo convencional criado pela crítica francesa. Este modo de explicar o romantismo é graciosamente estéril. Schiller e Vítor Hugo, Tennyson e Words-vvorth ficariam fora do quadro.

Houve recurso a outros expedientes: o romantismo é o sentimentalismo na literatura, é a continuação da melancolia de Rousseau, distendida por todo o século XIX. São bem conhecidos os tipos de Werther, Corina, Adolfo, Olímpio, René, Jocelyn, Lélia e muitos outros chamados para justificarem a teoria. Esta explicação é até a predominante geralmente no grande público.

Um homem romântico é um tipo pálido e tristonho, exibindo mágoas e desconsolos.

Uma moça romântica é uma criaturinha meio fantástica, de olhos langues, descoradas faces, um todo feito de sonhos e quimeras…

Quem não vê que os delírios passageiros de um tempo não podem constituir a força, a substância ativa de uma literatura? Não é o bom ou o mau-humor dos poetas que marca a índole das doutrinas e dos sistemas literários. O romantismo não possuiu somente chorões reais ou afetados : teve também muitos espíritos equilibrados e expansivos a comunicarem entusiasmos e alegrias.

Foi preciso à crítica inventar outra medida, outra toesa para marcar os poetas, romancistas e dramaturgos.

O romantismo foi o predomínio da imaginação, o principado da fantasia.

Que é um livro romântico? É um livro fantástico, eivado de miragens, de encantamentos, como o Ahasvérus de Quinet. Que é um herói romântico? É um ente raro, miraculoso, uma espécie de arquétipo em contraste com o mundo positivo, vivendo duma vida ideal.

Vítor Hugo criou uma galeria deles: Bug-Jargal, Jean Valjean, Quasímodo, Hernâni, Cimourdin, Lantenac, Ângelo e trinta outros.

Por menos que se deseje uma literatura que seja uma expressão da realidade, uma notação da vida mundana, não é possível desconhecer a falsidade das criações dos romances e dramas do grande lirista francês.

Se o romantismo tivesse ficado naquilo, teria sido um movimento insignificante, desprezível, e o próprio Hugo, se tivesse produzido só esses disparates, seria hoje um nome esquecido, justamente esquecido.

Houve, porém, momentos em que os românticos deixavam os sonhos e aproximavam-se da realidade. Balzac foi um deles. Para esses o romantismo era a última palavra das criações literárias: tinha uma base científica, e seu fim era representar a vida das almas humanas, a história natural dos caracteres, como a biologia é a história natural da vida orgânica nos seus domínios inferiores.

Era esta uma pretensão exagerada, em desacordo com as maiores invenções do sistema.

Não estavam esgotadas as doutrinas e as explicações.

É mister aprender a natureza da teoria feita pelos seus grandes representantes. Em 1830, em artigo consagrado às poesias de André Dovale, artigo reproduzido no prólogo de Hernâni, Vítor Hugo definia a nova escola — o domínio do liberalismo na arte. Se bem entendo o poeta espiritualista, o romantismo não era uma questão de idéias filosóficas, senão uma certa franquia na escolha dos assuntos e no modo de os tratar. Os clássicos tinham assuntos, idéias e linguagem consagrados; labutavam num círculo estreito a remexer velhos manequins duma retórica esta fada. O classismo era uma espécie de pagem da velha realeza. As idéias revolucionárias abalaram os tronos, entraram pela literatura adentro e desconcertaram as poentas cabeleiras clássicas.

Houve um grande acordar para a vida, a liberdade penetrou em todos os recessos do pensamento. Este o grande feito do romantismo.

É a verdade em parte; não dá, porém, toda a medida das novas tendências. Bem cedo o novo sistema teve também sua retórica vazia e retumbante, inanida e fútil. Vítor Hugo bem contribuiu para formá-la e difundi-la pelo mundo latino. Ao lado e ao tempo do cantor das Contemplações, Alfredo Musset, depois dos desvarios de 1830, ridicularizava a grande escola de que era ele um dos mais prestimosos ornamentos.

Em 1836, em artigo inserto na Revue des Deux Mondes, satirizava a literatura corrente, mostrando não ter ela nada avançado além da que a precedera a não ser o emprego abusivo de adjetivos.. . O primeiro poeta francês do século XIX pôs o dedo em cima de uma das chagas da romântica. Espíritos de segunda e terceira classe, rábulas e mezinheiros das letras, imiscuíram-se no meio dos grandes mestres e deitaram a perder o trabalho dos prógonos.

Sem idéias e sem vis criadora, apegaram-se às franjas da linguagem e esvaziaram a literatura do século.

A sátira do autor de Don Paez e de Porcia atinge perfeitamente o alvo; tem a sensatez da justiça.

Compreende-se, entretanto, não ser suficiente o gracejo humorístico do poeta de Rolla para definir e diferenciar um movimento literário, que se protraiu por mais de setenta anos.

Mais profundo, ou antes, profundamente sério, foi o programa traçado à nova escola por Frederico Schlegel em 1796. Sabe-se que os críticos alemães excluem da escola romântica Lessing, Klopstock, Herder, Goethe e Schiller.

O movimento romântico alemão é para eles posterior ao famoso período clássico em que floresceram aqueles grandes gênios, e começou com Schlegel no ano precitado

Ainda fazendo tão grande desconto, o romantismo germânico é bem anterior ao seu pretensioso irmão francês.

O manifesto literário de Schlegel consigna como idéia capital da doutrina o aproveitar-se ela dos ensinamentos da ciência, da história e da crítica. É evidentemente um prenúncio, uma antecipação ao filosofismo ou cientificismo defendido por alguns poetas pós-românticos. Schlegel queria apenas fornecer à poesia armas novas; aproximá-la das grandes lutas modernas, sem despi-la, porém, de seu caráter específico. Mal compreendida a idéia do romântico tedesco, pode-se tombar nas mais grosseiras extravagâncias. Em todo caso, seu programa não foi seguido; a poesia caminhou por um lado e a ciência por outro.

A doutrina de Schlegel, incompleta e ineficaz para explicar a índole da poesia e da literatura do século, foi adotada e desenvolvida por aqueles moços, que tomaram a Heine e Bcerne por chefes, e são conhecidos na história com o nome de Jovem Alemanha.

Para eles o grande desiderátum da literatura do tempo era lutar, pugnar pela liberdade política, social e religiosa. Devia para tanto lançar de preferência mão da prosa.

Seria isto muito bom nos panfletos políticos, nos escritos de polêmica, nas obras de crítica. Na poesia o eterno e cediço badalar contra Deus e o Cristo, contra o papa e os reis, será de muito alcance nas mãos ou na boca dos entusiastas e propagandistas; mas como arte, como poesia, é preferível ir ali a um sítio qualquer ouvir uma sertaneja cantar algumas trovas populares.

O que alguns sonhadores novos, tomados de ânsias demagógicas ou de religiofobia, julgam conquista novíssima de suas cabeças, é em verdade cousa bem velha no seio do velho romantismo. Não o explica, entretanto.

Mais alentada é a idéia de quem, como Grimm, julga ser a notação fundamental da literatura do XIX século — a volta de todas e de cada uma das nações às suas criações populares.

Foi esta certamente uma das grandes obras do romantismo. Ajudado pela crítica, pela lingüística e pela mito-grafia, ele penetrou na região encantada das lendas, dos contos, das canções, das crenças populares. A nativização, a nacionalização da poesia e da literatura em geral foi, talvez, o maior feito do romantismo. Não o explica de todo.

Tampouco o esclarece dizer, com Zola, que sua função histórica foi preparar a língua para ser empregada pelo naturalismo hodierno. Resultado inconsciente este, não constituiu jamais o programa de uma escola.

Que foi então o romantismo?

Tentarei explicá-lo. A diferença existente entre a literatura do século XIX e a literatura dos outros tempos é a mesma que existe entre a ciência e a filosofia do século XIX e a ciência e filosofia dos outros tempos.

A evolução intelectual obedece à lei do consensus em todas as suas faces. Filosofia nova, literatura nova.

Ora, a filosofia dos outros séculos estava no absoluto e a nossa está no relativo; a antiga era a priori e a nossa é a posteriori. Aquela tinha um direito universal, uma gramática universal, uma arte universal, um modelo universal para tudo; esta ensina ser o direito uma função da vida nacional, a língua uma formação nacional, a poesia uma idealização nacional. Há tantos direitos, gramáticas e artes originais, quantas são as raças que dividem a humanidade.

A poesia clássica tinha idéias, linguagem, forma predeterminadas; a poesia nova quebrou o molde antigo e vazou-se em tantos moldes novos, quantos povos e até quantos indivíduos de gênio poetaram.

O romantismo foi, pois, uma mudança de método na literatura; foi a introdução do princípio da relatividade nas produções literárias; foi o constante apelo para o regímen da historicidade na evolução da vida poética e artística.

Daí a liberdade, a generalidade de suas criações; ele descentralizou as letras; nacionalizou-as nuns pontos, pro-vincializou-as noutros, individualizou-as quase por toda a parte.

Neste sentido largo o romantismo é a literatura do presente e pode-se dizer que será a do futuro, não passando os sistemas de hoje de resultados necessários seus.

Foi a reforma nas ciências do espírito, a reforma dos métodos históricos, que influiu imediatamente na literatura.

Os seus iniciadores partiram da análise dos fatos, da relatividade das cousas; saíram do absoluto e procederam por via de indução. Lessing reformou a crítica literária, Winckelmann a crítica artística, Kant a crítica do conhecimento, Herder a crítica histórica, Wolf, Heine, Hermann, Lobeck, Kreuzer a crítica mitológica. Goethe e Schiller surgiram e a poesia nova estava criada. Movimento análogo dava-se entre os ingleses influenciados pela filosofia de Hume.

A história literária, como se escreve em Brasil e Portugal, faz partir a nova literatura de Montesquieu, de Voltaire e nomeadamente de Rousseau. É esquecer que o melhor das idéias de Montesquieu e Voltaire, em quem todos falam e que ninguém lê, é proveniente da Inglaterra, habitada e estudada por eles.

Rousseau, que se inspirou também na Inglaterra e na Suíça, exerceu duas influências perniciosíssimas: a política do Contrato Social, abstrata, ideológica, absoluta, cujos maus efeitos a Revolução patenteou; nada mais contrário à intuição política do século XIX; a literária, da Nova Heloísa e do Emílio, anti-humana, doentia, anti-cultural, cujos desatinos cobriram de descrédito uma parte dos seus adeptos.

Rousseau não é o pai da literatura do século XIX nas suas culminações. Maior influência teve Diderot, sem contudo ser o chefe da intuição literária dos novos tempos.

A teima de fazer do amigo de Madame d’Epinay o supremo inspirador das idéias do mundo hodierno é alguma cousa de análogo à mania de fazer de Carlos Magno um francês, da arte gótica um produto da Gália, da Renascença e da Reforma umas afilhadas do espírito parisiense.

A literatura do século XIX, a despeito de sua grande variedade, obedece a um princípio comum; nela o espírito percuciente vai descobrir os fios diretores de uma grande unidade de método e de intuitos gerais.

Na Europa atravessou períodos diversos em seu desenvolvimento filogenético, e mesmo na formação ontogénica de cada um de seus grandes representantes.

Goethe e Vítor Hugo, por exemplo, podem servir de belos espécimens de ontogênese literária. Atravessaram fases diversas e são como uma espécie de resumo da evolução cultural de alemães e franceses.

Volvamos as vistas para o nosso país.

A primeira irrupção do romantismo no Brasil, é costume dizer-se, foi o presente feito de Paris por Domingos de Magalhães de seus Suspiros Poéticos e Saudades em 1836, justamente no ano em que o bom Musset ridicularizava os excessos dos ultra-românticos.

Já provei anteriormente a falsidade desse boato histórico. É preciso recuar dez anos para pegar nas mãos as primeiras manifestações brasileiras da escola.

Já as indiquei; e é inútil repetir-me agora.1

Partamos, entretanto, de Magalhães e do ano de 1836.

Os fenômenos históricos na vida positiva das nações não se produzem em globo, nem se produzem isoladamente, como as abstrações de um quadro lógico. Manifestam-se orgânica e gradativamente.

O primeiro trabalho a fazer-se agora aqui, antes da caracterização específica dos tipos literários, é a notação precisa das fases da evolução.

A literatura rege-se pela lei do desenvolvimento à maneira das formações biológicas. Ainda como as criações biológicas, ela tem a sua luta pela existência, onde as idéias mais fracas são devoradas pelas mais fortes. As idéias têm todas um elemento hereditário e tradicional e um elemento novo de adaptação a novas necessidades e a novos meios.

Cada nação tem seu patrimônio de idéias representativas do seu desenvolvimento natural: é a filogenia literária, repetindo a linguagem de Haeckel. Cada grande tipo tem forças e impulsos próprios, além daqueles que recebe por herança: é a ontogenia literária, para falar ainda como o célebre naturalista.

A idéia de força e de luta domina sempre as grandes e até as pequenas literaturas; é o pugnar das idéias, das teorias, das opiniões; são as polêmicas, a guerra intestina dos sistemas. Uma literatura pacífica é uma literatura morta.

As letras seguem a marcha da civilização, porque elas são um produto da cultura e não da natureza.

Entre nós, como por toda a parte, o romantismo passou por« momentos diversos. Cada momento teve seus prógonos e seus epígonos.

O primeiro momento da romântica brasileira foi aberto sob a influência de Lamartine; é a fase religiosa, emanué-lica. Domingos de Magalhães foi o prógono, o chefe.

Porto Alegre, Teixeira e Sousa, Norberto Silva, João Cardoso foram os continuadores, os epígonos.

A esta fase seguiu-se muito de perto e pode-se dizer quase simultaneamente, o momento do indianismo, do americanismo, inspirado por Chateaubriand e Cooper.

1. Vide, no princípio deste volume, pâg. 701, a parte que trata de Maciel Monteiro principalmente.

Gonçalves Dias foi o propulsor nunca excedido do gênero.

Viu-se o curioso fenômeno de constituírem-se satélites do grande poeta maranhense todos aqueles, mais velhos, que tinham aberto a fase proximamente anterior. Foram-no durante algum tempo, deixando-o mais tarde. Além desses, o indianismo na poesia teve outros cultores, todos pequenos e hoje anônimos.

Não falo no romance e no drama, que serão vistos depois; falo da poesia, cujo desenvolvimento foi mais normal.

Depois do indianismo rasgou outras perspectivas ao romantismo brasileiro o genial espírito de um moço de vinte anos.

Vinha imbuído de idéias mais gerais, mais universais. A poesia não era daqui nem dali. Pálida e melancólica peregrina, era a hóspeda das almas ardentes em todos os tempos, sob todos os céus, ao calor de todos os sóis, ao sussurrar de todas as brisas.

Byron e Musset eram os deuses instigadores desses entusiasmos juvenis. Álvares de Azevedo foi o prógono de uma grande geração. Bernardo Guimarães, Aureliano Lessa, José Bonifácio, Teixeira de Melo, Casimiro de Abreu, Bittencourt Sampaio, Franklin Dória, Bruno Seabra, e trinta outros, formaram um grupo em torno da figura do poeta da Lira dos Vinte Anos. Isto em sentido muito geral.

O romantismo não se podia esquecer, deixar-se morrer nessa poesia de muitas mágoas e poucas alegrias.

Novos talentos forcejaram por arrancá-lo àquele torpor. Como acontecera nos anteriores movimentos, pediram um chefe à literatura da velha Europa.

Desta vez foi Vítor Hugo, com o seu lirismo ardente, arrebatado, e com seu humanitarismo simpático, o mestre escolhido. Tobias Barreto foi o provocador do movimento. Cercaram-no em ruidoso alvoroço, numa espécie de naturalismo lírico e socialista, as belas figuras de Castro Alves, Vitoriano Palhares, Guimarães Júnior, Altino de Araújo, Castro Rebelo, ao Norte do Brasil; e ao Sul, sob a influência direta de Castro Alves, Carlos Ferreira, Elzeário Pinto e alguns outros, que desaparecem no anonimato.

Foi em rigor o último instante do romantismo conscientemente praticado como tal.

Depois principiaram a surgir tentativas de reforma. Sílvio Romero2 atacou o velho sistema em repetidos artigos de crítica, apresentando a fórmula de uma poesia nova, inspirada na ciência e na filosofia do dia. Adotada, naquele tempo, a mesma intuição pelo moço Teixeira e Sousa, foi depois exagerada, especialmente por Martins Júnior e raros mais.

Ao lado desse filosofismo ou cientificismo, ergueu-se o lirismo despreocupado, visando fazer a poesia pela poesia, cultivando de preferência a forma. Eram os seguidores de Leconte de Lisle e de Banville.

É o grupo a que se deu o nome de. parnasianos. Inclinavam-se já para um naturalismo seleto, já para os puros domínios da fantasia. Quase toda a moderna poesia brasileira veio postar-se deste lado da montanha. Seu representante máximo foi o Dr. Luís Delfino dos Santos.

Com ser já homem velho em idade e velho nas letras, antigo poeta condoreiro, nunca havia tomado parte ativa em nossas lutas. Nos últimos vinte anos do século, porém, desenvolveu uma tal atividade e chegou a um grau tal de renome que foi preciso de então em diante contar com ele.

Em derredor desse decantado poeta lutaram quase todos os moços, disse eu, e, entre outros, devo lembrar os nomes de Teófilo Dias, Raimundo Correia, Alberto de Oliveira, Olavo Bilac e vinte outros com os quais me hei de ocupar oportunamente.

Tais as principais fases do romantismo brasileiro na poesia. No romance e no teatro a evolução não se fez tão normalmente, tão logicamente.

O romance e o teatro hão tido entre nós uma espécie de desenvolvimento episódico e esporádico.

O romance teve uma fase embrionária no velho Teixeira e Sousa; assumiu as proporções de estudo social em Joaquim Manuel de Macedo; multiplicou-se, para atender a todas as cambiantes da nossa população, em José de Alencar; adstringiu-se às populações campesinas em Franklin Távora; tomou feições psicológicas em Machado de Assis e naturalistas em Aluísio Azevedo. Em torno destes têm girado, em suas respectivas épocas, Manuel de Almeida, Escragnolle Taunay, Bernardo Guimarães,,Carneiro Vilela, Araripe Júnior, Celso de Magalhães, Inglês de Sousa, Raul Pompeia e outros.

2. Peço licença para, como tantos outros, falar no meu nome em 3.ª pessoa.

O teatro mostra um desenvolvimento ainda inferior ao do romance.

Pena, Macedo, Alencar e Agrário iniciaram a comédia, e balbuciaram o drama nacional. Não lembro agora as produções dramáticas de Magalhães, Norberto Silva, Porto Alegre e Ernesto França, porque não tiveram grande influência.

Os epígonos do teatro foram Quintino Bocaiúva, Castro Lopes, Pinheiro Guimarães, Sisenandb Nabuco, Aquiles Varejão, França Júnior, Artur Azevedo, sem falar em Machado de Assis e Franklin Távora, mais ilustres no romance e no conto.

Foi este o romantismo brasileiro.3

Será estudado especialmente na poesia, na crítica, na história, na filosofia, nas ciências, nas artes, em todas as manifestações em suma da inteligência desta nação.

O romantismo brasileiro, em seu acanhado círculo, asilou os mesmos debates que o seu congênere europeu. Seu maior título, a meu ver, foi arrancar-nos em parte da imitação portuguesa, aproximar-nos de nós mesmos e do grande mundo.

Seu início havia sido no decênio antecedente; mas seu maior impulso foi nos primeiros anos do reinado do segundo imperador; os dias difíceis da Regência tinham passado; abria-se uma época de grandes esperanças.

Com a inauguração do Império, a existência da corte e das sessões da Câmara dos Deputados e do Senado no Rio de Janeiro, os melhores talentos das províncias afluíam a esta cidade para onde deslocou-se o centro do pensamento brasileiro. O decênio de 1840 a 50 foi talvez um dos de maior efervescência literária havidos no Brasil.

O estudo das revistas do tempo, nomeadamente a Revista do Instituto Histórico, a Minerva Brasiliense e a Guanabara, facilita a reconstrução narrativa do romantismo brasileiro. Foi o tempo em que Magalhães, Porto Alegre, Varnhagen, Torres Homem, Pena, Macedo, Gonçalves Dias, Nunes Ribeiro, Adet, Bourgain, Norberto Silva, Melo Morais, Pereira da Silva, Inácio Acioli, Abreu e Lima, Joaquim Caetano e vinte outros conheciam-se, relacionavam-se, encontravam-se no Instituto Histórico, em casa de Paula Brito, ou na Petalógica do Largo do Rossio.

3. A determinação das fases do romantismo brasileiro foi Já por mim feita na Literatura Brasileira e a Critica Moderna, no Epílogo, e recentemente, sob forma mais completa, na memória literária que faz parte do livro do 4.] Centenario do Brasil.

 

Montalverne ainda vivia e era uma força atrativa para essa gente. Não existia naquele grupo nenhum gênio de primeira grandeza; mas achavam-se ali alguns dos mais valorosos talentos que este país tem produzido.

O decênio anterior (1830-40) foi dos primeiros ensaios daquela plêiada de escritores. Todo este período é o que se poderia chamar a escola fluminense na literatura brasileira.

O Rio de Janeiro é uma lindíssima cidade, capaz de ser uma terra de poetas e pensadores. O homem, em luta com a vida do espírito, precisa de procurar descanso e alentos no mundo exterior, e aqui ele os poderá achar e variadíssimos.

É uma cidade de pedra como Paris, e não de tijolos como Londres. De um lado é cercada pelo mar, que lhe proporciona o belíssimo porto, semeado de ilhas e circulado de morros; de outro lado estende-se pela planície adentro a encontrar outras montanhas, que a fecham como em círculo. Tudo isto adereçado de viçosa e pujante vegetação; grandes pedaços de mata virgem dão em muitos arrabaldes ainda hoje o espetáculo das florestas do interior.

A princípio a população era retraída e modesta. Depois, nos quarenta e nove anos do reinado do segundo imperador, mudou ela inteiramente de aspecto e de índole. O comércio cresceu; os interesses multiplicaram-se; uma enorme imigração das províncias e do estrangeiro invadiu a cidade, onde tudo tomou um aspecto transitório e flutuante.

Dizem que só por si este famoso Rio vale todo o Brasil… Não duvido que assim seja; porém não conheço outra cidade no país menos nacional do que esta. É sem dúvida a primeira na riqueza material, nos interesses de momento, nos prazeres fáceis, nos arranjos políticos. Não é a primeira no amor e nas tradições da pátria. Um não-sei-quê de cético, material e frívolo invadiu o geral dos espíritos; o amor do dinheiro sem trabalho, o favoritismo político e o gozo mercenário das mulheres tomaram proporções assustadoras numa terra deposta em leito de granito, cercada de montanhas de granito, onde parece que os caracteres deviam ser de bronze e as inteligências de ouro… Entretanto, a primeira fase do romantismo mostra ainda algumas inteligências sérias.

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