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XLIV. Mas, depois da batalha de Isso (47), mandou buscar
na cidade de Damas o ouro e a prata, a bagagem, as mulheres e as crianças que os persas tinham ali deixado. Lá
os soldados da Tessália atenderam muito bem às suas necessidades, mesmo porque ele
deliberadamente os enviara com essa intenção, porque os vira cumprir seu dever
no dia da batalha. Todavia, também o resto do exército encheu-se de riquezas. E
então pela primeira vez os macedônios tiveram o gosto do ouro e da prata, das
delícias, das mulheres e da maneira de viver dos persas, nem mais, nem menos do
que os cães de caça depois de encontrarem os vestígios do animal perseguido,
não desejando outra coisa senão essa opulência persa.

(47) Na Cilicia, entre os
montes Tauro e Amano.

XLV. Não obstante, foi Alexandre de opinião que
primeiro era melhor consolidar a posse das províncias baixas e marítimas. Assim
vieram incontinenti ter com ele os reis, que lhe puseram entre as mãos o reino
de Cipro e toda a Fenícia, excetuada a cidade de Tiro (48), diante da qual
estabeleceu o sítio e ali ficou sete meses, assaltando-a com grandes sortidas
que mandou lançar do mar com duzentas galeras e por terra com numerosos
engenhos de bateria. Durante o sítio, foi avisado uma noite de que Hércules lhe
estendia a mão por cima das muralhas da cidade e o chamava pelo nome, e também
vários tírios sonharam, dormindo, que Apolo lhes dizia desejar colocar-se ao
lado de Alexandre, porque não lhe agradava o que estava sendo feito dentro da
cidade; em virtude disso, ligaram e prenderam sua estátua, que era de tamanho
excessivo, com numerosas correntes, e prenderam-na bela base com grandes e
grossos pregos, nem mais, nem menos do que se tratasse de algum traidor que
pretendesse entregar-se, chamando-lhe Alexandris-ta, isto é, parcial que
favorece Alexandre. Ainda ali teve Alexandre outra visão dormindo, pois lhe
aconteceu ver um sátiro que de longe zombava dele, mas, quando ele se
aproximava para prendê-lo, es-capava-lhe sempre, até que finalmente, depois de
muito o ter provocado e corrido ao redor dele, caiu-lhe nas mãos. Os adivinhos,
consultados sobre tal sonho, responderam, com muito verossímil aparência, que
bastava dividir em dois a palavra Satyros, dizendo sa Tyros, que significaria a
cidade de Tiro será tua; e mostra-se ainda a fonte ao pé da qual lhe aconteceu
ver a sátiro.

(48) A Fenícia fica ao longo do Mediterrâneo, descendo
da Cilicia. Tiro fica na costa; ficava numa ilha, ao tempo de Alexandre, e
distante 40 estádios do continente, segundo Quinto Cúrclo, ou 700 passos,
segundo Plínio. As obras empreendidas por Alexandre a reuniram ao
"ontinente. A antiga Tiro, chamada Palétiro, ficava no continente, a 30
estádios da ilha.

XLVI. Durante o sítio, foi fazer a guerra aos
árabes, habitantes ao longo do monte chamado Antilíbano (49), onde sua pessoa
correu grande perigo, por ter esperado seu preceptor Lisímaco que o havia
seguido dizendo que não era pior nem mais velho do que
Fénix: quando chegaram ao pé da montanha, deixaram os cavalos e começaram a
subir o monte a pé; mas, tendo ele o coração tão gentil que não queria deixar
atrás seu mestre de escola, já tão cansado que não podia mais, mesmo porque a
noite descia e os inimigos não estavam longe deles, deteve-se na retaguarda
para dar-lhe coragem de caminhar e levá-lo quase até à metade do caminho, de maneira
que se viu distanciado do exército com muito poucas tropas, e surpreendido pela
noite e pelo frio cortante, num lugar mau e rude, onde de longe via muitos
fogos que os inimigos tinham acendido em vários pontos, e confiando na
disposição de sua pessoa, além do seu costume de sempre remediar com trabalho
próprio as dificuldades e necessidades em que se encontrassem os macedônios,
pondo ele próprio mãos à obra, avançou para os que haviam acendido os fogos
mais próximos e, matando com a espada dois dos bárbaros que estavam deitados ao
longo do fogo, arrebatou um tição e com ele retornou aos seus homens que
acenderam um grande fogo, com o que alguns bárbaros ficaram de tal maneira
aterrorizados que se puseram em fuga, e os outros que pretenderam atacá-lo foram
por ele derrotados. Assim, pode sem perigo alojar-se por essa noite com sua
sente, conforme escreveu Cares.

(49) Parte do Líbano, do lado da Arábia deserta.

XLVII. O sítio de Tiro teve
afinal este desfecho: Alexandre fazia repousar a maior parte do exército,
estando cansado e castigado por tantos combates que suportara, e enviava pouca
gente ao assalto apenas para impedir que os tírios repousas sem; e um dia o adivinho
Aristandro, tendo sacrificado aos deuses e considerado os sinais das entranhas,
afirmou com muita segurança aos assistentes que a cidade seria tomada até ao
fim do mês, de modo que todos começaram a rir, zombando dêle, porque era aquele
o último dia. Então Alexandre vendo-o desapontado, como se não soubesse o que
dizer, e esforçando-se sempre por dar relevo às predições dos adivinhos, mandou que nao se con tasse
aquele dia como o trigésimo, mas como o vigésimo-sétimo, e imediatamente fez soar as trombetas e
ordenou o assalto à mais forte muralha que havia encontrado desde o começo. O combate foi aspérrimo, pois aqueles mesmos
que tinham ficado dentro do acampamento tiveram de sair em soco dos que haviam
sido destacados para o assalto dessa forma, os tírios, vendo-se tão
furiosamente atacados de todos os lados, perderam a coragem, assim foi a cidade
tomada naquele mesmo dia.

XLVIII.
Depois, como estivesse diante de Gaza (50), cidade principal e a maior da Síria caiu-lhe às costas um fragmento de
terra, largada do alto por um pássaro em vôo. O pássaro foi pousar sobre um dos engenhos de bateria com os quais era atacada a cidade,
e ficou preso e enleado dentro das redes feitas de nervos que serviam para
virar as cordas dos engenhos. Aristandro predisse que isso significava que ele
seria ferido nas costas, mas tomaria a cidade, como de fato aconteceu. E, como
enviasse a sua mãe Olímpia, a Cleópatra e aos amigos muitos presentes dos
despojos ganhos no saque da cidade, enviou entre outras coisas quinhentos
quintais de incenso ao governador Leônidas, e cem de mirra, lembrando-se da
esperança que outrora ele lhe dera quando ainda criança; como um dia
sacrificasse aos deuses, tomando incenso com ambas as mãos para pô-lo no fogo
de fazer perfume, viu-o Leônidas e disse-lhe: "Quando tiveres conquistado
a região onde crescem as drogas e especiarias, farás perfumes à vontade; por
enquanto, porém, contenta-te com usar mais parcimoniosamente o que
possuis". Alexandre, lembrando-se então de sua advertência, escreveu-lhe
desta maneira: "Nós te enviamos incenso e mirra em abundância, a fim de que
doravante não sejas avaro com os deuses.

(50) No mar Mediterrâneo, ao SUl de Áscalon, na
Palestina.

XLIX. Levaram-lhe
também um pequeno cofre, considerado como a mais rica e mais preciosa jóia por ele
ganha na derrota de Dário; e perguntou aos seus favoritos o que lhes parecia
mais digno de ser posto dentro. Uns lhe disseram isto, outros aquilo. Mas ele
disse que ali colocaria a Ilíada de Homero para guardá-la dignamente. Isso
testemunham e escrevem todos os historiadores mais dignos de fé. E, se é
verdade o que os de Alexandria contam baseados no testemunho e no relato de
Heráclides, parece que Homero não lhe foi inútil nessa viagem; pois diziam que,
quando ele conquistou o Egito, quis ali construir uma grande cidade, povoá-la
com grande número de habitantes todos gregos e denominá-la com o seu próprio
nome; e estava já pronto para marcar e murar determinado lugar que lhe fora
indicado pelo conselho dos engenheiros ~4 mestres operários, quando teve na
noite anterior uma visão maravilhosa: aconteceu que foi apresentar-se diante
dele um personagem com os cabelos todos brancos de velhice, a face e a presença
veneráveis. o qual se aproximou pronunciando estes versos:

Uma ilha existe em meio ao mar
profundo,
Diante do Egito, esse país fecundo,
E por seu nome Faros é chamada.

L. Mal se levantou pela manhã, foi ver essa ilha
de Faros, então situada um pouco acima da embocadura do Nilo que tem o nome de
Canóbica. mas agora se junta à terra firme por um dique feite a mão; e
pareceu-íhe que era no mundo a base mais conveniente para o que tinha em mente
fazer, pois é como uma língua ou uma coluna de terra razoavelmente larga que
separa de um lado um grande lago e do outro o mar, o qual aí termina num grande
porto. Disse ele então que Homero era admirável em todas as coisas, mas que
entre outras era um sábio arquiteto, e mandou que, prontamente lhe construíssem
e designassem a forma da cidade, segundo a topografia do lugar. Como não
achassem imediatamente giz ou terra branca para marcar, tomaram farinha e sobre
a terra negra traçaram um grande recinto curvado em figura circular, cuja
circunferência terminava internamente em duas bases retas de igual tamanho e
que encerravam toda a área do recinto em forma de manto macedômco. Alexandre
achou bonito o desenho e ficou muito satisfeito; mas, de repente, uma infinita
multidão de grandes pássaros de todas as espécies levantou-se do lago e do rio,
em número tão grande que o ar se obscureceu como por efeito de uma grande
nuvem, e, vindo pousar naquele recinto, comeu toda a farinha sem nada deixar de
sobra.

LI. Perturbou-se Alexandre com o presságio, mas lhe
disseram, os adivinhos que não devia aborrecer-se, porque era sinal de que ele
construiria ali uma cidade tão fértil em todos os bens que bastaria para
alimentar todos os povos. Mandou então que se lançassem à obra aqueles aos
quais dera esse encargo, tomando ele o caminho do templo de Júpiter Âmon. A
estrada era longa e havia muitos trabalhos e dificuldades, mas dois perigos
principais entre todos os outros:
um era a falta de água, em virtude da qual há vários dias de país deserto e
inabitável; e outro era que o vento do meio-dia se levantasse impetuoso
enquanto estavam a caminho e revolvesse as areias de extensão e profundidade
infinitas, como dizem que outrora uma tormenta de tal maneira abalou aquelas
planícies, formando montões de areia, que cinquenta mil homens do exército de
Cambises morreram soterrados. Não havia ninguém no séquito que não relatasse e
previsse bem esses perigos; mas era difícil dissuadir Alexandre de qualquer
coisa que tivesse vontade de fazer, porque a fortuna, sendo-lhe favorável em
todas as empresas, tornava-o íntegro e firme em suas opiniões, e a grandeza de
sua coragem fazia que se obstinasse invencivelmente em todas as coisas, desde
que as tivesse empreendido, ao ponto de querer forçar não só os inimigos, mas
também o tempo e os lugares. Em suma, os socorros e os remédios que Deus lhe
deu contra as dificuldades e perigos dessa viagem foram considerados mais
críveis do que as respostas que dizem haver-lhe dado mais tarde e, o que é
mais, fizeram que de modo algum se prestasse fé aos oráculos que, segundo se
escreve, lhe foram respondidos. Em primeiro lugar, as grandes águas caídas do
céu e as contínuas chuvas os preservaram do perigo da sede, quebrando a secura
da areia, que se tornou úmida e ligada, de maneira que o próprio ar ficou mais
suave, mais fresco e mais límpido. Ademais, como fossem confusos os limites e fronteiras nos
quais os guias reconheciam o caminho, de sorte que erravam aqui e acolá sem
saberem mais aonde irem, apareceram-lhes corvos que os guiavam voando diante
deles, apressando-se a voar quando viam que eram seguidos e esperando-os quando
eles ficavam para trás. E, o que é ainda mais admirá­vel, Calístenes escreve
que à noite, com seus cantos, eles chamavam os que se haviam extraviado, gri­tando
tao forte que os repunham no rumo certo.

LlI Por fim, tendo atravessado o deserto,
chegou ao templo que procurava. Ao chegar, sau-dou-o o grande presbítero da
parte do deus, como de seu pai; e Alexandre perguntou-lhe se tinha escapado
algum dos que lhe mataram o pai. Res-pondeu-lhe o presbítero que se guardasse
de blas­femar, porque seu pai não era mortal. Enquanto, retomando a conversa,
perguntou-lhe se os assassi­nos que haviam conspirado a morte de Felipe ti­nham
sido todos punidos; e depois o interrogou também sobre a sorte do seu império e
se ele lhe concederia a graça de torná-lo monarca do mundo inteiro. Pela boca
de seu profeta, o deus respondeu-lhe que sim, e que a morte de Felipe tinha
sido inteiramente vingada. Fez ele então magnífi­cas oferendas ao deus e
distribuiu dinheiro com largueza aos presbíteros e ministros do templo. Eis aí
o que escreve a maior parte dos autores sobre o que ele perguntou e sobre o que
lhe foi respondido pelo Oráculo. É verdade que o próprio Alexandre, em missiva escrita à sua
mãe, diz que obtivera algumas respostas secretas do oráculo, as quais lhe comunicaria
a ela somente quando regressasse à Macedónia. Dizem outros que o presbítero,
querendo saudá-lo com expressão mais amável em língua grega, disse-lhe: Ó
Paidion, que quer dizer caro filho, mas a língua o traiu um pouco, porque não
era sua língua natural, e que ele pôs um "s" em lugar de um
"n" no fim, dizendo ó pai Dios, que significa ó filho de Júpiter; e
que Alexandre foi beneficiado por esse erro linguístico, pois entre os seus
homens correu a notícia de que Júpiter lhe chamara seu filho.

LIII. Dizem também que ele quis ouvir o filósofo Psâmon
no Egito e que achou muito boa uma sentença por ele proferida, ao dizer-lhe que
Deus era rei dos homens: "Porque, dizia ele, aquele que rema e domina
todas as coisas é sempre divino". Mas ele próprio discorreu com melhor
razão e mais filosoficamente, quando disse que Deus era pai comum de todos os
homens, mas que particularmente ele julgava por si mesmo e confessava seus os
homens de bem". Em suma, com os bárbaros mostrou-se mais arrogante e fazia
menção de acreditar firmemente que teria sido gerado por aquele Deus, mas com
os gregos falava dessa genitura divina com mais sobriedade e mais modéstia.

Todavia, numa carta que escreveu aos atenienses sobre a
cidade de Samos, diz: Não vos dei essa nobre e franca cidade, pois a tendes
como dom daquele que então se chamava meu senhor e meu pai", com
referência ao rei Felipe. Mas depois, tendo sido ferido por uma flechada e
sentindo-se em grande sofrimento, voltou-se para os amigos e disse-lhes:
"Isto que corre de minha ferida é verdadeiro sangue, e não como diz
Homero (51):

Um licor que
afinal parece mais
O que flui entre os deuses imortais.

E um dia, por ocasião de uma tempestade tão violenta que toda a gente
estava aterrorizada, Ana-xarco, o Retórico, que se achava junto dele,
disse-lhe: "E tu, filho de Júpiter, farias outro tanto: Alexandre, rindo,
respondeu-lhe: "Não quero se: temível aos meus amigos, como queres que eu
seja quando desprezas o serviço de minha mesa vende colocarem peixes em cima e
dizendo que ali deveriam ser vistas cabeças de príncipes e de sátrapas" Pois
na verdade dizem que um dia, como Alexandre enviasse alguns pequenos peixes a
Hefe: tio, esse Anaxarco deixou escapar da boca aquelas palavras, para
pilheriar e mostrar que tanto faz conquistar grandes estados e altos lugares de
autoridade acima dos outros, com tantos
trabalhos e perigos, como não ter nada absolutamente ou muito pouco mais do que
os outros nos prazeres e delícias deste mundo. Quando pois não houvesse outra
prova nem outras razões além das que enumeramos, ainda por estas se poderia
julgar que Alexandre não abusava nem se orgulhava dessa presunçosa opinião de
pensar que fora gerado por um deus, mas servia-se disso para manter os outros
homens sob o jugo de obediência, pela sugestão que lhe fazia dessa divindade.

(51) Íliada, 1. V, v. 340. Na tradução de Carlos Alberto
Nunes, edição de Pasquale Petraccone: ‘"Escorreu, logo, o licor da
deidade imortal, sangue que corre nas veias de todos os deuses eternos".

LIV. Ao partir do Egito, retornou à Fenícia, onde
fez sacrifícios, festas e procissões em honra dos deuses, e também danças,
representações de tragédias e outros passatempos que tais, muito belos de se
verem não só pela magnificência do aparato, mas também pela afeição e
diligência dos participantes, que se esforçavam quanto podiam rivalizando uns
com os outros, pois eram os príncipes de Cipro os empresários e tudo forneciam
aos atores, nem mais, nem menos do que em Atenas é sorteado um burguês de cada
linhagem do povo para pagar as despesas com tais representações. E emulavam-se
esses senhores com maravilhoso empenho para fazerem o melhor possível, mesmo
Nicocreonte, rei de Salamina (52), em Cipro e Pasícrates, senhor da cidade de
Soles. Coube a esses dois príncipes fornecer os aois mais excelentes atôres,
Pasícrates a Atenodoro e Nico-creonte a Tessalo, ao qual Alexandre muito
favorecia, sem contudo declarar seu favor, senão depois que Atenodoro, por
sentença dos juízes fosse nesse emprego declarado o vencedor. Então, retornando
das representações, disse ele que aprovava e confirmava o julgamento dos
juízes, mas que teria de bom grado abandonado uma parte do seu reino para não
ver Tessalo vencido. E, como os de Atenas o tivessem condenado à multa, porque
lá deixara de aparecer (53) nos dias das bacanais, quando se representavam as
comédias e tragédias, Atenodoro pediu a Alexandre que intercedesse por ele, a
fim de que a multa lhe fosse revelada. Alexandre não quis fazê-lo, mas enviou a
multa, que pagou do seu próprio bolso. Outro bom ator chamado Lícon, natural da
cidade de Escárfia (54), tendo um dia representado excelentemente, entremeou
com habilidade em seu papel alguns versos nos quais lhe pedia como presente
(55) dez talentos. Alexandre pôs-se a rir e atendeu ao pedido.

(52) Construída depois da tomada de Tróia por Teucro,
filho de Telamônio, que lhe deu esse nome, por causa da ilha de Salamina, ma
pátria.
(53)Nas festas de Baco,
pediu a Alexandre, etc.
(54)Escarféia fica no golfo Malíaco, na Lócrida, cognominada
Epicnemidiana, entre os lócrios cognominados ozolos no poente r os lócrios
opuntianos no oriente, diante de Eubéia.Seis mil escudos. — Amyot. 46.687
libras francesas. 76

LV. Nesse ínterim, Dário
escreveu-lhe e também a alguns de seus amigos para pedir-lhes consentisse em
receber dele (56) dez mil talentos como resgate das pessoas prisioneiras em seu
poder, com todos os países, terras e senhorias aquém do rio Eufrates e uma de
suas filhas em casamento para daí por diante ser aliado e amigo. Ele comunicou
essa proposta aos amigos, entre os quais Parmênion lhe disse: "Se eu fosse
Alexandre, aceitaria". "Também eu com certeza o faria, respondeu
Alexandre, se eu fosse Parmênion". Mas, por fim, escreveu a Dano dizendo
que, se ele quisesse vir ao seu encontro seria tratado com toda a humanidade;
se não, por-se-ia a caminho para procurá-lo. Todavia, logo se arrependeu,
porque a mulher de Dário morreu de parto, com o que se mostrou muito
contrariado, porque perdeu um grande meio de fazer conhecer sua clemência e
humanidade. Mas pelo menos inumou o corpo magnificamente, sem nada poupar.

LVI. Ora, havia entre os eunucos camareiros da rainha um
chamado Tireu, aprisionado junto com as mulheres. Ele fugiu do acampamento de
Alexandre e, montando a cavalo, foi ter com Dano para dar-lhe a notícia da
morte de sua mulher. Pôs-se então Dano a lamentar-se com altos gritos, esmurrou
a própria cabeça, com as lágrimas nos olhos, e disse suspirando amargamente:
"Ó deuses! a que infortúnio se reduziram os negócios da Pérsia, pois a
mulher e irmã do rei não só foi feita prisioneira em vida, mas ainda ao morrer
não teve ao menos a honra de sepultura real!" Ao que logo respondeu o
eunuco: "Quanto à sepultura, Sire, e a toda honra e dever que se pudessem
desejar, não poderias lamentar a má fortuna da Pérsia. Pois à rainha Estatira,
enquanto viveu cativa, nem a tua mãe, nem a tuas filhas, faltou nenhum dos bens
nem das honras que costumavam ter antes, senão a de ver a luz de tua glória, a
qual o senhor Orosmades restituirá ainda inteiramente, se lhe aprouver; nem foi
sua morte destituída de nenhum ornamento de funeral que pudesse ter em outra
parte, mas honrada com as lágrimas dos próprios inimigos. Alexandre é tão doce
e humano na vitória quanto áspero e valente em combate" . Ouvindo essas
palavras do eunuco e estando com o senso perturbado pelo desgosto, Dário entrou
incontinenti em más suspeitas e, retirando o eunuco à parte, para o mais
secreto lugar de sua tenda, disse-lhe: "Se tanto quanto a fortuna dos
persas não te tornaste macedónio por afeição, mas ainda em teu coração
reconheces Dário como teu senhor, peço-te e conjuro-te pela reverência que
deves a esta grande luz do sol e a destra real, que me digas a verdade. Não são
o cativeiro e a morte de Estatira os menores males que eu lamento? E sofremos
nós ainda pior enquanto ela viveu, de sorte que teríamos sido menos indigna c
vergonhosamente infelizes se tivéssemos caído nas mãos de um inimigo cruel e
desumano? Pois que honesta comunicação pode ter tido um jovem príncipe vitorioso com
a mulher prisioneira do inimigo, para que tenha querido prestar-lhe tantas
honras? Enquanto assim Dário ainda falava, o eunuco Tireu lançou-se-lhe aos pés
e pediu-lhe que não proferisse tais palavras e não fizesse essa injustiça à
virtude de Alexandre, nem essa desonra à irmã e mulher falecida, privando-se
ele próprio do maior conforto e da mais doce consolação que poderia desejar na
adversidade, isto é, ter sido vencido por um inimigo que tem perfeições maiores
do que comporta a natureza humana, mas que tivesse admiração pela excelente
virtude de Alexandre, o qual se mostrara ainda mais casto para com as damas do
que valente contra os homens da Pérsia. E, assim dizendo, o eunuco assegurou-lhe
e confirmou-lhe o que dissera por juramentos e execrações horríveis,
contando-lhe longa e pormenorizadamente o que eram a honestidade, continência e
magnanimidade de Alexandre. Então Dano, retornando à sala onde estavam seus
mais familiares amigos e estendendo as mãos para o céu, dirigiu esta prece aos
deuses: "Ó deuses, autores da vida e protetores dos reis e dos reinos, eu
vos suplico em primeiro lugar me concedais a graça de restabelecer a boa
fortuna da Pérsia, de sorte que aos meus sucessores deixe este império tão
grande e tão glorioso como o recebi dos meus predecessores, a fim de que,
ficando vitorioso, eu possa rivalizar com Alexandre em humanidade e
honestidade, das quais ele usou em minha adversidade para com o que neste mundo
me é mais caro. Ou então, se vier o tempo em que necessariamente, ou por
vingança divina, ou por natural mudança das coisas terrenas, o império persa
deva ter fim, ao menos não seja outro senão Alexandre que depois de mim ocupe o
trono de Ciro". A maioria dos historiadores admite que tudo isso se fez e
se disse.

(56)  
Seis
milhões de escudos. — Amyot. 46.688.500 libras francesas.

LVII. Tendo já reduzido à obediência tudo o que está
aquém do rio Eufrates, pôs-se a caminho para enfrentar Dário, o qual descia com
um milhão de combatentes; e ali houve alguém que lhe contou, para passar o
tempo, como os homens do seu exercite se haviam dividido em dois bandos e
eleito para cada qual um comandante-chefe, dando a um o nome de Alexandre e a
outro o de Dário; e que haviam eles começado a hostilizasse, primeiro atirando
torrões de terra, depois utilizando os punhos, mas por fim, já esquentados,
recorrendo a pauladas, de maneira que não se conseguia separá-los. Após ouvir,
quis Alexandre que os dois comandantes combatessem frente a frente entre si,
tendo ele próprio armado o que se chamava Alexandre, enquante Filotas armou o
que recebera o nome de Dário. Reuniu-se à volta o exército todo, para assistir
ao espetáculo desse combate que seria um presságio para o conhecimento e o
julgamento futuro. A luta foi áspera entre os dois campeões, mas afinal venceu
o chamado Alexandre. Como prêmio, deu-lhe Alexandre doze
aldeias e o privilégio de usar o hábito persa. Assim o escreveu Eratóstenes.

LVIII A última grande batalha que teve contra
Dário não foi em Arbelos, como admite a maior parte dos historiadores, mas em
Gausamelos (57), que segundo dizem significa, em língua persa, a casa do
camelo, porque um dos antigos reis da Pérsia, tendo escapado à perseguição dos
inimigos montado num dromedário, ali mandou alojá-lo e reservou para a sua
nutrição e manutenção a renda de algumas aldeias. Ora, houve eclipse da lua no
mês de agosto (58), aproximadamente quando começa a festa dos mistérios, em
Atenas, e na undécima noite seguinte, estando os exércitos à vista um do outro,
dispôs Dano seus homens em ordem de batalha e foi em pessoa, com tochas, passar
em revista os batalhões e companhias. E Alexandre, enquanto dormiam os soldados
macedônios, estava diante de sua tenda com o adivinho Aristandro, ali
praticando secretas cerimônias e sacrificando a Apolo (59).

(57) Vide as Observações.
(58) Vide as Observações.
(59) Os outros exemplares dão: ao
medo, tó phobos. Amyot.

LIX. E os mais antigos capitães macedônios,
inclusive Parmênion, vendo toda a planície entre o rio Nifates e as montanhas
Górdias reluzir aos fogos e às luzes dos bárbaros, enquanto um ruído confuso e
um clamor terrível se ouviam, nem mais, nem menos do que um mar infinito a
ressoar do seu acampamento, assustaram-se com tão grande multidão de homens e
opinaram que seria difícil e quase impossível contê-los a todos num combate à
luz do dia. Dingiram-se então a Alexandre, depois que ele terminou suas
cerimonias, e o aconselharam a travar a batalha durante a noite, porque, assim
fazendo, as trevas ocultariam a seus homens o espantoso poderio inimigo. E
deu-lhes ele esta resposta, mais tarde tão celebrada: "Não quero,
disse, roubar a vitória". Essa resposta, para alguns, parece louca e
presunçosa, pois não se deve pilheriar assim em presença de um extremo perigo.
Mas outros opinam que foi verdadeira magnanimidade presente e bom julgamento para
ele no futuro não permitir que Dario depois de vencido, retomasse coragem
e tentasse outra vez a fortuna, acusando as trevas e a noite como causas de
sua derrota, nem mais, nem menos do que, da vez precedente, costumava dizer
que fora derrotado pelas montanhas, pelos desfiladeiros e pelo mar. Com
efeito, jamais Dário cessaria de guerrear por falta de homens nem de armas,
visto como possuía um grande império e enorme extensão de territórios; mas, a
contrário, desistiria de recorrem às armas quando perdesse toda coragem e toda
a esperança, após se ver
derrotado à viva força, em pleno dia e em lisa batalha.

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