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DEPOIS DA APRESENTAÇÃO DOS PRIMEIROS CAPÍTULOS DO "SÉCULO DE LUÍS XIV" — PONTOS DE VISTA SOBRE HISTÓRIA
Ao Sr. Marquês d’Argenson
Bruxelas, 26 de Janeiro de 1740.
As infâmias de tantos homens de letras não me impedem, absolutamente, de amar a literatura. Sou como os verdadeiros devotos, que permanecem fiéis à religião, a despeito dos crimes dos hipócritas. Confesso-vos que, pela minha vontade, entregar-me-ia inteiramente à Histoire du siècle de Louis XIV, pois que o começo não vos desagradou; mas não posso trabalhar enquanto estiver em Bruxelas; preciso ter as fontes de onde extrair aquilo de que necessito; preciso consultar-vos constantemente. Não possuo material suficiente para construir o meu edifício fora da França. Vou,
pois, mergulhar na metafísica e nos espinhos da geometria, enquanto durar essa infeliz questão de Mine. du Châtelet.
Fiz o que pude para colocar Mahomet nos seus justos limites, sem sacrificar a poesia; mas receio que nessa peça, a preocupação de não dizer tudo que poderia ser dito haja apagado a minha flama. A circunspecção é uma bela coisa, mas em verso é uma coisa bem triste. Ser ponderado quer dizer também ser frio, e isto não honra, absolutamente, a razão. Se eu gozasse de boa saúde e pudesse gabar-me de viver intensamente, gostaria de escrever uma história da França a meu modo. Veio-me agora à cabeça uma ideia engraçada: é que só os que escreveram tragédias poderiam animar de algum interesse nossa história árida e bárbara. Mézeray e Daniel enfadam-me, porque não sabem pintar nem agitar paixões. Na história, como nas peças de teatro, deve haver exposição, enredo e desfecho.
Ainda outra ideia: tem-se escrito apenas a história dos reis, negligenciando-se a da nação. Parece que durante mil c quatrocentos anos não houve nas Gálias senão reis, ministros e generais. Será que nossos hábitos, nossas leis, nossos costumes, nosso espírito nada representam?
Adeus, senhor; meus respeitos e reconhecimento.