CARTA A JACKSON DE FIGUEIREDO (¹)
Rio, 6 de Abril de 1915
Meu caro Jackson
Quando
recebi sua primeira carta, estava seriamente doente, em condições tais que não
podia responder. Caso grave, pois passei mais de um mês de cama.
Mas
por fim passou a crise, com o que dei prova, de grande resistência. E persiste
assim num pensamento que se me meteu na cabeça, de que ainda hei de viver
muitos anos: o que não significa, entretanto, que eu tenha medo da morte, ou
que tenha muito amor à vida. Durante o período de minha moléstia deu-se ainda
um fato que me causou o mais profundo abalo: o suicídio de um rapaz, meu
parente, por quem eu tinha a mais alta estima. Eu, aliás, só vim a ter
conhecimento do que se passou, muitos dias depois. Mas o que sofri, não se
descreve. Veio-me, entretanto, daí uma inspiração que me parece fecunda; e à
força de pensar na morte, creio ter descoberto (estou disto convencido) o
verdadeiro fundamento da religião. Todas as minhas inspirações, pelo menos as
que persistem através de todo o curso de minha vida e dominam o meu pensamento,
vêm sempre da morte de uma pessoa querida.
A
morte de meu Pai deu-me a convicção de que nossa existência não termina com a
morte. Agora a morte desse rapaz dá-me o verdadeiro sentido da religião. Será
tudo isto ilusão? É possível.
É certo, entretanto, que vejo claro e sinto-me bem com essa
ilusão. Lembra-se da questão que levantamos certo dia, quando conversávamos na
Avenida, da possibilidade de uma comunicação entre o homem e a Inteligência
Infinita?
Este
problema continua a torturar-me. Mas na descoberta que julgo ter feito do
verdadeiro fundamento da religião faz-se muita luz sobre o caso.
Fiquei
satisfeitíssimo com a notícia que me dá de ser certa a sua volta ao Rio.
Brevemente teremos de trocar ideias. E não imagina quanto me é isto agradável,
pois não se encontra muito cem quem o fazer nesta terra. Pelo menos,
tratando-se dos assuntos de nossa preocupação.
(i) pp. 104-105
Estou
curiosíssimo por ver o seu trabalho a respeito dos meus livros. Não é o
interesse por ver os meus livros criticados que me faz esta curiosidade; mas o
desejo de ver o testemunho de uma consciência como a sua
sobre o valor das minhas ideias. Isto me fará refletir melhor, e poderei assim
verificar se estou ou não err erro. E é o que importa, pois é só a verdade o
que tenho em vista Abrace o colega muito amigo
R. de Farias Brito