A ALAVANCA HISTÓRICA – gold rush Matogrossense

A ALAVANCA HISTÓRICA

Uma jazida riquíssima havia atraído a atenção dos novos povoadores da terra predestinada.

Isto se dera num dos interstícios do outeiro da Prainha que partindo da hoje capital matogrossense, deriva ondeante para o Nordeste, onde o São Jerônimo se alteia como atalaia soberbo da cidade ridente.

Num daqueles desvãos, que abrem passagem por entre morros, numa apoteose festiva se alteia a imbuveira e a chagueira com as suas grandes favas odoríferas; braceja o tarumeiro, a nobre árvore dos nossos sertões opulentos que ombreia ao loureiro flexível, ao aricá da bela aparência e às galhudas tarumaranas…

Ali, naquele tempo, as cabeceiras se curvavam sob seus víreos pingentes a espelharem-se nos olheirões, de onde, aqui por entre as areias, ali, por entre a pederneira rebrilhante, derivam as fitas de água excelente, que se vão precipitar, algumas dezenas de braças, ao relvoso plaino por onde serpeia o aurífero córrego da Prainha.

Naquele tempo, aquelas humildes correntes requebravam por sobre um leito granido de ouro.

O amor da recém-vinda malta aventureira pelo precioso metal, só se pode aquilatar pela distância de mais de mil léguas por ela percorrida, através dos nososos sertões bravios que encerram a vegetação misteriosa em sua pompa realenga; os lagos e pantanais enormes; as serras con-fractuosas e os melodiosos campos gerais, cortados, em todas as direções, por ,uma rede de ribeirões, estes perpétuos, aqueles, efêmeros e pelos rios semelhantes a mares, que por si sós já revelam a grandeza da nossa terra estupendamente feraz.

Vindos, atraídos pelo ouro, quase somente nele pensavam os descobridores do fertilíssimo torrão.

Haviam chegado, vencendo mil peripécias e provações sem fim, ao El Dorado deslumbrante dos seus sonhos e convicções, ao regaço abençoado das minas inexauríveis.. .

E a malta, ousadamente aventureira, logo ao saber, pelos seus exploradores, da existência, numa ou noutra parte do caro metal, para lá se abalava, como uma lufada impetuosa, numa azáfama única, esquadrinhando e revirando as pedras, escavando o solo, rebolindo a bateia e ajuntando, cada um por suas vez, as preciosas pepitas encontradas.

* * *

Estava destinada aquela garganta do nosso querido morro a ser cenário de um grande movimento, durante muitos dias, de sol a sol.

Por um dos exploradores foi ali descoberto muito ouro, uma riqueza assombrosa e que parecia um sonho, e tendo êle comunicado o que havia visto, aos seus chefes, lhes apresentou um saquitel cheio do metal precioso que havia apanhado em alguns punhados.

A bandeira em peso, precipitou-se em massa, ao local e, como desesperada, doida toda aquela gente, se apertou, naquele lugar, em delirante azáfama em alvoroço febril.

Ouro, mas ouro como nunca haviam encontrado. De ouro, quase só de ouro parecia ser a constituição geológica da terra encantada.

Apanhavam-no em punhados, recolhendo-os às bateias, aos bocós, aos surrões.

Dias e dias durou aquele murmurinho à cata das tão cubicadas pepitas.

Quando começaram a manusear as bateias, já estavam ricos, assombrosamente ricos os heróis aventureiros.

Mas, grandes veios auríferos derivavam para o centro da terra e, por isso, procediam eles a escavações produtivas.

Escavados alguns palmos abaixo do solo, deram, repentinamente, com uma ponta de alavanca, grossa alavanca de ‘ouro que, admirados, experimentaram inutilmente arrancar.

Espalhados já, depois de alguns dias de lavra feliz, volveram todos, novamente para o lugar, atraídos pela alavanca de ouro, cuja ponta se mostrava.

Aumentou-se o número de cavouqueiros, mas, à proporção que cavavam, a alavanca descia…

Uma turma rendia outra, no cavoucar apressado, afanoso, cansativo.

A ponta estava ali, rebrilhando, sob o olhar do sol glorioso, enchendo de cobiça os corações da malta felizarda: meio palmo, um, dois palmos de fora e repentinamente se abismava…

Redobrava a azáfama, duplicava o murmurinho até o cair da noite.

Muitos dias correram, naquele cavoucar incessante, turmas após turmas de trabalhadores.

A vala que se ia abrindo, já se havia aprofundado muito e alargado um raio de muitas braças, e a alavanca, quando mais sorria a esperança e acendia a cubica nos corações dos mineiros, descia, outra vez e se sumia mesmo, aprofundando-se consideravelmente…

Nova turma descia, então, ao buracão profundo e continuava a excavação.

Não sabemos ao certo quanto tempo durou aquele cavoucar incessante, aquele acompanhar às profundezas a que se ia sempre abismando a misteriosa alavanca.

Cavoucaram, pode dizer-se sempre mais afoitos, de mais a mais esperançados no desenterramento da barra fugidia até que uma nota trágica pôs termo à esperança de todos: — desabaram-se repentinamente as barrancas do buracão, sepultando para sempre, em suas profundezas, os pobres cavouqueiros.

Este facto, tendo enchido de terror os circunstantes e lòda a grande leva adventícia, ninguém mais ousou aventurar-se à busca da misteriosa alavanca que lhes pareceu um chamariz da morte.

Do trágico buracão, hoje quase todo aterrado pelos enxurros do morro, ou pelas areias que descem do Areão, ainda existe eloquente vestígio na depressão que se faz naquela viridente garganta do belo e querido morro e nos olheirões de águas naturais, uns já extintos e outros ainda borbulhantes, que vão derramar seus fios de lágrimas no seio do córrego da Prainha.

Feliciano Galdino: Lendas Matogrossenses. Tipografia Calháo & Filho, Cuiabá, 1919, pp. 27-31.

Fonte: Estórias e Lendas de Goiás e Mato Grosso. Seleção de Regina Lacerda. Desenhos de J. Lanzelotti. Ed. Literat. 1962

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