Ilíada de Homero –
Versão brasileira de Manoel Odorico Mendes
Canto 18
ARGUMENTO DO LIVRO XVIII
Antíloco dá a Aquiles a notícia da
morte de Patroclo. — Dor
profunda de Aquiles. — Tétis com as
Nereidas vem consolar seu
filho. — Vendo-o animado do desejo
de vingança, ela promete-lhe
para o dia seguinte uma nova armadura
fabricada por Vulcano. —
Despede as Nereidas e dirige-se para
o Olimpo. — Durante este tempo
o combate se reanima em redor dos
restos de Patroclo. — Heitor se
apoderaria do cadáver, se, impelido
por Juno, Aquiles não houvesse
lançado o terror entre os Troianos.
— Ao anoitecer os Gregos tomam o
cadáver e o levam para a tenda de
Aquiles. — Os Troianos reúnem-se
para deliberar. — Heitor repele os
prudentes conselhos de Polidamas.
— Os Gregos lamentam a morte de Patroclo
e lbe fazem as honras
fúnebres. — Tótis vai ter com Vulcano.
— Benévolo acolhimento que
teve a deusa, — Vulcano fabrica para
Aquiles as melhores almas,
cuja descrição vai no fim deste canto.
Arde a peleja, e
Antíloco despede.
No já completo a
meditar, Aquiles
Ante as naus esporadas
suspirava
Dentro em sua alma
nobre: "Hui! por que os Dânaos
Turbados pelo campo
as naus procuram?
É que os numes o
trago me preparam
Por minha mãe predito;
ela afirmava
Que mão Troiana ao
Mírmidon mais forte
Roubaria, inda eu
vivo, a luz diurna:
Certo jaz morto o
mísero Menécio!
Cá voltar o mandei,
remoto o incêndio,
E nunca expor-se
do Priâmeo à fúria."
Enquanto assim pensava,
o bom Nestório
Chega-se, em quentes
lágrimas lavado:
"Ai! Pelides
sem-par, ouve o mais triste
Fúnebre anúncio,
que oxalá não fora:
Nu disputa-se o corpo
de Patroclo,
E Heitor brilhante
lhe possui as armas."
O herói súbito enubla-se:
aos punhados,
De pó suja a cabeça
e o rosto afeia,
Denigre em cinza
a túnica olorosa;
Carpindo e lacerando
as gentis faces,
Por grande espaço
o grande corpo estira.
As que ele cativara
e o seu Patroclo,
Mestas lamentam,
saem fora e o cercam,
A punhos contundindo
o seio belo,
Laxos os membros.
O Nestório aflito
Chora, nas suas tendo
as mãos de Aquiles,
Receia que este a
ferro se degole.
O urrar medonho ouviu-lhe
a augusta madre
Com seu pai no áqueo
pego, e ulula e geme.
Logo a torneiam Glauca,
Toa, Acteia,
Néscia, Espio, Cimódoce,
e Talia,
Olhipulcra Hália,
Jera, Agave e Doto,
E Mélita e Cimótoe,
e Linória,
Proto, Ferusa, Dinamene
e Dórís,
Calianira, Anfínome,
Dexâmene,
Nemerte, Apseude,
Calianassa, Anfítoe,
Panopeia, e a famosa
Galateia,
Mais Climene, Oritia,
Ianassa e Mera,
E Janira e Amatia
auricomada;
Quantas Nereidas
há nos fundos mares
Enchem-lhe a gruta
argentea, os peitos ferem.
Tétis seu luto exala:
"Irmãs, as penas
Sabei que me angustiam.
Miseranda!
O maior dos heróis
pari mesquinha!
Criado como planta
em horto ameno,
Forte medrava e belo,
quando a Ilion
Mandei-o em naus
rostradas. Ahl mais nunca
Posso abraçá-lo no
Peleio alcáçar!
Enquanto à luz do
sol inda boceja,
Não
me é dado abrandar seus pesadumes:
Mas parto a ver na
ausência dos combates
Que desgosto assaltou
meu caro filho."
Então saiu da gruta,
e as mais com ela
Vão lagrimosas dividindo
as vagas;
Sobem de Tróia à
praia, onde varadas
As numerosas naus
de Aquiles eram.
Do imo ele soluçava,
e a deusa um grito
Soltando agudo, abraça-lhe
a cabeça,
Dorido o coração:
"Tu choras, filho?
Que amargor sentes?
Fala, não mo encubras.
Fez Jove o que pediste
alçando as palmas:
Opressos, rebatidos
e acuados,
Os Aquivos sem ti
por ti suspiram."
"Sim, minha
mãe, responde gemebundo;
Mas que prazer terei,
se é morto aquele
Que eu tanto como
a vida apreciava ?
Heitor, ao trucidá-lo,
da armadura
O despojou, pasmoso
dom celeste
Feito a Peleu, no
dia em que os Supremos
No toro de um mortal
te colocaram.
Oh! também com mortal
fosse ele unido,
E entre as marinhas
deias habitasses!
Não te causara dor
imensa um filho,
Que não hás-de rever
no lar paterno.
Nem respirar o peito
me consente
No meio de homens,
sem que a lança minha
A alma arranque de
Heitor, vingue a Patroclo."
"Ah! torna Tétis
alagada em pranto,
Que dizes, filho
meu ? Se Heitor sucumbe,
Tens iminente o fado."
— "Pois morramos,
Diz soluçando Aquiles,
já que ao sócio,
Que tão longe expirou
do pátrio ninho,
Remir do bronze hostil
não me era dado;
Já que voltar a Ftia
me é defeso;
Já que a tantos Grajúgenas
amigos
Das mãos Hectóreas
preservar não pude;
Já que, excedendo
na peleja a todos,
Quanto no parlamento
alguns me excedem,
Fiquei-me aqui na
terra inútil peso.
Dos numes, dos mortais,
vá-se a discórdia,
Vá-se a ira que cega
ao mesmo sábio:
Ela mais doce do
que o mel estila,
Evapora-se e cresce
e os peitos incha;
Tal ma acendeste,
poderoso Atrida.
Mas deslembremos
a cruel injúria,
Submissos à fatal
necessidade.
Do meu Patroclo ao
matador já corro,
Embora os Céus a
morte me acelerem.
Hércules a esquivou,
tão caro a Jove?
A Parca e Juno em
cólera o domaram.
Eu jaza onde cair,
se é tal meu fado;
Porém colha primeiro
ingente glória.
De seio airoso as
Dárdanas e Tcucras,
Em mestos ais, das
faces delicadas
Às mãos ambas as
lágrimas enxuguem;
Sintam que eu repousava.
Nem mo empeças,
Que nisto, minha
mãe, não te obedeço."
A Argentípede logo:
"É bom, meu filho,
Que dos consócios
teus o exício afastes:
Ora, a exultar, o
insigne Heitor ombreia
A énea tua armadura
coruscante;
Mas não exultará
sobejo tempo.
Tu não entres no
marte, sem que eu volte
Aos olhos teus: ao
rei Vulcano parto:
Haverás na arraiada
o que precisas."
E às Nereidas virou-se:
"Ao fundo aquoso
Ide, irmãs, e a Nereu
contai meus males:
Ao celso fabro subo,
que a meu filho
Tempere e forje lampejantes
armas."
Cessa; as Nereidas
súbito mergulham.
E ao celso Olimpo
se encaminha Tétis.
Fremindo às praias
do Helesponto os Gregos,
Do fero Heitor batidos,
se acolhiam,
Sem livrarem Patroclo d’entre as lanças:
Pois, como chama,
eqüestres e pedestres
E o fulmíneo Priâmeo
o perseguiam:
Três vezes pelos
pés ávido o agarra
E brama aos seus;
de esforço revestidos,
Os Ajax vezes três
do morto o expelem:
Ele ardido, ora investe
e escala as turmas,
Ora tem-se a bradar,
mas não recua:
Sempre aos dois campeões
tenaz resiste,
Qual faminto leão
se aferra à presa,
Apesar dos pastores
que a vigiam.
E glorioso a rastos
a levara,
Se, da corte celeste
às escondidas,
De Juno por mandado,
não descesse
A núncia proeclípede
ao Pelides,
A quem rápido clama:
"Eia, ó dos homens
O mais terrível,
a Patroclo salva,
Por cujo corpo-,
acérrimos contendem,
Mortes reciprocando,
uns a retê-lo,
Outros querendo a
Pérgamo arrastá-lo;
Heitor mormenta que
num poste almeja
Espetar-lhe a cabaça
decepada.
Sus, de ócio basta;
pese-te a vergonha
De jogo o amigo ser
aos cães de Tróia:
Opróbrio é teu, se
ultrajam-lhe o cadáver."
"Íris, que deus,
pergunta-lhe o Peleio,
Te envia aqui?"
— Responde-lhe a Taumância:
"Do Satúrnio
a consorte soberana.
Sublime ele o não
sabe, ou qualquer outro
Que habite os cumes
do nevoso Olimpo."
"Como, Aquiles
tornou, pelejar posso?
Eles me têm o arnês;
a mãe querida,
Antes que volte,
proibiu-me a guerra:
Prometeu-me trazer
Vulcâneas armas.
E não sei que outras
vista, excepto o escudo
Do Telamónio Ajax;
mas este, creio,
Pelo Menécio luta
e a morte espalha."
"Oculto não
nos é, replicou Íris,
Que roubaram-te o
arnês: mesmo sem ele
Vai-te ao fosso e
aos Troianos apareças;
Da acção talvez atônitos
se abstenham,
E os Gregos marciais
do afã respirem:
O mais breve respiro
é proveitoso."
Dali sumiu-se. Ergueu-se
o divo Aquiles;
A grã Minerva a égide
franjada
Pôs-lhe aos válidos
ombros, de áurea nuvem
Refulgente o coroou:
qual monta o fumo
De ilha distante
e praça, em morte horrível
Dos cidadãos no dia
propugnada,
Onde, ao cadente
Sol, nas atalaias
Acendem fogaréus,
por que os vizinhos
Tragam naval socorro;
assim da nobre
Cabeça o resplendor
feria os ares.
Ei-lo ante o fosso,
obediente à madre,
Sem mesclar-se no
prélio, alteia o grito,
E o da mesma Tritónia
inda o reforça.
Pelos Teucros lavrou
tumulto e espanto.
Como o clangor da
tuba, em duro cerco
De hostes exiciais,
o alarma soa,
A voz soou de Aquiles
érea e clara:
Treme o inimigo;
retrocedem coches, .
Dano os frisoes cornados
pressagíam;
Assustam-se os aurigas,
do Pelides
Ao ver sobre a cabeça
o fogo horrendo,
Mais por Minerva
ccrula inflamado.
Vezes três sobre
o fosso grita Aquiles,
Três debandam-se
os Teucros e aliados;
Na confusão, feridos
por seu bronze,
Nos coches próprios
doze heróis perecem.
Ledos os Dânaos a
Patroclo salvam,
E deposto em seu
leito, em roda o choram
Amigos seus. O Eácida
com estes
Mistas lágrimas verte,
contemplando
No féretro a jazer
dilacerado
O fido sócio que enviara à pugna,
Para não mais o receber
com vida.
O infadigável Sol,
da augusta Juno
Constrangido, mergulha
no Oceano,
E hão no cruel conflito
os Gregos trégua.
Os Troianos também,
cessada a lide,
Os tiros desjungindo
a ceia esquecem
E em pé se ajuntam,
que nenhum se assenta;
Inda os assusta o
aparecer Aquiles,
Do funesto combate
há muito fora.
A mão toma o Pantóida,
único atento
Ao passado e ao futuro,
à mesma noite
Nascido com Heitor,
seu companheiro,
Mais eloqüente, se
inferior na lança:
Cordato orou: "Cautela
agora, amigos:
Não se aguarde no
campo a ruiva aurora:
Toca a entrai na
cidade, é longe o muro.
Irado esse homem
contra o fero Atrida,
Menos acres os Dânaos
combatiam;
Ledo eu-cá-pernoitava,
na esperança
De rendermos as naus
dupliagitadas:
Hoje me temo do veloz
Pelides.
Bravo como é, não
ficará na liça
Do esforço marcial
de Aqueus e Troas;
Irá dentro as mulheres
disputar-nos.
Segui-me, isto não
falha, eia, marchemos.
A alma noite o retém:
se aqui nos colhe,
Crástino alguém terá
de exprimentá-lo.
Feliz do que se escape
em Ílio santa !
Muitíssimos serão
de abutres pasto.
Nunca eu ouça tal
nova I Em que vos pese,
A concordar-se, à
noite nos munamos
De valioso conselho:
propugnemos
Das torres nossas,
reforçando as portas
Com travessas e barras
bem travadas.
N’alva aos merlões
em armas resistamos:
Ser-lhe-á mais árduo
contender conosco;
Se as praias deixa,
voltará confuso,
Saciados os corcéis
de vãos tentames
E correrias, sem
pedir-lhe o peito
A cidade assolar:
antes o faça,
De vagabundos cães
será tragado."
Austero Heitor: "Despraz-me,
Polidamas,
Na muralha encerrarmo-nos
de novo:
Não vos cansais de
estardes clausurados?
De ouro, de bronzes
rica, humanas línguas
De Príamo a cidade
apregoavam;
Mas vender as alfaias
e os tesouros
Foram-se à Frígia,
foram-se à Meónia,
Depois de infesto
Júpiter: e agora,
Que rebater e encurralar
os Gregos
Ele outorgou-me.
. . Insano, cal-te e cessa:
Ninguém há que te
escute, e eu não permito.
Obedecei-me à risca:
ceie em ranchos
Todo o exército;
vele homem por homem,
Rondem, patrulhem.
Quem receia e cuida
Perder seus bens,
à tropa os distribua;
É melhor que ela
os goze do que os Dânaos.
Ao luzir da manhã,
batalha seva
Excite-se ante as
naus. Se o divo Aquiles
Surge, o caso talvez
será mais grave:
Do horríssono conflito
eu não lhe fujo;
Hei-de firme arrostá-lo,
e um de nós haja
Claro triunfo. A
todos Marte ajuda,
E o que matar espera
às vezes morre."
Cegos os Teucros
por Minerva, aplaudem
Este fatal arbítrio,
e o bom rejeitam
Que expendera o sisudo
Polidamas.
Ceia depois o exército.
— Os Aquivos
Lastimando a Patroclo
a noite gastam,
E ao luto a suspirar
o herói preside,
Postas as sevas mãos
do amigo aos peitos.
Qual barbudo leão,
que à densa furna
Chega tarde e acha
faltos os cachorros,
Triste e em sanha se atira pelos vales,
Buscando o roubador
e os seus vestígios;
Tal geme e brada
aos Mírmidões Aquiles:
"Céus, que promessa
vã 1 Dentro em seu paço
Ao grã Menetes segurei
que ovante
A Opunta voltaria
o filho amado,
Da rasa Tróia com
porção da presa!
Nem sempre cumpre
Jove humanos votos.
Ambos fadado está
que rubriquemos
A mesma terra; e
aqui terei jazigo,
Sem que à mãe deusa
torne e aos pátrios lares.
Já que após ti, Menécio,
à campa desço,
Teus funerais espaço,
até que eu mesmo
Tire ao teu matador
a vida e as armas,
E em desafogo Teucros doze ilustres
Na pira tua imole.
Entanto, junto
Fiques das negras
n/ius, e dia e noite
Carpindo-em cerco,
as Dárdanas formosas
De reguados seios
te pranteiem,
Essas que à lança
ardidos conquistamos,
Opulentas cidades
assolando."
Então faz pôr ao
fogo trípode ampla,
Onde a sangueira
expurgue-se a Patroclo:
Assentam prestes
num brasido o vaso,
Enchem-no, acendem
por debaixo lenha,
E a chama em roda
lambe e aquece o bojo.
A água mal ferve
no sonoro cobre,
Lavado e ungido esparzem-lhe
nas chagas
Um bálsamo novene,
e em lençol fino,
Da fronte aos pés
o envolvem sobre o leito,
Alvo manto por cima.
Inteira a noite
Choram-no os Mirmidões,
geme o Pelides.
Jove à consorte e
irmã: " Juno olhipulcra,
O ardor enfim de
Aquiles inflamaste:
Certamente os Aqueus
amplo-comados
Provêm de ti."
— Responde a augusta Juno:
"Terrífico Satúrnio,
que proferes?
Mortal e a nós somenos
em cordura,
O homem consegue
o intento contra o homem;
E eu que as deusas
precedo, eu sangue e esposa
Do nume soberano,
eu só não devo
Dano aos Teucros
urdir e encher meu ódio!"
Chega, entanto, a
argentípede Nereida
À Vulcânea estrelada
e incorruptível,
Estupendo lavor do
coxo mestre;
Suado e azafamado
aos foles o acha,
Trípodes vinte a
fabricar, adornos
Da aénca regia: em
roda áureas pousam,
Com que espontâneo
ao divinal congresso
Vão-se e tornem-se
à casa, oh maravilha!
Perfeitas quase,
as pegas só lhes faltam,
Cujos cravos aguça.
Ao tempo que ele
Isto engenhava, aproximou-se
Tétis.
Eis Cáris, de Vulcano
a bem toucada
Gentil consorte,
a mão lhe aperta e fala:
"Deusa louça
de flutuante peplo,
Eras aqui mui rara;
a que vens hoje?
Anda, vou pôr-te
hospitaleira mesa."
Já, de escabelo aos
pés, dentro a coloca
Em primorosa claviargêntea
sela;
Depois chama a Vulcano:
"Vem, que Tétis
Algo há mister."
— O artífice responde:
"Quê! Vejo a
deusa que salvou-me aflito,
Quando ocultar este
aleijão querendo,
Me fez do céu cair
indigna Juno!
Quanto eu sofrerá,
a não me dar asilo,
Mais do Oceano refluente
a prole
Eurínome formosa!
Por nove anos
Em cava gruta lhes
forjei colares,
Anéis, fivelas, braceletes,
brincos:
Roncava espúmeo em
torno o imenso pego;
Homem nem deus algum
de mim sabia,
Porque Eurínome e
Tétis me velavam.
Procura-me a pulquérrima
Nereida;
Pagar-lhe devo obrigações tamanhas.
Tu lhe apresenta
opíparos manjares,
Enquanto os foles
e instrumentos guardo."
Já deixa a incude
o monstruoso fabro,
A vacilar nas bambas
frouxas pernas:
Retira os foles,
mete em arca argêntea
Os utensis; de esponja
a cara enxuga,
Pulsos, cachaço e
cabeludos peitos;
E, com túnica limpa
e um grave ceptro,
Vem coxeando; o rei
trôpego esteiam
Moças de ouro que
às vivas assemelham
Na força e mente
e voz, por dom celeste;
Ladeiam-no cuidosas.
Tardo o passo,
Vizinho a Tétis,
em brilhante sólio
Senta-se, a mão lhe
cerra acaricioso:
"De roçagante
peplo ó deusa; augusta,
Raro aqui vinhas;
que pretendes hoje?
Fala segura; o coração
me pede
Fazer tudo por ti,
se for possível."
E ela a chorar: "Do
Olimpo qual das deusas
Tem curtido, Vulcano,
as amarguras
Que me propina Jove?
Entre as Nereidas
Fui só quem de um
mortal entrei no toro,
Do Eácida Peleu forçada
esposa:
Velho jaz e abatido;
eu, mesta e aflita.
Parir deu-me e criar
o herói mais bravo,
Que medrou como planta
em horto ameno:
Crescido, o enviei
mesma em naus rostradas
Contra esses Teucros.
No Peleio alvergue
Não mais hei-de abraçá-lo,
e enquanto vejo
E goza a luz do sol,
vive em tristezas.
Nem consolá-lo sei:
roubou-lhe o Atrida
A quem houve em prêmio,
e a dor e o pejo o ralam
Dante as popas os
Dânaos, rechaçados,
Nem saíam; deprecam-lhe
os melhores
E honrosos dons prometem:
nega-se ele,
Mas no seu mesmo
arnês manda a Patroclo
E os
Mirmidões, que às portas Ceias pugnam
O dia inteiro. E
então caíra Tróia,
Se Apoio entre a
vanguarda não matasse,
Para glória de Heitor,
ao bom Menécío,
Que amplo estrago
esparzía. A teus pés rogo
Faças ao filho meu
de curta vida
Elmo, escudo, loriga
e afíveladas
Grevas gentis: perdeu-lhe
o amigo as armas;
E ele opresso e no
pó jaz consternado."
Diz Vulcano: "Sossega,
não te aflijas.
Pudesse à minaz Parca
subtraí-lo,
Como lhe hei-de aprestar
brilhantes armas,
Dos humanos espanto."
Eis vai-se aos foles,
VÍra-os ao fogo,
e ordena-lhes que operem.
Eles em vinte forjas
respiravam,
Ora com sopro lento,
ora apressado,
Segundo o que há
na mente e quer o artista.
Cobre indômito ao
fogo e estanho e prata
E ouro pôs fino,
ao cepo vasta incude,
A tenaz numa mão,
noutra o martelo.
Sólido forma o escudo,
ornado e vário
De orla alvíssima
e triple, donde argênteo
Boldrié pende, e
lâminas tem cinco.
Com dedáleo primor,
divino engenho,
Insculpiu nele os
céus e o mar e a terra;
Nele as constelações,
do pólo engastes,
Oríon valente, as
Híadas, as Pleias,
A Ursa que o vulgo
denomina Plaustro,
A só que não se lava
no Oceano.
Duas cidades povoou.
— Solenes
Bodas há numa: as
noivas, entre fachos,
Vêm dos talamos,
guiam-nas chamando
Por himeneu; de giro
dançam moços,
Tocam flautas e cítaras;
mulheres,
Dos vestíbulos seus,
estão pasmadas.
Apinham-se no foro,
a ver o pleito
Que por causa da
multa as partes erguem
Do Um recente homicídio; afirma ao povo
Um tê-la pago à risca,
o outro o nega,
Produzir ambos testemunhas
querem;
Divide-se o favor,
soa o tumulto,
V, impõe silêncio arautos;
sobre lisa
Pedra, em círculo
sacro, estão juizes,
Que em varas dos
arautos clamorosos,
Por seu turno opinando,
em pé se encostam;
Ali no meio há de
ouro dois talentos,
Para quem proferir
melhor sentença.
Na outra cidade,
exércitos se acampam
A reluzir. Os cercadores
traçam
Destruí-la, ou metade
saquear-lhe
Do que há no soberbíssimo
castelo.
Os de dentro, insistindo,
armam ciladas;
Em guarda ao muro
os velhos e as mulheres
E os meninos deixando,
uma sortida
Fazem com Marte e
Palas, ambos de ouro
E de ouro as vestes,
cujo brilho e talhe
Dos humildes mortais
os distinguiam.
Eles, já de emboscada
ao pé de um rio
E onde o armento
bebia não se despem
Do fulguroso bronze,
e avante postam
Vigias dois que da
chegada avisem
De negros bois e
ovelhas. Já descobrem
Uns pastores que,
alheios das insídias,
Na avena divertiam-se,
e improvisos
Aos míseros matando,
se apossavam
Do alvo rebanho e
gado. Os cercadores,
Em assembléia, a
bulha e o mugir fere,
E montando os corcéis,
rápido às abas
Do rio empenham férvida
batalha:
Vaga a Discórdia,
o Susto; aferra a Parca
De fresco um vulnerado
e um são e um morto,
E os roja pelos pés,
e tinto em sangue
Ata aos ombros o
manto. Os combatentes
Parecem vivos; de
uma e de outra parte,
Dos sócios os cadáveres
carregam.
Mole alqueive insculpiu,
largo, abundoso,
Três vezes amanhado,
e o lavram muitos,
Aqui e ali dos bois
virando o jugo;
Ao fim de cada sulco,
um homem sempre
Lhes verte um copo
de suave baco;
Eles outros começam,
desejosos
De profundá-los todos.
Bem que de ouro,
Atrás negreja o alqueive,
nem que arado
Verdadeiro o fendesse:
oh grã prodígio!
Insculpiu loura messe,
e dos ceifeiros
Foice a talha afiada:
em linha os molhos
Por terra vão caindo;
enfeixadores
Seguem três para
atá-los, e uns meninos
Lestos atrás colhendo,
os acumulam.
Numa paveia, o rei
ceptrado assiste,
Silente e alegre;
à sombra de um carvalho
Arautos põem-lhe
a mesa, espostejada
Enorme rês; mulheres
aos ceifeiros
Mesclam vária farinha
e a ceia aprontam.
Áurea vinha insculpiu
de roxos cachos,
Que ao peso verga,
e arrima-se em argêntea
Fieíra de tanchões;
de estanho sebe,
Fosso de esmalte
a cinge; uma azinhaga
Só tem para a vindima;
adolescentes
E donzelinhas, de
ânimo sinceros,
O doce fruto em canistréis
apanham.
Tange um menino harmônico
alaúde,
E canta com voz meiga
ao som das cordas;
Bailam tripudiando
os vinhateiros,
A repetir a ponto
as melodias.
Manada ali gravou
de altivos cornos:
De ouro e de estanho
os bois, mugindo rompem
Do curral para o
pasto, indo-se às margens
De ressonante caniçoso
rio;
De ouro há vaqueiros
quatro e mastins nove;
Dois medonhos leões
na frente empolgam
Um touro berrador,
que a rastos geme;
Segue a matilha e
a gente, mas as feras
Chupam-lhe o sangue
e as láceras entranhas;
Os vaqueiros seus
cães debalde açulam;
Os cães morder as
feras não se atrevem,
Bem que de perto
ladrem. — Pôs Vulcano
Em vale ameno cândidas
ovelhas,
E redis e tapigos
e tugúrios.
Coréia ali gravou,
qual na ampla Cnosso
Fez Dédalo à pulcrícoma
Ariadna.
Moços e virgens palma
a palma enlaçam.
A terra pulsam: tênue
linha as veste,
Veste-os guapo tecido
azeitonado;
Elas flóreas grinaldas,
eles trazem
Áureos alfanjes em
talins de prata.
Com mestra e leve
planta, ou já discorrem
Qual do oleiro tocada
ao móbil torno
Rápida volve a roda,
ou já desfilam:
Deleita-se o tropel
que em cerca pasma.
Dois adiante uma
toada rompem,
A voltear e aos pulos.
— Em remate,
Na orla esculpiu
do enorme rijo escudo
A ingente força do
Oceano rio.
Depois forma a coiraça
mais que o fogo
Resplandecente, e
à fronte acomodado
Grave brunido casco
de áurea crista,
E de dúctil estanho
as grevas tece.
Completo alçando
o arnês, à mãe de Aquiles
O deus o oferta;
ao gavião parelha,
Toma as Vulcâneas
coruscantes armas,
Do alto nevoso Olimpo
se despenha.
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