O Homem Medíocre (1913)
José Ingenieros (1877-1925)
Capítulo V – A INVEJA
I. a paixão nos medíocres. —II. psicologia dos invejosos. — III. os roedores da glória. — IV. uma cena dantesca: o seu castigo.
I — A paixão nos mediocres
A inveja é uma adoração que as sombras sentem pelos homens, que a mediocridade sente pelo mérito. É o rubor da face sonoramente esbofeteada pela gloria alheia. É a grilheta que os fracassados arrastam. É o áloc que os impotentes mastigam. É um humor veneno-no que se expele das feridas abertas pelo desengano da própria insignificância.
Por suas forças caudinas passam, cedo ou tarde, os que vivem como escravos da vaidade; desfilam, lívidos de angústia, trovos envergonhados da sua própria tristeza, sem suspeitarem que o seu ladrar envolve uma con sagração inequívoca do mérito alheio. A inextinguível hostilidade dos néscios sempre foi o pedestal de um mo numento.
É a mais ignóbil das torpes cicatrizes que afetam os carácteres vulgares. Aquele que inveja, rebaixa-se, sem o saber; confessa-se subalterno; esta paixão é o estig ma psicológico de uma humilhante inferioridade, senti da reconhecida.
Não basta ser inferior para invejar, pois todo ho mem o é de alguém, num sentido ou noutro; é necessá rio sofrer em conseqüência do bem alheio, da felicidade alheia, de qualquer enaltecimento alheio. Nesse sofrimento está o núcleo moral da inveja; morde o coração, como um ácido; carcome-o, como polilha; corrói, como a ferrugem, ao metal.