A região ao Sul do Zambeze

Fichamento do texto:A região ao Sul do Zambeze

H. H. K. Bhila in História Geral da África – Vol. V – África do século XVI ao XVIII

Miguel Lobato Duclos

O texto trata do Império Mutapa, o Império Rozwi e os Estados orientais shona.
Existem poucas fontes para essa região nesse período. O principal subsídio do autor são os relatos dos autores viajantes portugueses.
O Grande Zimbábue teve seu declínio acentuado com a escassez da produção do ouro. A ele se seguiu um estado obscuro que alguns chamam de Torwa, sucedido por sua vez pela dinastia rozwi nos XVI. A arqueologia mostra que eTorwa erigiu construções de pedra.

O Império Mutapa também surgiu com o declínio do Grande Zimbábue, tomando o controle do cultivo das terras agrícolas. A língua falada era o karanga. Embora outros povos cedessem tributos, havia reinos rebeldes, e a autoridade dos mutapa fora de seu planalto era limitada.

Os aposentos do rei na capital tinham uma sede suntuosa. O autor descreve os aposentos da rainha e o funcionamento da cozinha, onde apenas eram admitidos trabalhadores selecionados e parentes, com destaque para o consumo de diferentes tipos de carnes obtidas na caça.

No final do século XVIII os Mutapa perderam o controle do planalto e tiveram de se deslocar para terras mais baixas do Zambeze. O declínio começou com a invasão portuguesa e o Estado Mutapa foi considerado extinto em 1917. Outros grupos então foram tomando o território do império.

A autoridade exercida nas províncias era delegada a parentes do imperador ou pessoas de sua confiança, no início do império. Com sua autoridade sedimentada, permitiram que elas elegessem seus próprios chefes.

Um ritual simbólico relativo à manutenção da chama do fogo real era usado no controle administrativo. Para que os chefes viessem prestar lealdade ao soberano Mutapa, deviam apagar as chamas das suas localidades e reacendê-las na capital, uma vez por ano, ou na ocasião da morte do rei. Quem desobedecia era punido. Para tanto, o império contava com um exército numeroso, de milhares de homens.

Outro aspecto do controle era o religioso, uma vez que os feiticeiros estavam à serviço da coroa, supostamente incorporando os espíritos ancestrais dos monarcas fundadores. O culto aos ancestrais era ligado à autoridade real. Numa sociedade agrícola, apaziguá-los era importante para que a terra fosse fecunda. Havia rituais de chuva, promovidos pelos propritários de terra, onde a presença do imperador no ritual era considerada de grande préstimo. Estes “médiuns”, como nomeia o autor, constituíam uma classe importante a serviço do imperador, aconselhando-o e legitimando-o por gozar de grande prestígio junto à população.

O controle político era exercido de forma mais concreta através da cobrança de impostos, pago com produtos da terra e da caça ou então, frequente, com trabalho, na lavoura e mineração. Por sua vez, os vassalos subordinados também cobravam tributos das populações locais. No caso da descoberta de ouro, o soberano enviava os agentes mais eficientes para fazer valer seu sistema tributário.

Todavia, estes mecanismos de controle, embora tenha funcionado numa vasta região, não era totalitário, de forma que as rebeliões que iam surgindo, dificéis de serem controladas, foram contribuindo também para o declínio gradual do império, além do fator português.


O pagamento de tibutos pode ter sido um dos fatores que levaram os porgueses a querer combater os Mutapa. Eles se submeteram ao pagamento de 1550 a 1630, em troca de livre circulação protegida e comércio pelo território. Quando o capitão encarregado na fortificação portuguesa faltava a essa obrigação, o imperador determinava o embargo de todas as mercadorias, como ocorreu no ataque de 1610. Além dos mercadores, os árabes-swahili também eram submetidos a este sistema. Os portugueses ofereciam tecidos e outros artigos de luxo importados para ganhar prestígio junto à patronagem.

De 1569 e 1575 os portugueses passaram a combater acintosamente os mutapa, conquistando posições no Zambeze, nas cidades Uteve e de Manica. Depois de um acordo, obetiveram vantagens na circulação do território, onde acreditavam haver ouro, e na tributação. As rebeliões continuaram no século XVI, e os portugueses foram se aprofundando na política nativa. Fazendo acordos com outros chefes, participavam de rebeliões e guerras internas em troca de recompensas, embora não tivessem o contingente nem o conhecimento necessários para fazer valê-las.

Em 1607 e 1629 foram assinados tratados entre os Mutapa e a Coroa portuguesa que aumentaram os privilégios desses últimos, isentava os portugueses do pagamento da curva e cediam territórios. Isso aumentou a afluência dos europeus, sendo que os missionários católicos obtiveram liberdade de pregarem sua religião. A influência portuguesa acabou por desestabilizar os Mutapa, dando origem ao sistema de prazo e à uma nova entidade, o Império Rozwi.

O sistema de prazo mesclava características socio-econômicas da sociedade feudal européia com elementos originais daquela região africana. Os prazeros de origem portuguesa também desposavam inúmeras esposas dos chefes africanos locais, de forma a aumentar sua legitimidade junto ao povo e penetrar os valores da coroa, num processo que ficou conhecido como africanização portuguesa. Na colonização portuguesa da região de Moçambique os prazeros modificaram profundamente o sistema político local, embora não o tenham destruído. O autor também sustenta que a africanização não chegou ao ponto de representar um desligamento em relação à Metrópole.

Os prazos disseminaram-se ao norte e ao sul do Zambeze. Porém, havia diferenças. Os do sul eram submetidos diretamente à Coroa, ao passo que os do norte adquiriram as terras em virtude de acordos com chefes locais. Os prazeros do Norte não obedeciam à rigidez das regras da coroa, além de estarem mais próximos da feira de Zumbo e de minas de ouro. Os prazeros garantiam sua autoridade quando utilizavam escravos em diversas categorias de hierarquia, de representates, auditores até trabalhadores braçais. Os portugueses obtinham a mão de obra escrava ao roubarem crianças ou fazerem cativos em guerras. O autor aponta fontes que sinalizam a existência também da servidão voluntária, comparável ao sistema feudal europeu.

O sistema de prazos durou até o fim século XVIII, declinando por diversos fatores, como a concorrência de chefes nativos e os abusos impostos pelos portugueses, além da revolta contra o tráfico de escravos, que havia atingido seu ápice nesse período. Os prazeros buscando enriquecer forneceram seus próprios escravos para a exportação, enfraquecendo assim o sistema local. Isso ocorreu mais ao norte que ao sul do Zambeze, onde o declínio está mais relacionado ao surgimento da dinastia rozwi dos changamire.

O termo rozwi vêm do verbo na língua shona kurozva (destruir), e foi adotado após uma série de batalhas em que uma população dos Mutapa (karanga) lutou para emancipar-se do poder central, ascendendo ao poder Dombo Changamire. O palácia na capital era feito de pedra e cercado de marfim, guardado por homens armados de fuzis, negociados junto aos portugueses. Ali criavam-se cães de raça e abasteciam a cozinha do rei e de suas esposas. A administração do império Rozwi seguia os mesmos moldes do império Mutapa no tocante ao sistema tributário, porém diferencia no sistema religioso. Ao invés de “mediuns” conectados aos espíritos ancestrais, cultivava-ve a crença num deus único, que se revelava através de oráculos e fenômenos da natureza.

Um exército bem equipado, treinado e organizado garantia as conquistas e manutenção do império. Sua eficácia era tanta que tornou-se lendária. No entanto o autor contextualiza esse mito, aproximando-o à organização do império zulu no século XIX e relativizando as vitórias sobre os porgueses dentro do contexto geral da África Oriental e a crise do sistema de prazos.

Na sociedade shona, a agrcultua exercia um importante papel dentro da economia. Homens e mulheres tinham funções definidas, no entanto, participavam da colheita juntos. Além disso, havia o trabalho de metais, a criação de animais, a caça e a pesca, que circulavam dentro e além das fronteiras pelo fluxo do comércio. A influência dos portugueses passou a ser sentida nas técnicas e nos produtos de cultivo ao longo do período colonial, com a adoção, por exemplo, da cana-de-açucar e do trigo. Nas terras altas, ao contrário dos planaltos, com pouca terra fértil, era praticada a agricultura de pequena escala com a construção de “terraços” nas encostas. Segundo o autor, a escassez de fontes ou a contradição destas não é suficiente para fazer presumir o esteréotipo de constituírem os shona uma sociedade meramente de caça, relevando as variadas atividades agrícolas e o acúmulo de alimentos, em maior ou menor grau, mesmo nos períodos de escassez.

A criação de animais domésticos também exercia um papel importante na economia. Caprinos, bovinos forneciam carne, leite e adubo para as plantações. A posse de um bom rebanho garantia status social. Os grandes rebanhos eram transumados pelos pastores afim de garantir boa pastagem e evitar doenças. A carne de galinhas também era usada na alimentação, sendo criada em abundância e comerciada a preços baixos.

Embora as crônicas portuguesas dêes destaque para a mineração aurífera, o autor ressalva que outros metais, como chumbo e cobre, também era explorado, inclusive para o mercado africano, com a fabricação de enxadas, por exemplo. Também as salinas marítimas e a produção de tecidos eram fatores da economia e do comércio. Embora as jazidas de ouro tivessem dado vazão à imaginação dos exploradores, ela existiu de forma mais ou menos sazonas. Os Mutapa e Rozwi também escondiam dos europeus a localização exata dos novos filões descobertos, exercendo estrito controle sobre a atividade. O ouro foi motivo de constantes conflitos e contendas entre os nativos e os portugueses. O declínio da extração do ouro começou no século XVII, sendo que o autor defende que a guerra foi um fator principal, ainda neglegenciado pela historiografia. Os portugueses, aliados aos Mutapa, também participavam da caça de elefantes, com o objetivo da extração e comércio de marfim.

Embora os camponeses produzissem mais bens de consumo que de troca, havia comércio com base em bazares desde antes da chegada dos portugueses, provavelmente datando do século X, com o estabelecimento dos árabes-swahilis. No século XVI a fortaleza portuguesa construída em Sofala serviu de entreposto comercial. Isso gerou conflito com os swhilis que ali estavam estabelecidos, mas acabaram refugiando-se no Norte.Com a conquista de Sena e Tete, além da fortaleza de Kiwa, os portugueses atingiram um monopólio que tosava a autonomia dos swhilis, que acabaram por se submeter a uma aliança comercial, uma vez que os portugueses não tinham nem o pessoal nem o conhecimento necessários. Os camponeses africanos negociavam seus produtos, gêneros alimentícios, em especial, em troca de produtos exóticos, como adornos e pérolas.

Os bazares foram por fim sendo substituídos por grandes feiras organizadas administradas e protegidas pelos portugueses, ao longo do século XVI. O representante da Coroa nessas feiras era chamado de capitão-mor, sendo encarregado de estipular o triburo, controlar o preço e decidir a justiça nas contendas. A feira maior e mais conhecida era realizada em Dambarare. Quando o império rozwi surgiu, na figura de Changamire Dombo, entre 1693 e 1695, os portugueses tiveram de remodelar seu modelo comercial, pois foram sendo perseguidos e expulsos. Passaram então a exercer um comércio mais limitado, sendo obrigados a pagar impostos ao imperador africano.

Opinião:

O autor oferece um panorama vasto de uma vasta região num grande período de tempo, sem perder de vista a objetividade e a exatidão, apontando as deficiências e lacunas das informações e referenciando suas principais fontes e problemáticas. Essa difícil tarefa é cumprida de forma didática e envolvente, além de razoavelmente organizada, embora seja fácil se perder em meio ao vai-e-vem temático da linha do tempo, dos diferentes aspectos e dos povos envolvidos, tanto os impérios africanos, como árabes-swahilis e os invasores portugueses. O autor parece buscar a associação com modelos explicativos da sociedade ocidental e transpô-los ou adaptá-los para a realidade abordada. Assim, a riqueza de variações que aborda muitas se presta somente à mera substituição de nomes, distanciando-se do seu caráter intrínseco e próprio. A abordagem das religiões é um exemplo disso, sendo que o autor usa um termo relacionado à pleíade ocidental (Médium espírita) para explicar as atividades dos “feiticeiros” junto ao imperador Mutapa.

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