Continued from: Aristóteles - A Constituição de Atenas

XVII

Hípias e Hiparco tomaram as rédeas do governo,
baseados na sua posição e idade, porém Hípias, cuja
natureza era a do homem de governo sagaz, foi na realidade quem
governou. Hiparco era um jovem com disposições amorosas e
literárias, sendo por sua iniciativa que Anacreonte, Simônides e
outros poetas foram convidados a visitar Atenas, enquanto Thessalio, embora
muito mais moço em idade, era muito violento e pertinaz em sua conduta.
Todos os males que infelicitaram sua casa foram originados pelo seu
caráter. Acercou-se de Harmódio e, como não conseguisse
sua amizade, perdeu o freio de suas paixões e, alem de outras
demonstrações de cólera, proibiu finalmente, que a
irmã de Harmódio tomasse parte nas festas de Panatenai, alegando
que ele era pessoa de vida leviana. Assim, em um ataque de ódio. Harmódio
e Aristoton levaram a efeito sua celebrada aventura, juntamente com muitos
cúmplices. Porém, enquanto esperavam Hípias na
Acrópole, durante as Panateneas, este já ali se encontrava
aguardando a chegada da procissão, enquanto Hiparco organizava a
comitiva. Ao ver que uma das pessoas comprometidas na conspiração
falava com ele familiarmente, acreditando que os estivesse delatando com o
desejo de que pudessem fazer alguma coisa antes que os detivessem,
lançaram-se contra eles, realizando o atentado sem esperar os restantes
cúmplices. Lograram matar Hiparco per to do Leocoreo, quando este se
dispunha a ordenar a procissão, estropeando por completo o plano que
tinham concebido. Um dos diretores foi morto pelo guarda, Harmódio
e Aristogiton foram presos, morrendo mais adiante após padecerem
torturas cruéis. Enquanto os torturavam, acusaram muitas pessoas
pertencentes à melhor sociedade e amigos pessoais dos tiranos. Logo de
princípio o governo não pôde descobrir a trama da intriga,
porque a lenda que dizia que Hípias tinha ordenado que todos os que
figuravam na procissão deixassem as armas, descobrindo logo aos que
levavam punhais escondidos não pode ser verdadeira, posto que naquela
época não se conduzisse armas nas procissões, visto como
esse costume foi estabelecido pela democracia, mais tarde. Segundo a
historia do partido popular, Aristogiton acusou os amigos dos tiranos, com
o deliberado propósito de que estes cometessem um ato de crueldade,
debilitando-se, assim, e sacrificando os inocentes que eram os seus
próprios amigos. Dizem outros que ele não mentiu, mas que apenas
se vingou de seus verdadeiros cúmplices. Finalmente, quando viu que
com todos os seus esforços não conseguia livrar-se da morte,
prometeu dar maiores detalhes contra algumas outras pessoas, e, tendo induzido Hípias
para que lhe desse a mão para confirmar sua palavra, tão de
pronto a teve entre as suas, censurou-o por entregar sua mão ao
assassino de seu irmão. Hyppas encolerizaando-se no mais alto grau,
perdeu o domínio sobre si mesmo; agarrou o punhal e matou-o.

XVIII

Após este acontecimento, a tirania se deixou sentir
com maior força. Como vingança tomada por causa da morte de seu
irmão, Hípias resolveu a execução e desterro de
muitos, entregando-se à desconfiança e conturbando o
caracter. Uns três anos depois da morte de Hiparco, acreditando
não estar seguro na cidade, começou a fortificar Municia, com a
intenção de transferir-se para lá. Mas, quando menos
esperava, foi expulso por Cleómenes, rei da Lacedemônia, em vista
dos Espartanos serem constantemente incitados pelos oráculos para
derrubar a tirania. Estes oráculos eram obtidos da seguinte forma: Os
desterrados de Atenas acaudilhados por gente de Alcmeonidos, não podiam
efetuar sua volta à cidade pelo seu próprio esforço,
visto como continuamente fracassavam suas tentativas. Entre seus fracassos
figura o da fortificaçao de um posto na Ática, chamado Lipsidro,
situado sobre o monte Parnés; ali se lhes reuniram alguns
partidários da cidade, sendo cercados pelos tiranos e obrigados a
se render.

Tendo fracassado em quantos métodos aplicaram,
fizeram um acordo para a construção do templo de Delfos, obtendo,
assim, importantes fundos que empregaram para conquistar a ajuda dos
Lacedemônios. Durante todo o transcurso desse tempo, as Pithias animavam
continuamente os Lacedemônios que iam consultar o oráculo,
dizendo-lhes que deviam libertar Atenas, até que, finalmente,
conseguiram impedir os Espartanos a que dessem esse passo, embora a casa de Pisístrato
estivesse unida a eles por laços de hospitalidade. A
resolução tomada pelos Lacedemônios era devida igualmente à
amizade estabelecida entre a casa de Pisístrato e Argos. O
primeiro ato que praticaram, foi enviar Anchimolo por mar, à frente
de um exercito, sendo ele, porem, vencido e morto devido à chegada
de Kineas de Thessalia, em ajuda dos filhos de Pisístrato, com uma
força de três mil cavalarianos. Enfurecidos com o desastre,
enviaram seu próprio rei Cleómenes, por terra, acaudilhando outro
exercito mais númeroso, o qual, depois de ter vencido a cavalaria
de Thessalia, quando tentou cortar-lhe o caminho para a Ática,
enfrentou Hípias, obrigando-o a procurar refugio no sitio conhecido pelo
nome de muralha Pelargica, dando-lhe cerco com a ajuda dos aliados de Atenas.
Durante o assédio, aconteceu que os filhos dos tyran-nos foram
capturados ao tentar fugir em vista do que, capitularam mediante a
condição de ser respeitada a vida de seus filhos, entregando a
Acrópole aos Atenienses, e concedendo cinco dias para que pusessem em
ordem o que lhes pertencia. Passou-se isso durante o mandato do Arconte
Harpactides, depois de ter sido exercida a tirania durante uns
dezessete anos desde o falecimento de Pisístrato, ou quarenta e nove,
contando também o período do governo deste.

XIX

Uma vez derrubada a tirania, os chefes rivais no país
foram Iságoras, filho de Tissandro, partidário dos tiranos e
Clístenes, pertencente à família dos Alcmeonios.
Clístenes foi vencido nos agrupamentos políticos; apelou,
então, para o povo, concedendo privilegio às massas.
Isaáoras, considerando que perdia terreno com isso, convidou Cleómenes,
a quem o unia laços de hospitalidade, para que voltasse a Atenas,
convencendo-o de que "expulsasse a corrupção", frase que
se originava do fato que presumia os Alcmônios sob maldição
de corrupção. Então Clístenes retirou-se do
país, entrando Cleómenes na Ática à frente de uma
pequena força, e expulsando, como corrompidas, cerca de setecentas
famílias de Atenas. Uma vez feito isso, tentou dissolver o Conselho,
erigindo Iságoras e trezentos de seus partidários, ao supremo
poder da República. Não obstante, o Conselho resistiu, o
povo reuniu-se e Cleómenes e Iságoras tiveram que se refugiar na
Acrópole. Mas o povo cercou-os durante dois dias; ao fim do terceiro
dia convieram em deixar sair Cleómenes e os que o seguiam, ordenando
a Clístenes e demais desterrados, que voltassem a Atenas. Quando o povo
teve em suas mãos a direção do governo, Clístenes
foi o seu chefe. Tudo isso era muito natural porque, talvez os Alcmeonios
fossem a causa principal da expulsão dos tiranos e, durante quase a
maior parte de seu governo, estiveram em continua guerra come eles.
Razão tinha o povo para depositar confiança

em Clístenes. Uma
vez elevado ao posto de caudilho popular, três anos depois da
expulsão dos tiranos, e durante o mandato do Arconte Iságoras,
seu primeiro ato foi dividir a população em dez tribos, ao
invés das quatro existentes, com o fim de mesclar os membros de
todas elas, para que deste modo participassem mais dos privilégios. Dai
nasceu o provérbio: não te fies nas tribos, que se dizia aos que
desejavam fiscalizar as listas das antigas famílias. Também fez
com que o Conselho fosse integrado por quinhentos membros, contribuindo
com dez,cada uma das tribos, enquanto que, anteriormente, cada uma enviava uma
centena. A razão que o animou a não organizar a
população em doze tribos, foi não se ver no caso de ter de
empregar a divisão existente, em traços, porque as quatro
tribos contavam doze terços, de maneira que não teria conseguido
seu objetivo, que era distribuir a população de acordo com novas
combinações. Demais, dividiu o país em trinta grupos de
povos ou demes, assim distribuídos: dez, correspondentes aos distritos
próximos da cidade, dez, correspondentes aos próximos à
costa, e dez, correspondentes aos do interior. A estes chamou-os terços,
adjudicando três deles para cada tribo, por sorteio, de tal modo, que cada
uma delas tivesse uma parte em cada uma das localidades. Todos que viviam
em um povoado qualquer, eram declarados nominalmente de acordo com o mesmo, com
o fim de que os novos cidadãos não se denominassem pelo habitual
sistema do emprego dos nomes de família. Por isso os Atenienses se
chamam uns aos outros empregando os nomes dos respectivos povoados.
Também instituiu o cargo de Demarca, que tinha os mesmos deveres que os
Naucrari anteriores; os povos ou demes ocupavam o posto das naucranas. Deu nome
aos povos, derivando alguns das localidades de que dependiam, outros de seus
fundadores, embora que algumas de suas áreas não correspondessem
às localidades cujos nomes levavam. Por outro lado, permitiu que todos
conservassem os ritos familiares, de tribos e religiosos, de acordo com o
costume ancestral. Os nomes que receberam as tribos foram os doze indicados
pela Pythia, tomados de uma centena de heróis nacionais selecionados.

XXI

Com estas reformas, democratizou-se ainda mais a
constituição que no tempo de Sólon, cujas leis tinham sido
prescritas pelo pouco uso que delas fora feito durante o período de
tirania, substituindo-as Clístenes por leis novas com o fim de que a
vontade das massas fosse mais evidente. Entre as ditas leis, figurava uma
concernente ao ostracismo. Quatro anos depois de se haver estabelecido este
sistema, durante o mandato do Arconte Hermocreon, foi imposto ao Conselho dos
Quinhentos o juramento que ainda hoje é prestado. Logo começaram
a ser eleitos os generais por tribos, cabendo um por cada uma delas,
enquanto o Polemarca era considerado como chefe do exercito. Onze anos
depois, durante o mandato do Arconte Phenippo, ganharam a batalha de
Maraton e, ainda dois anos depois de conseguida essa vitória, quando o
povo adquiriu confiança em si mesmo, foi posta em vigor, pela primeira
vez, a lei do ostracismo. Esta lei foi promulgada principalmente como medida de
precaução contra os que ocupavam altos cargos, porque
Pisístrato valeu-se de sua situação, como caudilho popular
e como general, para proclamar-se tirano, sendo um de seus parentes o primeiro
a sofrer os rigores da lei, um tal Hiparco, filho de Charmos, do povoado de
Colito, pois Clístenes a pôs em execução,
especialmente para ele e com o propósito de alijá-lo do poder.
Até então ele tinha sempre conseguido livrar-se, pois que os
de Atenas, devido a sua costumeira mansidão democrática,
permitiram que permanecessem na cidade todos os partidários dos
tiranos, desde que se não tivessem associado aos seus feitos criminosos
durante os dias tumultuários, sendo precisamente Hiparco o chefe
que induzia a todos. No ano próximo, durante o mandato do Arconte
Telesino, elegeram por sorteio, pela primeira vez desde a tirania, tribo por
tribo, os nove Arcontes entre os quinhentos candidatos selecionados entre o
povo, pois os anteriores eram elegidos por votação. No mesmo
ano, Megades, filho de Hyppocrates, do povoado de Alopeso, foi vitima da nova
lei. Assim, continuou-se condenado ao ostracismo os amigos dos tiranos
durante três anos, pois, para eles precisamente tinha sido promulgada a
lei

em
questão. Porém, no ano seguinte, outros
começaram a ser condenados também, incluindo-se entre eles, todos
aqueles que pareciam possuir maior poder do que o julgado
conveniente. A primeira pessoa condenada independentemente dos tiranos, foi
Xantipo, filho de Ariphon. Dois anos depois, durante o mandato do Arconte
Nicodemo, foram descobertas as minas de Maroneia, obtendo a República
um beneficio "de cem talentos pela sua exploração. Houve
quem aconselhasse ao povo que se efetuasse uma divisão do dinheiro entre
todos, coisa que foi evitada por Temístocles. Este recusou-se a declarar
no que pretendia empregar o dinheiro, resolvendo depois que se emprestasse um
talento a cada um dos cem homens mais ricos de Atenas e, então, se o
modo como resolvera empregar o dinheiro fosse aprovado pelo povo, ele
reverteria ao estado; em caso contrario, este recolheria o dinheiro das
mãos daqueles a quem havia sido emprestado. Com o resultado desse dinheiro
que foi empregado pelos beneficiados em construções de
instrumentos, foi que se pôde levar a bom termo a batalha de Salamina
contra os bárbaros. Por esse tempo, Aristides, filho de Lisímaco
foi condenado ao ostracismo. Três anos depois, durante o mandato do Arconte
Hypsichides, foram anistiados todos os condenados pela lei do ostracismo, em
vista do avanço do exercito de Xerxes, resolvendo-se que, de
então em diante, os sentenciados pela dita lei deveriam viver entre
Geraesto e Scyleu, sob pena de perda irrevogável de seus direitos civis.

XXII

Esse foi o progresso feito pela cidade até
então, progresso que ia sempre num aumento crescente, à
medida que se intensificava a democracia. Porém, depois da guerra
com a Pérsia, o Conselho do Areópago readquiriu novamente suas
forças, assumindo o governo do Estado, não se devendo isso,
porém, a nenhum decreto formal, mas simplesmente em virtude de sua
atitude decisiva, que foi a causa da batalha de Salamina. Quando os
generais se acharam perplexos, conjeturando como haviam de fazer frente a tais
apuros e resolveram lançar uma proclamação, onde
aconselhavam que cada um se salvasse como pudesse, o Areópago concedeu
um donativo em dinheiro, distribuindo oito dracmas a cada tripulante dos
navios, animando-os deste modo a que voltassem aos seus barcos. Por isso o
povo inclinou-se diante do seu prestigio, e, durante todo esse período,
Atenas foi sempre bem administrada. Nessa época entregaram-se à
continuação da guerra, gozando de boa reputação
entre os gregos, de modo que o poder naval lhes foi conferido, a despeito da
oposição exercida pelos Lacedemônios. Os caudilhos
populares, durante esse período, foram Aristides, filho de Lisímaco
e Temístocles, filho de Neocles, sendo este ultimo o que se encarregou
da direção da guerra, enquanto o primeiro gozava da
reputação de hábil estadista e de um dos espíritos
mais justos de seu tempo. Por isso um se encarregou do generalato, enquanto o
outro exercia o cargo de conselheiro político. Embora em política
pensasse de modo oposto, dirigiram conjuntamente a reconstrução
das fortificações, mas Aristides, aproveitando a
ocasião que lhe proporcionava o descrédito lançado
sobre os Lacedemônios por Pausânias, inspirou a política pública
com respeito à retirada dos Jônicos da aliança com Esparta.
Parece que foi ele quem primeiramente impôs tributo aos
vários estados estrangeiros, dois anos depois da batalha de
Salamina, durante o mandato do Arconte Timosthenes, sendo ele, também,
quem prestou juramento de aliança ofensiva e defensiva com os Jônicos,
em ocasião que foi lançada ao mar grande quantidade de ferro.

XXIII

Ao ver depois disto que a República aumentava em
confiança e acumulava grandes riquezas, aconselhou ao povo que se
apoderasse da chefatura da liga, abandonasse os distritos campestres e se
estabelecesse na cidade, indicando-lhe que todos podiam ganhar a vida
assim; uns, entrando a tomar parte no exercito, outros, nas
guarnições e outros, ainda, participando dos assuntos
políticos, pois desse modo tomariam pé na direção.
Seguiram o conselho e, uma vez que o povo tinha assumido a
direção suprema, começaram a tratar seus aliados da
maneira mais imperiosa, exceção feita dos Chios, Lésbios e
Samios, que foram guardados para suster seu império, sem tocar em suas
constituições e permitindo-lhes conservar todos os
domínios que possuíam. Também asseguraram a manutenção
da massa dos povoadores, da maneira que Aristides lhes havia indicado. Com
o resultado da arrecadação dos tributos, impostos e das contribuições
dos aliados, mantinham mais de vinte mil pessoas. Havia seis mil jurados,
mil e seiscentos arqueiros, mil e duzentos cavalheiros, quinhentos membros
do Conselho, quinhentos guardas de armazéns, além de
cinqüenta guardas da Acrópole. Também havia setecentos
magistrados no interior e outros tantos no exterior. Demais, quando foram à
guerra, dispunham de dois mil e quinhentos soldados completamente armados, bem
como navios que cobravam os tributos e cujas tripulações ascendiam
a dois mil homens, escolhidos por sorteio. Além destas, havia ainda
pessoas que eram alimentadas no Pritaneu, órfãos e carcereiros,
porque todos eram mantidos às expensas do Estado.

XXIV

Tal era o modo como o povo ganhava a vida. A supremacia
do Areópago prevaleceu durante dezessete anos depois das guerras com a
Pérsia, embora fosse gradualmente perdendo

em intensidade. Porém,
à medida que aumentava a força do povo, Ephialtes, filho de
Sophonides, homem de reputação integra e possuidor das maiores
virtudes cívicas, que chegou a ser o chefe popular, atacou aquele
Conselho. O primeiro ato que praticou, foi destruir a muitos de seus membros,
acusando-os em tudo quanto se referia à sua administração.
Depois, durante o mandato do Arconte Conon, arrancou ao Conselho todas as
prerrogativas que ele havia adquirido, privando-o ainda de ser o
guardião da constituição, e transferindo alguns Poderei ao
Conselho dos Quinhentos, e outros à Assembléia. Quando de
sua revolução, foi ajudado por Temístocles, membro do
Areópago, esperando que este o julgasse, acusado que era dos tratos
havidos com a Pérsia e que eram considerados como traição.
Este era o motivo do seu desejo de derrubar o Areópago, advertindo
por isso a Ephialtes que o Conselho pensava no seu arresto, ao mesmo tempo que
informou aos partidários do Areópago, que lhes revelaria os nomes
de certas pessoas que estavam conspirando para transformar a
constituição. Então conduziu os representantes delegados
pelo Conselho, à residência de Ephialtes, prometendo-lhes indicar
os conspirados que ali se reuniam, e aos quais dirigiu a palavra,
empregando termos severos. Isto fez com que Ephialtes se alarmasse,
refugiando-se covardemente no altar. Todos surpreenderam-se do que presenciavam
e, quando se reuniu o Conselho dos Quinhentos, Ephialtes e Temístocles
resolveram denunciar o Areópago. Da mesma maneira agiram com respeito à
Assembléia, até que conseguiram privá-la de seu
poder. Não muito depois, Ephialtes foi assassinado por Aristodico
de Tanagra. Deste modo o Conselho do Areópago ficou privado de ser o
guardião da República.

XXV

Após esta resolução a administração
da República enfraquecia-se cada dia mais, em conseqüência da
grande rivalidade entre os candidatos que disputavam entre si o favor pública
Durante este período, o partido moderado não tinha chefe
verdadeiro, pois seu caudilho Cimon, filho de Milciades, era um tanto jovem e
havia se atrasado na sua entrada na vida pública; ao mesmo tempo o
populacho tinha sofrido grandes perdas em virtude da guerra. Os soldados
destinados ao serviço ativo, eram selecionados nesse tempo entre os
inscritos nas listas das cidades e, como os generais careciam de
experiência militar, pois que seu cargo era devido tão somente à
posição de suas famílias, acontecia que era comum morrerem
dois a três mil homens em cada expedição e, deste modo, iam
desaparecendo os melhores soldados, tanto entre os pertencentes às
classes médias, como às superiores.

A conseqüência disso, foi que, na maior parte dos
assuntos administrativos, passou-se a ter menos em consideração
os textos das leis que anteriormente. Contudo, no que respeitava à
eleição dos nove Arcontes, seu método não sofreu
qualquer modificação até cinco anos depois da morte de
Ephialtes, quando se resolveu que os candidatos que deviam se submeter a
sorteio para o desempenho do cargo, tinham que ser selecionados entre os
Zeugitas. O primeiro Arconte pertencente a esta classe foi Mnesiteides.
Até essa época todos os Arcontes tinham sido eleitos entre os
Pentacosiomedimnios e Cavalheiros, enquanto os pertencentes aos Zeugitas
ficavam limitados às magistraturas ordinárias. Quatro
anos depois, durante o mandato do Arconte Lysicrates, os trinta juizes locais,
como eram chamados, foram restabelecidos, e, dois anos mais tarde, durante o
mandato do Arconte Antídoto, em vista do grande aumento da cifra de
cidadãos, tomou-se a resolução, proposta por Péricles,
que ninguém poderia ser admitida a gozar do privilégio, sem que
fosse de estirpe citadina, tanto da parte de pai como de mãe

XXVI

Foi depois destes acontecimentos que se deu a
aparição de Péricles como corpo de Jurados. Alguns fizeram
críticas, acusando-o de que com essa pratica iria se corromper o caráter
dos jurados, embora fossem sempre homens pertencentes ao povo os que se
apresentavam à eleição para essa função, e
não os outros, que desfrutavam de melhor posição na
sociedade. Demais, estabeleceu-se o suborno, sendo Anito o primeiro que o
pôs em prática no exercício de seu mandato de Pilos, pois
que sendo processado por certos indivíduos, sob a acusação
de ser o causador da perda da dita cidade, escapou, entretanto,
graças a ter subornado o corpo de jurados.

XXVII

Tudo correu muito bem na República, enquanto Perfiles
foi caudilho do povo, mas logo após a sua morte as coisas pioraram. Pela
primeira vez erigiram-se em chefes, aliás de acordo com a vontade do
povo, pessoas que não gozavam de boa reputação entre a
gente de boa posição, enquanto até então, sempre se
observou que os eleitos acaudilhavam a democracia. O primeiro chefe
popular foi Sólon, ao que se seguiu Pisístrato, ambos de boa sociedade
e de posição definida. Depois da queda dos tiranos foi Clístenes,
membro da casa dos Alcomeonios, que não teve competidor depois da expulsão
do partido de Iságoras. Depois deste, o chefe popular foi Xantipo,
sendo Milciades da classe superior. Logo vieram Temístocles e
Aristides e, depois, vieram Ephialtes, como chefe popular, e Cimon, filho de
Milciades, de classe superior. Péricles seguiu-se-lhes como caudilho
popular e Tucídides, aparentado com Cimon, o foi da oposição.
Depois da morte de Péricles, Nicias, que mais tarde caiu em Sicília,
apareceu como chefe da aristocracia, e Cleon, filho de Claeneto, chefe
popular. Parece que o ultimo, foi a causa da corrupção da
democracia, mais que ninguém, pelas suas disparatadas iniciativas. Logo
vieram Teramenes, filho de Hagnon, como chefe de um partido, e o construtor de
liras, Cleophon, como chefe do popular. Cleophon foi quem instituiu pela
primeira vez o donativo de óbolos nas funções teatrais,
costume que continuou sendo adotado durante algum tempo. Porém,
Kallikrates de Peanía o superou, prometendo acrescentar um terceiro óbolo
ao dito donativo, Estes dois foram mais tarde condenados à morte porque
o povo, ainda quando se engane uma vez, chega finalmente a detestar aqueles
que o defraudaram mediante algum expediente indigno. Depois de Cleophon o
caudilhismo popular foi ocupado sucessivamente por homens que gostavam de
salvar as aparências, nada levando a serio e inclinando-se para o lado da
maioria, tendo em vista unicamente os interesses momentâneos. Os melhores
estadistas que teve Atenas, depois dos que governaram durante os tempos
primitivos, parece terem sido Nicías, Tucídides e Theramenes.

Quanto a Nicías e Theramenes, quase todos
estão de acordo em afirmar que não só eram homens de boa
origem e caracter, mas também verdadeiros estadistas, que governaram
paternalmente. No que se refere aos méritos de Theramenes, as
opiniões se mostram divididas, porque aconteceu que durante o seu
mandato, os assuntos públicos estavam num período atribulado.
Porém, os que expõem sua opinião deliberadamente, o julgam
de modo diferente de seus críticos, quando dizem que destruiu toda a
constituição; aqueles o consideram como fiel a ela, visto como
jamais violou nenhuma de suas leis, demonstrando deste modo que era tão
capaz como qualquer outro bom cidadão de viver sob qualquer
sistema, enquanto por outro lado recusou sempre patrocinar a ilegalidade,
sendo o seu maior inimigo.

XXVIII

Enquanto foram bafejados pela sorte em suas guerras, os Atenienses
conservaram sua democracia, mas em seguida desastre de Sicília, quando
foram sobrepujados pelos Lacedemônios que se tinham aliado com o rei da
Pérsia, viram-se na necessidade de abolir, estabelecendo em seu lugar a
constituição chamada dos Quatrocentos. O discurso que lhes
recomendava esse passo foi pronunciado por Melobio, antes de ser procedida a
votação, sendo Pitodoro de Anaphilisto quem apresentou a
proposição. Porém, o verdadeiro argumento que
convenceu a maioria, foi a crença de que se sua
constituição se baseasse na oligarquia, contariam com mais
probabilidades do que se o rei da Pérsia se aliasse com eles, A
moção de Pitodoro se propunha a produzir o seguinte efeito:
a Assembléia popular tinha que eleger vinte pessoas de mais de
quarenta anos de idade que, conjuntamente com os dez membros existentes do
Conselho de Segurança Pública, depois de ter prestado
juramento de que tomariam as medidas que julgassem mais convenientes para a República,
aprovassem proposições para a segurança pública.
Demais, alem deles, qualquer, outra pessoa podia apresentar, de modo que entre
todos os métodos que se oferecessem, pudesse o público eleger o
melhor. Pitodoro solicitou que a Junta investigasse as antigas leis postas em
vigor por Clístenes quando criou a democracia, com o fim de que as
tivessem à vista e, assim, estivessem em condições de
decidir com prudência; opinava que a constituição de Clístenes
não era verdadeiramente democrática, senão muito
semelhante & de Sólon. Uma vez nomeada a junta, a primeira
proposição que lhe foi apresentada foi a de que os Pritanos
fossem obrigados a por em votação toda moção que
fosse apresentada em favor da segurança pública. Logo foram
anuladas todas as denuncias devidas a proposições ilegais,
todas as delações e acusações públicas, com
o objetivo de que todo o Ateniense gozasse de liberdade para dar seu conselho
sobre a situação, se assim o julgasse conveniente decretando
que, se alguém impunha uma multa a outro pela sua atuação
nesses assuntos, ou o acusava ou citava ante um tribunal, fosse
imediatamente detido e levado à presença dos generais que o
entregariam ao Conselho dos Onze para que lhe fizessem justiça,
condenando-o se a investigação procedida sobre o caso o
considerasse realmente culpado. Após estas medidas preliminares,
redigiram uma constituição que, em traços gerais, era
a seguinte: As rendas do Estado apenas poderiam ser gastas em despesas de
guerra. Todos os magistrados prestariam seus serviços sem
remuneração, em tempo de guerra, exceto os nove Arcontes e os
Pritanos, que receberiam três óbolos diariamente. Tudo o mais
concernente à administração, em tempo de guerra,
devia ser posto nas mãos dos Atenienses mais experimentados em prestar
serviços à República, calculando-se um número de
cinco mil, pelo menos, para todos os serviços. Esta corporação,
assim formada, tinha poderes amplos, podendo até negociar tratados
com quem julgasse necessário, elegendo também dez
representantes, com mais de quarenta anos de idade, por cada uma das tribos,
para que redigissem a lista dos Cinco Mil, após haver prestado juramento
diante do mais completo sacrifício.

XXIX

Deixe um comentário

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.