Isso foi o que a junta recomendou e, uma vez ratificado, os
Cinco Mil elegeram, entre eles, cem encarregados de redigir a constituição.
Quando foram nomeados, aprovaram e apresentaram as seguintes
propostas; haveria um congresso para desempenhar o poder, durante um ano,
provido de homens de mais de trinta anos e que prestariam seus
serviços sem remuneração. A esta corporação
pertenciam os militares, os nove Arcontes, o Registrador Amphictionico, chamado
Hieromnenon, os Taxiarcas, os Hiparcos Philarkos, os comandantes das
guarnições, os Tesoureiros de Atenéa e demais deuses, em número
de dez, os Tesoureiros das outras moedas não sagradas, em número
de vinte, os dez Encarregados dos Sacrifícios ou Hieropoeios, e os dez
Zeladores dos Mistérios. Todos eles deviam ser nomeados pelo Conselho
entre grande número de candidatos selecionados, eleitos entre seus
membros durante aquele tempo. Todos os demais cargos deviam ser preenchidos por
sorteio, entre os não pertencentes ao Conselho. Os Tesoureiros
Helênicos que administravam os fundos, não assistiam ao Conselho.
Quanto para o futuro, era necessário criar-se quatro conselhos de homens
que contassem a idade mencionada, tendo que eleger por sorteio um desses
para ocupar o cargo imediatamente, enquanto que os outros tinham que o
desempenhar, por sua vez pela ordem que fosse decidida por sorteio. Para isso
os cem encarregados tinham que se agrupar, tanto eles como os demais, e com
toda igualdade possível, em quatro partes, procedendo o sorteio com
o fim de ver quem tinha preferência, sendo que os eleitos desempenhariam
seus cargos durante um ano, obrigando-se a administrar como melhor achassem. Se
desejassem chamar ao conselho maior número de pessoas, cada um
dos membros tinha a faculdade de se adjudicar um ajudante de sua
própria eleição, sujeito às mesmas
condições quanto à idade. O Conselho tinha que se reunir
cada cinco dias, a não ser que houvesse necessidade de sessões
mais freqüentes. A votação do Conselho seria efetuada pelos
nove Arcontes: os votos dos grupos tinham que ser comprovados por cinco locutores
eleitos por sorteio, entre os membros do Conselho, tendo que eleger diariamente,
e por sorteio, um deles como presidente. Estes cinco tirariam a sorte quanto à
prioridade, entre as partes que desejassem apresentar-se perante o Conselho,
cedendo o primeiro lugar aos assuntos sagrados, o segundo aos
heráldicos, o terceiro às embaixadas, e o quarto aos demais
assuntos. Entretanto os assuntos de guerra tinham sempre preferência sobre os
demais, devendo ser tratados sempre que fossem necessários e sem
sorteio, apenas por proposta dos generais. Todo membro do Conselho que
não atendesse quando convocado, seria multado em uma dracma por cada dia
de ausência, exceto no caso em que estivesse com licença devidamente
concedida pela corporação.
XXX
Essa foi a constituição que promulgaram
para o futuro, tendo sido idealizado o seguinte sistema para o momento:
haveria um Conselho de Quatrocentos, como na antiga
constituição, quarenta por cada uma das tribos, eleitos
entre os cidadãos maiores de trinta anos de idade, pelos membros das
tribos. Este Conselho nomearia magistrados, indicando a maneira como deviam
prestar juramento, sendo que em tudo contas oficiais e outros assuntos em
geral, deviam agir de conformidade com a sua discrição.
Não obstante, tinham que observar as leis que fossem postas em vigor no
que se referisse à constituição do Estado, não
tendo faculdades para alterai-as nem para promulgar outras. Os generais
seriam nomeados provisoriamente entre a corporação dos Cinco Mil,
porém, tão depressa como o Conselho entrasse em
função, deveria ser comprovado tudo quanto se referisse aos
preparativos militares. Para isso seriam eleitos dez pessoas, com um
secretario, sendo que os eleitos deste modo desempenhariam seus cargos
durante o ano seguinte com plenos poderes, gozando do direito, sempre que assim
o quisessem, de se unir às deliberações do Conselho. Os
Cinco Mil tinham que eleger um só Hiparco e dez Philarcos, porém,
daí em diante, o Conselho elegeria estes cargos de conformidade com a
regulamentação acima indicada. Nenhum cargo, exceto o de membro
do Conselho e de general, podia ser desempenhado mais de uma vez, já por
parte dos primeiros que os ocupassem, já da parte dos que os sucedessem.
Quanto à distribuição futura dos quatrocentos nas
quatro seções sucessivas, os cem encarregados tinham que
dividi-las quando chegasse o dia em que os cidadãos tivessem que entrar
no Conselho com os demais.
XXXI
Os cem funcionários nomeados pelos Cinco Mil,
redigiram a constituição que acabamos de mencionar. Uma vez
ratificada pelo povo, sob a presidência de Aristômaco, o
Conselho existente, quer dizer, o Conselho correspondente ao ano de Cálias,
dissolveu-se antes de chegar o termo de seu mandato. Sua
dissolução teve lugar no dia 14 do mês de Targelion,
começando a desempenhar seu cargo o Conselho dos Quatrocentos, no
dia 21, enquanto o Conselho regular, eleito por sorteio, devia
começar suas funções no dia 14 de Schirophrorio. Deste
modo ficou estabelecida a oligarquia durante o mandato do Arconte
Cálias, precisamente cem anos depois da expulsão dos tiranos. Os
principais promotores da revolução foram Pisandro, Antiphon e
Teramenes, todos de elevada posição e de comprovada
reputação. Uma vez estabelecida esta
constituição, os Cinco Mil foram eleitos apenas nominalmente, e
os Quatrocentos, juntamente com os dez encarregados, aos quais tinham sido
conferidos amplos poderes, passaram desta forma, a ocupar a Casa do
Conselho e a administrar a República. Inauguraram seu mandato, enviando
embaixadores aos Lacedemônios e propondo-lhes a cessação da
guerra na base da situação existente. Porém, como os Lacedemônios
não os quisessem escutar no tocante a abandonar a supremacia naval,
ficariam rotas todas as negociações.
XXXII
A constituição dos Quatrocentos durou uns
quatro meses; Mnasiloco desempenhou o mandato de Arconte, nomeado por eles, durante
dois meses, no ano de Theopompo, que foi o Arconte durante os dez meses
restantes. Ao perder a batalha naval de Eretria e inteirar-se da
rebelião de Euboea, que se levantou toda, enceto Oreo, a indignação
popular foi maior que diante dos desastres anteriores, embora naquele tempo
fossem recebidas provisões da Euboea em maior parte que mesmo da
Ática. Assim, foram depostos os Quatrocentos, ficando os Cinco Mil
encarregados da direção do Estado, visto que todos os
membros deste agrupamento possuíam equipagem militar. Ao mesmo
tempo foi votado que se não remunerasse nenhum cargo público. Os
principais responsáveis da Revolução foram Aristocrates e
Theramenes que desaprovaram a gestão dos Quatrocentos por reterem em
suas mãos os assuntos públicos sem conceder
participação alguma aos Cinco Mil. Parece que durante este
período a constituição da República foi
admirável, posto que fosse tempo de guerra, estando o privilegio
nas mãos dos que possuíam equipamento militar.
XXXIII
Não obstante, bem depressa o povo retirou aos Cinco
Mil o monopólio de governo; seis anos após serem derrubados os
Quatrocentos, durante o mandato do Arconte Cálias de Angele, foram
também ajustadas contas da batalha Arginusa, resultando na
condenação, em um só conselho, dos dez generais que tinham
alcançado a vitória, pois que o povo tinha sido mal informado
por pessoas que lhe tinham despertado a indignação, muito embora
alguns dos ditos generais não tivessem mesmo tomado parte na batalha
em questão. Em
segundo lugar, quando os Lacedemônios propuseram evacuação
de Decelea, celebrando paz na base da situação existente no
momento; ainda que alguns Atenienses concordassem com. tal política, a
maioria recusou dar-lhes ouvidos, a esse mau caminho foram levados por Cleophon
que se apresentou na Assembléia embriagado e evitando qualquer acordo
para a paz, declarando que nunca a aceitaria, a menos que os Lacedemônios
renunciassem às suas reclamações sobre todas as cidades
aliadas. Nessa ocasião perderam uma ótima oportunidade que
se apresentava, dando-se conta, pouco depois, do erro que haviam cometido.
No ano seguinte, durante o mandato do Arconte Alexias, foram vitimas do desastre
de Aegospotami, cujas conseqüências foram que Lysardo dominasse
a cidade, estabelecendo o governo dos Trinta, coisa que efetuou do
seguinte modo; Uma das condições estipuladas para a paz foi que a
República seria governada de conformidade com a antiga
constituição. De acordo com ela, o partido popular intentou
conservar a democracia, enquanto a parte da classe superior pertencente
às associações políticas, unidas aos expatriados,
que tinham regressado depois de celebrada a paz, tendia para a oligarquia,
sendo que os que não pertenciam a nenhum agrupamento, embora a
outros respeitos se considerassem tão valiosos como quaisquer outros
cidadãos, sentiam ansiedade por restaurar também a
constituição antiga. Entre estes últimos encontravam-se
Arcino, Anito, Cleitophon, Phormisio e muitos outros, sendo, porém,
Theramenes, seu principal orientador. Lysardo pôs sua influência a
serviço do partido oligarca, e a Assembléia Popular viu-se
obrigada, por insofismavel intimidação, a aprovar um voto que
estabelecia a oligarquia. Este projeto foi proposto por Dráconntides de
Aphidna.
XXXIV
Ficaram, assim, os Trinta estabelecidos no poder durante o
mandato do Arconte Pitodoro. Tão depressa se apoderaram da cidade, foram
relegadas ao esquecimento todas as resoluções aprovadas e
referentes organisação da constituição; mas depois
de haver nomeado um Conselho de Quinhentos, bem como os demais magistrados,
entre mil candidatos selecionados, associando-se a dez Arcontes no Pireu, onze
inspetores de cárceres e trezentos flageladores, como escolta, com a
ajuda de todos eles, tiveram amplo domínio sobre a cidade. No principio
trataram moderadamente os cidadãos, pretendendo administrar a República
de conformidade, com a antiga constituição. Seguindo esta
política, baixaram da colina do Areópago as leis de Ephialtes e
Archestrato, referentes ao Conselho do Areópago, sendo revogados os
estatutos de Sólon que não apresentavam clareza, abolindo o poder
supremo das audiências. Ao fazerem isso diziam que restabeleciam a
Constituição, livrando-a de tenebrosidades, tais como: deixar em
liberdade absoluta o que testava instituindo herdeiros a seu gosto, e
abolir as limitações existentes em caso de loucura, velhice
e influencia feminina indébita, com o fim de não deixar
resquício por onde pudessem se infiltrar os acusadores profissionais. De
igual maneira procederam com outras coisas. Em princípio sua conduta
não rebaixou esses limites, anulando aos acusadores profissionais e aos
maliciosos e malvados que, em detrimento da democracia, tinham aderido a ela
com o fim único de usufruir beneficio. Tudo isto foi muito agradável
à cidade, acreditando-se que os Trinta o faziam com a melhor das
intenções. Porém, tão depressa como tiveram a
cidade em suas mãos, não repararam em nada que dissesse respeito
aos cidadãos, condenando à morte quantos tivessem o menor
deslize. Com tal sistema tinham em vista que desaparecesse toda e qualquer
pessoa que lhes pudesse de qualquer quer maneira infundir temor, ao mesmo tempo
que lhes era muito agradável satisfazer o apetite, pondo a mão
nas propriedades dos condenados. Em pouco tinham sido condenados à morte
de mais de mil e quinhentas pessoas.
XXXV
Mesmo assim, Theramenes, ao ver que a cidade era levada
à ruína, mostrou-se desgostoso com aquele modo de proceder,
aconselhando-os que cessassem com aquela política insensata, permitindo
que as classes superiores participassem do governo. Ao principio resistiram
em aceitar tal conselho, mas quando foram conhecidas no estrangeiro suas
proposições, e as massas começaram a se agitar, foram
presas de alarme, temendo que Theramenes chegasse a acaudilhar o povo e derrubasse
seu despótico governo. Por isso redigiram uma lista de três
mil cidadãos aos quais anunciavam que concediam que participassem do
governo. Não obstante Theramenes criticou essa idéia
também, primeiramente baseando-se em que, enquanto propunham conceder a
todos os cidadãos respeitáveis, participação
no governo, concediam-na agora apenas a três mil, como se todos os
méritos estivessem limitados a essas pessoas, e, em segundo lugar,
porque praticavam duas coisas opostas, visto que assentavam o governo sobre a
força e, contudo, faziam com que os governantes fossem inferiores em
força aos governados. Ainda assim, não fizeram caso de suas
criticas, demorando muito a publicação da lista dos Três
Mil, ficando para eles apenas os nomes dos que nela figuravam e, sempre que se
resolviam a públicá-la, excluíam alguns que tinham sido incluídos,
inserindo outros que tinham sido omitidos.
XXXVI
Quando chegou o inverno, Trasíbulo, juntamente com os
desterrados ocuparam Philé, sendo assim vencida a força que os Trinta
tinham organizado para atacá-los. Estes então resolveram o
desarmamento da massa bem como se desfazerem de Theramenes, coisa que levaram a
efeito do seguinte modo: Apresentaram duas leis ao Conselho, cuja
aprovação ordenaram; a primeira delas entregava, de um modo
absoluto, o poder nas mãos dos Trinta, afim de poderem condenar à
morte os cidadãos, quaisquer que fossem, uma vez que não fizessem
parte da lista dos Três Mil, enquanto que pela segunda lei ficavam
desqualificados todos que tivessem intervido na demolição da
fortaleza de Stioncia, ou tivessem procedido de qualquer maneira contra os
Quatrocentos organizadores da oligarquia anterior, privando-os de qualquer
participação no privilegio. Como Theramenes se achasse incluído
nos dispositivos de ambas as leis, tão depressa elas foram ratificadas,
ficou excluído do privilegio, gozando os Trinta de pleno poderes
para o condenar à.morte. Uma vez tendo ficado Theramenes em tais
condições, desarmaram também o povo, exceto os Três
Mil, mostrando os detentores do poder uma completa falta de escrúpulos
com relação a tudo quanto fosse crueldade e crime. Foram
também enviados embaixadores aos Lacedemônios para desacreditar
Theramenes e, ao mesmo tempo, solicitar o seu apoio. Os Lacedemônios,
como resposta ao seu apelo, enviaram Calibio na qualidade de governador
militar, com uns setecentos soldados, que logo ocuparam a Acrópole,
tão depressa chegaram.
XXXVII
A estes acontecimentos sucedeu a ocupação de
Municia pelos desterrados de Philé e sua vitória sobre os Trinta
e seus sequazes. Depois da luta o partido da cidade retirou-se, reunindo-se no
dia seguinte no mercado, depondo os Trinta e elegendo dez cidadãos com
amplos poderes para que pusessem fim à guerra. Contudo isso, uma vez que
assumiram as rédeas do governo, os Vez nada fizeram quanto ao objeto
para que tinham sido eleitos, tendo apenas enviado mensageiros à Lacedemônia,
rogando que os ajudassem e lhes emprestassem dinheiro. Demais, observando
que os cidadãos que gozavam do privilegio mostravam-se desgostosos com
seus modos de proceder, sentiram receio de serem depostos e, por
isso, com o fim de espalhar o terror entre eles, o que conseguiram, detiveram
Demareto, um dos cidadãos mais eminentes, condenando-o a morte. Tal
ato robusteceu-lhe o governo, tendo o povo que suportar Calibio e os seus
Peloponenses com muitos dos cavalheiros, porque alguns dos pertencentes a
esta classe mostravam-se muito zelosos entre os cidadãos, opondo-se
a que os desterrados de Philé voltassem. Contudo, quando o partido do
Pireu e Municia começou a ganhar terreno na guerra, em vista da
defecção da população inteira que não se
lhes uniu, o partido da cidade derrubou os Dez primeiramente nomeados,
substituindo-os por outros Dez que foram eleitos entre os homens de melhor
reputação. Pela sua administração e pela sua ativa
e zelosa cooperação, estabeleceu-se um tratado de
reconciliação, voltando o povo à cidade. Os mais eminentes
entre os que formavam aquele Conselho foram Rinon de Peania e Phailo de
Acherdo, que foram os que, antes da chegada de Pausânias, entraram em
negociações com o partido do Pireu e, depois de sua chegada,
secundaram seus esforços para conseguir a volta dos expatriados. Foi Pausânias,
rei dos Lacedemônios, quem levou a paz e a reconciliação à
bom termo, juntamente com os dez encarregados do arbitramento e que chegaram
mais tarde da Lacedemônia devido ao seu urgente chamado. Rinon e os seus
foram objeto de depois do respectivo juramento, quanto às pessoas que
já estivessem no país rea2izando-se a sua partida dentro dos
vinte dias que se seguissem. Os que se achassem fora do país gozariam
das mesmas condições, a partir da sua chegada. Ninguém que
se estabelecesse em Eleusis poderia desempenhar qualquer cargo em Atenas,
até se identificar com a cidade. Os julgamentos por homicídio
ou ferimentos, isto é, tentativa de morte, seriam julgados de conformidade
com as leis antigas. Haveria anistia geral no que se relacionasse com os
acontecimentos anteriores, sendo essa medida extensiva todos, exceto aos
Trinta, aos Dez, aos Onze e aos magistrados do Pireu. Contudo, tombem estes
seriam favorecidos, si submetessem suas provas a um julgamento
ordinário. Tais provas deviam ser levadas pelos magistrados do Pireu
diante de um tribunal de cidadãos. Nestas condições, aqueles
que o desejassem, podiam deixar a cidade. Cada uma das partes tinha que
satisfazer separadamente a importância que Houvesse tomado por
empréstimo para a guerra.
XXXIX
Quando estabeleceram a reconciliação de
conformidade com as condições acima, os que tinham lutado por
parte dos Trinta, sentiram-se bastante receosos, motivo por que grande número
deles pensou em deixar a cidade, porém, como aguardavam o momento
de dar os seus nomes, cujo prazo estava a expirar, como de costume, vendo
Arquino que seu número era bastante elevado e desejando
conservá-los como cidadãos, tornou sem efeito os dias que ainda
faltavam para encerrar a lista, sendo deste modo muitos os que foram obrigados
a permanecer na cidade, embora a contragosto, até recuperarem a
confiança. Esta foi uma das ocasiões
em que Archino parece ter
agido como político, sendo a outra, a subseqüente, o processo de
Trasíbulo, acusado de ilegalidade por apresentar uma proposição
pela qual se conferia privilegio a todos que tinham tomado parte na volta do
Pireu, embora todos soubessem que alguns eram escravos. Outra ocasião
que se lhe apresentou, foi o caso de um dos desterrados que, na sua volta,
começou a violar a anistia, sendo por isso citado por Archino ante o
Conselho, persuadindo-o que o condenasse à morte, sem julgamento
prévio, dizendo-lhes que assim deviam fazer, se quisessem conservar a
democracia e cumprir os juramentos que haviam prestado, visto como se
deixassem escapar aquele homem, animariam a que outros o imitassem, enquanto
que se o executassem, dariam um exemplo que todos teriam sempre
presente. Isto foi justamente o que aconteceu, porque depois da sua
execução, ninguém mais violou a anistia, mas pelo
contrario, os Atenienses portaram-se, tanto pública como privadamente,
de um modo admirável e que não tinha precedentes no que se
referia aos passados distúrbios. Não só limparam todas as
manchas dos agravos anteriores, como também satisfizeram aos Lacedemônios,
do tesouro público, todas as somas que os Trinta haviam pedido emprestado
para a guerra, muito embora o tratado estabelecesse que cada parte, tanto
a cidade como o Pireu, pagasse as suas separadamente. Se assim foi feito,
é porque julgaram que esse era um passo necessário para
estabelecer a verdadeira concórdia . Porém,
em outros Estados, longe
dos partidos democráticos que fazem adiantamentos de suas
próprias possessões, costumam estabelecer distribuições
gerais de terras. Dois anos depois da cessão, durante o mandato do Arconte
Senaeneto, fez-se a reconciliação final com os secessionistas.
Durante a época de que estamos falando, o povo que se
havia apoderado do governo da República, pôs em vigor a
constituição existente em nossos dias. Naquela época o Arconte
era Pitodoro mas parece que a democracia assumiu o poder supremo dentro da
justiça, posto que devesse o seu retorno aos seus próprios
esforços. Essa foi a undécima mudança que experimentou a
constituição ateniense. A primeira modificação que
sofreu seu estado primitivo foi quando Íon e seus companheiros
uniram o povo, que até então estivera dividido em quatro tribos,
em comunidade, criando os reis tributários. Depois desta primeira
alteração, houve outra, durante o reinado de Teseu, que consistiu
num ligeiro desvio da monarquia absoluta. Veio depois a constituição
formada nos tempos de Drácon, quando foi redigido o primeiro
código de leis. A terceira transformação foi a que
sucedeu à guerra civil, nos tempos de Sólon, tendo, desse movimento,
surgido a democracia. A quarta, foi a tirania de Pisístrato. A quinta,
foi a constituição de Clístenes, depois da
deposição dos tiranos, de caráter mais democrático
que a de Sólon. A sexta, foi a que se seguiu às guerras
pérsicas, quando o Conselho do Areópago se encarregou da
direção da República. A sétima, foi a constituição
esboçada por Aristides e completada por Ephialtes ao derrubar o
Conselho do Areópago. Durante o governo deste último, a
nação reduzida pelos demagogos, incorreu nos mais graves
erros com relação aos interesses do seu império
marítimo. A oitava, foi o estabelecimento dos Quatrocentos. A nona,
foi a restauração da democracia. A décima, a tirania dos
Trinta e dos Dez, sendo a undécima, a que sucedeu à volta dos
refugiados de Philé e do Piro. Essa ultima transformação
tem resistido até os nossos dias, com o continuo aumento do poder
do povo. A democracia apoderou-se de tudo e administra com seus votos
na Assembléia e no Palácio de Justiça, nos quais exerce
seu poder supremo. Mesmo a jurisdição do Conselho descansa
nas mãos do povo em grande parte, parecendo isso muito judicioso, pois
que as pequenas corporações estão mais sujeitas que as
grandes à corrupção, já mediante suborno, já
mediante influência. No principio foi recusado conceder
remuneração por assistência à Assembléia,
dando em resultado que o povo não comparecia às suas
sessões. Em vista disso, depois que os Pritanos projetaram, em pura
perda, varias medidas para induzir o povo a comparecer à
Assembléia e ratificar a sua votação, Agirio, como
primeira providência, estabeleceu a gratificação de um óbolo
diário, que Heradides de Clazomene, chamado o rei aumentou para dois, e
Agirio, novamente, para três.