Introdução a Sociologia – PRIMEIRA PARTE – OS PROBLEMAS SOCIOLÓGICOS
Professor A. Cuvillier (1939).
Capítulo II A ESPECIFICIDADE DO SOCIAL: A SOCIOLOGIA NATURALISTA E A SOCIOLOGIA PSICOLÓGICA
Faltava à sociologia adquirir uma noção essencial: tinha de tomar consciência nítida da especificidade do social, quer dizer, do fato de os fenômenos sociais constituírem, segundo expressão de Durkheim, um "reino natural" com os seus caracteres próprios e distintos das outras ordens de fenômenos.
I. — Os precursores
Em boa verdade, quando uma disciplina tende a constituir-se como ciência, obedece, freqüentemente, a exigências opostas e, aparentemente, contraditórias. A nova ciência, por necessidade de se afirmar como disciplina positiva, sofre, primeiramente, a atração das ciências mais próximas a ponto de simplificar ao extremo o seu objeto, a fim de se identificar com elas. Mas chega um dia em que essas simplificações se mostram decididamente inadequadas à complexidade do objeto estudado e em que se afirma a especificidade desse objeto.
A sociologia passou, naturalmente, por essas vicissitudes, e foi, na sua origem, fortemente influenciada pelas ciências naturais.
Na França, atribui-se a Saint-Simon geralmente a honra desta concepção de uma ciência autônoma dos fenômenos sociais. Mas apressamo-nos a dizer imediatamente que Saint-Simon se limitou a continuar uma tradição que já vinha dos Enciclopedistas. É a estes que Durkheim, em 1900, no seu artigo na Revue Bleue, atribui as origens da idéia sociológica. René Hubert mostrou como os Enciclopedistas "fizeram penetrar nas ciências sociais o espírito positivo" : antes de Comte, eles afirmam a unidade dos conhecimentos humanos ; aceitam a idéia de um determinismo universal, no qual tudo está ligado; já d’Holbach dissera que há um sistema social, como há um sistema da natureza. Mas, reconhece o mesmo autor, por outro lado, os nossos "filósofos" tiveram muito pouco "o sentido do coletivo e do social, considerados como tais"; racionalistas, até leibnizianos, acreditavam na unidade da natureza humana e, para eles, "pois que se trata de descobrir o universal, é uma inutilidade proceder, pela investigação objetiva, à comparação dos tipos sociais".
Esta idéia de uma "ciência do Homem" de que fala dAlembert, depois de bacon, nem por isso deixa de se transmitir, através da tradição dos Ideólogos e dos médicos (Cabanis, Bichat), até Saint-Simon. Mas continua a ser de inspiração biológica. O próprio Saint-Simon (1760-1825) andou, diz-nos Maxime Leroy, "muito preocupado com a fisiologia". Foi tomando esta ciência como modelo que êle concebeu aquilo a que chamou a "ciência nova". Na sua Mémoire sur la science de l’Homme (1813), insiste sobre a necessidade de basear todos os raciocínios em fatos constatados e criticados, e acrescenta: "Conclui-se daqui, necessariamente, que a fisiologia, de que a ciência do homem faz parte, deverá ser tratada pelo método adotado para as outras ciências físicas". É por isso que a história, apesar de já ser bem grande a sua tendência para explicar os grandes fatos com pequenas causas, deve, segundo êle, deixar de ser um conjunto de "histórias nacionais" para se tornar "a história da Espécie".
A diferença entre sociologia e fisiologia encontra-se mais bem vincada no seu discípulo, o médico Buchez, que publicou, de abril a setembro de 1826, na revista saint-simoniana Le Producteur, uma série de artigos muito interessantes sobre "os pontos de passagem da fisiologia individual para a fisiologia social". Ainda que admitindo que é no indivíduo que se encontra "a origem dos diversos fenômenos gerais apresentados pela fisiologia da espécie", especialmente a da divisão do trabalho, Buchez expõe, em termos muito claros, o princípio da especificidade dos fenômenos sociais. O seu raciocínio é absolutamente típico: "Os fenômenos sociais — escreve êle — não são idênticos nos diversos pontos do globo e nas diversas épocas históricas. Ao passo que o indivíduo apresenta sempre os mesmos instintos, as mesmas paixões, as mesmas necessidades (Buchez explica que nem "a diferença das raças", nem "a variedade dos climas" produzem modificações essenciais), a organização social difere o mais possível e sofre mutações numerosas e acentuadas, o que, em nossa opinião, demonstra que a sociedade não é a única expressão das tendências individuais e que a espécie está submetida a leis especiais, diversas das que regem a fisiologia." (Le Producteur, abril de 1826, pág. 132).
Mas foi sobretudo augusto Comte quem vulgarizou a noção de uma ciência positiva e autônoma dos fenômenos sociais.* É sabido que toda a sua classificação das ciências assenta na idéia de uma hierarquia de disciplinas, na qual as que têm um objeto mais complexo dependem das que têm um objeto mais simples, sem contudo se reduzirem a elas e conservando a sua originalidade própria. A "física social", como Comte lhe chama ainda nas primeiras lições do Cours de Philosophie positive, a "sociologia", como lhe chamará no tomo IV (1839), para evitar confusões com a física social de Quételet (1835), — constitui, precisamente, o ponto mais elevado dessa hierarquia. A "física" ou ciência da natureza, divide-se em: física inorgânica e em física orgânica, e esta, por sua vez, em fisiologia propriamente dita, tendo por objeto os fenômenos individuais, e em física social, aplicando-se "aos que dizem respeito à espécie, sobretudo — acrescenta bizarramente Augusto Comte — quando ela é social". Observemos, com efeito, que há, a este respeito, tanto em Comte como em Saint-Simon e em Buchez, um equívoco: o conceito de espécie é um conceito biológico ; só o conceito de sociedade e de agrupamento social é propriamente sociológico. Sente-se, portanto, ainda aqui, a ação das ciências naturais sobre o estudo dos fenômenos sociais. Comte não frisa com menos energia que a física social é bem mais que um "simples apêndice da fisiologia", e combate as ilusões de Cabanis e de Gall, que pretendem reduzir as leis das sociedades às da vida individual. Com efeito, diz êle, "as condições sociais que modificam a ação das leis fisiológicas são, precisamente, então, o que é mais essencial considerar". Essas condições são, não somente "a ação dos indivíduos uns sobre os outros", mas sobretudo, na espécie humana, "a ação de cada geração sobre a que a se-gue"", a solidariedade das gerações entre si. Em sociologia, como em fisiologia, devemos colocar-nos, sucessivamente, no ponto de vista estático e no ponto de vista dinâmico. A estática social procurará as leis de coexistência: será uma "espécie de anatomia social" que terá por objeto as ações e reações que exercem continuamente, umas sobre as outras, as diversas partes do sistema social. Com efeito, há em COMTE, neste ponto, uma idéia muito importante, de que teremos de voltar a falar: é que "os fenômenos sociais são profundamente conexos", e que, por conseguinte, o "seu estudo real nunca poderá ser racionalmente separado; disto resulta a obrigação permanente de sempre considerar simultaneamente os di-‘ versos aspetos sociais". Quanto à dinâmica social, o seu objeto será a investigação das leis de sucessão : em face da estática, teoria da ordem, constituirá uma teoria do progresso, mas sob a condição de tirar a este termo toda e qualquer significação finalista, fazendo-o, simplesmente, sinônimo da palavra desenvolvimento, "que designa, sem nenhuma apreciação moral, um fato geral incontestável". Com efeito, esse desenvolvimento aparece como submetido a leis naturais, como efetuando-se segundo uma ordem determinada, que revela, segundo Comte, "a exata comparação dos desenvolvimentos paralelos, observados em populações distintas e independentes", mais uma idéia fundamental de que a sociologia se devia apropriar.
Em resumo, a contribuição da tradição saint-simoniana e comtista é uma noção já bastante nítida da especificidade da sociologia, conservando, no entanto, uma certa tendência para a conceber segundo o tipo da biologia.
II. — a sociologia naturalista
É interessante seguir o movimento graças ao qual a sociologia — depois de se ter colocado ao serviço das disciplinas vizinhas, e isto precisamente tendo em vista firmar-se sobre uma base positiva — foi levada a afirmar cada vez mais nitidamente essa noção da especificidade dos fenômenos sociais.
Ver-se-á, no capítulo VI, como a antropossocio-logia e a sociogeografia, que julgavam ter encontrado o "substrato" dos fenômenos sociais, uma no quadro físico, no meio geográfico, a outra num elemento fisiológico tal como a raça, acabaram, nos nossos dias, por pôr em evidência os fatores propriamente humanos: a ação do homem sobre a natureza.
1. O organicismo.
— Mas a forma mais cara-terística tomada pela sociologia naturalista foi a chamada teoria organicista, que consiste em assimilar a sociedade a um organismo vivo. A idéia é muito velha. Mas as descobertas da biologia moderna, fazendo aparecer o organismo como um sistema de unidades individuais, as células, deviam favorecer essa tendência.
Para dizer a verdade, os próprios biologistas tinham ido buscar aos fenômenos sociais alguns termos de comparação. Henri Milne-Edwards, na Introdução das suas Leçons de physiologie et d’ana-tomie comparée (1857), dedicava-se a mostrar que a divisão do trabalho existe "tanto nas criações da natureza como nu indústria dos homens", e sabe-se que Darwin se inspirou, para edificar a sua teoria da concorrência vital, nas idéias do economista Malthus.
Mas, se desta forma os biologistas foram bus-car ao dominio dos sociólogos algumas vagas analo-gias, é necessário confessar que estes se pagaram largamente. Foi, talvez, no sociólogo russo Lilienfeld que essa tendência atingiu a forma mais dogmática. Na sua obra principal, escrita em alemão sob o tí-tulo: Pensamentos sobre a ciência social do futuro ( 1873-1881), assimila, sem reservas, a sociedade a um organismo vivo e leva a comparação até aos mais pequenos detalhes: chama "formação do capital" à constituição das reservas orgânicas e das tendências hereditárias e assimila-a à produção e à transmissão dos bens materiais e espirituais, na sociedade. Para ele, nada há na sociedade que não exista na natureza viva.
O organicismo de Herbert Spencer mostra-se já muito mais circunspecto. Os seus Principes de Sociologie (1879) destinam-se, sem dúvida, a mostrar como há continuidade na evolução do inorgânico para o orgânico e deste para o "superorgânico", isto é, para o social: "A evolução social — formula êle como princípio — é uma parte da evolução em geral". Mas nele as analogias são procuradas, de preferência, no conjunto. A sociedade, segundo Spencer, deve ser encarada como um organismo, por duas razões: primeiro,, em virtude do seu "crescimento contínuo", em seguida, por causa do fenômeno da divisão do trabalho. Estas duas razões são, de resto, correlativas. Aqui, como em toda a parte, a evolução faz-se por integração, isto é, ao mesmo tempo por crescimento da massa e por passagem do homogêneo difuso para o heterogêneo coordenado.
Sob este aspeto, afirma Spencer, "os dois organismos são absolutamente semelhantes". No entanto, a analogia limita-se a isto, e o próprio Spencer indica duas diferenças, a segunda das quais, diz êle, é fundamental : é que, na sociedade, as unidades vivas estão separadas e mais ou menos dispersas, ao passo que o corpo de um animal forma um todo concreto; e, também, é que, no’organismo vivo, "a consciência está concentrada numa pequena parte do agregado", ao passo que na. sociedade "está espalhada por todo o agregado ; todas as unidades possuem aptidão para a felicidade e para a desgraça, pouco mais ou menos no mesmo grau" : não há "sensório social".
É este mesmo argumento — a existência de unidades conscientes — que corrige o organicismo do alemão. Albert Schaeffle e do belga Guillaume de Greef. Nos quatro volumes da sua Structure et vie do corps social (1875-1878) Schaeffle usa e abusa das analogias organicistas. Contudo, além de que, na segunda edição da obra (1896), a parte consagrada a estas analogias se encontra muito reduzida, êle assinala desde o início que organismos Vivos e sociedades formam uma gradação ascendente: a sociedade é "um organismo voluntário", mais uma organização que um organismo. Em conclusão, o método de Schaeffle provém mais de uma inspiração idealista, que se manifesta no seu Esquisse d’une sociologie (1906) : nesta obra, apesar de indicar os elementos de toda uma "morfologia social", como solo, capital social e população, e de reconhecer, por conseguinte, as relações constantes da sociedade com o mundo material, Schaeffle define-a como um cosmos moral, formado pela ação mútua das consciências individuais umas sobre as outras.
GUIHLLAUME de Greef manteve sempre, mesmo nos seus últimos trabalhos (1908), a sua concepção da sociedade "hiperorganismo": a sociedade obedece as leis gerais de estrutura, de funcionamento’ e de evolução da matéria organizada; como os organismos vivos, ela é suscetível de progresso e de "re-gresso" e, neste último caso, como no domínio orgânico, são as funções mais elevadas as primeiras a desaparecer. Todavia, G. de Greef afirma que "as sociedades apresentam propriedades, formas de combinações e de funcionamento, que não encontramos em mais parte alguma". Nos agregados sociais, as unidades componentes são capazes, no mais elevado grau, de se ligarem por meio de laços puramente contratuais. E assim, aos fatores econômicos e genesíacos vêm sobrepor-se os fatores estéticos, intelectuais, morais, jurídicos e, finalmente, políticos.
Mais nítida ainda foi a evolução de dois sociólogos franceses que, a princípio, tinham sido campeões do organicismo: Alfredo Espinas e René Worms.
No seu livro sobre as sociedades animais, Des Sociétés animales (1877), Espinas esforça-se por demonstrar que o próprio indivíduo é já uma sociedade, em que se manifestam os fenômenos de con-curso, de consenso vital que se encontram na ordem social: "Qualquer indivíduo complexo é um agrupamento de células ou de outros elementos orgânicos". Portanto, a ordem social mergulha as suas raízes até na ordem biológica, e há continuidade desde as sociedades mais simples até às sociedades baseadas na simpatia, em que a consciência é o fator predominante. Espinas chega até a definir a sociedade como "uma consciência viva ou um organismo de idéias". Em 1882, num artigo da Revue Philosophique, admite, contrariamente a Spencer, a existência de uma verdadeira "consciência coletiva". Depois disso, especialmente no seu célebre artigo de 1901 : Ser ou não ser no qual apresenta as condições de existência da sociologia, moderará ainda mais o seu organicismo, renunciando, expressamente, a fazer do agregado de indivíduos pluricelulares, do pólipo ou "blastoderme", o elemento original da realidade social.
Também René Worms, na sua primeira grande obra Organisme et Société (1896), adotava, quase sem reservas, a tese organicista. Mais tarde, reconheceu a necessidade de limitar êste ponto de vista. "O social — escreve êle ainda — é um aspeto da vida", e as leis biológicas aplicam-se em sociologia. Mas "inúmeros elementos novos se lhe introduzem, sob a ação das idéias e das vontades humanas". Passa-se do mundo orgânico para o mundo social "sem tropeções e sem interrupção, por intermédio do mundo mental"; e, se resta "qualquer coisa de orgânico" na sociedade, "essa parte orgânica foi recoberta, e, ao mesmo tempo, utilizada e desenvolvida por sucessivas e inúmeras contribuições mentais". Por essa razão, "a sociologia não poderia ser um simples prolongamento da biologia".
Em suma, se, procurarmos fazer o balanço do organicismo, veremos que, apesar das aparências, êle contribuiu para fixar a noção da especificidade dos
fenômenos sociais: assim como o organismo vivo possui uma realidade própria, diferente da dos elementos que o compõem, pois esses elementos podem mudar ou desaparecer ao passo que êle subsiste, também devíamos ser levados a compreender que o grupo social constitui uma realidade distinta, que é mais alguma coisa que um simples total, que uma simples justaposição de indivíduos: Spencer diz isto mesmo em termos claros: "a vida do conjunto é absolutamente diversa da vida das unidades, apesar de ser o produto desta última". Schaeffle afirma também que a sociedade é uma realidade e que o homem não precisou de inventá-la. Espinas declara, no artigo atrás citado: "Apesar de a sociedade nada ser sem os indivíduos, cada um deles é muito mais um produto da sociedade do que seu autor". G. DE Greef chega até a afirmar que a sociologia tem direito a ser reconhecida "como ciência ao mesmo tempo independente e soberana".
2. A zoossociologia.
— As ciências naturais provocaram uma outra série de investigações que, até certo ponto, ajudaram a precisar a posição dos problemas sociológicos: o estudo das "sociedades animais" — a zoossociologia.
Em Espinas, esse estudo estava ainda intimamente ligado ao organicismo. Certos naturalistas, mesmo nos nossos dias, adotam essa interpretação, que havia sido desenvolvida por Edmond Ferrier nas suas Colonies animales (1881) e P. Girod em Les sociétés chez les animaux (1891). É assim que M. E.-L. Bouvier, no seu Communisme chez les In-sectes (1926), afirma que certas sociedades de insetos são verdadeiros "organismos multicelulares"; e cita a passagem da Évolution créatrice em que Bergson diz que as abelhas da colmeia são "real, e não metaforicamente, um único organismo". Mas há muitos biologistas que se recusam a aceitar esse ponto de vista. O conjunto das células que constituem o corpo de um animal, observa Rabaud, não constitui uma sociedade: "Uma sociedade é formada por indivíduos, e o indivíduo só existe completamente livre de laços materiais; desde que se produz uma ligação material, uma dependência fisiológica, o indivíduo desaparece" (2 Semaine Internationale de Synthèse, 1930). E, igualmente, François Picard considera como um grande erro de Espinas ter confundido as colônias animais com as sociedades.
Portanto, teremos de procurar o determinismo dos fenômenos sociais entre os animais nos instintos, tais como o instinto sexual ou o instinto "filoproge-nitor", que são a base da família? "A atração sexual — responde Picard — não é, certamente, a base das sociedades". Quanto à família, não constitui, por forma alguma, uma etapa para a vida social. No capítulo VI voltaremos a tratar deste importante ponto.
As mesmas objeções podem-se fazer à imitação que, segundo bouvier, constituiria, naquilo a que chama "as sociedades comunistas de insetos", "o fator principal do progresso" e pela qual se explicariam essas "ações da multidão", resultantes de uma espécie de contágio psíquico, as quais desempenham um papel tão importante entre as formigas, as vespas, as abelhas, etc. "Não se vê nada que possa passar por imitação… — replica Rabaud — Imitar implica um trabalho extremamente complexo; imitar é compreender, e muito poucos animais compreendem". Picard, pelo menos, confirma: a imitação não cria a vida social: certo animal é imitador e social, outro, sendo igualmente imitador, vive solitário. De resto, Rabaud e Picard recusam-se, identicamente, a ver na "multidão" uma’ sociedade, mesmo rudimentar: a multidão é um simples ajuntamento provocado por um excitante puramente externo, ao passo que o fenômeno social propriamente dito seria a interatração, a atração recíproca entre seres vivos.
Em qualquer caso, não há motivo, acrescenta RABAUD, para imaginar que nos animais sociais exista "nada que se relacione, sob qualquer aspeto, com as representações coletivas compreendidas no sentido humano". O próprio Bouvier, que atribui uma importância muito maior à influência dos fatores psíquicos nos animais, acentua fortemente a diferença específica das sociedades humanas: "Neste ponto — escreve êle — o contraste torna-se impressionante: o Homem é um recém-chegado à terra. .. Sobre o fundo instintivo das raças, assentou a preponderância do plástico, as suas mais altas atividades são inteligentes".
Prenant parece apresentar a conclusão mais pertinente nas seguintes frases: "O fato fundamen-tal é, entre os indivíduos e sob a condição de estarem bastante próximos uns dos outros, uma ação de ordem material, que nunca falta e cuja natureza pode variar de uma espécie para outra e de um meio para outro. Essa interação, para uma só natureza causal, pode, conforme os casos, ter diversos efeitos: atração positiva, negativa ou nula. Só no primeiro caso há um fenômeno social, no sentido corrente da palavra… A sociedade humana, a princípio, deve ter sido um agrupamento desta ordem… Mas diversas particularidades do Homem, juntas ao estado social, devem ter permitido o desenvolvimento progressivo da utensilagem técnica e, paralelamente, o das noções, a princípio obscuras e ainda atualmente incompletas, mas estreitamente ligadas entre si, de causalidade, de finalidade humana e de liberdade. Quando se nega que a sociedade humana visa um fim e quando se assimila o Homem de hoje diretamente aos outros animais, volta a cair-se no erro, tantas vezes demonstrado, que cometeram Haeckel e certos sociólogos: esquece-se a sua evolução".
E Prenant não deixa de reconhecer que entre o estudo das associações animais e a sociologia humana há, sem dúvida, relações longínquas, mas também há "grandes diferenças de qualidade". Apesar da complexidade da questão, é a especificidade do fenômeno social na espécie humana o que nos parece concluir-se mais claramente de todos estes estudos.
III. — A SOCIOLOGIA PSICOLÓGICA
Daí a apresentar os problemas relativos à sociedade humana no campo puramente psicológico, só havia um passo a dar, e foi o que fizeram muitos sociólogos que, sob diversas formas, ligaram a sua ciência à psicologia.
1. As teorias da imitação e a interpsicologia de Gabriel Tarde.
— A imitação, que, como acabamos de ver, foi utilizada por certos naturalistas para explicar os fenômenos sociais entre os animais, foi igualmente considerada como o princípio gerador das sociedades humanas. Não falando de Emile Wax-weiler, de que a Sociologie (1906) é especialmente de inspiração biológica, o teórico mais eminente, sob este ponto de vista, foi o sociólogo francês Gabriel Tarde (1843-1904).
"A sociedade — escreyeu Tarde — não poderia viver, dar um passo em frente, modificar-se, sem um tesouro de rotina, de macaqueação e de car-neirice insondável, incessantemente aumentado pelas gerações sucessivas". Com efeito, em sua opinião, a imitação é o fenômeno social por excelência, e o grupo social pode definir-se como "uma coleção de seres que procuram imitar-se uns aos outros, ou que, sem se imitar atualmente, se assemelham, e cujos caracteres comuns são cópias antigas de um único modelo". Mas aqui a imitação é interpretada por forma nitidamente psicológica. Tarde repudia todas as formas da sociologia naturalista; porque elas não têm na devida conta o "privilégio excepcional" de que a sociologia está investida, que é ter à mão "as verdadeiras causas" de que é feito o seu objeto. O "grupo social elementar", afirma êle, é o de duas pessoas, "uma das quais atua espiritualmente sobre a outra", e assim, "a relação entre essas duas pessoas é o elemento único e necessário da vida social".
Temos, portanto, que voltar sempre ao indivíduo, e o velho método da psicologia individual, a introspeção, será também o da sociologia. "Socialmente, tudo é apenas invenção e imitação"; mas a invenção é uma coisa individual: "Para inovar, para descobrir, para despertar um momento do seu sonho familiar ou nacional, o indivíduo tem de fugir, momentaneamente, à sociedade", e Tarde exalta, então, o papel dos grandes homens que "polarizaram a alma do seu povo". A história é, precisamente, "a coleção das iniciativas mais imitadas". Por isso, é preciso explicar "as semelhanças de conjunto pela acumulação de pequenas ações elementares, o grande pelo pequeno, o total pelo detalhe. . . Tudo nasce do infinitesimal", e Tarde, que se recorda de haver preparado o concurso para a Escola Politécnica, compara esse método à análise matemática !
Atomismo social, portanto, mas também atomismo psicológico. A psicologia a que Tarde se refere é, com efeito, a de Charcot e Taine. é no hipnotismo que êle vê o tipo da relação social: "O estado social como o estado hipnótico não passam de formas do sonho, um sonho ordenado e um sonho em ação. Só ter idéias sugeridas e julgá-las espontâneas, é a ilusão caraterística do sonâmbulo e, também, do homem social". Psicologia bastante errônea, segundo nos parece. Não só o hipnotismo perdeu hoje completamente a importância que então lhe era atribuída, mas, se acreditarmos em Georges Dumas, essa imitação automática é infinitamente mais rara, no estado puro, do que geralmente se pensa. A própria sugestionabilidade depende de tudo o que favorece "a abdicação das funções de iniciativa e de crítica"; não parece uma estatística de Bernheim demonstrar que ela existe, na sua máxima expressão, nos antigos empregados de administração e nos antigos militares, numa palavra, em todos aqueles que contraíram o hábito da disciplina passiva? De maneira que esse fator psicológico, por meio do qual Tarde pretendia explicar o essencial do fenômeno social, depende, êle próprio, de é*ausas sociais!
Mas não é tudo. Essa imitação entre indivíduos, em que Tarde vê a base da psicologia "inter-cerebral" ou interpsicologia, não passa, a seus olhos, de uma forma mais complexa da imitação de si mesmo, origem do hábito e da memória e que é a base da psicologia "intracerebral". Aqui esse sociólogo invoca Taine: não é o cérebro, segundo Taine, um órgão repetidor dos órgãos sensitivos, e não é, êle próprio, um composto de elementos que se repetem uns aos outros? Assim, a imitação aparece como um aspeto da universal repetição, que já se manifesta no mundo orgânico sob a forma da hereditariedade e até no mundo físico sob a forma da ondulação!
Quase não vale a pena observar quanto uma tal fisiologia está antiquada e como semelhantes analogias parecem hoje mais superficiais e mais verbais ainda que esse organicismo que Tarde repudiava. No entanto, a verdade é que apesar dessas premissas, que levam, precisamente, à negação da sociologia como disciplina autônoma, tarde, como mostrou Blondel, por vezes viu-se levado, pelos próprios fatos, a afirmações e a métodos que se aproximam dos pontos de vista propriamente sociológicos. "O homem — escreve êle.— é um ser social enxertado num ser vital", e acaba, assim, por admitir a existência de funções mentais e de "categorias", tais como a língua e a divindade, que são caraterísticas do espírito social; mostra as próprias tendências humanas só tomando forma graças às possibilidades de satisfação que lhes oferece a vida coletiva; insiste sobre a importância da "comunicação social das crenças"; explica pelo "prestígio" a autoridade do costume e a dos grandes homens que, diz êle, "só deveram a sua força às grandes idéias de que foram os executores": não será já reconhecer a importância daquilo a que Durkheim chamará as "representações coletivas"? Por vezes, até a personalidade individual é por êle apresentada como "o princípio essencial" que se elabora nesse "alambique misterioso, de inúmeras espirais", que é a vida social. Estamos bem longe das premissas puramente individuais do princípio.
2. As teorias da "alma coletiva".
— Em oposição a essa tendência que pretendia tirar a sociologia da psicologia individual, encontram-se as teorias que têm por base a noção da "alma coletiva". Por mais confusa que seja esta noção, a sua exploração não deixou, por isso, de ter contribuído para vulgarizar a idéia de que, só pela circunstância de os indivíduos estarem reunidos em grupos, a sua psicologia sofre profundas transformações.
a) A psicologia das multidões e A escola
CRIMINALISTA italiana. — Tal foi o caso, nomeadamente, da "psicologia das multidões". tarde, no seu livro L’Opinion et la Foule, já havia distinguido a multidão, "feixe de contágios psíquicos "essencialmente produzidos por contatos físicos", e o público, "coletividade puramente espiritual, disseminação de indivíduos fisicamente separados e cuja coesão é apenas mental". Certos escritores não foram tão prudentes e usaram e abusaram do conceito de multidão. Pensamos, especialmente, no autor das Lois psychologiques de l’évolution des peuples (1894) e da Psychologie des foules (1895) : Gustave Le Bon, cujo principal valor se limita, talvez, a ter atraído , a atenção sobre problemas de que, pelo menos, em França, ninguém se ocupara antes dele.
Mais importantes e valiosos são, sem favor, os trabalhos da escola criminalista italiana, começados . por Enrico Ferri, continuados por Scipio Sieghele e depois por Pasquale Rossi e pela Rivista italiana di Sociologia. Ferri já apresentara o princípio de que o agrupamento dos indivíduos "não dá nunca um resultado igual à soma de todos eles, tomados individualmente". Em La foule criminelle (1891), SIGHELE, falando do problema da responsabilidade coletiva da multidão, escreve também: "O resultado de uma reunião de homens não é uma soma, mas um produto". E define este princípio enunciando, duas leis que afirmam: na multidão — agregado homogêneo e inorganizado — que os sentimentos e as paixões são mais fortes (e disso provém a aptidão das multidões para o crime e para a loucura), ao passo que as idéias baixam e as altas manifestações da inteligência são abolidas.
Rossi aceita, em conjunto, essas conclusões. Mas, nas manifestações da alma das multidões, recusa-se a ver unicamente fenômenos mórbidos. Na Sua Psychologie collective (1900), admite-que resulta uma "alma coletiva" da conjugação das almas individuais, em conseqüência da similitude, ao mesmo tempo, da excitação exterior e das consciências individuais que a recebem. Distingue esse "produto psicocoletivo estático", que caracteriza a multidão, dos "produtos psicocoletivos dinâmicos", que são característicos das sociedades permanentes (família, nação, etc). É aqui que Rossi (Sociologie e Psychologie-collective, 1904) vê a base da diferença que estabelece entre a "psicologia coletiva", a das multidões, — a "psicologia social", a dos povos ou das sociedades, — e a "sociologia", síntese das ciências sociais especiais.
Muitas reservas haveria a fazer acerca destas tentativas. A mais grave seria a respeito da indeterminação da noção de multidão, que certos autores identificaram, sem o menor escrúpulo, com as de público, de povo, de massa, de sociedade e até de raça. Blondel, na sua Introduction à la Psychologie collective, acabou com a confusão de quiproquós e de paralogismos para onde um Gustave Le Bon arrasta muitos leitores desprevenidos, como também com as alegações infundadas, e muitas vezes tendenciosas, que abundam na sua obra, mas que era nada prejudicaram — pelo contrário, o que é um lindo fenômeno de "psicologia colectiva"! — o seu sucesso. Por ocasião da Quatrième Semaine Internationale de Synthese (1932), na qual a discussão incidiu, precisamente, sobre a noção de multidão, Dupréel, denunciando "esse livrito incrivelmente concluído" que é a Psychologie des foules, acrescentou: "A ambição dos nossos autores não é pequena: trata-se de explicar a História e os destinos da Humanidade! Um Le Bon ou um Rossi apercebem, na perspetiva da sua psicologia das multidões, toda a atividade dos homens associados. Le Bon fala das multidões e saca conclusões acerca das raças humanas, das nações, do regime parlamentar, da instituição do júri, etc".
b) A "psicologia dos povos" na alemanha. — De resto, a idéia explorada por Le Bon e pelos criminalistas italianos não era nova: já tinha aparecido na Alemanha sob o nome de Völkerpsychologie ou "psicologia dos povos". HEGEL falara do "espírito nacional", do Volksgeist, e tivera em conta, na sua filosofia da história, o "espírito" próprio de cada povo. Herbart, que considerava a psicologia como uma espécie de "mecânica do espírito" em que as representações são as forças ativas, mostrara, nas representações coletivas, centros de forças.
É na escola de Herbart que se filiam Maurice Lazarus (1824-1903) e Heymann Steinthal (1823-1899), que fundaram em 1859 a Zeitschrift für Völkerpsychologie. A "psicologia dos povos" apresenta-se, em parte, como reação contra o naturalismo. A verdadeira explicação dos fenômenos sociais, — porque se trata de explicar e não somente de descrever — encontra-se, segundo esta escola, na psicologia: instituições, guerras, etc, todos esses fenômenos têm, no fundo, a sua causa nos sentimentos e nas idéias e as próprias influências exteriores só agem por intermédio do espírito. Mas o espírito é um produto da sociedade;’foi ela que formou o individuo e lhe permitiu tomar consciência de si próprio Existe um "espírito objetivo" que é o espírito cole-tivo, "o espírito do todo" (Allgeist) como lhe cha-ma Steinthal. Esse espírito exprime-se especialmente nessa realidade social a que se chama o "povo" ou a naçãò, e que engloba todas as outras: família, corporação, classe, etc.
Tornamos a encontrar, em parte, estas idéias na imponente Völkerpsychologie, de Wilhelm Wundt. o autor atribui por objeto à psicologia dos povos "os processos psíquicos em que assentam o desenvolvimento geral das sociedades humanas e a criação das produções intelectuais comuns de valor universal". Esforça-se por pôr em evidência as modificações que resultam, na linguagem, nos mitos, na religião e na arte, considerados como produtos coletivos, da união dos indivíduos e das ações e reações de uns sobre os outros.
Melhor ainda que as precedentes, a "psicologia dos povos" deixa transparecer o defeito comum a todas estas tentativas. A noção de "alma coletiva" exprime o fato muito positivo de a psicologia de um grupo humano, seja êle qual fôr, constituir uma realidade original, até certo ponto, distinta do psiquismo individual. Mas, além de haver perigo em transformar o próprio fato em explicação, esta noção degenerou demasiadas vezes numa verdadeira entidade que se prestava com demasiada facilidade às utilizações tendenciosas.
3. A psicossociologia americana.
— As interpretações da psicossociologia americana têm sido mais complexas e principalmente mais variadas.
Dominadas ainda, com Sumner, Ward e até Small, por um preconceito biológico, dele se emancipam com Giddings, Cooley, Mac-Douglas e os seus sucessores, em proveito do ponto de vista psicológico ou interpsicológico, W. G. Sumner (1840-1910) reconhece já nos seus Folkiuays (1907) a pressão que exerce o costume, mas a sua distinção entre os in-groups ou grupos de "nós" e os out-groups, ou grupos de "outros" fundamenta-se ainda nos postulados darwinianos. A sua The Science of Society publicada em 1927 por A. G. Keller assimila as funções sociais às de um organismo. Lester Ward (1841-1913) vê na sociedade "um jogo de fatores mentais". A sua Sociologie pure (1903) é uma mecânica social em que as forças são de natureza psíquica.
Franklin H. Giddings (1855-1931) apresenta, nos seus Príncipes de Sociologie (1896), a noção de "consciência da espécie". Essa noção é, a seus olhos, o elemento constituinte do laço social: "Sociedade, no sentido primitivo da palavra, é uma camaradagem, relações mútuas, associação e todos os fatos sociais genuínos são de natureza psíquica". Com Adam Smith, de quem faz o elogio por ter, na sua Théorie des sentiments moraux, analisado os sentimentos que unem os homens, Giddings estuda os fatores psíquicos de integração humana: comunicação, imitação, memória, simpatia, etc. Graças a esses fatores nasce um "espírito social", resultado da ação recíproca das consciências individuais, mas que as domina, as subjuga e é dotado de memória. Charles H. Cooley (1864-1929) vai ainda mais longe. Já em 1909, na sua Social Organization, êle esboça a célebre noção dos "grupos primários" (família, vizinhança, grupos de jogos, etc.) que são face to face groups onde as relações interpessoais se exercem diretamente e onde as individualidades se fundem nos "nós". A personalidade individual é, segundo este autor, uma criação da vida do grupo, e, assim, indivíduo e sociedade são os dois aspectos de uma mesma realidade psíquica. Muito próximo de Cooley encontra-se Charles A. Ellwood (1873-1946) que, nos seus Príncipes de Psycho-Sociologie (1912), afirma que o espírito individual é "uma parte de um conjunto mais vasto", provindo o conteúdo da consciência principalmente da hereditariedade e do meio social. Todavia êle recorda que só o indivíduo é um centro de experiência consciente e que, por conse-guinte, existe "não um espírito social, no sentido em que existe um espírito individual, mas uma vida mental coletiva".
A estas tendências "realistas", principalmente nítidas em Cooley, opõe-se o "relacionismo" de ALBION W. small (1854-1926), o fundador do The American Journal of Sociology (1895). Para este autor os fatores da vida social são necessidades, in-terêssês individuais, e esta vida se explica pela influência recíproca dos indivíduos uns sobre os outros. Este "formalismo" iria ter sucesso na escola de Chicago. A maior parte dos sociólogos americanos conceberam a sociedade como um simples conjunto de relações ou processos de interação entre os indivíduos, tais como: cooperação, competição, oposição, conflito, ajustamento, acomodação, assimilação, etc. Tal é, designadamente, o ponto de vista de Edward a Ross nos seus Foundations of Sociology (1905) ; tal é o do manual clássico de Park e Burgess, An Introduction to the science of sociology (1921), e, em grande parte, o de Ogburn e Nimkoff, no seu manual Sociology (1940). Floyd H. Allport leva esse formalismo até o ponto de denunciar como falaciosos os conceitos de grupo e de instituição.
A psicossociologia americana seguiu as flutuações dos diversos conceitos de psicologia que foram sendo elaborados. Na sua Introduction to social psychology (1908), W. Mac Dougall (1871-1938) utiliza o behaviorismo para determinar os "instintos" fundamentais, que são, na sua opinião, "as bases naturais do espírito", e que coloca na origem dos grandes fenômenos sociais, tais como a religião (produto do medo, da curiosidade e da submissão), o aumento das grandes cidades (produto do instinto gregário), a acumulação do capital (produto do instinto da aquisição) etc. Mas, em The group mind (1920), reconhece na sociedade "uma vida mental que não é a simples soma das vidas mentais das unidades que a compõem". Se rejeita a noção de "consciência coletiva", porque a supõe uma contiguidade espacial dos elementos componentes que, realizados no organismo, não o são na sociedade, entende que esta nem por isso deixa de possuir um "espírito de grupo" e uma vontade coletiva (M. Davy vê aí, com razão, uma síntese do organicismo spenceriano e das teorias de Rousseau) que são os produtos de uma evolução organizadora graças à qual se forma, por exemplo numa nação, uma idéia consciente do todo, um "conhecimento do grupo em si, assim como de uma certa representação desse grupo". Ao behaviorismo pode ainda ser reportada a teoria das "atitudes" (Kimball Young, Social attitudes, 1931; F. Znaniecki, Social Actions, 1936; W. Thomas, Primitive behavior, 1937),— É do behaviorismo, finalmente, que partiu um psicólogo, george herbert Mead, cuja obra principal, Mine, self and society, publicada em 1934, depois da sua morte, exerceu uma influência profunda. Mas Mead ultrapassa o behaviorismo mostrando como o indivíduo acaba, graças ao processo já indicado por cooley do "eu em espelho", pór "desempenhar o papel do outro" e rapidamente "do outro generalizado", quer dizer do meio organizado que o cerca: é assim, segundo mead, que o indivíduo se torna consciente de si próprio e que nasce o espírito da "matriz das interações sociais".
A psicanálise teve também uma influência profunda sobre a psicossociologia americana. Certas idéias de Mead não deixam de ter certa analogia com as de Freud. Mas devemos citar aqui os estudos curiosos de Abram Kardiner (The individual and his society, 1939) e seus colaboradores sobre os índios, os indígenas da ilha de Alor, etc., onde são utilizadas ao mesmo tempo a biografia, a psicanálise, os testes de Rohrschach, etc. Todavia muitos autores como Ruth Benedict, Margaret Mead, e sobretudo Ralph Linton (The cultural background of personality, 1945), entregando-se à mesma "análise da personalidade", foram levados a focalizar a influência dos modelos (patterns), dos tipos culturais e dos "papéis" sociais, inclusive sobre o que eles chamaram a basic personnality.
Enfim podemos considerar como uma tentativa de fazer reviver o velho conceito psicológico de Fechner, uma forma de pesquisa que tem tido um êxito enorme na América: a sociometria, cuja origem remonta ao livro do psiquiatra J. L. Moreno: Who shall survive? (1934). A sociometría parte da noção do "átomo social" definido, não como o indivíduo, mas como um "sistema de atrações e de repulsas projetadas pelo indivíduo". Esforça-se, ser-vindo-se de testes (sociométricos, psicodramáticos, sociodramáticos, etc), por realizar uma verdadeira experimentação sociológica, de que pretende traduzir os resultados sob a forma de sociogramas e de medidas. Mas foi obrigada a recorrer também à noção do papel social e de reconhecer que esses papéis não derivam do eu.
Os sociólogos americanos, aliás, também manifestaram, ao mesmo tempo que uma grande tendência pelas pesquisas concretas (estudos de casos particulares ou case studies; utilização de biografias, cartas, documentos pessoais, como o célebre estudo de Thomas e Znaniecki sobre o camponês polonês The polish peasant in Europe and America (1918-1920; pesquisas sociais, por exemplo a de R. S. Lynd sobre Middletown, 1929; sondagens de opinião, etc), um interesse completamente novo pelas pesquisas de métodos e de epistemologia, de que os dois livros de R. M. MacIver sobre a Social Causation (1942) e P. Sorokin sobre causalidade, espaço e tempos socio-culturais (Sociocultural Causality, Space, Time) são exemplos típicos.
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