A capitania geral de Pernambuco – Brasil Colônia

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Gottfried Heinrich Handelmann (1827 – 1891)

História do Brasil

Traduzido pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. (IHGB) Publicador pelo MEC, primeiro lançamento em 1931.

SEGUNDA SEÇÃO – A colonização do Brasil –

CAPÍTULO VIII

A capitania geral de Pernambuco

O segundo grupo de Estados brasileiros é a capitania geral de Pernambuco, que se estendia entre os limites do antigo Estado do Maranhão de um lado, o rio São Francisco de outro lado, e compreendia as atuais províncias do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas.

Foi esta mesma região a que formou o principal elemento do impérií^olonial da Companhia Holandesa das índias Ocidentais, a Nova Holanda Brasileira, e nós interrompemos a sua história justamente no momento em que com a capitulação do Recife, a 26 de janeiro de 1654, ficou completamente restabelecida a soberania portuguesa. Com isto as antigas condições de novo se estabeleceram, se bem que com grandes modificações.

Antes da invasão holandesa existiam, como se sabe, entre o Ceará e o rio São Francisco, quatro capitanias, sendo duas da coroa, Rio Grande do Norte e Paraíba, e duas feudais, Itamaracá e Pernambuco; estas ambas ainda se transmitiam por via de sucessão à descendência dos primitivos donatários: Itamaracá, à de Pero Lopes de Sousa; Pernambuco, à de Duarte Coelho. Os governadores hereditários não haviam, porém, podido conservar os seus domínios nem reconquistá-los; a guerra de independência contra os holandeses foi conduzida não nos seus nomes, mas sob as bandeiras reais, e assim o rei d. João IV julgou-se com direito de confiscar os dois feudos e reuni-los à coroa. Naturalmente protestaram contra isso as duas famílias interessadas e por meio de reclamações e queixas judiciais procuraram obter a revogação desta medida. Assim, em primeiro lugar quanto a Pernambuco, Duarte d’Albuquerque Coelho, o último herdeiro feudal que havia estado realmente empossado, falecera ainda durante a guerra de libertação e havia deixado uma única filha herdeira, a esposa de d. Miguel de Portugal, conde de Vimioso; esta intentou um processo contra o rei, para a restituição do seu feudo hereditário, e os seus descendentes continuaram o mesmo durante sessenta anos, com alternativas da sorte, isto é, diversas vezes obtendo sentença favorável; porém, sempre lhes foram contrapostos novos embargos.

Finalmente, quando se compenetraram de que a coroa de modo algum desistiria desta importante província, propuseram uma acomodação; com a sanção do rei d. João V concluiu o pretendente, d. Francisco de Portugal, conde de Vimioso, um ajuste com o procurador da coroa, no qual ele renunciava para si e seus herdeiros a todos os direitos sobre Pernambuco, e em troca receberia, a título de indenização, a quantia de 80.000 cruzados, pagáveis em dez iguais prazos anuais e além disso o marquesado português de Valença, que sob o mesmo título passaria ao seu filho e, sob o título de conde, deveria passar aos seus seguintes descendentes (1716).

Mais feliz foi a família de Pero Lopes de Sousa, em Itamaracá: depois de um processo de quase quarenta anos, conseguiu o herdeiro de direito, d. Luís Álvares de Castro Ataíde e Sousa, uma sentença favorável, e foi de novo empossado do seu feudo hereditário (1693), onde os seus descendentes ainda dominaram durante setenta anos. Finalmente, no ano 1763 comprou o rei d. José Manuel este território pela quantia de 40.000 cruzados, para a coroa; e, daí em diante, a ilha de Itamaracá, com as suas dependências em terra firme, fez a princípio parte da capitania da Paraíba, até que por ordem do gabinete, de 30 de maio de 1815, dela foi separada e incorporada definitivamente à atual província de Pernambuco. Isso quanto à extinção dos dois velhos domínios feudais; vejamos agora a sua nova constituição política. Imediatamente depois da capitulação do Recife, Francisco Barreto de Meneses, que até então havia atuado como representante do rei junto do exército da revolução, assumiu o governo, tanto nesta cidade, como em todo o domínio da Nova Holanda brasileira (28 de janeiro de 1654), e continuou provisoriamente, até que três anos depois foi elevado ao governo geral da Bahia. Nesse ínterim, reuniu o rei d. João IV todo o trecho de terras ao norte do rio São Francisco até ao Ceará ou inclusive este (a este respeito houve depois litígio) numa capitania geral, de Pernambuco, que, nominalmente, ficava sujeita ao governo-geral do Estado do Brasil na Bahia, de fato, porém, estava mais ou menos equiparada a ele, com igualdade de direitos.

O primeiro, a quem foi confiado este governo-geral, foi André Vidal de Negreiros (22 de março de 1657 até 26 de janeiro de 1661), natural da Paraíba, que fora um dos chefes do exército da revolução pernambucana e depois governador-geral do Estado do Maranhão. Também o segundo governador-geral, Francisco de Brito Freire (26 de janeiro de 1661 até 25 de março de 1664), merece menção especial; havia ele sido um dos almirantes que com a esquadra de comércio luso-brasileira havia colaborado de modo tão importante para a final conquista do Recife, e ainda maior glória obteve ele mais tarde, como historiador da guerra holando-brasileira. Por outro lado, nada adiantaria citar a longa série de seus sucessores; acrescentamos por isso somente que o cargo de governador-geral subsistiu quase até ao tempo da independência; só em 1792 se separou a Paraíba, em 1818 Alagoas, em 1820 Rio Grande do Norte, e foram elevadas a províncias, com iguais direitos; e com isso extinguiu-se a capitania geral de Pernambuco, a antiga primazia da província de igual nome. Somente em matéria de justiça ela a conservou a Relação que foi fundada na sua capital, Recife, pelo decreto de 6 de fevereiro de 1821, é ainda atualmente o único tribunal de 2* instância a que todas as quatro províncias da antiga capitania geral de Pernambuco recorrem judicialmente.

Além disso, no que diz respeito à organização eclesiástica deste grupo de Estados, pertencia ele, como todo o Brasil, primitivamente, à diocese do bispo de São Salvador (Bahia), até quando Paulo V, por uma bula de 15 de julho de 1614, instituiu para Pernambuco e os territórios mais ao norte um prelado, administrador próprio; todavia esta administração independente foi de novo revogada, por uma bula do ano de 1623 e uma ordem régia de 27 de setembro de 1624, sendo Pernambuco, com as suas dependências, de novo incorporado à diocese da Bahia. Somente no governo do rei d. Pedro II foi feita, neste sentido, uma modificação: a seu desejo erigiu o papa Inocêncio XI um bispado de Pernambuco (16 de novembro de 1676), porém de modo que o bispo dali devia ser sufragáneo do arcebispado brasileiro em São Salvador, e indicou como limites da alta fundação, ao sul, o rio São Francisco, ao norte a fronteira norte do Ceará, área na qual se conservou até aos tempos mais recentes.

Todavia nos últimos anos obteve o Ceará o seu bispado próprio, e a diocese do bispo de Pernambuco restringe-se, portanto, atualmente à esfera da antiga capitania geral de igual nome, às províncias de Rio Grande do Norte, Paraiba Pernambuco e Alagoas.

De outras instituições gerais, temos que nos referir especialmente a duas.

Primeira: as missões estavam aqui, como em toda parte no "Estado Brasileiro" propriamente dito, desde o princípio, exclusivamente nas mãos dos jesuítas; sem dúvida eles tiveram que se conformar durante o domínio holandês, com a con correncia dos missionários calvinistas; todavia estes pouco sucesso obtiveram; depois da expulsão dos holandeses, de novo a Companhia de Jesus tomou a si exclusivo cuidado das almas dos índios, que conservou até ao desaparecimento dessa instituição.

Aqui nunca foram de importância as missões; logo os primeiros imigrantes conquistadores fizeram grande mortandade entre a população primitiva; depois foram ceifados muitos índios pela guerra holandesa, e muitos, como aliados dos exércitos combatentes, levados para outras regiões; ainda outras tribos, para escapar à sujeição ao homem branco, emigraram, transpondo as próximas montanhas limítrofes, para o Ceará, ou, ao longo do curso do São Francisco, para o interior; e assim é que dentro do trecho de costa que formava o elemento principal desta capitania geral, restou relativamente muito pouco da raça indígena. Também à expulsão dos jesuítas, em 3 de setembro de 1759, existiam apenas sete missões; no interior da diocese de Pernambuco e atualmente, segundo o relatório oficial de 188.5, existem aqui apenas 16 aldeamentos exclusivamente índios, sendo em Alagoas oito, com 4.500 almas, na Paraíba quatro com 250, e quatro no Rio Grande do Norte.

Os habitantes dos mesmos e, sobretudo, os índios deste grupo de Estados já desde muito deixaram os costumes de seus antepassados e misturaram-se com a imigração européia; deu-se um caldeamento, no qual o sangue branco foi sempre preponderando e daí a razão por que a composição do povo, quanto a raças, é aqui essencialmente diversa da do antigo Estado do Maranhão.

Ao passo que ali, no Pará, Maranhão, Ceará, a grande massa das classes trabalhadoras descende de sangue índio ou meio índio, aqui ela provém, de preferência, da raça africana; e em vez da "questão dos índios", sobretudo em Pernambuco, apresenta-se a "questão dos negros".

De muito menor vulto é uma segunda circunstância histórica que devemos aqui referir, porque diz respeito igualmente ao conjunto deste grupo de Estados: trata-se das medidas político-comerciáis do marquês de Pombal. Tal qual fez no Estado do Maranhão, submeteu esse primeiro ministro também a capitania geral de Pernambuco, que até então era somente sujeita ao monopólio da mãe-pátria, ao monopólio de uma associação de comércio; a 30 de julho de 1759 foi fundada por negociantes de Lisboa, Porto e Pernambuco a Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba, com um capital inicial de 3.400 ações, cada uma a 400 mil réis, e a 13 de agosto de 1759 concedeu à mesma o rei d."José Manuel a sanção régia. Durante dezoito anos esta sociedade comercial monopolizou, em detrimento dos colonos, a importação e a exportação; finalmente, logo depois da demissão do marquês de Pombal, seu fundador (5 de março de 1777), foi ela abolida e a capitania geral de Pernambuco reabriu, primeiro, o seu comércio a todos os negociantes da mãe-pátria, em seguida, com todo o Brasil, foi franqueada ao comércio mundial, em 28 de janeiro de 1808.

Vohemo-nos agora das notícias gerais para a história particular de cada uma das regiões desta capitania geral, começando com a extrema norte, Rio Grande do Norte, que deve o seu nome ao "grande rio do Norte", Potengi, que o percorre em toda a sua extensão; tem 2.000 léguas quadradas de superfície e mais ou menos 190.000 habitantes.

Dela pouca coisa há para narrar, desde a expulsão dos holandeses. A princípio teve a província que servir duas vezes para elemento fundamental de uma formação feudal. Nos anos 1654-1656 fez o rei d. João IV doação da capital, Natal, com suas dependências, a Manuel Jordão; porém, quando esse donatário aqui chegou para tomar posse, naufragou a sua embarcação à entrada, no rio Potengi, ele próprio pereceu, e o seu feudo reverteu à coroa. Mais tarde elevou o rei d. Pedro II esta mesma terra à categoria de condado, em favor de Lope Furtado de Mendonça (16 8 9)70; resta a saber, contudo, se com esse título, conde do Rio Grande do Norte, acaso estava ligado algum direito de posse, pois não se falou mais nisso. De fato, sempre o Rio Grande do Norte fez parte essencial, sempre foi território da capitania geral de Pernambuco; na sua capital, Natal, residia um subgovernador, o qual era responsável perante o capitão-general; e a justiça, segundo uma ordenação régia de 12 de dezembro de 1687 era administrada ao mesmo tempo pelo auditor -geral da cidade de Paraíba. Nisto somente desde o princípio deste século se fez uma mudança. No ano de 1817, quando em Pernambuco estalou um movimento republicano, que durou alguns meses, o então subgovernador do Rio Grande, José Inácio Borges, aproveitou esta oportunidade para emancipar-se da autoridade do capitão-general dali. Ele adotou todas as insígnias de um governador com plenos poderes, e daí em diante despachava os seus relatórios não mais de conformidade com as ordens, para Pernambuco, porém diretamente para o ministério do Reino. O governo de d. João VI consentiu tacitamente nessa usurpação, em parte por consideração pelo próprio Borges, também porque tinha toda a razão de querer enfraquecer o agitado Pernambuco, com um tal desmembramento.

Imediatamente se tomaram disposições para organizar o Rio Grande a todos os respeitos como província autônoma: um decreto de 18 de março de 1818 retirou do auditor-geral da Paraíba o poder judiciário, que ele até aqui havia exercido sobre o Rio Grande, e estabeleceu em Natal um juiz próprio; segundo decreto, de 3 de fevereiro de 1820, criou nesta mesma cidade uma alfândega e tesouraria próprias. Daí em diante foi o Rio Grande do Norte uma província autônoma do reino, mais tarde do império do Brasil, e acompanhou todas as guerras de partidos e demoradas agitações, sem que nunca de qualquer forma representasse papel importante.

No que diz respeito à natureza interna desta província, já se mencionou que aqui, como no Ceará, se estendem grandes areais ao longo da costa; mais para o interior eleva-se uma mata virgem baixa, que fornece o melhor pau-brasil, ao que se diz, e alterna-se aqui e ali com campos não muito férteis. A hidrografia é, em suma, muito melhor que a das vizinhas províncias do Norte, porque relativamente muitos rios percorrem o seu território; por outro lado, costuma o tempo das águas dar muito pouca chuva, às vezes nenhuma; assim é que o Rio Grande do Norte está exposto, tanto como o Ceará e Piauí, às pavorosas secas que ameaçam com destruição toda a vida animal e vegetal. No interior a criação cavalar e bovina e a exploração das salinas, na costa considerável pescaria, são as principais indústrias da população; fora isto, mormente nas margens dos rios, explora-se a lavoura, que, além de produzir para o consumo local, fornece para exportação algum algodão e tabaco; a outrora importante produção de açúcar foi pouco a pouco escasseando muito, e os escravos, que assim se tornaram desnecessários, foram vendidos para o sul. Por este motivo hoje são relativamente poucos os negros no Rio Grande do Norte, e a província, em relação à mistura de raças, forma como que a transição natural entre as suas vizinhas do norte e do sul.

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