DAVID
HUME E O ENTENDIMENTO HUMANO EM RELAÇÃO À MORAL
Márcio
José Silva Lima*
RESUMO:
David Hume
apresentou uma nova abordagem da moral diferente daquela apresentada pelos
filósofos racionalistas, sobretudo Kant. Baseado no empirismo britânico, Hume
mostrou que as ações morais são determinadas pelas paixões e não pela razão.
Segundo o filósofo, a razão deve servir e obedecer às paixões sem que haja
divergência entre ambas.
PALAVRAS CHAVES: Moral, paixão, razão
A filosofia de Hume está ligada, sobretudo ao empirismo. Seus argumentos
sobre o empirismo estão baseados a partir de um certo número de suposições que
aglutinam a sua teoria do conhecimento. Para ele, as impressões e ideias fazem
parte daquilo que conhecemos através da percepção. Ele afirma que a impressão
tanto se origina da experiência sensorial quanto das atividades provindas da
memória, que antes também já passou pela experiência.
Segundo
Hume, as ideias são cópias de impressões que, em um dado momento, precederam da
experiência sensível. Dessa forma, toda experiência, sensitiva ou imaginária, é
para ele uma percepção.
Hume, partindo do pressuposto empírico, chega à dedução de que tudo
aquilo que imaginamos no processo do pensamento, pode ser resultado de uma
possível experiência, pois, tudo o que não pode ser imaginado,
consequentemente, também não pode ser experimentado. Assim, Hume afirma que a
humanidade é um conjunto de diferentes percepções que está em perpétuo fluxo ou
movimento, de onde se originará toda experiência e conhecimento.
Sobre o que concerne a moral, o filósofo também parte do princípio em que
o entendimento humano está submetido à experiência (emperia) que é segundo ele,
a base de todo conhecimento. Para Hume, a atividade do espírito consiste em
combinar, associar e generalizar os dados da experiência, pois, da percepção
vai-se até o intelecto. O conteúdo da mente e a forma como ela opera encontram
sua origem na natureza e os princípios naturais e necessários geram a luz da
razão, as ações humanas segundo o determinismo da natureza. Sendo assim, os
princípios da natureza fundam as bases do mundo moral. Através do determinismo
da natureza temos conhecimento e liberdade para agir.
A vontade envolve sentimento, portanto implica impressão e ideia, dessa
forma, a vontade é gerada pela necessidade e induz à liberdade. A necessidade
determina a conduta humana, sendo o interesse da nossa constituição moral.
Assim, as diferentes condições de vida nascem de princípios constantes
(necessários) da natureza humana, pois, os princípios naturais são as causas do
comportamento humano. Para Hume, há uma uniformidade e uma regularidade nos
princípios naturais que atingem a totalidade dos homens. Os princípios naturais
e necessários fundam a razão e as sociedades humanas, os princípios da natureza
humana, a sociedade, o governo, a constituição, a moral, a cultura, as artes e
a ciência. Em outras palavras, a natureza define a relação entre o eu, o
nós e o mundo. Portanto, há uma determinação da natureza nas atividades
produzidas pelos homens, como o próprio Hume aponta que:
Existe um curso geral da natureza nas ações humanas,
assim como nas operações do sol e do clima. Existem também caracteres
peculiares a diferentes nações e a diferentes pessoas, e outros que são comuns
a toda comunidade. (Hume, 2001, p.439)
As sensações estão na origem de nossos pensamentos e ações. A moral é,
portanto, produto dos sentimentos na qualidade de senso moral. Este senso moral
é um sentimento com razão, mais não determinado por ela, que permite o
indivíduo se auto-governar e agir de forma virtuosa. Dessa forma, o senso moral
é um dispositivo interno do sujeito que o faz aprender e que o orienta em seu
agir moral. É uma benevolência, espécie de sentimento/virtude, que conduz o
homem à prática do bem.
Segundo Hume, o senso moral está associado às paixões que são as fontes
originárias da nossa conduta moral.
Como a moral, portanto, tem uma influência sobre as
ações e os afetos, segue-se que não pode ser derivada da razão, porque a razão
sozinha, como já provamos, nunca poderia ter tal influência. A moral desperta
paixões, e produz ou impede ações. A razão por si só, é inteiramente impotente
quanto a esse aspecto. As regras da moral, portanto, não são conclusões de
nossa razão. (Hume, 2001, p.497)
As paixões determinam os fins morais que pretendemos alcançar. Mas, o que
são as paixões segundo David Hume? As paixões são um modo de existência
anterior a reflexão. É uma impressão suscitada sempre por uma outra, ou por uma
ideia que deriva de uma impressão, de modo que suas
múltiplas formas permitam que uma paixão se converta sempre numa outra. É
sensibilidade, mas, também é consciência desta sensibilidade. Podem derivar de
ideias correspondentes às impressões/sensações. As paixões são, portanto,
reações afetivas à sensação e à ideia que lhe está atrelada. A associação de
impressões e ideias determinam as múltiplas formas de paixões, neste caso o eu
é o objeto das paixões e suas causas podem ser diversas.
A paixão é uma faculdade ativa que gera comportamento e conduta. Pelo contrário, a razão é uma faculdade inativa que
gera reflexão e pensamento. Para Hume, a razão não pode ser motivo para uma
ação da vontade e a vontade, não pode se opor às paixões, pois, a razão é a
fonte do entendimento e o papel do entendimento é o que o filósofo chama de
demonstração e inferência. Portanto o raciocínio não pode sozinho ser causa de
uma ação, pois, o raciocínio nos permite compreender o que é verdadeiro e
falso, mas, não o que é correto e incorreto. Este ato cabe a paixão, o
raciocínio não determina a nossa vontade.
A razão nos permite descobrir a conexão que há entre os objetos da nossa
experiência (causalidade do mundo natural). A razão sozinha não produz volição
nem ação, não é capaz de disputar nossa preferência com qualquer emoção. Segundo
Hume, a razão deve servir e obedecer às paixões. Porém, não existe uma
divergência entre as paixões e a razão, ambas se complementam. Elas não são
instâncias opostas, uma paixão nunca é irracional, mas apenas a crença que a
acompanha. Também nunca é falsa, apenas a crença que lhe está ligada que é
passiva de erro.
Hume faz críticas ao racionalismo, sobretudo de Aristóteles, Kant,
Spinoza e Descartes, que afirmavam ser a virtude algo pensado em conformidade
com a razão. Para ele, as paixões influenciam o mundo moral e amoral influencia
novas paixões. A razão não determina as nossas ações e paixões, as regras
morais não decorrem originalmente da razão. Ao contrário, a paixão é a
adequação ou a inadequação de uma atitude ou conduta, se nossas ações não podem
ser declaradas verdadeiras ou falsas, elas também não podem ser contrárias ou
conforme a razão. De modo que, a razão não pode produzir ou impedir uma ação,
então não pode ser também ser fonte de distinção entre o bem e o mal (prazer ou
dor). As ações podem ser louváveis ou condenáveis, mas jamais racionais ou
irracionais. A razão não pode ser a fonte de um principio ativo como o senso
moral. Ela influencia nossa conduta acerca da existência de algo que pode nos
despertar uma paixão e nos oferecendo meios para exercer/viver uma paixão
qualquer.
Sendo a paixão quem determina nossos atos e condutas, nada pode impedir
seu impulso, apenas uma paixão contrária. As distinções morais não derivam da
razão, mas de um senso moral que está na base dos nossos julgamentos e ações
morais determinados pelas paixões.
Nada pode se opor ao impulso da paixão, ou retardá-lo,
senão um impulso contrário; e para que esse impulso contrário pudesse alguma
vez resultar da razão, esta última faculdade teria de exercer uma influência
original sobre a vontade e ser capaz de causar, bem como de impedir, qualquer
ato volitivo. […] A razão é, e deve ser, apenas a escrava das paixões, e não
pode aspirar à outra função além de servir e obedecer a elas. (Hume, 2001,
p.450-451)
Dessa forma, a razão é, e não pode deixar de ser, submetida à paixão,
serve apenas para gerar reflexão e pensamento, porém, a decisão parte da
paixão.
Os sentimentos de aprovação e reprovação determinam nossa faculdade de
juízo moral. Como bom empirista Hume vai dizer que a moral antes de ser pensada
é sentida e o sentimento é quem determina a diferença entre o vício e a
virtude. Assim, percebemos que a virtude é agradável, pois traz há a
possibilidade de recompensa, quanto que o vício é desagradável e causa punição.
Dessa forma, acabamos então por perceber que a paixão determina a ação e a
razão apenas dirige o impulso. A paixão gera vontade e ação e a razão gera
demonstração e cálculo (probabilidade).
A filosofia moral de David Hume apresenta uma proposta nova e diferente
das anteriores, especialmente a de Aristóteles e Kant. Apresentando as paixões
como fator determinante das ações humanas, Hume rompe com a tradição
racionalista que apontava a razão como a base de nossos atos e deveres. Porém,
é importante perceber que o seu pensamento não acaba por se tornar
irracionalista. Ele não abandona a razão, mas vê nela o agente do cálculo, a
fonte do entendimento e da reflexão.
* Graduando
em História e Filosofia pela UVA/UFPB – e-mail: [email protected]
REFERÊNCIAS
HUME, David. Tratado
da natureza humana: uma tentativa de introduzir o método experimental de
raciocínio nos assuntos morais. Tradução de Deborah Danowski. São Paulo:
UNESP, 2001.
RUSSEL, Bertrand.
História do pensamento ocidental: a aventura dos pré-socráticos a
Wittgenstein. Tradução de Laura Alves e Aurélio Rabello. Rio de Janeiro:
Ediouro, 2001.
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