cap. 16 – A metafísica do racionalismo – Fundamentos de Filosofia de Manuel Morente

Fundamentos de Filosofia de Manuel Garcia Morente
Lições Preliminares

Lição XVI

A METAFÍSICA DO
RACIONALISMO

121.
PONTO DE PARTIDA NO EU. — 122. MOVIMENTO, MATÉRIA E FÔBCA. — 123. O CALCULO
INFINITESIMAL. — 124. A MONADA: PERCEPÇÃO E APETIÇÃO. — 125. HIERARQUIA DAS
MÔNADAS. — 126. COMUNICAÇÃO ENTRE AS   SUBSTANCIAS:    HARMONIA  
PREESTABELECIDA.   —   127.    O   OTIMISMO.

 

A
metafísica do racionalismo encontra-se representada em sua forma mais perfeita
por Leibniz, cuja teoria do conhecimento vimos na lição anterior.

Essa
teoria do conhecimento de Leibniz é o solo, é o território sobre o qual os
pensamentos filosóficos de Leibniz foram pouco a pouco desenvolvendo-se. A
metafísica de Leibniz não é uma teoria sistemática que tenha sido de um
golpe pensada na sua totalidade por ele e exposta numa forma conclusiva e
terminante, antes, ao contrário, as idéias metafísicas leibnizianas foram-se
desenvolvendo a fio, ao longo da vida deste grande pensador, principalmente
canalizadas e estimuladas por seus estudos científicos e metodológicos, tanto
na teoria do conhecimento como na física e nas matemáticas.

Por
isso o sistema metafísico de Leibniz não foi exposto por seu autor senão nos
últimos anos de sua vida, e mesmo a obra que o contém da maneira mais
completa e conclusiva só foi publicada depois de sua morte. Mas se o álveo em
que se foram formando as idéias metafísicas de Leibniz foi a teoria do
conhecimento, a matemática e a física, cabe dizer que o ponto de partida
encontra-se totalmente na metafísica cartesiana. Uma e outra vez comprovamos o
fato histórico de que Descartes estabelece suas Meditações metafísicas, em seu Discurso do método, em seus Princípios de Filosofia, umas bases sobre as quais havia de especular todo
o pensamento filosófico ulterior. A filosofia de Descartes levanta um certo
número de problemas, tanto de lógica como de metafísica, como também de
matemáticas e de física, que constituem os problemas essenciais de todo o
século XVII e de grande parte do século XVIII. De modo que os filósofos posteriores
a Descartes são aquilo que são, ora porque desenvolvem pensamentos
cartesianos, ora porque se opõem a estes pensamentos com maior ou menor êxito.
Leibniz também. Desde sua mocidade apossa-se de Leibniz o afã de aprofundar nas
noções metafísicas de Descartes, e partiu desta metafísica; mas não podia
satisfazê-lo a metafísica cartesiana, e não podia satisfazê-lo por algumas
razões que vou expor imediatamente.

 

121.  
Ponto de partida no eu.

 

Que
é que Leibniz encontrava em Descartes que pudesse servir–lhe de base? Pois
simplesmente o mesmo que os demais filósofos de

sua
época, ou seja a descoberta essencial cartesiana do cogito. O ponto de partida
de toda filosofia não pode ser outro que a intuição do eu, da alma como
substância pensante. Leibniz aceita, pois, este ponto de partida cartesiano e
aceita também com o maior entusiasmo a distinção fundamental que faz Descartes
entre as idéias claras e as idéias confusas. Para Leibniz, como para Descartes,
as idéias confusas são problemáticas; constituem outras tantas interrogações,
outros tantos enigmas, cuja solução consiste em esforçar-se para que a razão,
mediante as análises conceptuais, transforme essas idéias obscuras em idéias claras.

Mas
precisamente aqui, e com razão, Leibniz nota a falta na filosofia de
Descartes, do estudo profundo do trânsito que vai das idéias confusas às idéias
claras. Como se verifica essa passagem, esse trânsito de uma idéia confusa a
uma idéia clara? Se a idéia confusa, mediante o pensamento racional, chega a
ser idéia clara, é, sem dúvida, porque a idéia confusa continha no seu seio
germinativamente a idéia clara. Pois bem; já sabemos que em toda a terminologia
filosófica deste século "idéia confusa" eqüivale à sensação,
percepção sensível, experiência sensível. Por conseguinte, a experiência
sensível tinha que conter germinativamente em seu seio a conclusão racional, a
idéia clara. Relembremos como resolveu Leibniz o problema do inatismo ou
empirismo apresentado por Locke. No sentido de que as verdades de razão, se bem
não são inatas na totalidade e no exato pormenor de sua estrutura, são,
todavia, inatas enquanto nascem de germes obscuros que estão implícitos em
nossa razão.

Se,
pois, tudo isto podia satisfazer a Leibniz, havia, ao contrário, outros
elementos na metafísica de Descartes que não o podiam contentar de maneira
alguma. O principal elemento contra o qual Leibniz se revolta, negando-se
inteiramente a admiti-lo, é o que poderíamos chamar o "geometrismo"
de Descartes. Como sabemos, Descartes estabelece por intuição direta, a
substância pensante, o eu, a alma pensante. Estabelece também, por uma
intuição direta, a existência do Deus, porque descobre que a idéia de Deus é a
única idéia na qual o objeto, a existência do objeto, está garantida pela idéia
mesma. Esta é a interpretação que demos do argumento ontológico. Mas, em troca,
a substância material, extensa, aparece a Descartes pura e simplesmente como
correlato objetivo de nossas idéias geométricas. De sorte que para Descartes a
substância material, a matéria é pura e simplesmente extensão. Isto é que
perturba a Leibniz e provoca nele uma oposição violenta a Descartes. Como a
matéria pode ser pura e simplesmente extensão? A extensão, o puro espaço
geométrico é totalmente irreal. Não é uma realidade, não é mais do que as
combinações mentais que fazemos com pontos, retas, superfícies, volumes. Certamente,
indubitavelmente, a realidade mesma, a realidade em si (seja ela qual for, e
que depois pesquisaremos) terá que acomodar-se à forma do espaço, à forma da
extensão. As coisas materiais haverão de ser também extensas. Porém não
exclusivamente extensas. Definir a matéria pela pura extensão é estabelecer uma
identidade intolerável entre a coisa real e a figura geométrica, e a isso tendia
realmente Descartes. Para Descartes, na realidade, as coisas reais não são nem
mais nem menos que simples figuras geométricas. Essa tendência cartesiana a
reduzir o físico simplesmente à espacialidade, à extensão pura geométrica é a
dificuldade contra a qual Leibniz vai-se revoltando constantemente.

 

122.  
Movimento, matéria e força.

 

Desde
os primeiros momentos de seus trabalhos científicos dirige seu pensamento para
dois problemas intimamente relacionados com este ponto: primeiramente, para o
problema do movimento; e em segundo lugar, para o problema da definição da
matéria. Mas nestes dois problemas, já nas suas primeiras lucubrações juvenis,
nota-se no pensamento de Leibniz a orientação, a marca peculiar que há de progredir
no futuro e conduzi-lo às conclusões mais famosas de sua metafísica.

Com
efeito, no problema do movimento aquilo que a Leibniz interessa não é tanto o
problema da trajetória que descreve o móvel quanto o problema da iniciação do
movimento. Aspira o jovem Leibniz a descobrir em que consiste o começo do
movimento, o que deve haver em um corpo para que esse corpo se ponha em movimento. Depois esse movimento percorre uma e outra trajetórias. Que há na essência mais
íntima do ponto em movimento que o faz percorrer uma trajetória em vez de
outra? Assim, por exemplo, se consideramos uma trajetória circular e outra
trajetória linear tangente à trajetória circular, há um ponto — o ponto de
tangência — que pertence ao mesmo tempo ao sistema da reta e ao sistema do
círculo. Que é o que há dentro deste ponto, no interior do ponto, primeiro que
o faz mover-se, e segundo, que o faz mover-se como reta, em trajetória
retilínea ou em trajetória circular? É isso que Leibniz aspira a captar
conceptual-mente. Por isso, no seu primeiro pequeno tratado acerca do movimento
abstrato e do movimento concreto, Theoria motus abstracti e Theoria motus
concreti, chega Leibniz a um conceito que lhe parece o conceito mãe de todo
movimento, e que ele chama em latim conatus, esforço, força.

Aqui
se vê a correção fundamental que Leibniz pouco a pouco vai fazendo na física e
na metafísica cartesiana. Leibniz vai procurando, por debaixo da pura
espacialidade, da pura extensão, do mecanismo das figuras geométricas, os
pontos de energia, a força, o não-espacial, o não-extenso, o dinâmico que há na
realidade. Parece a Leibniz que precisamente o erro mais grave do cartesianismo
foi esquecer esse elemento dinâmico que jaz no fundo de toda realidade.

Por que Leibniz pensa que esse elemento
dinâmico é essencial na realidade e, ao contrário, Descartes o tem
eliminado? Pois precisamente porque Descartes considerava que essas noções de
força, de energia, de conatus, de esforço, são noções obscuras e
confusas e como as reputava obscuras e confusas, eliminou-as de sua física e de
sua metafísica para substituí-las por noções claras e distintas, que são as
noções puramente geométricas.

 

123.  
O cálculo infinitesimal.

 

Pois bem; diz Leibniz: essas noções de
força, do esforço, de direção, de dinamismo, eram obscuras e confusas para
Descartes porque este não tinha ainda forjado o instrumento matemático capaz de
fazer presa nessas noções e de dispor delas, manejá-las com clareza e precisão
matemáticas. Por isso Leibniz, logo depois de seus primeiros ensaios de
definição mecânica do conatus, põe-se à procura desses instrumentos
matemáticos capazes de definir o infinitamente pequeno, e à procura desses
elementos matemáticos consagra um certo número $e anos, e chega com isso à
descoberta do cálculo infinitesimal, ao qual deu a forma que hoje tem
essencialmente em nossas escolas, ou seja, a divisão em cálculo integral e
cálculo diferencial, sendo o cálculo diferencial aquele que procura a
formulação exata daquilo que distingue o ponto da reta e o ponto da curva, a
diferença que há entre eles; e sendo o cálculo integral, ao contrário, o
esforço por encontrar a formulação matemática que permita, na definição do
ponto mesmo, ver já incluída a direção que vai tomar: se reta, ou curva, ou
elipse, ou parábola, ou hipérbole ou qualquer outra trajetória. Consegue,
finalmente, Leibniz estruturar este novo ramo da matemática, que lhe permite
por fim definir um ponto qualquer determinado não só como cruzamento de duas
retas, ou como cruzamento de duas curvas ou como tangência — como na geometria
— mas, também, como uma função de uma, duas ou três variáveis, que faz com que
o estabelecimento matemático da função nos diga de uma maneira prévia, por
assim dizer a priori, o percurso que este ponto vai seguir.

O
êxito que logra Leibniz nesta teoria do cálculo infinitesimal documenta-se
imediatamente na física, no problema da matéria, que é o segundo dos
problemas a que se encaminha sua reflexão juvenil. E neste problema da matéria
também tropeça logo depois com uma oposição à física cartesiana. A física
cartesiana é uma física geométrica. Para Descartes, o corpo não é nem mais nem
menos que a extensão. Por isso precisamente, quando Descartes calcula a
quantidade de movimento, ou seja, o produto da massa de um corpo pela sua
velocidade, encontra que a quantidade de movimento num sistema cerrado de corpo
é constante. Chama-se "sistema fechado de corpos" a um conjunto de
corpos que estão em movimento relativo uns com respeito aos outros, mas que
constituem um conjunto, um sistema, dentro do qual não penetra nenhuma
influência de fora. Semelhante sistema não se dá na realidade física na qual
vivemos; mas se consideramos a totalidade do universo, essa totalidade é, com
efeito, um sistema fechado desse universo.

Pois
bem: a tese de Descartes consiste em afirmar que a quantidade de movimento, ou
seja, o produto da massa pela velocidade, num sistema fechado (no universo, por
exemplo) é constante, e estabelece a constância de m multiplicado por v.
Leibniz examina detidamente esta tese cartesiana e acha que é fisicamente
falsa. Descartes não tomou em conta que os corpos não são somente figuras geométricas,
mas também são algo que tem a figura geométrica; não são somente extensão, mas
algo que tem a extensão; e por isso, cegado por seu geometrismo, falhou na formulação
desta lei mecânica, porque aquilo que é constante num sistema fechado,
mecânico, não é a quantidade de movimento, não é o produto da massa pela
velocidade, mas o produto da massa pelo quadrado da velocidade, aquilo que
desde então se chama em física "força viva". Leibniz, pois, descobre
a constância da força viva num sistema fechado. Quer dizer que o ponto
material não é ponto geométrico, não é definível somente pelas coordenadas
analíticas cartesianas, mas também esse ponto, se é material, se é real, contém
materialmente uma força viva, que é aquela que determina sua trajetória e sua
quantidade de movimento, e essa força viva que o ponto material contém é, num
momento determinado, a resultante exata de todo o passado da trajetória que a
massa deste ponto material percorreu e contém já in nuce, em germe, a lei da
trajetória futura.

Assim
substitui Leibniz na sua física pela noção da força viva a noção de puro espaço
extenso. Os corpos não são somente figuras geométricas, mas, ademais e
Sobretudo, forças, conglomerados de energia, conglomerados dinâmicos. Cada um
desses conglomerados pode definir-se matematicamente, porque com a trajetória
percorrida, o quadrado da velocidade e a massa, se têm elementos suficientes para
determinar matematicamente a situação dinâmica atual de qualquer corpo, e essa
situação dinâmica atual de qualquer corpo contém por sua vez a lei de sua
evolução dinâmica ulterior, posterior.

 

124.  
A mônada: percepção e apetição.

 

Com
isto, com o infinitamente pequeno do cálculo infinitesimal, com a força viva
como elemento definitório da matéria em lugar da pura extensão, temos os dois
elementos, as duas idéias fundamentais que, chegando a uma maridagem, a um
casamento, a uma união perfeita, vão produzir a metafísica propriamente dita de
Leibniz. A metafísica de Leibniz está constituída toda ela sobre o fundamento
da idéia de "mônada". Pode-se dizer que a metafísica, de Leibniz é a
teoria das mônadas, e ele o compreendeu assim, visto que sua última obra,
publicada depois de sua morte, leva este nome: "Teoria das Mônadas",
ou dito em uma só palavra: Monadologia. Vamos ver que 6 a mônada.

A
palavra "mônada" não é de Leibniz. Provavelmente Leibniz tomou-a de
suas leituras de um filósofo da Renascença, üm físico, astrônomo e matemático
muito genial, porém um pouco fantástico que se chamava Giordano Bruno. Giordano
Bruno foi quem a pôs em circulação na Europa. Talvez ele a tivesse tomado
também de leituras que houvesse feito, de místicos e filósofos da Antigüidade;
talvez de Plotino, que também a empregou. O fato é que até muito tarde na sua
evolução pessoal filosófica não usou Leibniz a palavra "mônada", e
quando chega já a usá-la cristalizam-se em torno dessa palavra todos os
elementos fundamentais de sua metafísica.

Que
é a mônada? A mônada é primeiramente substância, quer dizer, realidade.
Substância como realidade, e não substância como conteúdo do pensamento, como
termo puramente psicológico de nossas vivências, mas substância como realidade
em si e por si. Pois bem; que é para Leibniz ser substância? Ser substância,
para Leibniz, não consiste em ser extenso. Acabamos de vê-lo. Para Leibniz, a
extensão é a ordem das substâncias, a ordem da simultaneidade das substâncias,
como o tempo é a ordem da sucessão de nossos estados de consciência. A
extensão, o espaço é uma idéia prévia, mas não tem um objeto substancial, real.
O único objeto substancial, real, a substância, a mônada, não pode, por
conseguinte, definir-se pela extensão. Se a mônada pudesse definir-se pela
extensão, então a mônada seria extensa. Que quer dizer? Que seria divisível; e
se fosse divisível seria dual, ou trial etc. Mas a mônada é mônada, ou seja,
única, só, e, por conseguinte, indivisível. E para que seja indivisível não
vale falar de átomos. Os átomos materiais não satisfazem a Leibniz, porque o
átomo, se é material, se é extenso, é divisível; será mais ou menos difícil de
dividir pela técnica digital humana, mas como não se trata de técnica digital,
mas da estrutura de si e por si da substância, uma substância extensa será
sempre divisível. Por conseguinte, a mônada não pode ser divisível; é
indivisível, e se é indivisível, não é material, não pode ser material. E se,
sendo indivisível, é imaterial, que é, pois? Qual é a consistência da mônada?
Em que consiste a mônada? Se não consiste em extensão, se não consiste em
matéria, em que consiste? Pois não pode consistir em outra coisa que em força,
em energia, em vis, como se diz em latim; em vigor. A mônada é, pois, aquilo que tem força, aquilo que tem energia.

Mas
que é força e energia? Força e energia não as devemos representar como
aparecem na nossa experiência sensível. Na nossa experiência sensível chamamos
força à capacidade que um corpo tem de pôr em movimento outro corpo. Define-se,
pois, a força pela capacidade de pôr em movimento outro corpo. Mas assim não
pode definir-se metafisicamente a energia, porque aqui não há corpos; as mônadas
não são corpos, as mônadas não são extensas. Então, que será esta força em que
consiste a mônada? Não pode ser outra coisa que a capacidade de agir, a
capacidade de atuar. E que é este atuar? Que é este agir? Pois verificamos que
não há para nós intuição de ação, intuição dinâmica nenhuma, senão a que temos
de nós mesmos. Aqui outra vez o método do cogito cartesiano vem dar a Leibniz
um apoio e um auxílio. Pois como podemos imaginar e representar a força, a
energia da mônada? Pois do mesmo modo que nós, no interior de nós mesmos,
captamos a nós mesmos como força, como energia; quer dizer, como trânsito e
movimento interno psicológico de uma idéia, de uma percepção a outra percepção,
de uma vivência a outra vivência. Essa capacidade de ter vivência, essa
capacidade de variar nosso estado interior, que deixa de ser a vivência A para
passar a ser a vivência B, depois a vivência C; essa capacidade íntima de
suceder-se umas a outras as vivências, é isso que constitui para Leibniz a
consistência da mônada. A mônada é substância ativa. Que quer dizer isto?
Substância, diremos, psíquica. Essa substância ativa, essa capacidade de passar
por vários estados, essa possibilidade de_ viver com que se pode definir a
mônada, tem uma porção de caracteres interessantes.

Em
primeiro lugar, a mônada não somente é indivisível, mas individual. Que quer
dizer isto? Quer dizer que uma mônada é totalmente diferente de outra mônada;
não pode haver no universo duas mônadas iguais. Em virtude do princípio de
Leibniz chamado dos "indiscerníveis", se uma mônada fosse igual a
outra mônada, verdadeiramente igual a ela, não poderiam ser duas, mas uma. As
coisas no mundo, as realidades no mundo são indiscerníveis quando são iguais.
Portanto, nunca são iguais. A individualidade da mônada é um dos pontos
essenciais da metafísica de Leibniz.

Mas,
ademais, essa individualidade é simplicidade. Indivisível significa indivíduo,
mas ademais simples. Simples quer dizer sem partes. U mônada não tem partes,
mas, como é ativa, há de se encontrar uma definição que torne compatível a
individualidade, a indivisibilidade, a simplicidade da mônada com as mudanças
interiores da mônada. Como pode haver mudanças interiores, atividade, mudança
interior nos estados da mônada se, de outro lado, tem que ser indivisível, individual
e simples? Pois não há mais que uma maneira que é dotar a mônada de percepção.

A
mônada está, pois, dotada de percepção e de apetição, caracteres de tudo o que
é essencialmente psíquico. Percepção, porque a percepção é justamente o ato
mesmo de ter o múltiplo no simples. Na alma espiritual, no ato da percepção, o
múltiplo percebido, o conteúdo múltiplo da vivência está na unidade
indivisível, na unidade simples daquele que percebe. Na percepção é que se dá
precisamente o requisito que antes exigíamos, a saber, que a mônada seja
simples, indivisível e individual, e ao mesmo tempo que contenha uma pluralidade
de estados. Essa precisamente é a percepção; e assim define literalmente
Leibniz a percepção: como a representação do múltiplo no simples.

Mas,
ale’m de percepção, a mônada tem apetição, ou seja, tendência de passar de uma
a outra percepção. As percepções se sucedem na mônada, e esse suceder-se das
percepções na mônada constituem a apetição. Agora já temos uma representação,
uma ide’ia muito mais complexa e clara da atividade da mônada. A atividade da
mônada é dupla: de um lado, perceber; de outro lado, apetecer. Corresponde,
pois, — como diz o próprio Leibniz — a realidade metafísica da mônada a essa
realidade que chamamos o "eu".

Paremos
agora um momento; relembremos o geometrismo e o mecanismo de Descartes. Que
vemos agora? Vemos que Leibniz perfurou, por assim dizer, o fenômeno, a
aparência do geométrico, do mecânico, do físico, do material, e por debaixo
dessa aparência fenomênica do extenso, do mecânico, do material, do físico,
descobriu, como suporte real metafísico dessa aparência mecânica, a mônada, que
não é extensa, que não é movimento, mas sim é pura atividade, ou seja,
percepção e apetição.

Estas
mônadas são a sucessão constante de diferentes e diversas percepções, o
trânsito constante de uma a outra percepção. E qual é a lei íntima desse
trânsito? É uma lei espontânea. Assim como o círculo percorrido por um ponto
está já in nuce, em germe, dentro da divisão infinitesimal do ponto, assim
também as mônadas, para Leibniz, não têm janelas nem nelas penetra nada do
mundo exterior. Mas a lei íntima de sucessão de seus estados perceptívos e de
sua própria apetição é uma lei que rege essa sucessão; da mesma forma que a lei
íntima de uma função, de uma variável, está integralmente contida no seio do
ponto dessa variável. E assim verificamos que em qualquer momento de sua vida,
do seu ser, do seu existir; em qualquer instante da sua realidade, a mônada é
uma redução do mundo inteiro. É a mônada em qualquer momento de sua vida algo
que nesse momento contém todo o passado da mônada e todo o porvir, visto que a
série das percepções que a mônada vai tendo vem determinada por uma lei
interna, que é a definição dessa individualidade metafísica substancial. Em
qualquer momento da vida da mônada todo o seu passado está vertido nesse
presente e esse presente por seu turno não é mais do que o prelúdio do futuro,
inscrito já também na atividade presente da mônada.

Pois
bem; se as mônadas refletem desta sorte o universo; se cada mônada é um reflexo
universal, é assim exclusivamente de um certo ponto de vista. Reflete, pois,
cada mônada a totalidade do universo, porém a reflete do ponto de vista em que
se encontra situada, e ademais a reflete obscuramente. Leibniz distingue
perfeitamente a percepção da apercepção. Leibniz distingue entre perceber e
aperceber. Que é aperceber? Muito simplesmente: aperceber é ter consciência de
que se está percebendo. A apercepção é o saber da percepção; a percepção que se
sabe a si mesma como tal percepção. De modo que Leibniz distingue entre estes
atos psíquicos: a apercepção e a percepção.

 

125.  
Hierarquia das mônadas.

 

As
mônadas têm percepções; porém algumas dentre as mônadas além de percepções, têm
apercepções. As mônadas que têm apercepções e memória constituem o que se chama
as almas, ou seja um plano superior, na hierarquia metafísica, ao das simples
mônadas com percepções, ou seja, com idéias confusas e obscuras. Esforça-se
Leibniz,, em muitas passagens de suas obras, para tornar patente a existência
de percepções inconscientes; pois se não houvesse ou não pudesse haver
percepções inconscientes, toda sua teoria viria abaixo. Se toda percepção fosse
também, necessariamente apercepção, então todo o sistema metafísico de Leibniz
viria abaixo. Porém Leibniz esforça-se por mostrar como na nossa própria vida
psíquica, tão desenvolvida, pois somos almas com apercepção e memória,
encontramos também percepções sem consciência, e alude a uma porção de fatos
psicológicos bem conhecidos desde então na psicologia e que revelam que a cada
momento estamos percebendo sem aperceber. Temos percepções e não apercepção
disso. Por exemplo, quando Leibniz faz notar que o ruído das ondas do mar sobre
a praia tem que se compor necessariamente de uma multidão enorme de pequenos
ruídos: o que cada gota de água faz sobre cada grão de areia; e sem embargo,
não somos conscientes desses pequenos ruídos, disso que ele chama petites
perceptions, pequenas percepções. Somos conscientes somente da soma deles, do
conjunto deles, mas não de cada um deles. À parte as sensações, alude também a
uma porção de outros fenômenos psíquicos que não são conscientes. Seria bem
fácil mostrar como em nossa vida psíquica estamos a cada momento tendo
percepções e sensações das quais não nos damos conta. Pois bem: quando a
mônada, além da percepção inconsciente, tem percepção consciente, ou seja, a
percepção e capacidade de relembrar, ou seja, a memória, essa mônada é alma.
Aqui Leibniz opõe-se radicalmente à teoria de Descartes, que afirmava que os
animais não têm alma, que são puros mecanismos, iguais aos relógios, e funcionam
como relógios. Pois bem; Leibniz considera que não há tal, antes que os animais
têm alma, porque têm apercepção, se dão conta e ademais têm memória.

Outro
degrau superior na hierarquia metafísica das mônadas seriam os espíritos.
Leibniz chama espíritos às almas que ademais possuem a possibilidade,
capacidade ou faculdade de conhecer as verdades racionais, as verdades de
razão. A possibilidade de intuir as verdades de razão, de ter percepção
aperceptiva das verdades de razão, é para Leibniz o sinal distintivo dos
espíritos.

E,
por último, no mais alto, no ponto supremo da hierarquia das mônadas, está
Deus, que é uma mônada perfeita, ou seja, em que todas as percepções são
apercebidas, em que todas as idéias são claras, nenhuma confusa, e em que o mundo,
o universo, está refletido não de um ponto de vista, mas de todos os pontos de
vista. Imaginemos, pois, um ser que veja o universo, como o vemos nós, de um
setor do universo. Todo o universo está nesse setor, porque sem descontinuidade
nenhuma poderíamos passar desse setor a outro; porém simultaneamente não
podemos estar situados mais que num ponto de observação; de maneira que, embora
tendo o máximo conhecimento científico não poderíamos refletir o mundo mais que
de um certo ângulo visual. Mas imaginemos agora um ser que possa refletir, da
soma de todos os ângulos visuais, o mundo, um ser que tenha uma perspectiva
universal:  esse é Deus.

Desta
maneira, o enxame infinito das mônadas constitui um edifício hierárquico em
cuja base estão as mônadas inferiores, as mônadas materiais, cujos
conglomerados constituem os corpos mesmos, que são pontos de substância
imaterial, pontos de substância psíquica com percepção e apetição. Mas logo em
cima estão as almas, ou seja aquelas mônadas dotadas de apercepção e de,
memória. Por cima ainda, os espíritos, aquelas mônadas dotadas de apercepção
memória e conhecimento das verdades eternas. E finalmente, no ápice, está Deus,
mônada perfeita, na qual toda idéia é clara, nenhuma confusa, e toda percepção
é apercebida ou consciente.

 

126.  
Comunicação entre as substâncias: harmonia preestabelecida.

 

Deus criou o universo. Significa que Deus
cria as mônadas, e quando Deus cria as mônadas põe em cada uma delas a lei da
evolução interna de suas percepções. Por conseguinte, todas as mônadas que
constituem o universo estão entre si numa harmônica correspondência,
correspondência harmônica que foi preestabelecida por Deus no ato mesmo da
criação; no ato mesmo da criação cada mônada recebeu sua essência individual,
sua consistência individual, e essa consistência individual é a definição
funcional, infinitesimal, dessa mônada. Quer dizer, que essa mônada,
desenvolvendo sua própria essência, sem necessidade de que de fora dela entrem
ações nenhumas a influir nela, desenvolvendo sua própria essência, coincide e
corresponde com as demais mônadas numa harmonia perfeita totalmente universal.

Desta
maneira, somente com a definição essencial de cada um desses pontos de
substância metafísica que são as mônadas, Leibniz resolve o problema
formidável que se levantara na metafísica européia radicado à morte de
Descartes. Era o grande problema, o enorme problema da comunicação entre as
substâncias e principalmente da relação entre a alma e o corpo. Recordemos que
Descartes tinha estabelecido três substâncias: a substância divina, a
substância extensa, ou seja o corpo, e a substância pensante. Trata-se de
saber como é possível que o corpo influa sobre a alma e que a alma influa sobre
o corpo. Que existe essa influência é indubitável, porque um pensamento, o
pensamento de levantar a mão direita me basta para que levante a mão direita.
Por conseguinte, a alma influi sobre o corpo. Que o corpo influi sobre a
alma é também indubitável, porque uma modificação qualquer do corpo, produz em
mim pelo menos a idéia confusa da dor.

Agora,
como é possível essa comunicação entre as substâncias? Pois para que duas
substâncias, dois seres, duas coisas se comuniquem é preciso que exista entre
elas algo de comum; tem que haver algo de comum para que duas coisas se
comuniquem; têm que se comunicar por uma via comum. Mas que há de comum entre
o puro pensar e o ser extenso? Não há nada de comum. Como, pois, resolver o
problema da comunicação das substâncias, da influência do corpo sobre a alma e
da influência da alma sobre o corpo? Os metafísicos posteriores a Descartes
esforçaram-se para resolver este problema. O próprio Leibniz, num de seus
escritos, estabelece um símile muito instrutivo que compreende todas as
possíveis soluções a este problema e que alude aos filósofos que adotaram
essas possíveis soluções. O símile é o seguinte: suponhamos num quarto dois
relógios; esses dois relógios marcham sempre compassadamente, de modo que quando
um assinala as 3:05, o outro também assinala as 3:05. Como é possível que
marchem tão compassadamente? Como é possível que as modificações do corpo
sejam percebidas pela alma? Como é possível que as modificações da alma
produzam efeitos no corpo? Como é possível que os dois relógios andem
tão compassadamente? Há várias hipóteses possíveis para explicar esta
coincidência entre as duas substâncias. Primeira hipótese: a de uma influência
direta de um relógio sobre o outro. Mas não se compreende esta hipótese, que é
a de Descartes. Descartes alojava a alma dentro da glândula pineal e imaginava
que todo o movimento dos nervos era como o puxar o cordel de um sinozinho: ao
puxar, mecanicamente se transmite o movimento pelo cordel e ao chegar à
glândula pineal que, com efeito, tem a forma de um badalo de sinozinho,
mecanicamente se move e a alma se inteira. Mas como se inteira? Porque é ao
chegar aí que não se compreende; porque não há nada de comum entre um movimento
e uma percepção. Essa é a primeira hipótese, porém é uma hipótese rejeitável e
que rejeitaram todos os filósofos depois de Descartes. Não pode haver
comunicação direta entre os relógios. Então, como explicar essa
correspondência?

Cabe
ainda esta outra hipótese: um prudente e hábil artesão relojoeiro, perito em
mecânica, coloca-se diante dos dois relógios, presta toda a atenção e quando um
dos dois relógios começa a querer adiantar-se ao outro, toca em sua máquina
para que não se adiante; quando o outro começa a querer adiantar-se ao
anterior, toca na sua máquina para que não se adiante. Esta é a teoria de
Malebranche, filósofo francês discípulo de Descartes, e que se conhece com o
nome de "teoria das causas ocasionais"; segundo a qual Deus seria
esse operário; Deus estaria constantemente atento ao que sucede às substâncias,
e quando numa substância sucede algo, isto lhe dá ocasião para influir na outra
substância para que aconteça na outra o correspondente. Para Malebranche não
há outra causa eficiente senão Deus e aquilo que chamamos causas na física e na
natureza são ocasiões que Deus tem de intervir continuamente na harmonia entre
as substâncias no universo. Esta hipótese está sujeita também a críticas muito
graves.

Cabe
outra hipótese, que é a de dizer: pois que não existam dois relógios, mas sim
um só mecanismo com tiuas esferas; um só conjunto de rodas e de peças, porém
duas esferas, uma à direita e outra à esquerda. Então, por força têm que andar
sempre as duas esferas correspondentes e parelhas, porque como é um só
mecanismo aquele que manda nas duas agulhas, não pode haver diferenças entre
elas. Esta solução é o panteísmo do filósofo holandês Espinosa. O panteís-mo
nos diz: não há mais que uma substância metafisicamente, que é Deus. Esta
substância tem duas faces, dois atributos: a extensão cartesiana e o pensamento
cartesiano. Como se comunicam a extensão e o pensamento? Nem é preciso
perguntar. Como a extensão e o pensamento não são mais que dois atributos de
uma e a mesma substância universal, as modificações numa e as modificações na
outra são modificações na única substância. Diz muito bem Leibniz, é como se em
lugar de dois relógios fosse um só mecanismo com duas esferas; as duas,
naturalmente, marcariam sempre do mesmo modo, porque dependeriam de um único
mecanismo. Tampouco pôde satisfazer a Leibniz esta hipótese que conduz
diretamente ao panteísmo. O panteísmo produz dificuldades enormes, entre
outras, as dificuldades físicas ou mecânicas que vêm adscritas à negação da
existência de Deus na física do século XVII.

Assim,
pois, Leibniz tem que se socorrer de outra hipótese, que é a sua: que os dois relógios
não foram fabricados por um mau relojoeiro, mas por um operário relojoeiro
magnífico. Como magnífico? Deus é um relojoeiro tão perfeito, que uma vez que fez
os dois relógios e os pôs em marcha, não há possibilidade nenhuma de que os
dois relógios feitos por Deus se afastem nem um milésimo de segundo um do
outro, visto que foram feitos perfeitamente por Deus. Esta é a hipótese de
Leibniz, que se chama da harmonia preestabelecida. Deus criou as mônadas e o
ato de criação das mônadas é o ato de individualização das mônadas; a mônada é
criada individualmente, com sua marca individual, com sua essência, com sua
substância própria individual, ou seja com a lei íntima funcionai de todo seu
desenvolvimento ulterior. Mas Deus, ao criar a totalidade das mônadas, cada
uma com sua lei funcional interna, criou-as em harmonia preestabelecida, e
então, sem necessidade de que haja uma intercomunicação das substâncias, de
fato, seguindo cada uma cegamente sua própria lei, resulta a harmonia universal
do todo.

 

127.  
O otimismo.

 

Assim
termina a metafísica de Leibniz numa aproximação à teodicéia, ao otimismo.
Para Leibniz o mundo criado por Deus, o universo das mônadas, é o melhor, o
mais perfeito dos mundos possíveis. Se nos pusermos a excogitar, do perito de
vista da lógica pura, verificaremos que havia um grande número, um número
infinito de mundos possíveis, mas Deus criou o melhor dentre eles. Este
princípio do melhor se pode qualificar de ótimo, e a teoria leibniziana de que
este mundo criado por Deus é o melhor dos mundos possíveis é o otimismo.

Porém
esta tese do otimismo se choca com grandes dificuldades: as dificuldades
inerentes ao mal que existe no mundo. Como se podo dizer que este mundo é o
melhor dos mundos possíveis quando a cada momento vemos os homens
assassinarem-se brutalmente uns aos outros; vemos os homens morrerem de mágoa,
de nojo; vemos a in felicidade, a dor, o choro reinarem no mundo? Ora, que
mundo melhor possível é este! E então, em quinhentas páginas de um livro que se
chama Teodicéia ou justificação de Deus, Leibniz se esforça paru mostrar que,
com efeito, existe mal no mundo; porém que este mal é um mal necessário. Ou
seja, que dentro da concepção e definição do melhor mundo possível, algum mal
também entra. Qualquer outro mundo que não fosse este, teria mais mal do que
este; porque é forçoso que em qualquer mundo haja mal, e este é o mundo em que
há menos mal. Não pode haver mundo sem mal, por três razões: o mal metafísico
procede de que o mundo é limitado, finito, é finito e não pode deixar de ser; o
mal físico procede de que o mundo em sua aparência fenomênica, na realidade de
nossa vida intuitiva, é material, e n matéria traz consigo a privação, o
defeito, o mal; e, de outra parto, o mal moral tem que existir também, porque é
condição do bem moral. O bem moral não é senão a vitória da vontade moral
robusta sobre a tentação e o mal. Bem, no moral, não significa mais do que
triunfo sobre o mal, e para que haja bem é mister que haja mal, e, por
conseguinte, o mal é a base necessária, o fundo obscuro do quadro,
absolutamente indispensável para que sobre ele se destaque o bem. Neste mundo o
mal existe, por conseguinte, como condição para o bem, e é precisamente por
isso que este é o melhor dos mundos possíveis, porque o mal que nele existe é
o mínimo necessário para um máximo de bem.

Assim,
a metafísica de Leibniz termina nestes cânticos de oti­mismo universal. Na
próxima lição faremos o balanço geral desta metafísica leibniziana e
enunciaremos um novo ponto de vista que o Idealismo adota depois de morto
Leibniz.

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